A prefeitura da cidade de Itaquaquecetuba, região metropolitana de São Paulo, anunciou que utilizará novo caminhão “Tempestade” para dispersar bailes nas periferias da cidade. De forma irônica, por utilizar jatos de água com alta pressão, o veículo carrega a frase “depois do Tempestade, vem a calmaria”.
Leonardo Carvalho | Itaquaquecetuba
DESTAQUES – Durante o anúncio, ao lado do prefeito, delegado Eduardo Boigues (PP), o secretário de segurança urbana, Anderson Caldeira, declarou que “na contramão dos eventos culturais, os chamados fluxos clandestinos causam aglomerações, fecham as vias, promovem a insegurança e reúnem a juventude em meio ao tráfico de drogas e o consumo abusivo de álcool”.
Muitos bailes em diversas periferias das cidades causam incômodo à população ao redor, com músicas altas durante a madrugada, porém a reação do Estado com violência é o oposto da exigência da juventude por mais cultura e lazer.
Os investimentos culturais na cidade sempre são escassos, se resumindo a uma ou duas atividades em todo o ano, como o caso do evento “Cultura Itinerante”, realizado pela mesma prefeitura em julho deste ano, com atrações escolhidas pela própria pasta sem abordar amplamente os gostos musicais da juventude da periferia além de servir de vitrine para consumo em trailers de foodtruck com preços que não chegam perto de serem populares.
Já para as periferias, o lazer que sobra para a juventude são os bares e os bailes realizados pela própria população de forma autônoma e nos espaços que são possíveis, sem nenhum apoio de estrutura por parte do Estado.
O consumo excessivo de drogas é uma realidade generalizada de grande parte da juventude, rica ou pobre. Porém, a guerra às drogas alimentada pelo Estado com altos investimentos em armas e mecanismos de violência, que muitas vezes param nas mãos do próprio tráfico através de propinas, se dá somente nas favelas contra os mais pobres.
O alto escalão da polícia e do tráfico seguem impunes e enriquecendo e, quando raramente investigados e julgados, são muito menos punidos que os pobres.
Já a imensa maioria da juventude usuária que é reprimida são pobres e negros, enquanto o mesmo uso de jovens ricos em baladas de alto padrão é permitido como se a lei não existisse. Logo a repressão dos bailes funk com a prerrogativa de combate às drogas apenas reforça o elitismo e a punição somente dos mais pobres.
Criminalizar o funk e declarar que “vai na contramão dos eventos culturais” é mostrar como o poder burguês do estado não reconhece a cultura da população mais pobre como digna de investimento, marginalizando cada vez mais nossa juventude, fazendo com que “se vire” para se divertir da forma que dá, com acesso ao lazer cada vez mais restrito e incentivando ainda mais o contato com as organizações criminosas que se colocam como alternativa ao Estado e suporte para essa população esquecida pelas prefeituras.
Se queremos mais tranquilidade sem baile funk em frente a casa dos trabalhadores na periferia devemos cobrar do Estado uma reforma urbana que invista no lazer e na cultura que a periferia reconhece, exercendo seu direito de ouvir as músicas que gostam não na margem da sociedade, mas amparada por ela com estruturas públicas suficientes como somente os ricos têm.