Embora não seja diretamente citada no recurso julgado, implicações da decisão do Supremo sobre a Lei de Cotas para PcDs preocupam movimentos de pessoas com deficiência.
Acauã Pozino
Rio de Janeiro
BRASIL – No dia de ontem (2), o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou o recurso que ficou popularmente conhecido como Tema 1046, já noticiado por A Verdade. Esse recurso, cuja história começa em uma mineradora do estado de Goiás, pedia que o STF considerasse constitucional que acordos coletivos de trabalho (feitos entre empresas e sindicatos) pudessem reduzir direitos assegurados por leis trabalhistas.
A ação, apresentada pela mineradora Serra Grande S.A., foi a resposta da empresa ao protesto dos seus trabalhadores pelo fato da companhia não oferecer transporte até o local de trabalho, de difícil acesso, direito assegurado legalmente, mas restrito pelo acordo coletivo vigente.
Por 7 votos a 2, o Supremo decidiu que acordos coletivos podem reduzir direitos trabalhistas, desde que respeitem “um patamar mínimo civilizatório”. Desde que entrou em pauta, o julgamento vinha preocupando os movimentos e entidades de pessoas com deficiência, muitos dos quais enviaram ofícios aos ministros alertando do perigo desse julgamento.
Agora, já que acordos coletivos podem reduzir direitos, também as cotas obrigatórias para funcionários com deficiência (2 a 5% em empresas com mais de 100 funcionários) também podem ser reduzidas ou, no pior dos casos, suprimidas por completo.
Mesmo com a ressalva feita pelos ministros, de que essa redução precisa respeitar o tal “patamar mínimo civilizatório” e não deve tirar do trabalhador “garantias mínimas de cidadania”, quem irá definir esse patamar e o mínimo aceitável de cidadania? Os patrões, que foram ao STF para não ter que fornecer aos trabalhadores goianos um trajeto de segurança para o trabalho? O judiciário, cúmplice histórico da extrema desigualdade do nosso país? No país do Holocausto de Barbacena, de Amíltons e Genivaldos, onde está a garantia de que as pessoas com deficiência estarão nesse patamar?
Mesmo não tendo sido o assunto primário da discussão, é de conhecimento público que a imensa maioria das pessoas com deficiência só está empregada porque a cota não podia, até hoje, ser objeto de acordos coletivos.
Contra mais esse ataque à classe trabalhadora como um todo, e em maior medida aos trabalhadores com deficiência e que exercem profissões de risco, a saída é clara: precisamos ocupar as ruas e mostrar que não vamos permitir que o papel representativo dos sindicatos seja usado para nos jogar na miséria e no trabalho precário. O “patamar civilizatório” precisa ser definido por nós, trabalhadores, e não por aqueles que ou querem lucrar a absolutamente qualquer custo ou estão comprometidos em proteger esses lucros em troca de algumas migalhas.