Segundo o Diário Oficial do Município, o aumento se deu “em razão da constatação de aumento nas despesas que compõem os principais insumos relativos aos custos operacionais desse serviço público essencial”
Gustavo Marcelino | Morador de São Bernardo do Campo
SOCIEDADE – Em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, os trabalhadores que dependem do transporte público para se locomover já começaram o ano de 2024 sofrendo ataques por parte daqueles que administram a cidade a seu bel-prazer viajando no conforto de seus carros. O motivo: a passagem de ônibus municipal, que já ostentava a posição de mais cara do estado de SP quando era R$5,75, sofreu um aumento de quase 4% em Janeiro deste ano, passando para R$5,95 já a partir do primeiro dia de 2024.
Às vésperas do fim do ano – quando algumas empresas e membros de sindicatos estavam de recesso – a prefeitura de Orlando Morando decidiu que os trabalhadores deveriam pagar a conta pela má gestão do transporte e mobilidade urbana na cidade. Além de que, mais uma vez, a política neoliberal impôs a carestia dos produtos ao bolso do povo.
Vale analisar o inciso II do art. 169, da Lei Orgânica Municipal, que estabelece as diretrizes na prestação dos serviços de transportes coletivos em São Bernardo. Segundo este inciso, a tarifa deve ser condizente com o poder aquisitivo da população e a qualidade dos serviços.
De acordo com o IBGE, a cidade tem quase 30% da população em vulnerabilidade social, isto é, aproximadamente 240 mil pessoas que recebem até um salário-mínimo (R$1.412) para suprir as despesas próprias e de sua família com alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência.
Conforme a última pesquisa do Procon na região, o valor da cesta básica em SBC é R$1.247,04. Os aluguéis estão entre os mais caros da Região Metropolitana de São Paulo e ainda assim são a única alternativa do povo pobre, pois a especulação imobiliária e as grandes construtoras usurparam os financiamentos de imóveis na cidade e fazem com que não haja programas habitacionais, tornando o acesso à moradia própria impossível para trabalhadores honestos.
Com essa nova tarifa dos ônibus um cidadão que utiliza apenas duas conduções por dia passará a gastar R$261,80 por mês com o transporte apenas nos dias úteis. Considerando que o planejamento de mobilidade urbana na cidade é excludente e que para a maioria dos trajetos é necessário tomar mais de uma condução, muitos trabalhadores precisarão desembolsar muito mais que esse preço para poder ir de um ponto a outro, gastando boa parte do salário só para conseguir chegar e ir embora do local de serviço.
Não é possível afirmar de forma alguma que o poder aquisitivo da população de São Bernardo do Campo admite qualquer aumento no valor de um serviço que deveria ser facilmente acessado por todos, independentemente da situação financeira, idade, condição física e mental, escolaridade e local de residência.
População reclama das condições do transporte
“Eu já cheguei a ouvir ‘mas é só o senhor acompanhar por aplicativo’. Quer dizer, agora sou obrigado a ter um aplicativo porque senão vou ficar uma hora, quarenta minutos no ponto de ônibus? Por que isso acontece?”, disse Dorival Nunes, professor entrevistado pelo Jornal A Verdade.
Para aquelas e aqueles que moram em bairros ainda mais distantes e periféricos, como o bairro dos Três Marias, por exemplo, é ainda pior: “De domingo não existe ônibus. Eles acham que pobre só pode sair de casa para trabalhar e de segunda a sábado, de domingo a gente precisa sair de casa às 07h da manhã se quiser chegar em qualquer lugar antes da 12h”, afirma Lucia Simão, moradora do local.
Além do tempo de espera exagerado, os usuários enfrentam diariamente os veículos lotados e com defeitos. Os motoristas dos ônibus também sofrem com as imposições da gestão. Trabalham com carga horária extensa, sem reajuste há anos e exercendo, na prática, as funções de motorista, cobrador e auxiliar de mobilidade.
Servidores municipais sofrem para poder ir ao trabalho
Já aos servidores e servidoras públicas que trabalham exaustivamente para manter o município em funcionamento a Prefeitura burocratiza e dificulta o recebimento de um auxílio-transporte humilhante de no máximo R$88,00, criado em 2002 e que desde então só passou por um reajuste há quase uma década.
Na prática, muitos funcionários de escolas, unidades de saúde, guardas civis municipais e demais trabalhadores concursados relatam que esse benefício não ajuda sequer com uma semana de custeio das tarifas. É comum, inclusive, a Prefeitura exonerar servidores por “uso indevido do benefício” quando é verificado o uso de transportes alheios às linhas de ônibus informadas na solicitação ao RH, acompanhado de processo administrativo por “lesar o município”.
Cabe comentar também que a logística de movimentação de pessoal das secretarias geralmente é desumana e contraditória, enviando servidores para exercerem seus cargos distante de suas residências e em horários nem sempre condizentes com o que o trabalhador informou que tem disponíveis, impedindo planejamentos com os estudos, atividades físicas, lazer, família e fazendo com que o tempo gasto no trajeto seja ainda maior, simplesmente por conta do recorte aleatório da lista na atribuição de vagas.
O Prefeito Orlando Morando, seus vereadores e os Deputados da sua base, como Carla Morando e Marcelo Lima (ex-vice de Morando e que teve seu mandato de deputado cassado), somam cada dia mais ataques à população de São Bernardo.
Utilizam o dinheiro dos impostos da população para se promover, injetar altos gastos em publicidade, alçar nomes de seus partidos a cargos políticos, aumentam seus próprios salários, enquanto os servidores da cidade sofrem para se manter em seus empregos e pagar as contas.
Cabe aos usuários do transporte público, ou seja, os trabalhadores e trabalhadoras, se revoltarem contra esses absurdos e organizarem atos contra o aumento, se posicionando contrários às políticas excludentes e nefastas do neoliberalismo e do prefeito Orlando Morando, denunciado na ONU e no MP por racismo institucional.
Se o transporte coletivo é público, sua gestão deveria estar nas mãos da população que o utiliza e esse direito garantido pela constituição federal deveria ser amplamente acessado por todos e todas.