A luta pela verdadeira libertação do povo brasileiro

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Movimentos sociais e políticos de todo país vão às ruas no 28º Grito dos Excluídos. Nos 200 anos do Grito do Ipiranga questionamos: (IN)dependência para quem?

José Levino


HISTÓRIA – Há 28 anos, no Brasil, dois gritos se contrapõem no dia 7 de setembro. Neste ano de 2022, de um lado, as classes dominantes estarão celebrando os 200 anos do Grito do Ipiranga, tendo como símbolo maior o coração morto do imperador Pedro I. Do outro, milhares de corações vivos, representando milhões do povo brasileiro, vão às ruas questionar: 200 Anos de (IN)dependência para quem? É o 28º Grito dos Excluídos.

De fato, como falar de independência quando 33 milhões de brasileiros/as passam fome e mais de metade da população, 125 milhões de pessoas, vive em situação de insegurança alimentar? Os números não são chutados. São resultado de pesquisa séria realizada pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan), entre novembro de 2021 e abril de 2022, que visitou 12.745 domicílios de 577 municípios nos 26 estados e no Distrito Federal. Uma triste realidade num país que é o quarto produtor mundial de grãos e o segundo maior exportador (dados da Embrapa).

O PT se gaba de que, nos seus 14 anos de governo, tirou o Brasil do Mapa da Fome da ONU e agora promete que o país retornará a esse status com a eleição de Lula em 2022. Entretanto, esquece que bastaram quatro anos de governo liberal neofascista para tudo cair por terra. É uma prova de que não adiantam políticas compensatórias ou paliativas, sem mudanças profundas na estrutura econômica da Sociedade. Essa estrutura, como escrevi em artigo recente (A Verdade, nº 253) sobre a importância da Reforma Agrária, foi implantada pelos europeus (Portugal, especialmente), gerando uma economia dependente e associada, cujas classes dominantes rejeitam qualquer desenvolvimentismo com um mínimo de autonomia, punindo severamente aqueles que o tentaram imprimir, a exemplo de Vargas, Juscelino e o próprio Lula, que amargaram o suicídio imposto (Vargas), a morte questionada (Goulart), o acidente suspeito (Juscelino), o impedimento (Dilma) e a cadeia (Lula).

Porém, insistem em seguir pelos mesmos caminhos, apesar das duras lições da História em nosso país, como nos demais que foram (e continuam) sendo dominados pelo centro capitalista, há quase cem anos capitaneado pelos Estados Unidos da América do Norte (EUA). Somente o povo consciente e organizado, o Poder Popular, pode assegurar a ruptura com o modelo neocolonial. Não basta ganhar as eleições, com ou sem maioria no Parlamento (as Forças Armadas estão aí para recolocar o trem da exploração nos trilhos) ou, como dizia o velho Mao, é pela boca do fuzil que se expressa o poder da burguesia. Ou seria por acaso que Bolsonaro faz de tudo para os militares assumirem o controle do TSE e ameaça não reconhecer o resultado eleitoral, se lhe for desfavorável?

O que houve em 1822 não foi um grito de libertação às margens do riacho Ipiranga. Não foi mais que um arranjo, já cantado por dom João VI ao voltar para Portugal, em 1821, ocasião em que falou para seu filho: “Pedro, se o Brasil se separar de Portugal, antes seja para ti, que me hás de respeitar, do que para algum desses aventureiros”.

A vinda da corte portuguesa para o Brasil, em 1808, foi resultado da disputa entre Inglaterra e França pelo domínio da Europa (e do mundo). Aliado da Inglaterra, Portugal foi invadido pela França e, por orientação inglesa, dom João VI fugiu com sua Corte para o Brasil, instalando aqui a sede do Reino, que se tornou mero instrumento da política inglesa.

Vitoriosa, a Inglaterra se torna potência dominante e busca negociar diretamente com as colônias portuguesas, passando a apoiar os movimentos pela Independência. Com a Declaração de dom Pedro I, em 1822, dom João VI finge resistir, inicialmente, mas não demora a negociar a aceitação da independência, compensando-a com uma indenização do Governo do Brasil, que consistiu em assumir um empréstimo de 1,4 milhão de libras que a Coroa Portuguesa havia contraído com a Inglaterra, mais 600 mil libras para pagar ao próprio dom João VI as propriedades que ele havia deixado no Brasil. E assim começa a dívida externa brasileira.

Nada mudou, efetivamente, visto que o nosso país continuou submetido a mero exportador de matérias-primas e sem condições de se industrializar. A burguesia interna nunca se rebelou contra essa dominação, pois preferia (e prefere) se aproveitar das migalhas de sua associação com o capital externo e o latifúndio nacional. E continua assim até os dias de hoje, frustradas as tentativas de um mínimo de independência e autonomia, como falamos acima.

O verdadeiro grito!

Na convocação para que todos e todas saiam às ruas no dia 7 de setembro, não para comemorar os 200 anos do Grito do Ipiranga, mas para bradar o Grito dos Excluídos, a Coordenação declara que o sofrimento do povo brasileiro é “retrato de desigualdades fomentadas dentro do jogo político e econômico que prioriza a dívida pública. No orçamento federal executado em 2021, o Brasil pagou quase R$ 2 trilhões com juros e amortização da dívida pública, o que representa um aumento de 42% do valor gasto no ano passado”. Para mudar essa realidade, a Coordenação conclama a todos para ocuparem ruas, praças, florestas e rios neste 7 de setembro, fortalecendo os Mutirões da Vida na elaboração de um projeto popular.

Estamos em ano de eleições presidenciais. Os candidatos da burguesia, que têm espaços abertos nos grandes meios de comunicação, prometem resolver os problemas do povo, como vêm fazendo há tantos anos, e a vida apenas piora. Para fazer o contraponto a essa mistificação, complemento o chamamento do Grito dos Excluídos com as palavras do candidato a presidente da República pela Unidade Popular (UP), Leonardo Pericles, que não promete resolver os problemas do povo, pois sabe que não tem condições para isso, nem quer enganar a população. Pelo contrário, aponta os caminhos para a vitória desse objetivo maior: “Precisamos aumentar as mobilizações junto aos trabalhadores rurais, aos povos indígenas, às mulheres, ao povo negro, à juventude, à comunidade LGBT, enfim, junto à classe trabalhadora, para que a consciência popular avance e para que a maioria entenda que, sob o domínio da burguesia e do capitalismo, a classe trabalhadora, os pobres deste país, nunca terão seus direitos garantidos. Por isso, a necessidade da luta pelo fim do atual sistema capitalista e a luta pelo poder popular e pelo socialismo”.

“INDEPENDÊNCIA OU MORTE!”. Para o povo brasileiro, este não é um grito a ser comemorado, mas a continuar sendo bradado em todos os lugares onde está o povo sofrido até a conquista da verdadeira independência.