UM JORNAL DOS TRABALHADORES NA LUTA PELO SOCIALISMO

domingo, 20 de abril de 2025
Início Site Página 14

A quem servem os acordos com o Centrão no parlamento?

Não é novidade a defesa de diversos setores da esquerda, sobre os “necessários” acordos com o Centrão para ocupação dos espaços em mesas legislativas, sejam elas municipais, estaduais ou mesmo na Câmara dos Deputados. Mas qual o custo dessa posição? A troco de que?

Rafael Pires | Diretório Nacional da UP


OPINIÃO – No último dia 1 de fevereiro, com a segunda maior votação da história da eleição para a presidência da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), o candidato de Arthur Lira (PP-AL), foi eleito para dirigir durante os próximos dois anos a mais importante casa do parlamento brasileiro.

Com apenas 35 anos, em seu quarto mandato de deputado federal e sem nunca ter trabalhado na vida, Hugo é filho de uma tradicional e oligarca família política na cidade de Patos (PB). Quando Hugo tinha 3 anos, sua avó era vice-prefeita da cidade, e em todas as eleições municipais desde então, sua avó ou pai, atual prefeito, disputaram a eleição para a maior cidade do sertão paraibano.

Ao longo de sua vida na Câmara dos Deputados, Hugo nunca deixou ninguém duvidar de que ele tem lado. Foi tropa de choque do corrupto Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara, apoiou e votou a favor do impeachment de Dilma, compôs a base de Michel Temer e Bolsonaro, sempre se posicionou contra os direitos da classe trabalhadora e a favor dos cortes no orçamento público, e figura ativa na articulação junto a Lira da construção do “orçamento secreto”, aquele que permite aos deputados indicar e desviar verbas sem nenhum controle público ou judicial. 

Foi graças a esse grande currículo e o apoio do governo federal que ele recebeu 444 votos em sua eleição, iniciando em grande estilo uma gestão que, já em seus primeiros dias demonstrou suas intenções, coerente com sua história e compromissos. Hugo declarou que teria imparcialidade e que está pronto para debater com os líderes o projeto de anistia com os golpistas de 8 de janeiro, defendeu ainda discutir proposta de implantação do parlamentarismo, e defendeu com unhas e dentes a continuidade do orçamento secreto!

No Senado, a situação não foi melhor. Os partidos sociais-democratas do governo federal (PT, PDT e PSB) decidiram por apoio David Alcolumbre, que já tinha sido presidente da Casa entre 2019 e 2021. Nesse período, Alcolumbre foi peça central para impedir o impeachment de Bolsonaro e criar o “orçamento secreto”. Além disso, junto com o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia, aprovou a Reforma da Previdência, que impede milhões de pessoas de conseguir suas aposentadorias no país.

O que a esquerda ganha apoiando Hugo Motta e David Alcolumbre?

Não é novidade a defesa de diversos setores da esquerda, sobre os “necessários” acordos para ocupação dos espaços em mesas legislativas, sejam elas municipais, estaduais ou mesmo na Câmara dos Deputados. Mas qual o custo dessa posição? A troco de que? Com a eleição de Hugo Mota, algo foi pautado e acordado sobre a votação de projetos em favor da classe trabalhadora e do povo? A votação pelo fim da escala 6×1 foi assegurada com esse apoio? 

Há dois anos, Arthur Lira foi reeleito e se tornou o deputado mais votado da história com 464 votos entre os 513 deputados, com o voto de praticamente toda base do governo Lula. Isso não o impediu de perseguir a atuação da esquerda na Câmara, dando sustentação ao absurdo processo de cassação do Deputado Glauber Braga (PSOL-RJ), por exemplo. A votação da taxação das grandes fortunas ou a ampliação da isenção do Imposto de Renda para R$ 5 mil não saíram do papel com o “aliado” Arthur Lira. 

A ilusão em transformar e mudar a vida da população através de acordos no parlamento, ou mesmo em nome da “estabilidade” do governo é tão grande que ignoram-se os fatos e tentam negar as coisas como elas verdadeiramente são. Arthur Lira e Hugo Mota tem compromissos profundos com a corrupção parlamentar, a troca de favores e as negociações com o dinheiro público para benefício do agronegócio e do capital financeiro, enquanto fecham os olhos para os reais problemas do povo.

Dessa forma, o que a esquerda consegue junto com esses e tantos outros candidatos nas assembleias e câmaras municipais é apenas se igualar aos partidos do Centrão e da direita, apresentando para toda população que, no fim das contas, estarão todos juntos, mais uma vez.

É preciso avançar com radicalidade e consequência a luta popular. Qualquer medida que enfraqueça a autoridade da luta popular frente os acordos parlamentares, deve ser repudiada. Não podemos nos esquecer que a luta contra o fascismo não acabou. Conciliar com vereadores e deputados da extrema direita e seu braço auxiliar, o Centrão, em troca de cargos e espaços em mesas diretoras e comissões parlamentares é negar o único caminho que temos para esmagar o fascismo: aumentar a mobilização popular e o desenvolvimento das lutas de rua.

Palestinos conquistam cessar-fogo e a libertação de 2 mil reféns presos em Israel

O acordo pode ser considerado uma importante vitória da causa palestina. O governo do ditador Benjamin Netanyahu, por sua vez, sai sem garantir nada do que queria. A resistência palestina continua a existir e, mesmo com o genocídio, o povo palestino continua a sobreviver em Gaza.

Felipe Annunziata | Redação


No dia 19 de janeiro, iniciou-se o cessar-fogo na Faixa de Gaza, após quase 500 dias de genocídio televisionado. Entre os primeiros palestinos a ganharem a liberdade das prisões de Israel, como parte do acordo válido por seis semanas entre o grupo Hamas e o Estado de Israel, 70 mulheres e 20 adolescentes (meninas e meninos de 15 anos presos em ataques soldados sionistas a cidades palestinas na Cisjordânia). “Prisão significa escuridão. Você não vê ninguém. É apenas um túmulo”, disse a jovem palestina Rose Khwais, de apenas 16 anos, libertada do cativeiro.

Com a saída dos reféns palestinos dos presídios, voltam a se multiplicar os relatos de torturas, maus-tratos e violações de direitos por parte do Estado de Israel. Mulheres, homens e adolescentes foram submetidos a espancamentos, estupros, privação de sono e de comida, entre outros tipos de tortura.

Uma das principais lideranças populares soltas é Khalida Jarrar, dirigente da Frente Popular de Libertação da Palestina (FPLP), organização de esquerda que faz o enfrentamento ao colonialismo de Israel desde a década de 1960.

