Polícia Militar da Bahia assassina criança de 10 anos na porta de casa em Lauro de Freitas

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“Foi a polícia que entrou atirando e eu quero justiça, que eles percam a farda deles. Tiraram um pedaço de mim, o meu sonho, a minha vontade de viver. Eles tiraram todo o prazer da minha vida, destruíram”, disse aos prantos Samile Costa, mãe de Gabriel.

Caio Mago | Salvador 


SOCIEDADE – Há 16 anos sob gestão de governadores petistas, a Polícia Militar da Bahia se mostra cada vez mais um instrumento de opressão do Estado contra a juventude negra e pobre. Foi às 16h do dia 23 de julho que a 52ª Companhia Independente tirou não só a vida de Gabriel Júnior, assassinado aos dez anos de idade enquanto brincava na porta de casa, como o futuro e os sonhos de Dona Samile e a paz de dezenas de pais e mães de família que moram na região.

Ney Lázaro, liderança comunitária do bairro de Portão, onde reside o luto, criticou a justificativa da PM, que como de costume alegou ter sido recebida a tiros: “É sempre o copiar e colar: ‘Cheguei, fui recebido à bala e revidei’. Essa é a justificativa da Polícia Militar, que é quem representa o Estado. A população já não aguenta mais conviver com essa triste realidade que vivemos”, disse Lázaro em entrevista. 

Samile, mãe de Gabriel, também negou firmemente a versão contada pela corporação fascista: “Não teve troca de tiro, não tinha ladrão. Se tivesse ladrão, troca de tiros, eu como mãe, ia defender ladrão contra o meu filho?”

A comunidade de Portão realizou na tarde do dia seguinte (24) um protesto exigindo justiça por Gabriel Junior e cobrando das autoridades uma resposta ao crime bárbaro cometido pelo Estado, bloqueando a BA-099 nos dois sentidos, Salvador e Abrantes.

População se revolta com mais uma morte de uma criança sob a mira da Polícia Militar baiana (Foto: Müller Nunes/TV Bahia).

Genocídio Negro na Bahia: Um velho conhecido

Mais de uma vez já noticiamos no Jornal A Verdade casos de truculência, covardia e assassinatos cometidos pela Polícia Militar da Bahia, a exemplo dos ataques à Ocupação Carlos Marighella, os assassinatos de Marcelinho, no Nordeste de Amaralina, e Antônio Assis, no São Gonçalo do Retiro e a agressão sofrida por um companheiro indígena do Diretório Estadual da Unidade Popular durante uma abordagem truculenta. No entanto, para os grandes veículos de comunicação controlados pela burguesia, ou seja, os ricos (entre eles a família Magalhães, do fascista ACM e seu neto afro-conveniente ACM Neto), nada disso passa de uma série de casos isolados, tristes consequências do que a Polícia Militar da Bahia chama de combate ao crime organizado, tão urgente que deve ser levado às últimas consequências, independente de quais sejam.

Se engana quem acredita nessa narrativa patética, que só poderia ter vindo daqueles que nunca pisaram o pé numa favela fora do período eleitoral. Na realidade o que se vive nas periferias é uma grande secação de gelo, uma guerra sem fim que só mata policiais e jovens negros, criminosos ou não. Na prática o que ocorre na Bahia é um apartheid social, uma política que segrega a população negra e a exclui do emprego formal e do direito à vida na cidade, empurrando a grande maioria de sua população para as periferias e o tráfico de entorpecentes e protegendo a população branca nos condomínios e bairros nobres. 

Basta nos questionarmos: por que a polícia na cidade de Itacaré – cercada de quilombos – age quase exclusivamente na base da infiltração, vigiando em silêncio os pequenos traficantes e invadindo em bandos encapuzados suas casas na calada da noite enquanto permite que os turistas consumam drogas livremente pelas ruas da cidade? Por que os policiais condenados pela Chacina da Gamboa, ocorrida em março de 2022, continuam passeando pelas ruas e ameaçando os moradores da comunidade, mesmo depois que a Corregedoria reportou ilegalidade na ação e recomendou processo disciplinar? Por que a Bahia segue como o estado mais violento do país, mesmo tendo a polícia que mais mata? Qual a cor das vítimas da Polícia Militar da Bahia?

Em resposta aos dados apresentados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública – que colocam a Polícia baiana como a mais letal do país, com quase 1.500 assassinatos em suas costas no ano de 2022, a Secretaria de Segurança Pública da Bahia disse no dia 20 de julho que os mortos pela polícia baiana são “homicidas, traficantes, estupradores, assaltantes, entre outros criminosos”, se colocando como “inimiga da realidade” e fortalecendo uma narrativa populista, mentirosa e eleitoreira.

E agora?

Para Dona Samile, o que resta é o luto eterno pela perda do filho, dos sonhos, do futuro que sonhou para Gabriel Junior. Todo julho será triste, todo julho será de dor até o fim de sua vida. Como continuar vivendo com a lembrança de ter visto seu filho ser assassinado na porta de casa, jogando bola, brincando e sonhando como todo pivete de periferia? Quantos de nós, favelados desse Brasil, não estivemos como esteve Gabriel, sonhando em ser jogador de futebol, enquanto nossas mães corriam o dobro para que vivêssemos a metade de uma vida realmente digna? Quantos de nós já vimos mulheres da mesma cor de Dona Samile enterrarem seus filhos covardemente assassinados pelo Estado brasileiro, através da bala da polícia ou do envolvimento no tráfico?

Já para a alta cúpula do Partido dos Trabalhadores, o conforto do ar condicionado dos gabinetes, dos motoristas particulares, dos condomínios de luxo e as recompensas de vender a vida de seu povo em troca da permanência no poder. Rui Costa, um dos piores facínoras entre os últimos governadores baianos, ascendeu a ministro da Casa Civil, ministério mais importante do Governo Federal, mesmo após as Chacinas do Cabula, da Gamboa e a transformação da Polícia Militar da Bahia na força mais letal do país. 

O povo negro e pobre da Bahia precisa lutar para eliminar o capitalismo, sistema que permite a perpetuação do racismo que há 500 anos faz com que a esmagadora maioria de brasileiros seja oprimida e explorada por uma minoria burguesa e racista colocando o lucro acima da vida.

Rui Costa, à direita, ex-governador da Bahia e atual Ministro da Casa Civil do Brasil. À sua esquerda, Major Denice, candidata pelo PT à prefeitura de Salvador em 2020 (Foto: Divulgação/Secom)