A Reforma Tributária, aprovada no dia 06 de julho pela Câmara dos Deputados, e agora em discussão no Senado Federal, não reduziu nenhum imposto pago pela imensa maioria da população e manteve os privilégios para a minoria de super-ricos, a grande burguesia nacional e estrangeira.
Luiz Falcão | Comitê Central do PCR
EDITORIAL – Se há uma classe na sociedade brasileira que trabalha duro e é responsável por recolher o lixo nas cidades, pela construção dos prédios, viadutos e avenidas, por transportar milhões de pessoas em ônibus, metrôs e automóveis, por garantir acesso de crianças e adultos à educação e à saúde, esta é a classe dos trabalhadores e das trabalhadoras. Já a classe capitalista tem uma única função social: explorar de maneira brutal as massas trabalhadoras. Prova disso é que metade dos trabalhadores não tem carteira assinada e recebe um dos mais baixos salários mínimos do mundo.
Diante dessa realidade, era de se esperar que o Governo Federal e o Congresso Nacional, ao elaborar uma nova lei sobre a cobrança dos impostos, pelo menos diminuíssem as injustiças que dominam o sistema tributário nacional. Coisa nenhuma!
A Reforma Tributária, aprovada no dia 06 de julho pela Câmara dos Deputados, e agora em discussão no Senado Federal, não reduziu nenhum imposto pago pela imensa maioria da população e manteve os privilégios para a minoria de super-ricos, a grande burguesia nacional e estrangeira.
Este é o motivo de os comentaristas dos grandes meios de comunicação, empresários, donos dos bancos, executivos de multinacionais não pouparem louvores ao ministro da Fazenda Fernando Haddad e a sua equipe. Afinal, a reforma garante isenção aos donos do dinheiro e joga a pesada carga tributária sob os ombros dos trabalhadores. Detalhe: ao fazer a Reforma Trabalhista, o Congresso retirou direitos dos trabalhadores. Mas, na Reforma Tributária, não retira um só privilégio da classe rica.
Quem paga os impostos?
Grande parte dos impostos cobrados no Brasil são indiretos, ou seja, quem compra a mercadoria é quem paga o imposto. Assim, quando compramos arroz, feijão, ovos, um tênis, pagamos de uma só vez o produto e o imposto que o governo cobra das empresas. No preço do feijão, o imposto é de 15%; no leite em pó, 28%; no tênis, 44%; em roupas, 34,67%. Graças a esse sistema, ao comprar a mesma mercadoria, o rico paga o mesmo imposto que o pobre, contrariando a própria Constituição, que diz que quem tem mais tem que pagar mais. Pior: todos os impostos que o Estado cobra dos capitalistas são repassados aos preços.
Em outras palavras, os consumidores, que compram os produtos, é quem paga os impostos, é o que se chama de imposto indireto. Para esconder essa trapaça, os empresários colocam na nota fiscal o percentual do imposto que está sendo cobrado do consumidor. Porém, não dizem que este imposto deveria ser pago por quem ficará com o lucro, e não por quem garante que o lucro ocorra: o trabalhador.
Há mais injustiças. Quem possui uma moto ou um carro e o usa para entregar mercadorias ou transportar pessoas paga anualmente o IPVA. Mas os donos de jatinhos e de iates nunca pagaram nenhum imposto por esses bens para seus momentos de lazer e relaxamento.
Não bastasse, desde 1996, os lucros e dividendos da classe capitalista estão isentos de pagar imposto. Também recebem isenção tributária, grandes exportadores e as multinacionais que remetem lucros para o exterior.
Em consequência dessas benesses do Estado para com os bancos, agronegócio, mineração, empresas estrangeiras, etc., a Associação Nacional dos Auditores Fiscais (Unafisco) calcula que o governo deixará de arrecadar este ano R$ 445 bilhões de impostos, um dinheiro que poderia pôr fim ao déficit habitacional, permitir o livre acesso à universidade ou aumentar em 100% o salário-mínimo.