Na segunda troca de prisioneiros, ocorrida no dia 25 de janeiro, mais 200 palestinos conseguiram a liberdade. Entre eles, Mohammed al-Tous, de 67 anos, refém de Israel desde 1985. Era o palestino mantido preso por mais tempo em Israel. Os palestinos libertados foram recebidos por uma multidão alegre em Ramallah, maior cidade palestina da Cisjordânia.

A libertação de militantes e jovens mantidos em cativeiro por Israel foi, sem dúvida, a maior conquista do cessar-fogo em Gaza. O acordo também prevê a saída gradual das tropas de Israel do enclave palestino e a garantia de que colonos israelenses não ocuparão o território.

Em Gaza, além dos escombros criados por Israel com a destruição de 90% da infraestrutura, dos cerca de 60 mil mortos e dos 2 milhões de deslocados, ficaram também a força e a resistência do conjunto do povo palestino. 

Um povo formado por homens, mulheres e crianças que não abriram mão em nenhum momento da sua terra natal para a ocupação de uma potência colonial estrangeira. A essa resistência os palestinos chamam de Sumud, palavra árabe que pode ser traduzida como “resiliência”. Este princípio guia a luta palestina desde a primeira limpeza étnica realizada por Israel em 1948. 

Agora, a primeira luta da população de Gaza é para começar a reconstruir suas vidas, como tantas vezes o fizeram nos últimos 77 anos. O povo do enclave também se prepara para iniciar a busca pelos corpos de entes queridos desaparecidos em meio aos bombardeios. No fim do ano passado, a estimativa da ONU era de que pelo menos 10 mil corpos de palestinos estejam soterrados.

É o caso de Inshirah Darabeh, de 55 anos, que tenta voltar para sua casa na Cidade de Gaza para procurar o corpo de sua filha, Maram, de 36 anos, assassinada por Israel em outubro de 2023. Inshirah tenta caminhar cerca de 10 km desde onde está refugiada até sua antiga casa, destruída por Israel. “Não estou voltando para procurar minha casa, o que eu só quero é colocar minha filha num túmulo e colocar seu nome numa lápide”, afirmou a palestina a rede al-Jazeera.

Olfat Abdrabboh, de 25 anos, tenta também achar o túmulo de seu filho de 4 anos assassinado pelo Exército israelense. A mãe palestina quer agora reconstruir sua vida com seus outros dois filhos. Ela também tenta reencontrar seu marido, da qual foi obrigada a estar separada desde o início do genocídio. À rede al-Jazeera, ela disse que “tudo que eu quero é colocar minha tenda em cima dos escombros da minha casa e reunir minha família”.

Causa palestina

Quando a resistência palestina iniciou suas ações em 7 de outubro de 2023, algumas prioridades foram estabelecidas para garantir o êxito da luta contra a ocupação sionista de Israel: a libertação do maior número possível de reféns palestinos das prisões israelenses; o impedimento de qualquer avanço de colonos de Israel na Faixa de Gaza; a colocação da luta pela libertação da Palestina como uma das prioridades na luta anti-imperialista mundial; e o impedimento da aproximação diplomática de Israel com os países árabes.

Ao contrário dos palestinos, Israel estabeleceu como objetivo principal a destruição completa das organizações da resistência armada da Palestina e a expulsão completa da população da Faixa de Gaza, seja por meio do genocídio ou do deslocamento forçado.

Lembrar desses objetivos é importante para entendermos o caráter vitorioso para os palestinos do acordo estabelecido no momento: 16 meses depois do início dos ataques de Israel, os palestinos garantiram a libertação de quase 2 mil reféns e prisioneiros políticos e a retirada gradual das tropas sionistas de Gaza.

Ao mesmo tempo, a atuação palestina impediu a aproximação de Israel com outros países árabes, que estão sendo forçados pelos trabalhadores de seus países a não celebrarem acordos com o Estado sionista. Foi o caso da Arábia Saudita, governado por uma monarquia absolutista, estava para fechar um acordo com Israel quando se iniciou o conflito e o genocídio em Gaza.

Portanto, o acordo pode ser considerado uma importante vitória da causa palestina. O governo do ditador Benjamin Netanyahu, por sua vez, sai sem garantir nada do que queria. A resistência palestina continua a existir e, mesmo com o genocídio, o povo palestino continua a sobreviver em Gaza.

Luta não acabou

Esta situação também mostra que o cessar-fogo tem um caráter temporário e, portanto, a luta pela libertação da Palestina não acabou. Desde o início da sua implementação, Netanyahu tem dado demonstrações de que pretende romper o acordo em março, após o fim da primeira fase. 

Por sua vez, o presidente fascista dos EUA, Donald Trump, tem se colocado a favor de uma guerra após a consolidação do seu novo governo na principal potência imperialista do mundo. Para Trump, assim como era para o antigo presidente Joe Biden, o conflito em Gaza é bom para os lucros bilionários da indústria armamentista dos EUA e a ocupação da Palestina pode garantir aos estadunidenses acesso mais fácil ao petróleo e gás do Oriente Médio.

Portanto, é urgente também a luta por justiça. “Os criminosos de guerra nazistas, após a Segunda Guerra Mundial, não deixaram de ser buscados. Pelo contrário, após a guerra, houve o Tribunal de Nuremberg. Por isso, a Corte Internacional deve continuar apurando a responsabilidade de Israel, dos Estados Unidos e de outros atores internacionais neste genocídio”, defende Ualid Rabah, presidente da Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal). 

E ele aponta ainda outros objetivos estratégicos: “Para o reconhecimento do Estado palestino, os Estados Unidos devem levantar seu veto na ONU; Israel deve retirar suas forças armadas e colonos de todos os territórios palestinos ocupados, incluindo a Cisjordânia; Gaza deve ser reconstruída às custas daqueles que provocaram sua destruição; e os mais de 18 mil detidos palestinos por Israel devem ser libertados”.

Cabe ainda destacar que, enquanto o acordo de cessar-fogo vale para a Faixa de Gaza, o Estado genocida de Israel segue assassinando na Cisjordânia. No dia 26 de janeiro, a menina Layla Khateeb, de apenas 2 anos, foi executada com um tiro na cabeça no campo de refugiados de Jenin. Segundo sua família, eles preparavam o jantar dentro da tenda quando perceberam os feixes de luz da mira a laser dos atiradores israelenses e, na sequência, vieram os disparos.

Por tudo isso, é fundamental nesse próximo período garantir a mobilização permanente dos povos do mundo em defesa da libertação palestina. Apesar de vitorioso, não se pode confiar no acordo fechado com Israel e os EUA. Para os senhores da guerra do imperialismo, qualquer oportunidade para retomar o genocídio será aproveitada.

