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sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Ambulantes do bairro da Liberdade, em São Paulo, enfrentam difíceis condições de trabalho

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A luta dos ambulantes do bairro da Liberdade encontra paralelos em diversos lugares do Brasil. Por conta da informalidade, trabalhadores sofrem com a precarização do trabalho e com a repressão do Estado.

Raul Scurciatto e Núcleo da UP do centro de São Paulo


SÃO PAULO (SP) – No bairro da Liberdade em São Paulo, sob um sol matinal que castiga quem por ali passa, várias barracas de ambulantes se estendem sobre as ruas. De repente, carros da Guarda Civil Metropolitana avançam pela rua e os policiais descem ostentando cassetetes e armas em punho. “Aí sábado e domingo no final de semana, feriado como as vendas dá uma aquecida eu vou trabalhar… Essa é a rotina, da rua, essa loucura das ruas. E sem falar na correria, que a gente tem que correr do rapa, polícia…Tem essas coisa também na rua”, conta Djavan, 50 anos, trabalhador ambulante, formado em Letras e, atualmente, pós-graduando em Inglês.

Amante da cultura hip hop, Djavan sonha em constituir uma carreira como professor e gravar suas composições de rap. Nascido em Buriti Bravo, no interior do Maranhão, tem uma história que se assemelha com a de muitos trabalhadores migrantes das regiões Norte e Nordeste que construíram (e constroem) a cidade de São Paulo cotidianamente.

Cenas e personagens do bairro da Liberdade, mas que são comuns a vários grandes centros do Brasil. É na rua, o ambiente de trabalho de inúmeros ambulantes, trabalhadores na informalidade que vivem da renda da venda de produtos variados em suas barracas.

Ainda que a cena descrita anteriormente seja comum a diversos lugares do Brasil, um olhar para a história do bairro da Liberdade, em São Paulo, nos ajuda a ter uma noção do contexto de formação local e entender os problemas sistêmicos e como a herança maldita da escravidão – através do apagamento histórico da influência da cultura africana – atravessam o bairro na construção de sua identidade.

De origem negra, o bairro da Liberdade tem seu início como uma região de chácaras e propriedades rurais que se transformaram para receber a crescente população do centro nos períodos entre os séculos XVIII e XIX. A origem de seu nome se dá pela história de Chaguinhas, hoje santo reverenciado na Capela dos Aflitos, acervo histórico do bairro.

Chaguinhas foi um soldado negro que liderou, em 1821, um levante contra o atraso de salários. A rebelião malsucedida fez com que ele fosse condenado à pena de morte por enforcamento. Então, ocorreram três tentativas de enforcamento e em todas as cordas se romperam. A população que acompanhava aquilo gritava por “liberdade” para o condenado e, assim, o evento ficou associado ao surgimento do nome do bairro.  O milagre de um santo negro deu origem ao nome de um bairro que hoje parece querer apagar suas raízes. E foi por volta desse período que o comércio ambulante surgiu no Brasil, onde a população negra recém liberta via a atividade como forma de sobrevivência alternativa.

De volta ao cenário atual, vivemos nos últimos anos no Brasil um período de franco ataque aos direitos trabalhistas, tendo seu apogeu nas políticas neoliberais empregadas pela Reforma Trabalhista efetuada no governo do golpista Michel Temer e que tiveram continuidade e intensificação por meio de políticas da linha fascista-empresarial do governo Bolsonaro-Guedes. Isso tem reflexo direto nas condições de vida dos trabalhadores e contribui para o fenômeno capitalista da precarização do trabalho.

Com a classe dos ambulantes, a situação é complicada. Obrigados a enfrentar difíceis condições impostas pelas ruas, desde o perigo do trânsito a condições climáticas desfavoráveis como a exposição contínua ao sol forte e temperaturas elevadas até chuvas intensas que, por vezes, acarretam perda da mercadoria ou então.

Como se isso não bastasse, enfrentam outro problema ainda maior: o rapa.  “Hoje em dia tá um pouco mais leve. Mas assim, quem está na rua a qualquer momento pode perder o seu produto né, pra eles. E quando eles chegam, você sabe como que é né? Daquele jeito lá deles, com armas em punho…”.

A Guarda Civil Municipal, criada para proteger e auxiliar a população, tem se tornado, cada vez mais, ferramenta de repressão das prefeituras (Foto: Gustavo Ferraz/ A Verdade).

