Wilhelm Pieck, um simples marceneiro alemão, lutou contra o fascismo e se tornou o primeiro presidente da República Democrática da Alemanha. Seu papel histórico contra o fascismo e pelo socialismo deve ser um exemplo para nós
Andrei Rodrigues | Rio de Janeiro (RJ)
Desde que o comunismo surgiu enquanto doutrina de libertação do proletariado, as camadasmais reacionárias da humanidade apresentaram o anticomunismo como resposta. Com o objetivo de esconder o potencial de transformação que uma sociedade pode ter sob o socialismo, os ideólogos da burguesia fazem de tudo para falsificar, distorcer e deformar as experiências históricas de construção das revoluções por todo o mundo e, ao mesmo tempo, apagar o papel heróico dos melhores filhos da classe trabalhadora. Compreender esse panorama nos ajuda a entender porque é desconhecida a história de Wilhelm Pieck, um simples marceneiro alemão que se tornou o primeiro presidente da República Democrática da Alemanha.
Os primeiros anos de luta
Nascido em 1876, no seio de uma família proletária na cidade de Guben (atualmente localizada na Polônia), Friedrich Wilhelm Reinhold Pieck deparou-se, ainda cedo, com a dureza da realidade capitalista. Filho de pai cocheiro e de uma madrasta lavadeira, Pieck foi jogado ainda muito cedo ao mundo do trabalho e, na década de 1890, com 15 anos, teve que ingressar em um curso técnico de marcenaria.
Revoltado com as terríveis condições às quais os trabalhadores alemães eram submetidos sob o Império, em 1894, direcionou as suas energias à militância na Associação dos Trabalhadores da Madeira. No ano seguinte, em 1895, ao compreender que a luta sindical é uma etapa específica de uma luta geral de transformação total da sociedade, Pieck decide entrar nas fileiras do Partido Social-Democrata da Alemanha (PSA), à época, o maior partido socialista de todo o mundo.
A partir da primeira metade da década de 1900, graças a sua dedicação e disciplina, o jovem marceneiro é escolhido como secretário do PSA na altamente proletarizada cidade de Bremen e, ainda nessa época, após ser eleito por expressivas votações entre os operários, começou a compor o parlamento local prussiano como representante do partido.
A Primeira Guerra Mundial e a luta contra o Social-chauvinismo
Com a chegada da Primeira Guerra Mundial, frente às posições revisionistas e social-chauvinistas da maioria da direção do PSA, que defendiam a participação dos operários na guerra da burguesia contra o operariado de outros países, Pieck se une definitivamente à ala internacionalista do partido.
Junto a camaradas como Rosa Luxemburgo, Karl Liebknecht e Clara Zetkin, denuncia as posições reacionárias da social-democracia da II Internacional. A organização de atos, conferências e a divulgação de propagandas anti-guerra fez com que Wilhelm Pieck fosse arduamente perseguido pelos cruéis oficiais alemães, que o jogaram na linha de frente da guerra de rapina.
Algum tempo após ser atirado ao campo de batalha, o comunista se negou a lutar a guerra das burguesias europeias e, por conta disso, foi preso por “insubordinação”, mas conseguiu fugir das punições que lhe foram impostas e entrou definitivamente na clandestinidade. Nesse período, a fim de fortalecer a unidade da classe trabalhadora alemã em prol da paz e da construção de um governo popular, Pieck empreendeu grandes esforços na consolidação da ala internacionalista (que veio a ser conhecida como Liga Espartaquista) como uma alternativa ao caduco e reacionário PSA. Em 1918, ao mesmo tempo em que organizava as mobilizações e as greves que fizeram parte da Revolução Alemã, foi também uma das figuras centrais na união dos grupos e organizações mais radicais do país que deram origem ao Partido Comunista da Alemanha (PCA), o estado-maior da classe trabalhadora alemã e leal membro da III Internacional.