É preciso que, no curto prazo, lutemos pela permanência do acordo de cessar-fogo para dar ao povo de Gaza tempo para reconstruir sua vida e à resistência palestina espaço para reorganizar suas forças. Tudo isso, para que, no futuro, a luta pela libertação completa da Palestina possa alcançar uma vitória definitiva.

Matéria publicada na edição n° 306 do Jornal A Verdade.

Manifesto de Fundação da Frente Negra Revolucionária


A Verdade reproduz trechos do Manifesto da FNR – Manoel Aleixo,
lançada oficialmente em 1º de fevereiro de 2025 em Recife.


Nós, o povo negro, maioria da população brasileira; nós, pretas e pretos, pardas e pardos, cansados do açoite contemporâneo do Estado capitalista, exaustos da exploração rica e branca do fascismo, indignados com a opressão selvagem imposta pelo racismo que tenta nos esmagar, nós nos levantamos, aquilombamos e decidimos lutar! 

Assim, nasce a Frente Negra Revolucionária (FNR) – Manoel Aleixo. Avança a Unidade Popular, impulsionada pela união de militantes negros e negras de várias organizações, como o Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), o Movimento de Mulheres Olga Benario, o Movimento Luta de Classes (MLC) e a União da Juventude Rebelião (UJR).

A história do negro no Brasil, ensinada nas escolas, narrada pelos brancos europeus, é contada a partir do período da escravidão, destacando os horrores do percurso enfrentado e as atrocidades desse desumano sistema social e econômico.

Não falam, ou apenas citam de relance, o Brasil de antes da invasão Europeia, das grandiosas realizações dos povos originários que governavam este território de norte a sul, sem a existência de fome, miséria ou destruição da natureza, e que foram os primeiros a sofrer com o genocídio promovido pelo invasor e que nunca deixaram de lutar lado a lado com o conjunto dos oprimidos e explorados por liberdade e justiça.

Não falam também da história do nosso país “agigantada” pela nossa ancestralidade negra que traz consigo beleza, cultura, tecnologia e todas as suas cores alegres e fortes, de um povo altivo e desenvolvido. Apresentam apenas, de maneira superficial, a nossa rica cultura afro-brasileira e a tradição negra, ocultando o legado histórico e cultural de luta e resistência dos povos escravizados. 

Nosso país ainda sofre com os resquícios dos mais de 400 anos de escravidão. Em pleno século 21, longe de sermos minorias, somos os menos favorecidos, os desaparecidos políticos, os encarcerados, os desempregados, os menos remunerados, somos aquelas que cuidam dos filhos dos patrões, nas mesmas “casas grandes”. Somos as mães que perdem os filhos pelas balas nada perdidas dos policiais. Vivemos asfixiados por um sistema socioeconômico, dito democrático, que, na tentativa frustrada de esconder suas mazelas sociais, nega o racismo, mas defende o lucro e não gente.

Somos a maior população negra fora do continente africano: 56,7% da população brasileira é preta e parda, ou seja, negra (PNAD – Contínua, segundo semestre de 2024). Somos a maioria dos trabalhadores (55%). E, se tudo produzimos, tudo a nós pertence!

É nessa perspectiva de combate e transformação que a Frente Negra Revolucionária (FNR) se organiza para pôr fim aos herdeiros dos senhores de escravos, a atual classe rica e dominante brasileira e para organizar os negros que ainda hoje necessitam vender sua força de trabalho para sobreviver e seguem sendo massacrados, física e “espiritualmente”, pelo sistema capitalista, racista e opressor. 

“Ser livre da matéria escrava, arrancar os grilhões que nos flagelam”

(“Livre”, Cruz e Sousa)

A letalidade policial no país aumentou 189% nos últimos dez anos, sendo que 90% do total de mortos eram negros (Agência Brasil, 2023). Dessa forma, as chacinas passaram a ser notícias correntes nos noticiários, revelando a maneira como a polícia tem operado nas periferias, como revelam as chacinas de Jacarezinho (RJ), do Guarujá (SP), de Camaragibe (PE) e a Operação Escudo (SP).  

Não esqueceremos: Evaldo Rosa, teve seu carro alvejado com mais de 250 tiros por militares do Exército em 2019 (recentemente, absolvidos); Amarildo Dias, que desapareceu após ter sido detido por policiais militares em 2016 (seu corpo nunca foi encontrado); Cláudia Silva, baleada por PMs e arrastada por cerca de 350 metros pela viatura policial. Lembraremos sempre de: Marielle Franco (RJ), Mãe Bernadete (Quilombo Pitanga dos Palmares, Bahia); Josimar da Silva (Acampamento São Francisco, Vitória de Santo Antão/PE); Giovanne Gabriel (RN) e Genivaldo de Jesus Santos (SE), do Menino Miguel (PE), dentre milhares de outros irmãos e irmãs. Nem mesmo as crianças são poupadas do extermínio, como ocorreu com a menina Ágatha e Thiaguinho (Rio de Janeiro, 8 anos e 13 anos respectivamente) e Jonathas (Engenho Roncadorzinho, Barreiros/PE, 9 anos). Essa situação se agravou a partir do governo fascista de Bolsonaro e seus seguidores e cúmplices nos estados. 

Não resta dúvida, portanto, que o racismo dialoga diretamente com o fascismo, que usa das opressões para silenciar, esmagar e aniquilar o povo para que garanta os privilégios das classes dominantes, ricas. Hoje, o enfrentamento à extrema-direita se faz cada vez mais necessário. Nosso inimigo não é apenas o discurso da meritocracia ou do senso comum; nos últimos tempos, enfrentamos diretamente uma política de morte e violência. 

Por isso, é urgente desmilitarizar as polícias, as escolas e a sociedade, seguindo o exemplo daquelas mulheres e homens que, em nosso país, lutaram contra a ditadura militar fascista de 1964-1985. Sendo assim, se faz necessário e urgente, resgatar a memória dos que lutaram contra o golpe militar e foram perseguidos e por isso, lutamos por memória, verdade, justiça e reparação no Brasil.

A luta de Ventania segue! Manoel Aleixo está vivo!

Nascido no dia 04 de junho de 1931, no engenho Cova da Onça, em São Lourenço da Mata (PE), Manoel Aleixo começou a trabalhar ainda criança para ter direito a comida e a vestuário semelhante ao dos escravos da senzala. Seus pais, João Aleixo da Silva e Maria Sabino da Silva, foram alcançados pela escravidão quando meninos. Trabalhador rural, Manoel foi líder camponês com atuação no Estado de Pernambuco. Após o golpe de 1964, ficou conhecido como “Ventania” e tornou-se militante do Partido Comunista Revolucionário (PCR). Foi morto sob torturas, após ser sequestrado de dentro de sua casa, em 29 de agosto de 1973, no Município de Joaquim Nabuco (PE). Pelo seu exemplo e bravura, decidimos homenagear Ventania como patrono da Frente Negra Revolucionária. 

