Redação Piauí
Jornal A Verdade
O Jornal A Verdade, na programação de formação na quarentena, decidiu abordar O Marxismo e o Direito, tema pouco abordado na perspectiva marxista, onde existem muitas incompreensões. Escolhemos vários textos para possibilitar abordagens por várias perspectivas do tema, entre elas, como o marxismo encara o direito, características do direito em um sistema socialista, como foi a experiência da União Soviética, em particular o seu sistema prisional, entre outros aspectos.
Selecionamos dois trechos de obras de Karl Marx, o primeiro, é o “Prefácio Contribuição a Crítica da Economia Política”, onde expõe a concepção da base materialista para poder entender o direito e as diversas manifestações das relações de produção. Texto onde encontra-se sua brilhante declaração:
“Não é a consciência dos homens que determina o seu ser; ao contrário, é o ser social que determina sua consciência, ou seja, as relações jurídicas, bem como as formas do Estado, não podem ser explicadas por si mesmas, nem pela chamada evolução geral do espirito humano; essas relações têm, ao contrário, suas raízes nas condições materiais de existência, em suas totalidades.”
O segundo, é o trecho do livro Ideologia Alemã, com apoio de Friedrich Engels, “Relação do Estado e do Direito com a Propriedade”, onde desenvolve as relações entre o Estado e o direito, com a propriedade, fazendo uma crítica as ilusões jurídicas onde pregam a suposta autonomia do direito e do Estado.
O “Socialismo Jurídico” é um artigo de Engels que por motivos de saúde foi concluído por Karl Kautsky (ainda revolucionário). O artigo teve como objetivo, dar uma resposta a sucessivos ataques à teoria econômica de Karl Marx. Do mesmo modo, desenvolver uma crítica ao reformismo jurídico e combater a sua influência no movimento operário. Evidencia o Direito como exigência objetiva de relações materiais do mercado de trocas capitalistas, ou seja, o direito capitalista advém do complexo processo das trocas mercantis, quando tais trocas se tornam generalizadas, socialmente. Citamos aqui uma passagem:
“Tratava-se da secularização da visão teológica. O dogma e o direito divino eram substituídos pelo direito humano, e a igreja pelo Estado. As relações econômicas e sociais, anteriormente representadas como criações do dogma e da igreja, porque esta as sancionava, agora se representam fundadas no direito e criadas pelo Estado. Visto que o desenvolvimento pleno do intercâmbio de mercadorias em escala social – isto é, por meio da concessão de incentivos e créditos – engendra complicadas relações contratuais recíprocas e exige regras universalmente válidas, que só poderiam ser estabelecidas pela comunidade – normas jurídicas estabelecidas pelo Estado –, imaginou-se que tais normas não proviessem dos fatos econômicos, mas dos decretos formais do Estado.”
Escolhemos o capítulo “Mercadoria e Sujeito” do livro “Teoria Geral do Direito e o Marxismo” do jurista soviético Evgueni Pachukanis. Em seu livro questiona a versão tradicional da onipresença do direito em todas as sociedades de todas as épocas. Sustenta que o direito é uma criação capitalista e que o sentido jurídico adquirido a partir de então, não existia nas antigas civilizações.
Selecionamos também o texto “Ideias Políticas e Jurídicas” do livro “Fundamentos da Filosofia”, de autoria de V.G. Afanássiev, o qual integrava o corpo docente do ‘Instituto Marx, Engels, Lênin (IMEL)’, em Moscou, uma biblioteca e um instituto de arquivamento Soviético. Posteriormente, serviu como centro de pesquisa e editora de obras oficialmente publicadas da doutrina marxista. Neste trecho, desenvolve a concepção marxista em relação ao direito, estado e da política. Afirmando:
“O direito, da mesma forma que a política, surgiu com as classes e o estado. Sendo a vontade da classe dominante, elevados à categoria de lei, o direito defende seus interesses políticos e econômicos.”
A escolha do trecho do livro “Marxismo e Direito”, do escritor e professor da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP), Natanael Sarmento. É uma importante explanação sobre o marxismo e sua relação com o direito. Desenvolvendo de forma crítica, uma luta ideológica com as concepções revisionistas e reformistas sobre o assunto, ele firma:
“Ora, direis de peito inflado: todo poder emana do povo e em seu nome é exercido! Contanto que o suposto soberano não ouse acabar a esbórnia da exploração capitalista, que o escravo permaneça escravo pensando que é livre, que o vassalo mais degenerado da escala social acredite que ele é a fonte da soberania. Não há invenção mais geniosa da humanidade que supere o engenho da ideologia jurídica, desde a invenção do fogo.”
No trecho “Fundamento e Natureza da Ordem Econômica Instituída” do livro “Curso de Direito Constitucional Positivo”, do jurista brasileiro, José Afonso da Silva, especialista em direito constitucional, apesar de não ser marxista, faz uma interessante abordagem sobre a Constituição Brasileira, onde está, declara como função da ordem econômica assegurar a existência digna e a justiça social, para José Afonso, “apenas promessas que não tem como se efetivar na prática” enquanto se manter a sociedade capitalista. Declara:
“Um regime de acumulação ou de concentração do capital e da renda nacional, que resulta da apropriação privada dos meios de produção, não propicia efetiva justiça social, porque nele sempre se manifesta grande diversidade de classe social, com amplas camadas de população carente ao lado de minoria afortunada.”
Por último, apresentamos ao leitor o livro “O Mundo da Paz”, do escritor Jorge Amado. No livro, o renomado autor brasileiro relata sua visita a União Soviética e às demais Repúblicas Populares no leste europeu entre 1948 e 1949. Em um dos diversos intertítulos, apresentamos o trecho “Recuperação de Criminosos”, onde expõe sobre o sistema prisional soviético, destacando as profundas diferenças com o Brasil. Em uma passagem, revela a avaliação de um importante jurista francês, Marcel Willard, sobre este tema:
“Se existe um país onde o aparelho repressivo não é absolutamente um instrumento de vingança pública, esse é o país do socialismo. Dois anos após a vitória sobre o fascismo (em 26 de maio de 1947) a pena de morte foi abolida. O encarceramento não é o castigo normal, é a exceção. A grande maioria das penas não comporta privação de liberdade: o condenado livre trabalha, seja em locais de trabalho do Estado, seja no seu local de trabalho habitual, e nesse caso a pena se reduz a uma multa, de 25% no máximo, sobre seu salário e à suspensão das vantagens sociais. A pena mais grave, longe de ser baseada sobre ideias de expiação ou de represálias, visa um duplo fim: medida de preservação social, ela isola um certo tempo o culpado, considerado perigoso, da sociedade dos trabalhadores; medida corretiva, e não correcional. Tende, durante a sua duração, a criar progressivamente no condenado as condições de sua readaptação, de sua reintegração social.”