O resultado desse modelo tributário é que sete de cada dez trabalhadores ganham até dois salários-mínimos, mas pagam mais impostos do que os empresários e acionistas que recebem lucros e dividendos milionários sem produzir um sapato.
De fato, segundo a Oxfam, os 10% mais pobres do Brasil gastam com impostos 32% do pouco dinheiro que possuem, enquanto os que exploram o povo e as nossas riquezas (os 10% mais ricos da sociedade) gastam somente 21% da fortuna que possuem. Até a classe média (médicos, advogados, engenheiros, etc.) pagam mais impostos que os bilionários, pois a maioria desses profissionais tem carteira assinada ou emitem notas e recibos que são taxados diretamente pelo Imposto de Renda (IR).
Reforma tributária mantém injustiças
Trocando em miúdos: antes da Reforma Tributária, 50% dos impostos recolhidos pelo Estado eram pagos pelo consumidor e as fortunas e o patrimônio dos milionários estavam livres de tributos. Após a reforma, essas injustiças continuarão acontecendo. Promete-se, para o próximo ano, uma segunda etapa da reforma para debater o imposto sobre fortunas, lucros e dividendos. Mas não há nem pressa nem vontade do Governo, e menos ainda do Congresso Nacional, para mexer nos bolsos da classe rica.
É de se perguntar: se não ocorreu nenhuma mudança no sistema, por que tanta propaganda e elogio à Reforma Tributária?
Primeiro, porque a reforma mantém os escandalosos privilégios da classe dominante, permitindo que continuem sem pagar impostos e perpetuando a injustiça e a desigualdade. Segundo, porque facilita a vida da burguesia ao criar o Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) dual: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) que unifica o Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI), o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Confins); e, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que vai unificar o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Imposto sobre Serviços (ISS). Porém, o fundamental do modelo tributário continua: impostos indiretos pagos principalmente pelos consumidores e isenção para a influente e poderosa classe capitalista.
“Ah, mas há algo de novo e que pode ajudar os pobres”, gritam os que desistiram de lutar pelo socialismo. Trata-se do cashbach, que promete devolver os impostos pagos pela população que estiver inscrita no Cadastro Único e recebem o Bolsa Família. Não se sabe, entretanto, em que ano esta regra vai começar a valer e tampouco de que forma esse dinheiro será devolvido. Pouco importa, o que vale é a intenção, que sempre deixa o inferno cheio.
Uma lembrança oportuna: a Constituição brasileira, aprovada em 1988, determina a cobrança do imposto sobre grandes fortunas. Passaram-se 33 anos e, até hoje, este imposto não foi regulamentado. Consequentemente, não pode ser cobrado. Pelo contrário, alguns anos depois, o Congresso aprovou e regulamentou a isenção de imposto sobre lucros e dividendos distribuídos aos sócios. A explicação para a reviravolta: num país em que uma minoria detém o capital e os meios de produção e os trabalhadores possuem apenas a força de trabalho, os capitalistas, os donos das terras, bancos e empresas, têm infinitamente mais recursos e vantagens para fazer campanha eleitoral, corromper governantes e obter maioria no Congresso Nacional.
Em resumo, as desigualdades e a concentração de renda existentes no Brasil são resultado do injusto sistema econômico que transforma os trabalhadores em escravos assalariados de uma minoria de famílias bilionárias ou 1% da população. Para acabar de forma profunda e definitiva com as desigualdades, os trabalhadores e trabalhadoras precisam se organizar em sindicatos, movimentos sociais, realizar greves e mobilizações, e, principalmente, se organizar num partido revolucionário que defenda a conquista do poder econômico e político pela classe operária e pelos camponeses pobres, que promova uma verdadeira revolução popular.
Editorial publicado na edição nº 275 do Jornal A Verdade.