Ao líder dessa luta de resistência pela democracia brasileira e pelo socialismo, e em memória de todos aqueles que, como Manoel Aleixo, dedicaram suas vidas pela construção de uma nova sociedade: a FNR os vingará! 

Reaja ao racismo: lute pelo socialismo!

Para avançar o nível de consciência dos nossos militantes e do povo, é necessário elevar o nível de organização, de modo a termos pessoas trabalhando, sistematicamente, pelo êxito dessa tarefa. A nossa luta é de gênero, de raça e de classe! Um chamado para construir “o porvir em frente do passado, a liberdade em frente à escravidão” (“Ode ao dois de julho”, Castro Alves).

Portanto, nós que lutamos pelo fim da exploração capitalista, para que nossa luta seja completa e consequente, temos que lutar pela igualdade racial e enfrentar qualquer tipo de racismo e preconceito.

Chamamos, portanto, todo o povo negro do Brasil a se organizar, defender e se aquilombar:

  1.  Lutar contra o racismo e o preconceito em todas as partes: locais de trabalho, bairros, lugares de ensino, campo, etc; 
  2. Lutar contra o extermínio do povo negro, especialmente das periferias. Pela desmilitarização das polícias; punição dos responsáveis; fim do auto de resistência;
  3. Pôr fim ao encarceramento em massa e os maus tratos nos presídios e locais de reeducação de jovens infratores. Apoio aos familiares de presos e denúncia das prisões injustas. Contra o racismo no Judiciário, eleições de juízes e tribunais através do povo;
  4. Garantir a apuração e reparação quanto aos genocídios promovidos pelos regimes autoritários; direito à memória, verdade, justiça e reparação. Punição aos criminosos da ditadura militar implantada com o golpe de 1964. Implantação das recomendações da Comissão Nacional da Verdade;
  5. Exigir a garantia de educação pública e de qualidade em todos os níveis, erradicando o analfabetismo e o cumprimento da lei 10.639/2003 (ensino de história e cultura afro-brasileira) e a descriminalização e incentivo das expressões de cultura negra e popular;
  6. Defender a igualdade e a liberdade das práticas religiosas. Combate aos ataques promovidos a locais de culto religioso e de natureza discriminatória contra os seus praticantes, especialmente quanto às religiões de matriz africana;
  7. Defender condições adequadas de saúde e acesso a tratamento no Sistema Único de Saúde;
  8. Defender os direitos das mulheres contra todas as formas de violência e opressão, incluindo de gênero;
  9. Pela garantia de moradia digna e pela reforma urbana. Contra o racismo ambiental. Demarcação das áreas quilombolas e dos povos originários e reforma agrária;
  10. Defender a promoção, valorização e estímulo da cultura do nosso povo com o ensino da história afro-brasileira;
  11. Proteger as crianças e adolescentes contra a violência e contra o trabalho infantil. Acesso à educação, esporte, lazer, saúde, alimentação e cultura;
  12. Propagandear a história do povo e dos heróis negros do nosso país e do mundo;
  13. Conectar permanentemente a luta contra o racismo com a luta pela superação do capitalismo e a construção do socialismo, entendendo que não há contradição entre as duas pautas e só se cria a condição para acabar em definitivo com o racismo, destruindo o sistema capitalista.

Publicado na edição n° 306 do Jornal A Verdade.

Trump ameaça nações para esconder grave crise dos EUA

Conciliar com Trump e os fascistas do governo dos EUA significa atrasar a luta pela libertação da Palestina, ampliar a dependência da economia brasileira aos monopólios estadunidenses e entregar a classe trabalhadora a uma realidade de exploração sem limites em função do lucro de meia-dúzia de bilionários.

Rafael Freire e Felipe Annunziata | Redação


EDITORIAL Antes mesmo de tomar posse como presidente dos EUA, Donald Trump já iniciou uma série de ameaças a outras nações. Nenhuma surpresa. Quando esteve na Presidência da maior potência imperialista do mundo pela primeira vez, entre 2017 e 2021, não foi diferente. Mas, como diz o ditado popular: “Cão que ladra, não morde”.

No último dia 20 de janeiro, iniciou seu segundo mandato de quatro anos, agora totalmente alinhado com as grandes empresas de comunicação digital do mundo, as chamadas Big Techs. No palco de sua festa estavam perfilados, em destaque, os magnatas da Amazon, Google, Meta, X (Twitter), Apple e até a chinesa TikTok. Não à toa, cada declaração de Trump toma conta hoje, rapidamente, não só do noticiário das redes de comunicação tradicionais (TVs, rádios, jornais), como também das redes digitais. Ou seja, vai poder latir e mentir à vontade.

Trata-se de um poderoso setor da burguesia mundial, com tendência a crescer sua influência na disputa ideológica na sociedade, além de sua riqueza. Para efeito de comparação, Elon Musk (Tesla/X), Jeff Bezos (Amazon) e Mark Zuckerberg (Meta) possuem um patrimônio líquido maior que a soma do valor de mercado das dez maiores empresas do Brasil. Juntos, têm US$ 891 bilhões (mais de R$ 5 trilhões). As empresas Petrobras, Itaú e Vale têm hoje um valor de mercado de R$ 1 trilhão.

Derrotismo

As análises derrotistas são sempre colocadas como se fosse inevitável que Trump consiga impor toda sua agenda reacionária aos EUA e ao mundo. A conclusão é sempre a mesma: não há alternativa a não ser aceitar a “nova” política do imperialismo estadunidense.

Na mídia burguesa, os “analistas” defendem que o Brasil e os demais países devem aceitar o governo de Trump, não opor resistência e tentar negociar com o fascista, pois se tratam de países dependentes do capital ianque. 

Por sua vez, jornalistas, comentaristas e dirigentes políticos ditos progressistas repetem a mesma coisa, mas com um verniz à esquerda. Dizem que, para evitar a volta do fascismo ao governo brasileiro, é preciso conciliar com Trump e seu governo de bilionários. 

Em qualquer um dos casos, jamais provocar a ira do furioso Trump.