Há quem ache trivial ouvir na rua “olha o rapa!”, presenciar vendedores correndo com grandes sacolas no ombros e não enxergar a violência por trás de cenas como essa. O rapa é uma das formas de repressão empregada pelo Estado e, na Liberdade, ocorre como um conjunto de acordos políticos com a pequena burguesia local.

Informações obtidas através de denúncias de pessoa que preferiu ter identidade preservada para esta matéria dão conta de que há um acordo de donos de monopólios dos pontos de venda com a GCM para se utilizarem destes últimos como mecanismo de repressão e dispersão dos ambulantes, que acabam por sofrer agressões e têm seus materiais apreendidos ou danificados nessas ações.

Em uma dessas intervenções, Djavan nos traz um relato da vez em que chegou a ser preso juntamente com mais 6 colegas ambulantes, apenas por estar exercendo seu trabalho “Chegaram lá pegaram tudo nossos produtos, 6 trabalhadores né… O delegado já falou logo “eu quero eles presos, descer direto pro presídio”. Então ele não pensou “são trabalhadores, eu vou dar uma chance pra eles” não, ele mandou foi direto pro presídio”.

Um dos problemas detectados na luta dos ambulantes da Liberdade é a falta de organização e a resistência em se unirem. Eles contam que ainda há uma desconfiança por parte da maioria dos ambulantes quanto à atuação do sindicato na defesa dos seus direitos, vendo pouco avanço nas condições de trabalho e um maior interesse eleitoreiro do que uma atuação prática efetiva.

A luta contra oportunistas se dá, portanto, em diversas frentes para os ambulantes. Nesse ponto, a dificuldade de organização se coloca como um desafio para a superação das difíceis condições atuais desses trabalhadores.

A organização segue sendo a arma mais efetiva na luta por direitos da classe trabalhadora. A história nos fornece inúmeros exemplos de como os avanços e melhorias das condições de vida dos trabalhadores se deram em contextos em que eles encontraram condições de se organizar para impor suas demandas.

Um dos problemas da informalidade é de criar um senso de competitividade entre os ambulantes, onde se veem isolados e apenas como concorrentes que são jogados uns contra os outros para disputar o pouco espaço que lhes sobra nas ruas, dificultando ainda mais os diálogos para organização da classe.

As políticas neoliberais que avançaram sobre a questão do trabalho no Brasil geraram uma forte migração para a informalidade, pois na falta de opções, o trabalhador vê no trabalho informal uma saída possível. ”Mas trabalhando registrado nós temos essa segurança, né? Mesmo com o salário mais baixo, eu tenho esse seguro. Trabalhar nas ruas como autônomo você não tem isso, né? Você não tem essa segurança, se você ficar doente um mês, não conseguir trabalhar, não entra nada”. A fala de Djavan expressa o problema que muitos trabalhadores enfrentam no Brasil hoje.

Djavan é artista e pós-graduando, mas precisa ganhar a vida vendendo produtos nas ruas devido à crise capitalista (Foto: Gustavo Ferraz/ A Verdade).

A falta de garantias trabalhistas e regulamentação das profissões afeta a vida de milhares de trabalhadores que se veem desamparados pela ausência de políticas públicas que deem acesso a condições mais dignas para exercer seu trabalho. Além disso, relatos recorrentes na conversa com ambulantes apontam para a opressão sofrida no modelo formal de trabalho em antigos empregos, principalmente, na forma de assédio moral, o que acaba causando malefícios à saúde mental desses trabalhadores e tornando a informalidade um escape.

A luta dos ambulantes do bairro da Liberdade encontra paralelos em diversos lugares do Brasil. Por conta da informalidade, sofrem com a precarização do trabalho e com a repressão do Estado, que age por meio da GCM em conluio com pequeno-burgueses locais, e acabam se vendo coagidos a não se organizarem enquanto classe na busca por melhores condições.

Assim, é preciso continuar o trabalho de base, intensificando o diálogo com os ambulantes da Liberdade na busca pela construção de uma classe organizada. O socialismo é a via única para a emancipação da classe trabalhadora, e para isso a organização é fundamental. Para avançar em nossas conquistas, rumo à revolução, é preciso antes de tudo uma classe trabalhadora organizada.

Nenhum passo atrás na luta contra a burguesia. Classe trabalhadora unida para a revolução socialista!

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