Não contente em vender a cidade para a burguesia, a Prefeitura de Florianópolis utiliza todos os meios possíveis para impulsionar a terceirização e privatização da saúde. As consequências desse processo são as dificuldades de atendimento nos Centros de Saúde e UPAs e um adoecimento em massa dos trabalhadores da saúde.
João Paulo TIZ | Florianópolis
Que a Prefeitura de Florianópolis, capital de Santa Catarina, tem o projeto de vender a cidade aos ricos, já não há dúvidas. Não faltam exemplos: foi assim com a aprovação do Plano Diretor na primeira metade deste ano e também com a tentativa de privatização da COMCAP, empresa pública de limpeza urbana. Como parte desse projeto, a saúde pública tem sido o novo alvo de ataque e desmonte, prejudicando trabalhadores e a população em geral.
De forma ditatorial, a Prefeitura e a Secretaria Municipal de Saúde têm atropelado todas as instâncias dos Conselhos de Saúde. Não bastasse, não há renovação de contratos dos profissionais, sejam médicos, enfermeiros ou administrativos. Quando há novos médicos, além de virem com contratos temporários em vez de efetivos, não possuem a qualificação e treinamento para o tipo de atuação para onde são alocados.
Adoecimento dos profissionais
O Centro de Saúde (CS) do bairro Pantanal, por exemplo, perdeu dois médicos em um período de menos de dois meses. O primeiro descobriu, no seu último dia de trabalho, que seu contrato não foi renovado. O segundo, também sem qualquer aviso prévio, foi transferido de unidade sem tempo hábil para que o CS pudesse treinar alguém para substituí-lo. Assim, o CS Pantanal, que necessita de 5 equipes completas para atender os 13 mil usuários da região, conta atualmente com 3 equipes das quais apenas 1 está completa.
Já o CS do bairro Itacorubi, além de necessitar de reformas, sofre com a falta de técnicos de enfermagem, dentista e de uma farmácia de referência para a entrega de remédios controlados. Mesmo assim, a prefeitura não renovou o contrato de uma das enfermeiras e da única profissional de Recursos Humanos.
O caos gerado pelo desmonte da saúde tem afetado de forma brutal os profissionais da saúde. O Conselho Municipal de Saúde (CMS) apresentou dados alarmantes: de janeiro a agosto deste ano, com 1334 servidores atuando na área, foram feitos 2999 pedidos de afastamento, dos quais 81% foram para o profissional tratar da própria saúde.
Além disso, apesar das 580 contratações, houveram 313 desligamentos, sendo 87% a pedido dos profissionais. O que esses números estão dizendo é: os profissionais que cuidam da nossa saúde estão adoecendo física e mentalmente por atuar sobrecarregados e em péssimas condições de trabalho.
Sucatear para privatizar
O que poderia ser apenas uma hipótese foi comprovado no dia 13 de novembro pela prefeitura. Em portaria publicada, oficializou-se a entrega do gerenciamento e execução das ações de serviços de saúde de Urgência e Emergência da UPA (Unidade de Pronto Atendimento) Norte para uma Organização Social (OS).
Ou seja, o objetivo desse desmonte é desde o princípio a privatização – entregar nossa saúde para um punhado reduzido de pessoas que decidirão nos manter vivos somente se for lucrativo. No capitalismo, isso é chamado de progresso e eficiência.
Há ainda o caso da UPA Sul, que arbitrariamente está sendo transferida para 10km de distância de sua localização atual, longe de quase toda a comunidade que atende.
Em plenária do CMS, foi denunciado o processo de contratação da empresa responsável pela obra, Centro Comercial Carianos, criada em 16 de março com um capital inicial de R$10 mil. O contrato, firmado com a prefeitura em 16 de maio – 3 dias antes da reunião do CMS que avaliaria o caso – no valor de R$41 milhões sem licitação, tem como fiadora a Plena Malls S/A, empresa cujos proprietários, Filipe Demetérico e João Gomes, são os mesmos da contratada. Não bastasse, o edital que deu origem a esse contrato foi aberto dia 21 de março, apenas 5 dias após a criação da Centro Comercial Carianos.
O caso, que segue no momento sendo investigado pelo Ministério Público, escancara o quanto a Prefeitura está disposta a se desdobrar para entregar recursos públicos à iniciativa privada. Enquanto aos Centros de Saúde foram dadas somente promessas para atender a necessidade dos médicos e da população, as construtoras e OSs tiveram as demandas atendidas tão rapidamente que chegaram antes mesmo do conhecimento dos Conselhos de Saúde.
Povo na rua para salvar a saúde
Graças a um trabalho de conscientização, panfletagem e denúncias, os moradores têm se mobilizado para ir às ruas barrar a precarização da saúde, a exemplo dos atos “UPA Sul Fica”. Assim, mais pessoas têm se mostrado dispostas a lutar pela valorização dos profissionais da saúde e pelo fim dessa política de desmonte. Em resposta à recente entrega da UPA Norte para uma OS, por exemplo, os moradores e usuários da unidade construíram a frente “A UPA Norte é nossa!” a fim de barrar o processo.
No dia 8 de Novembro, um ato em frente ao Centro de Saúde do Pantanal, pressionou a Prefeitura a finalmente agir e, em apenas uma semana, o CS Pantanal conseguiu 4 médicos para trabalhar no local. Essa luta, que foi exemplar e ecoou por outros Centros de Saúde do município, demonstrou o potencial da organização popular na garantia de seus direitos.
Porém, isso não significa que a Prefeitura tenha cedido às demandas por completo, visto que os contratos são temporários e mais um contrato do CS, desta vez da equipe de RH, não foi renovado. Além disso, a Prefeitura havia prometido a abertura dos editais de concurso público ainda na primeira metade de novembro, o que até agora não foi feito.
Assim, essas lutas e conquistas demonstram que é possível reverter a situação. Agora se faz necessário construí-las nas demais unidades, organizar os moradores das regiões, transformando em uma luta municipal. Com mobilização popular, com o povo na rua, é possível acabar com a política de desmonte que coloca a saúde dos moradores e dos trabalhadores em risco.