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terça-feira, 15 de outubro de 2024

60 anos do histórico encontro entre Malcolm X, Fidel e o povo negro

“E, se você conversa com uma pessoa que expressa uma filosofia que te faz ter certeza de que ela não tem esse racismo em sua visão, normalmente se trata de um socialista ou de alguém que tem o socialismo como filosofia política”, Malcolm X.

Gabriel GB | Florianópolis (SC)


HISTÓRIA – No dia 18 de setembro de 1960, Fidel Castro e cerca de 60 cubanos desembarcaram em Nova York para participar da 15ª Assembleia Geral da ONU. A princípio toda delegação se hospedaria no Hotel Shelburn, mas devido uma tentativa de sabotagem promovida pelo dono do hotel em conjunto com o Departamento de Estado e a mídia burguesa, a delegação decidiu se retirar logo na manhã do dia 19.

Fidel então orientou que um membro da comitiva providenciasse barracas e declarou com sarcasmo à imprensa: “somos gente das montanhas, estamos acostumados a dormir ao ar livre”, indicando que como forma de denúncia, dormiriam “a qualquer lugar, até no Central Park”, ou mesmo no jardim do prédio da ONU, visto que tratava-se de um território internacional. 

A ida de Fidel ao Harlem Negro

Acontece que enquanto o “Tio Sam” tentava sabotar os cubanos a despeito da derrota sofrida pelo seu capacho Fulgêncio Batista pouco mais de um ano antes, existia uma imensa massa de trabalhadores que se inspiravam na revolução liderada por Fidel e Che e viam nela um apoio fundamental para a luta promovida no coração do imperialismo. Entre estas pessoas estava o líder e revolucionário negro Malcolm X.

Ao tomar conhecimento do acontecido, Malcolm articulou a ida de toda delegação para o Hotel Teresa (ponto muito utilizado por Malcolm para fazer agitações públicas e discursos) e um encontro entre os dois. Assim foi feito. Naquela mesma noite milhares de pessoas se aglomeraram em vigília para saudar o líder máximo da revolução cubana. Segundo o membro da Missão Permanente de Cuba na ONU, Raúl Roa Kouri “Quando a caravana chegou, eles (o povo) começaram a gritar ‘Fidel! Fidel!’. Era como estar em Cuba.”

O encontro entre o revolucionário cubano e o afroamericano aconteceu no quarto do Hotel e durou cerca de 15 minutos. Segundo Ralph D. Matthews, jornalista membro da imprensa negra que estava presente, os dois conversaram sobre racismo nos Estados Unidos, os ataques contra Cuba (em especial a tentativa de invasão à Baía dos Porcos) e a participação do país na assembleia da ONU. Malcolm X afirmou a Fidel que os negros do Harlem não eram influenciados pela propaganda anti-cuba espalhada nos centros das cidades. 

O primeiro chefe de estado a visitar o gueto 

Apesar do curto encontro Fidel se manteve hospedado no Harlem até o dia 26. Sua estadia atraiu outros chefes de estado, como Kwame N’krumah, importante lutador pela descolonização da África e presidente da República de Gana, primeiro país africano a varrer os colonizadores e realizar uma revolução. 

No dia 22 de setembro, enquanto os EUA excluía Cuba de um banquete feito para presidentes de países da América Latina, Fidel convocou, no mesmo horário, uma cerimônia no salão do Hotel Theresa. Os convidados? O proletariado do Harlem! Enquanto os representantes da burguesia se reuniam para debater como explorar ainda mais o povo latino americano, o líder revolucionário sentava com os funcionários do estabelecimento e deles recebia homenagens. 

O legado deste encontro 

Em um discurso pronunciado em 1990, Fidel lembrou com carinho do acontecido e reforçou que a revolução cubana, que naquela altura ainda não havia declarado seu caráter socialista, era dos pobres para os pobres, e que por isso o Hotel Theresa, no bairro negro, era o lugar. 

O encontro também teve grande influência sobre o raciocínio de Malcolm X. Após se reunir com Fidel, o militante se dedicou a denunciar os ataques dos EUA contra Cuba em diversos discursos, situação que se intensificou ainda mais após seu rompimento com a Nação do Islã. Ao passo que ia abandonando a visão essencialista pregada por sua antiga organização de que o homem branco era o demônio, ele se aproximava cada vez mais do entendimento da necessidade de uma revolução mundial e da visão internacionalista.

Isso somado a sua viagem à África, onde teve contato com diversas organizações que lutavam pela independência, Malcolm X disse em 29 de maio de 1964: “todos os países que estão emergindo hoje, quebrando as correntes do colonialismo, estão se voltando para o socialismo. Eu não acho que seja por acaso.  A maioria dos países que eram potências coloniais eram países capitalistas e o último baluarte do capitalismo hoje é a América (EUA). É impossível para uma pessoa branca acreditar no capitalismo e não acreditar no racismo. E, se você conversa com uma pessoa que expressa uma filosofia que te faz ter certeza de que ela não tem esse racismo em sua visão, normalmente se trata de um socialista ou de alguém que tem o socialismo como filosofia política”. 

Infelizmente sua aproximação com as ideias socialistas viria a ser interrompida no dia 21 de fevereiro de 1965, no mesmo Hotel Theresa, cinco anos mais tarde, quando foi assassinado aos 39 anos. Independente disso, o encontro entre os dois e a relação que se estabeleceu desde então inspiraram todas as organizações negras e anti-imperialistas que viriam a ser formadas até os dias de hoje.

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