Apesar de avanços contra a violência, luta das mulheres estudantes da UFABC continua pela construção de um ambiente acadêmico seguro e inclusivo.
Priscila Carvalho* e Aretha Malange* | Santo André
MULHERES – Não é novidade que desde antes da pandemia as universidades já não eram espaços seguros para mulheres, sendo palco de diversos casos de assédio, estupro e até feminicídio. Os cortes orçamentários na educação pública e a retirada de 90% do orçamento de políticas públicas para o enfrentamento da violência contra a mulher realizados pelo governo fascista de Bolsonaro agravaram ainda mais esse cenário dentro das universidades.
Como mostra o brutal assassinato de Janaina Bezerra dentro da UFPI no começo desse ano, a organização das mulheres estudantes é fundamental para denunciar essas violências e lutar pela construção de um ambiente acadêmico que seja seguro e pensado para as mulheres mães, jovens, negras, trabalhadoras e PCDs.
Na Universidade Federal do ABC, as lutas coletivas das mulheres pelo fim da violência e pela permanência das estudantes dentro da universidade nos últimos anos trouxeram vários frutos. A Comissão UFABC sem Assédio, voltada para levantar dados, analisar e propor medidas contra assédio, ainda que não seja específica para casos de assédio sexual, é uma grande vitória.
Ainda assim, a Ouvidoria da Universidade contabiliza essas denúncias como “denúncia contra conduta de servidoras/es docentes, técnico-administrativas/os e discentes da UFABC”. A ouvidoria é o canal oficial para realização de qualquer tipo de denúncia, inclusive para denúncia de casos de assédio e violência sexual.
Isso dificulta a transparência e a entender a quantidade de casos de assédio que temos na UFABC. Conforme consultado com a ouvidoria, no ano de 2021 não foram realizadas denúncias de assédio ou violência, porém a falta de denúncias é reflexo geral da sociedade onde mulheres não buscam ajuda institucional, mas sim de amigos e familiares.
Outra importante conquista foi a Política de Diversidade Sexual e de Gênero aprovada em agosto de 2022, que tem como definição “Promover a igualdade e equidade de gênero, acabar com o assédio e as violências de gênero e de sexualidade na UFABC”.
Nesta resolução consta que é responsabilidade dos diferentes setores, Reitoria e Pró-Reitorias: “promover cursos, treinamentos, formações e capacitações com a temática diversidade sexual e gênero para as pessoas servidoras e trabalhadoras terceirizadas e parceiras, conscientizando-as e educando-as no que tange a diversidade sexual e de gênero, com foco no combate às violências, preconceitos, discriminações contra mulheres e pessoas LGBTQIA+”.
Apesar disso, ainda pipocam casos de assédio dentro do fretado, no trajeto a pé da estação até a UFABC (campus Santo André), na Alameda (campus SBC) e, principalmente, em festas. Esta última acaba sendo a mais publicizada.
Após cada uma das festas organizadas pelas entidades surgem denúncias no Spotted Ufabc, página do Instagram voltada para mandar recados anônimos para crush ou relatos sobre a própria universidade. Com isso, vemos a falta de informação e confiança que as estudantes têm sobre os canais institucionais da Universidade para denúncias de casos de assédio.
Estudantes mães
Mesmo com algumas conquistas as estudantes mães ainda são discriminadas. Para as estudantes mães trabalhadoras existe uma dificuldade maior em darem continuidade aos estudos porque além da tripla jornada, elas também têm que encarar um espaço que ainda não as acolhe e inclui.
Até março, aconteceram pelo menos 3 casos de estudantes mães serem impedidas de embarcar no fretado intercampi com suas crianças, mesmo sendo um direito garantido pela universidade. Quando denunciada essa situação, a universidade disse ser responsabilidade da empresa terceirizada orientar sobre o embarque ser garantido para filhos e filhas de estudantes.
Somente com a pressão realizada pelo Coletivo de Mães e Pais da UFABC, junto a nós do Movimento de Mulheres Olga Benário, foram colocados cartazes no fretado esclarecendo quem tem acesso a ele e explicitando o direito das crianças filhas de estudantes.
Além dos constrangimentos dentro do fretado, já aconteceram casos de as estudantes serem impedidas de assistir suas aulas junto com o filho ou filha e até faltarem às aulas por conta do adoecimento dos filhos e não terem os atestados médicos das crianças aceitos como justificativa para as faltas.
No campus de São Bernardo do Campo, graças à luta das mulheres estudantes, professoras e técnicas administrativas, temos o Espaço Marielle Franco, que é um local de acolhimento de bebês e crianças da comunidade acadêmica.
O espaço vem atendendo as crianças das estudantes, mas ainda é preciso avançar na luta pela garantia de seu funcionamento. É preciso ampliar a divulgação da sua existência, garantir projetos de extensão para a promoção de atividades com as crianças e bebês, como também sua ampliação para o campus de Santo André, que atualmente não possui um espaço semelhante.
Com tudo isso, vemos que ainda temos muito que avançar nas políticas de combate à violência dentro das universidades. Na UFABC as estudantes se somam às fileiras do Movimento de Mulheres Olga Benário nos núcleos dos campus de São Bernardo e de Santo André, para mostrar que não vão mais aceitar a realidade hostil das mulheres dentro e fora da universidade.
Entendemos que nossa luta não termina dentro do campus e que a violência dentro da universidade é reflexo do agravamento das violências contra as mulheres por todo o Brasil.
No calendário das próximas lutas está a organização de atividades para a semana de Integração Universitária com as ingressantes, apresentando a alternativa de mudança com luta e organização para cada vez mais meninas. Busca-se também ampliar as comissões de segurança nas festas universitárias em conjunto com a elaboração de uma cartilha anti-opressão produzida junto a outros coletivos.
*militantes do Movimento de Mulheres Olga Benário – núcleo UFABC