Beatriz Caroline e Victor Magalhães Afonso
SÃO PAULO – Atualmente a Universidade de São Paulo (USP) tem um orçamento de 7,5 bilhões de reais, o que representa mais que o dobro dos 3,5 bilhões destinados pelo Ministério da Educação para todos os Institutos e Universidades Federais do Brasil. Mesmo com essa verba astronômica, os estudantes se veem cada vez mais em uma situação de desamparo em que se percebe que as migalhas que essa universidade destina para a permanência não são suficientes. Com os dados apresentados acima, uma certeza temos: a de que essa ausência de auxílios não é por acaso – ou falta de dinheiro – mas coincide com o projeto político de reforço do seu caráter elitista nesse contexto de uma entrada cada vez maior de estudantes de escolas públicas e vindos de cotas PPI, no qual a USP acirra sua política de ataques a todos os pilares da permanência e condições de ensino para garantir que mesmo que o povo pobre entre nessa universidade pública, não consiga permanecer nela até se formar.
Alinhada a essa política anti-pobre, a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) tem se incorporado nessa onda de ataques. Depois de 2 anos de lamentáveis condições de ensino remoto emergencial, durante o qual diversos alunos não conseguiram acompanhar as aulas com a mínima qualidade, o retorno à presencialidade não havia sido planejado pela direção, pois esta estava mais preocupada em realizar um brutal ataque aos direitos dos estudantes: o corte das cotas de impressão. A justificativa foi dada em cima de uma pretensa falta de verba universitária, e sob um falso-ambientalismo articulado com a política da “FFLCH sem Papel”.
Comecemos pelo último, o ambientalismo que está sendo debatido na universidade é feito a portas fechadas, sem levar em consideração os estudantes e a questão da permanência. Sabemos da importância da questão ambiental, mas também entendemos que as políticas ambientais não podem estar desvinculadas das necessidades imediatas da permanência estudantil. Assim, entendemos que essa política da “FFLCH sem Papel”, se estivesse realmente preocupada com o meio ambiente estaria focando em digitalizar integralmente toda a papelada burocrática, adotando papel reciclável, instalando pontos de coleta para reciclagem, entre outras medidas – e não simplesmente buscando uma “saída fácil” de diminuir o uso ao cortar direitos por ser a “solução” de mínimo esforço.
Feito de forma sorrateira, o ataque pretendia deixar o movimento estudantil desmobilizado e pegar os estudantes de surpresa, esperando que não houvesse tempo e articulação para uma mobilização estudantil massiva. Entretanto, o Centro Acadêmico de História (CAHIS) – Luiz Eduardo Merlino descobriu que haveria esse corte – logo começando a se articular com outros centros acadêmicos, entidades e representantes discentes para mobilizar os estudantes e barrá-lo.
A reação da diretoria frente às mobilizações foi convocar uma reunião em que ficou clara a postura da direção: com o diretor da FFLCH recebendo com escárnio a pauta dos estudantes, num tom agressivo de nos dar a escolha de “qual bolsa gostaríamos de cortar” para que as cotas permanecessem! De encontro a essa afronta, os militantes do Movimento Correnteza, que constroem o CAHIS e atuam enquanto Representantes Discentes, não ficaram parados. A construção dessa luta, logo com o início das aulas, contou com uma intervenção no espaço físico das salas Pró-Aluno (espaço para essas impressões) – em que os estudantes fizeram a colagem de cartazes e faixas, além da carta-denúncia e abaixo-assinado contra os cortes, escrita coletivamente, que já alcançou centenas de assinaturas.
Enquanto os estudantes vinham sendo obrigados a escolher por quais textos pagar – há textos obrigatórios que chegam a custar dezenas de reais semanalmente – o diretor da FFLCH apresentava dados escandalosamente mentirosos quanto aos gastos de impressão da faculdade, declarando que se gastaria mais que o próprio orçamento total para a unidade. Uma conta básica desses custos feita pelas nossas lideranças estudantis provou o contrário: foram apresentadas saídas cabíveis que abrangiam tanto a questão orçamentária quanto a ambiental defendendo uma luta por permanência e exigindo nenhuma cota de impressão a menos.
Nossa mobilização estudantil já forçou a direção da FFLCH a ter um recuo parcial: abrirão as salas pró-aluno durante o mês de abril para um teste sob a alegação de ver quantas folhas, grampos e toner são realmente gastos com as cotas de impressão liberadas. No entanto, essa é uma vitória inicial, haja vista o apelo da direção em boicotar a nossa luta, encaminhando um e-mail aos mais de 8000 alunos da FFLCH acusando a paralisação das aulas de ser uma medida “imprudente e precipitada” – mesmo assim, o CAHIS mobilizou mais de 100 estudantes nessa ação: garantimos um grandioso ato em frente à diretoria durante a paralisação na quarta-feira (06/04/2022), e, no período noturno, uma reunião aberta do Comitê de Defesa da Pró-Aluno, como mais um passo para construir uma sólida contra-proposta que contemple o que a direção não consegue fazer, que é resolver os problemas apresentados garantindo os direitos dos alunos à permanência.