Porém, como afirmou de maneira objetiva e certeira, no recente artigo intitulado “Nos EUA, águia ou abutre?”, publicado no site de A Verdade, o companheiro Frei Gilvander (este sim, um verdadeiro analista crítico de esquerda), todo esse falatório de Donald Trump não passa de bravata fascista, de um tipo de imperialismo decadente. Vejamos:

“Pelo discurso colonialista, racista, prepotente e ufanista, e também pelos decretos assinados no mesmo dia da posse, expõe a podridão de um sistema que tenta, desesperadamente, manter sua hegemonia. Por isso, assistimos a algo com rompantes de um imperador, usando em vão o nome de Deus, o que é idolatria (usar o nome de Deus para justificar políticas de morte), se auto-apresentando como imbatível, ao afirmar que ‘inicia agora a era de ouro da América’; ‘construiremos as Forças Armadas mais poderosas do mundo’; ‘vamos invadir o Panamá e retomar o Canal’; ‘vamos terminar o muro que separa os EUA do México’; ‘vamos cobrar impostos dos povos em outros países, impondo tarifas comerciais para que nossos cidadãos paguem menos impostos e possam ter prosperidade, glória e seremos motivo de inveja em todo o mundo’.”

Contradições internas

Para não render muito acerca da “inveja” do restante do mundo em relação aos EUA, vamos citar apenas duas graves contradições internas do país: crescimento da pobreza e das greves de trabalhadores.

Pobreza – Quase 30% de todas as famílias dos EUA relataram que, em 2024, gastaram mais de 95% de sua renda em moradia, alimentação e contas de serviços públicos, segundo o Bank of America Institute.

Em outubro, a então vice-presidenta dos EUA e candidata à Presidência derrotada por Trump, chamou de “salário de pobreza” o salário mínimo norte-americano. Atualmente, o valor mínimo da hora de trabalho é de US$ 7,25 (aproximadamente R$ 43,5/hora).

Já nos últimos dias de 2024, o Departamento de Habitação e Desenvolvimento Urbano do Governo dos EUA publicou um relatório oficial em que estimou que, em janeiro daquele ano, havia 771.480 pessoas vivendo em situação de rua no país, 18% a mais do que o identificado em 2023. Com uma inflação persistente e os altos preços dos imóveis, que subiram, em média 20% durante a gestão de Joe Biden e Kamala Harris. Deste total, cerca de 150 mil são crianças e jovens de até 17 anos.

Greves – Os motoristas da Amazon entraram em greve às vésperas do Natal, na maior greve da história da empresa. Os motoristas exigiam vínculo empregatício, salários dignos e o fim do sistema de classificação no estilo Uber, que controla seus horários de trabalho. Em Nova York, motoristas empregados por 20 empresas terceirizadas ganham cerca de US$ 15 por hora, muito abaixo do “salário de pobreza” citado acima.

Também funcionários da rede de alimentos Starbucks entraram em greve no dia 20 de dezembro. Apesar dos US$ 3,76 bilhões em lucros em 2024, a Starbucks não ofereceu nenhum aumento imediato e apenas 1,5% de aumentos futuros. O salário médio na empresa é de US$ 18 por hora.

Tanto Amazon quanto Starbucks são gigantescas corporações globais. A Amazon, com sua vasta força de trabalho em mais de 50 países, domina setores como varejo, logística, tecnologia e entretenimento. A Starbucks, com mais de 360.000 funcionários e presença em 80 países.

Sem nenhuma repercussão na grande mídia brasileira, operários portuários fizeram greve e conquistaram um aumento de 62% nos salários, em outubro passado. Já a greve na Boeing (indústria de aviação) mobilizou 33 mil operários no mesmo período e conquistou um aumento de 35%.

Ainda em 2023, uma greve no setor automobilístico (responsável por 3% do PIB dos EUA) paralisou 350 mil operários, por três meses, arrancando um aumento salarial médio de 25%.

Política anti-imigrante

Na tentativa de intimidar os povos do mundo, o Governo Trump adotou como “primeira medida de impacto” a deportação de imigrantes sem visto, alguns com décadas de moradia e trabalho nos EUA. Há um foco especial para os latinos, incluindo brasileiros.

O primeiro voo de deportados que chegou ao Brasil, no dia 25 de janeiro, trouxe pessoas arrancadas de dentro de suas casas, locais de trabalho e até de serviços de saúde. Alguns foram espancados e enforcados no momento da prisão e durante o voo, feito numa aeronave sem condições para transporte de pessoas, quente e sem direito à alimentação. Quase todos os 88 brasileiros desembarcaram com algemas nas mãos e nos pés, como escravos numa espécie de “navio negreiro”.

“Foi um inferno, uma tortura. Desde que a gente saiu de Luisiana, deu para perceber que o avião estava com algum problema. Mesmo assim, eles forçaram”, disse Sandra Souza, 36 anos. “Eles bateram na gente porque a gente tava com calor e a gente não queria ficar mais preso no avião”, relata Vitor Gustavo da Silva, 21 anos.

Segundo dados do governo do México, somente em 2022, as comunidades latinas foram responsáveis pela produção – em bens e serviços – de US$ 3,6 trilhões do PIB dos EUA (cerca de R$ 21,24 trilhões). Isto significa que, se os latinos fossem um país separado dentro dos Estados Unidos, representariam a quinta maior economia do mundo, à frente de países como o Reino Unido, a França ou mesmo o Brasil.

O imperialismo é invencível?

O medo nunca foi resposta para nada na História. Não foi a saída para encarar a ditadura militar fascista de 1964 ou o governo reacionário de Bolsonaro, em 2022. Tampouco para o povo negro norte-americano que saiu em massa às ruas para dizer “vidas negras importam” e cobrar justiça pelo assassinato de George Floyd, influenciando diretamente na derrota eleitoral de Trump à reeleição, em 2020.

Imaginem se o povo palestino se deixasse apossar por esse sentimento. O que vimos, na verdade, foi uma resistência heroica durante 15 meses e, agora, com o cessar-fogo temporário, declarações e mais declarações de orgulho por terem dobrado a política genocida de Benjamin Netanyahu, Joe Biden e da União Europeia.

Assim como os palestinos mostraram que nem todas as armas do mundo podem acabar com a determinação de um povo pela sua libertação, precisamos levantar mais alto a bandeira anti-imperialista no período que se avizinha. 

Conciliar com Trump e os fascistas do governo dos EUA significa atrasar a luta pela libertação da Palestina, ampliar a dependência da economia brasileira aos monopólios estadunidenses e entregar a classe trabalhadora a uma realidade de exploração sem limites em função do lucro de meia-dúzia de bilionários.

Se, após tantas décadas com o imperialismo estadunidense impondo golpes militares, regimes reacionários, invasões e guerras de rapina, os povos do mundo não se renderam, não será agora que nos renderemos a um bandido como Trump.

Publicado na edição n° 306 do Jornal A Verdade.

A nova mulher e a moral sexual

1

Trechos extraídos do livro A nova mulher e a moral sexual (1978)

Alexandra Kollontai


TEORIA MARXISTA – A dura realidade exige outras qualidades nas mulheres trabalhadoras. Precisa agora de firmeza, decisão e energia […]. Privada da proteção que até então lhe prestara a família, ao passar do aconchego do lar para a batalha da vida e da luta de classes, a mulher não tem outro remédio senão armar-se, fortificar-se, rapidamente […].