A luta antifascista e a fundação da República Democrática da Alemanha
Após a repressão violenta da Revolução Alemã, as classes reacionárias do país coroaram o seu novo governo, a República de Weimar (1919-1933), com uma grande fachada democrática. Assim, a república que a burguesia divulgava internacionalmente como ápice da liberdade e da humanidade, foi, na realidade, terreno propício para que grupos fascistas se desenvolvessem e prosperassem sem pudor – tudo isso com a conivência da social-democracia, que priorizava perseguir os comunistas do que combater os reacionários. Frente a esse panorama, o PCA tomou para si a missão histórica de organizar as massas exploradas da Alemanha, utilizando as eleições como meio de divulgação da linha política do partido e transformando o parlamento burguês em uma tribuna de denúncias do povo.
Pieck cumpriu um papel fundamental na construção cotidiana dessas tarefas. A partir de 1921, a construção cotidiana e sistemática do trabalho partidário entre as massas alemãs permitiu que o camarada fosse continuamente eleito para diferentes instituições de poder – desde os parlamentos locais até ao Reichstag, o maior parlamento do país. Longe de se deixar levar pela ilusão burguesa de democracia, Pieck aproveitou a janela de oportunidade relativa das “liberdades democráticas” para divulgar incansavelmente o programa do Partido nos cargos em que ocupava.
O esforço coletivo empreendido pelo camarada e pelo conjunto do PCA garantiu que ele se massificasse e alcançasse a impressionante marca de mais 350.000 membros.
Com o avanço do fascismo na Europa e a chegada de Hitler ao poder na Alemanha, o PCA, agora sob a liderança máxima de Wilhelm Pieck, realizou um esforço internacional pela implementação da linha já defendida anteriormente pelo camarada Dimitrov da Frente Popular Antifascista. Mesmo estando exilado de sua terra natal, Pieck não poupou esforços para garantir o acompanhamento do trabalho do Partido e defendeu incansavelmente a justeza da linha da Frente Antifascista como secretário-geral da Internacional Comunista.
O papel histórico de coesão que o PCA cumpriu entre as demais forças anti-fascistas na Alemanha deve ser um exemplo para nós. Ao centrarem as suas energias na formação política das massas oprimidas pelo regime hitlerista e convocarem todos os setores populares para lutarem consigo, os comunistas foram capazes de superar o cisma entre as diferentes organizações e camadas politicamente atuantes e puderam atacar o fascismo com mais qualidade. Foi graças à tática chefiada pelo PCA que, após a libertação de Berlim pelo Exército Vermelho, o povo pode agir em prol da construção de uma nova Alemanha.
Em 1949, quatro anos após o fim da 2º Guerra Mundial, um golpe imperialista sequestrou a parte oeste da Alemanha e promoveu a fundação de um país satélite dos EUA e da OTAN, a República Federal da Alemanha (RFA). A fim de defenderem a sua soberania e a sua liderança política, os trabalhadores do leste, organizados sob a bandeira comunista do então Partido Socialista Unificado da Alemanha (SED) – fruto da fusão entre o PCA e o PSA – realizaram amplos debates e discussões entre os sindicatos e os conselhos operários que resultaram na proposta da fundação de uma nação nova, soberana e, sobretudo, socialista: A República Democrática da Alemanha (RDA).
O povo da RDA elegeu Wilhelm Pieck como presidente e provou, assim, que em um país socialista até um simples marceneiro pode exercer o poder. Na presidência, Pieck promoveu uma ampla campanha de desnazificação no país, fortaleceu os sindicatos e as organizações operárias, abriu a política para que todos pudessem participar e investiu na reconstrução da Alemanha. O que os comunistas fizeram, isto é, reerguer um país das cinzas ao mesmo tempo que garantiam comida, moradia, educação, saúde e cultura para o povo não foi uma tarefa fácil e só pôde ser realizada graças à clareza política do partido e de Pieck.
Ainda em 1946, ao falar das tarefas do proletariado organizado para reconstruir a Alemanha o camarada disse:
“Nossa tarefa mais importante é aliviar a miséria do nosso povo e, acima de tudo, fazer nossa economia se mover novamente. Mas, diferente de antes, isso não é mais tarefa dos grandes capitalistas; em vez disso, deve ser feita por total responsabilidade dos trabalhadores, dos sindicatos e dos conselhos de operários. Eles devem ser assegurados da influência decisiva que têm neste processo […] Ainda maior é o nosso interesse em desenvolver nossa indústria como uma indústria de paz e em usar sua produção para satisfazer as necessidades do nosso povo.”