A mulher da classe operária contempla como nasce e se fortalece dentro de si a consciência de sua independente individualidade. Tem fé em suas próprias forças. Gradualmente, de forma inevitável e poderosa, desenvolve-se o processo de acumulação de novos caracteres morais e espirituais da mulher operária, caracteres que lhe são indispensáveis como representante de uma classe determinada. […] 

A vontade individual submerge e desaparece no esforço coletivo de milhões de mulheres da classe operária, para adaptar-se às novas condições da vida. Também nesta transformação desenvolve o capitalismo uma grande atividade. Ao arrancar do lar, do berço, milhares de mulheres, o capitalismo converte essas mulheres submissas e passivas, escravas obedientes dos maridos, num exército que luta pelos seus próprios direitos e pelos direitos e interesses da comunidade humana. Desperta o espírito de protesto e educa a vontade. Tudo isto contribui para que se desenvolva e fortaleça a individualidade da mulher. […]

O novo tipo da mulher, que é interiormente livre e independente, corresponde, plenamente, à moral que elabora o meio operário no interesse de sua própria classe. A classe operária necessita, para a realização de sua missão social, de mulheres que não sejam escravas. Não quer mulheres sem personalidade, no matrimônio e no seio da família, nem mulheres que possuam as “virtudes femininas” – passividade e submissão. Necessita de companheiras com uma individualidade capaz de protestar contra toda servidão, que possam ser consideradas como um membro ativo, em pleno exercício de seus direitos e, consequentemente, que sirvam à coletividade e à sua classe. […]

A força dos séculos é demasiado grande e pesa muito sobre a alma da mulher do novo tipo. Os sentimentos atávicos perturbam e debilitam as novas sensações. As velhas concepções da vida prendem ainda o espírito da mulher que busca sua libertação. O antigo e o novo se encontram em contínua hostilidade na alma da mulher. Logo, as heroínas contemporâneas têm que lutar contra um inimigo que apresenta duas frentes: o mundo exterior e suas próprias tendências, herdadas de suas mães e avós. […]

Determinemos, pois, quem sāo essas mulheres que constituem o novo tipo feminino. Desde logo, não são as encantadoras e “puras” jovens cujas novelas terminam com o matrimônio feliz, nem as esposas que sofrem resignadamente as infidelidades do marido, nem as casadas culpadas de adultério. Não são, tampouco, as solteironas que dedicaram toda a sua vida a chorar um amor desgraçado de juventude, nem as “sacerdotizas do amor”, vítimas das tristes condições da vida ou de sua própria natureza viciada. Não. Estas mulheres são algo novo, isto é, um quinto tipo de heroína desconhecida anteriormente, heroínas que se apresentam à vida com exigências próprias, heroínas que afirmam sua personalidade; heroínas que protestam contra a submissão da mulher dentro do Estado, no seio da família, na sociedade; heroínas que sabem lutar por seus direitos. Representam um novo tipo de mulher. […]

A característica típica da mulher do passado, considerada seu maior ornamento e defeito, era o predomínio do sentimento. A realidade contemporânea, que arrastou a mulher à ativa luta pela existência, exige, antes de tudo, a ciência de saber vencer seus sentimentos e os numerosos obstáculos de ordem social que se seu espírito pouco resistente, seu espírito que cede com demasiada facilidade, por meio da vontade. Para conservar seus novos direitos conquistados, a mulher tem que realizar um trabalho de autoeducação muito mais profundo que o do homem. […]

A realidade contemporânea exige, de uma maneira implacável, que toda mulher que se vê obrigada a trabalhar num ofício ou profissão, em qualquer trabalho que a leve para fora do lar, possua autodisciplina e força de vontade necessárias para saber vencer seus sentimentos; qualidades que somente poderíamos encontrar excepcionalmente nas mulheres do tipo antigo. […]

Outro traço característico da mulher contemporânea consiste nas exigências, cada vez maiores, que fazem ao homem. A mulher do passado estava acostumada por seu amo e senhor, durante séculos e séculos, a esquecer-se de si mesma, a descuidar completamente seu pequeno mundo espiritual. A mulher do passado não dava nenhum valor a sua própria personalidade, acostumada aos sorrisos indulgentes que os homens tinham para com suas debilidades e sofrimentos de mulher. Por isto resignava-se, sem protestar, a que seu companheiro não prestasse a menor atenção ao que pensava e sentia. Ainda em nossos tempos, admiramo-nos de que somente alguns homens extraordinários saibam compreender a mulher, ainda que nos momentos de maior intimidade. […]

A mulher do passado, incapaz de enfrentar a vida sozinha, tinha medo da solidão, e por isso, estava sempre disposta a renunciar, quando se lhe apresentava a menor ocasião, à sua inútil e desagradável independência.

A mulher do novo tipo não somente não tem medo da independência, como, a cada dia, aprecia mais seu valor, à medida que seus interesses se sobrepõem aos limites impostos pela família, pelo lar e pelo amor. […]

O amor deixa de ser para a mulher o conteúdo único de sua vida, começa a ficar relegado a um lugar secundário, como sucede com a maioria dos homens. […]

A nova mulher não abdica da sua natureza de mulher, não foge da vida, nem de suas alegrias terrenas, que a realidade, tão avara em sorrisos, lhe concede. As heroínas modernas são mães sem estarem casadas; abandonam o marido ou o amante; sua vida pode ser rica em aventuras amorosas. […]

Esta é a mulher moderna: a autodisciplina, em vez de um sentimentalismo exagerado; a apreciação da liberdade e da independência, em vez de submissão e de falta de personalidade; a afirmação de sua individualidade, e não os estúpidos esforços por identificar-se com o homem amado; a afirmação do direito a gozar dos prazeres terrenos, e não a máscara hipócrita da “pureza”; e, finalmente, o relegar das aventuras do amor a um lugar secundário na vida. Diante de nós, temos não uma fêmea, nem uma sombra do homem, mas sim uma mulher-individualidade.

Movimento Olga Benario realiza encontros regionais

0

O Movimento de Mulheres Olga Benario realizou encontros regionais nos dias 18 e 19 de janeiro para fortalecer seus núcleos de base e ampliar sua atuação no país.

Ana Carolina Martins (PA) e Talita Bezerra (SP)


MULHERES – Nos dias 18 e 19 de janeiro, o Movimento de Mulheres Olga Benario realizou encontros regionais reunindo suas militantes das regiões Norte e Nordeste, em Recife, e Centro-Oeste, Sudeste e Sul, em São Paulo. Os debates tiveram como foco o fortalecimento dos núcleos de base, em especial, a construção de novos núcleos; o funcionamento das coordenações estaduais e regionais; e a formação de novas dirigentes.

As delegações de cada estado se debruçaram para avaliar o trabalho em 2024, em que o Movimento chegou a mais cinco novos estados, totalizando 22, estando presente em todas as regiões do Brasil.

A presença dessas militantes nos encontros regionais representa um avanço após os diversos desafios que enfrentamos, nos últimos anos, para garantir todas as regiões nas atividades nacionais. Apontou também para a necessidade de organizar e formar mais mulheres diante dos ataques aos nossos direitos e às nossas vidas, como os ataques ao direito ao aborto e a criminalização de vítimas de estupro, sobretudo crianças, assim como o desemprego, a pobreza, o aumento dos casos de feminicídio.

Diante dessa conjuntura fica mais evidente que os núcleos das mulheres trabalhadoras, estudantes e mães organizadas no Movimento de Mulheres Olga Benario são a base do trabalho, sua força real. Por isso, a periodicidade das reuniões de núcleo, com data e horário fixos, se faz tão necessário.

Os núcleos também não podem se fechar em si, ao contrário, devem estar em estado de crescimento diário, construindo as lutas nas ruas: manifestações, panfletagens, patrulhas, rodas de conversa, plantões de atendimento em nossas casas.

Para avançar ainda mais nosso trabalho, foi debatida a importância da formação política das militantes no âmbito dos núcleos e dos espaços estaduais e nacional, bebendo da teoria feminista marxista.

Para que o Movimento possa continuar crescendo e avançando na luta em defesa dos direitos das mulheres e do socialismo, é indispensável debater sua autossustentação, como desenvolver mais atividades para construir as lutas e conseguir mais apoiadores.

Ainda cabe destacar a importância da agitação política e propaganda do socialismo, deixando claro o papel que o jornal A Verdade tem na formação das militantes, com leituras nos núcleos e na aproximação de novas mulheres através de brigadas do jornal em bairros e portas de fábrica.


Matéria publicada no jornal A Verdade impresso nº306

Se todas as favelas juntas fossem um estado, seria o 3º mais populoso do país

“Hoje, mais de 16 milhões de pessoas vivem em favelas de todo o país. Esse processo de crescimento das favelas é um reflexo da política de segregação social, racial e econômica do sistema capitalista que vivemos.”

Laís Chaud | Coordenação Nacional do MLB


Hoje mais de 16 milhões de pessoas vivem em favelas em todo país. Se essa área fosse um estado, seria o terceiro mais populoso do Brasil. O aumento de 39% registrado nos últimos anos (em 2010, eram 11,5 milhões de pessoas) expressa, dentre outras coisas, o aprofundamento das contradições e desigualdades políticas, sociais e econômicas.

O processo de crescimento e formação das favelas é antigo, tendo suas origens desde o século 19, principalmente após a Lei de Terras (1850) e a Lei Áurea (1888). Os negros escravizados, tendo sido “libertos”, foram obrigados a se alojarem nas áreas mais afastadas das cidades, pois não houve qualquer intenção para que eles pudessem viver de forma digna enquanto “pessoas livres”. Assim, a forte opressão e exploração se mantiveram presentes.

Ao longo da história, com o desenvolvimento industrial e a urbanização, aconteceu um forte êxodo rural. Ou seja, a mudança, forçada ou não, de famílias moradoras do campo para as cidades em busca de trabalho e melhores condições de vida. Porém, com a discriminação e por falta de recursos para encarar a carestia, essas pessoas foram construindo seus barracos, casas e cortiços nas áreas mais afastadas dos centros comerciais, muitas vezes, em áreas de risco de enchentes e desabamentos.

Esse processo de crescimento das favelas é, portanto, um reflexo da política de segregação social, racial e econômica do sistema capitalista que vivemos. As favelas são ocupações de autoconstrução, feitas de forma desorganizada, pois não conseguem pagar os elevados preços de aluguel. Por isso, vivem de forma precária, sem saneamento básico, transporte de qualidade, postos de saúde e escolas.

Essa realidade poderia ser diferente. Mas, por ser ocupada pelo povo pobre e, em sua grande maioria, por pessoas negras, essas áreas são propositalmente esquecidas e, ao mesmo tempo, atacadas pelo poder público. Além das dificuldades enfrentadas dentro das favelas, morar em regiões afastadas ou em condições precarizadas dificulta a circulação e nega o direito das pessoas à cidade. Esmaga o dia a dia dos trabalhadores, que passam horas dentro de um transporte público caro e precário, para ir e vir de casa para o trabalho, e ainda enfrentam a humilhação e a opressão da polícia.

Como diz Carolina Maria de Jesus, em seu livro Diário de uma favelada – Quarto de Despejo“De quatro em quatro anos, mudam-se os políticos e não soluciona a fome, que tem sua matriz nas favelas e suas sucursais (filiais) nos lares dos operários”.

Se antes as contas não fechavam, hoje nosso povo está sendo esmagado pelo aumento da carestia da vida. Fazendo alguns cálculos, pelo menos 18% do salário mínimo vai para pagar o transporte público, considerando apenas duas passagens por dia, em uma escala 6×1. Na alimentação vão, pelo menos, mais 53% para comprar uma única cesta básica, que sequer alimenta uma família no mês. Nesse cálculo, sobrariam em torno de R$ 455 para o aluguel. Quem hoje encontra um lugar digno, ou mesmo algum lugar qualquer, para morar por esse valor?

Enquanto os grandes empresários e políticos lucram milhões com a especulação imobiliária, o déficit habitacional registra pelo menos 8 milhões de famílias no nosso país.

Por isso, nossa luta deve ser em defesa da moradia digna, por uma saúde, educação, transporte público de qualidade, que atenda as verdadeiras necessidades do nosso povo trabalhador.

Devemos intensificar nosso trabalho com os operários e as operárias nas portas de fábricas, em quem encontramos as famílias esmagadas pelo preço do aluguel, as mulheres que necessitam de creche para seus filhos, os pais e mães dos jovens que são diariamente assediados pelo tráfico e criminalizados pela polícia. Ou seja, encontramos nosso povo explorado e humilhado por esse sistema e que, por isso, só poderá vir deles a resposta para construção de uma nova sociedade.

Matéria publicada na edição impressa nº 306 do jornal A Verdade

Ocupação Eliana Silva resiste a tentativa de despejo

Forte mobilização de moradores e apoiadores em defesa da Ocupação Eliana Silva, que resiste há 12 anos, derrubou liminar de despejo e conquistou um compromisso da Prefeitura de Belo Horizonte com a urbanização da área

Edinho Silva | Belo Horizonte (MG)


O Vale das Ocupações, em Belo Horizonte, conta com sete ocupações e caminha para a sua completa urbanização. Ao longo dos anos, as lutas proporcionaram das famílias renderam muitas conquistas, como a ligação das redes oficiais de água e energia, asfalto, coleta de lixo e CEP nas ruas e o reconhecimento como bairros populares.

Mesmo com tantos avanços, no final do mês de novembro de 2024, os moradores da Ocupação Eliana Silva foram surpreendidos por um despacho da juíza Rafaela Kehrig Silvestre, de primeira instância, para o cumprimento da reintegração de posse. Esse processo data de 2012 e estava suspenso desde de 2014.

Em janeiro deste ano, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais tentou uma mediação para o conflito e, tanto o governo de Romeu Zema (Novo), quanto do prefeito Fuad Noman (PSD), lavaram as mãos. A Prefeitura, inclusive, teve uma atitude ainda mais agressiva, uma vez que toda a região se encontra no programa “Já to lá”, que tem feito pesquisas e levantamentos em toda a região para um processo definitivo de regularização.

A Ocupação Eliana Silva, organizada pelo Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), completou 12 anos de resistência em 2024 e nunca abaixou a cabeça para qualquer injustiça.

Solidariedade

Assim que a notícia foi dada, rapidamente formou-se uma rede de apoio e resistência contra o despejo. Grandes assembleias foram realizadas nas ocupações do Vale em solidariedade, mas também entendendo que, caso fosse despejada uma ocupação tão consolidada quanto a Eliana Silva, para as demais seria questão de tempo.

Na noite de 09 de dezembro, o MLB realizou um ato com cerca de 400 pessoas, representantes de sindicatos, partidos políticos, movimentos populares e mais de uma dezena de ocupações de Belo Horizonte e região metropolitana.

Antes do ato, na tarde do mesmo dia, seis viaturas estiveram na Ocupação, fazendo fotos e dizendo “queremos saber o conteúdo da reunião, se vão fazer alguma manifestação”. A resposta diante dessa pergunta não poderia ser outra: “Ditadura nunca mais!”. Ações truculentas como estas não podem ser normalizadas, pois a Polícia não pode intervir em reuniões para as quais não foi convidada, usando de tal violência para intimidar os moradores e cercear o livre direito de manifestação.

No dia 11 de dezembro, cerca de 400 famílias da Ocupação Eliana Silva e outras ocupações de Belo Horizonte realizaram um grandioso ato na porta da Prefeitura para cobrar uma posição sobre o processo. No primeiro momento, a resposta da Prefeitura foi a repressão. Dois moradores foram presos e dezenas foram feridos pela Guarda Municipal militarizada. O povo não recuou nem desistiu.

Após um dia intenso de luta, que repercutiu em toda imprensa e gerou um grande reboliço na cidade, a postura da Prefeitura mudou. Desta vez, não era mais a guarda militarizada, mas uma comissão de representantes da prefeitura e as respectivas secretarias responsáveis pela pauta, além da Procuradoria Geral do Município.

Esses representantes se comprometeram a intervir no processo judicial e se retratarem do erro que haviam cometido em dizer que não tinham interesse de participar da resolução do conflito, além de afirmar que já existe o programa para regularização da região em andamento. No fim do dia, uma grande assembleia foi realizada na porta da Prefeitura, e as centenas de moradores comemoraram a liberdade dos companheiros que haviam sido presos.

Dois dias depois, a Prefeitura visitou as ocupações e se comprometeram a avançar nas obras de urbanização. A juíza suspendeu a liminar do despejo e encaminhou o processo para a comissão de resolução de conflitos fundiários do Tribunal de Justiça, que também realizou uma visita técnica no dia 19 de dezembro.

As ocupações, mais uma vez, mostraram que o caminho para a vitória sempre passa pela luta, e que só com a organização do povo é possível vencer. A Ocupação Eliana Silva, além de vitoriosa, sai ainda mais fortalecida desse processo. Nossa luta resiste e avança!

Matéria publicada na edição impressa nº 306 do jornal A Verdade

O vício em celulares prejudica o ensino nas escolas

0

Sobre a recente proibição do uso de celulares nas escolas, o Movimento Rebele-se defende: “É preciso que essa medida venha acompanhada de uma política séria de incentivo à cultura, ao esporte e ao lazer; contratação de mais professores, psicólogos e assistentes sociais; promoção de aulas de artes; abertura das quadras e bibliotecas durante os intervalos e liberdade de organização dos grêmios estudantis.”

Coordenação do Movimento Rebele-se


O uso abusivo e o vício em celulares e outros dispositivos eletrônicos está atrapalhando a aprendizagem das crianças e jovens nas escolas. Nos últimos anos, alguns países como França, México, Espanha e Grécia chegaram a adotar uma política de regulamentação com o objetivo de combater a falta de sociabilidade entre os estudantes, problemas de saúde mental, distração e falta de concentração durante as aulas.

No Brasil, algumas unidades de ensino adotaram a proibição dos celulares e, no dia 13 de janeiro, o presidente da República sancionou a Lei 15.100/25, que proíbe o uso dos dispositivos nas instituições de ensino em todo território nacional. A lei permite a utilização de dispositivos para fins pedagógicos e didáticos, desde que sob supervisão de professor(a).

Falta de concentração

Diferentes estudos apontam que o uso do celular interfere na capacidade de concentração das pessoas. O relatório do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), de 2022, aponta que 8 em cada 10 alunos brasileiros de 15 anos disseram que se distraem com o uso de celulares nas aulas de matemática. Também há impacto pela simples presença de um smartphone no mesmo local que o indivíduo. Quando as pessoas conseguem evitar a tentação de verificar seus telefones, a mera presença desses dispositivos reduz a capacidade cognitiva. Ou seja, o esforço de ignorar a presença do dispositivo consome recursos cognitivos, tornando a concentração mais difícil e o desempenho nas tarefas prejudicado.

Problemas de saúde

O uso excessivo de dispositivos móveis acarreta em problemas musculares, ortopédicos, visuais, distúrbios do sono, dependência e transtornos psicológicos, como ansiedade e depressão.

A preocupação se intensifica quando se trata de crianças e adolescentes. Estudo publicado na Clinical Psychological Science revelou uma relação entre o aumento do tempo de uso desses aparelhos e o aumento dos índices de depressão e suicídio entre os jovens.

Desde a pandemia, o isolamento social entre os jovens tem se tornado uma preocupação crescente. O uso excessivo de celulares agrava essa situação, substituindo relações interpessoais por conexões digitais superficiais. Durante os intervalos escolares, muitos jovens preferem ficar em frente às telas em vez de interagir com os colegas, o que prejudica o desenvolvimento das habilidades sociais.

Movimento Estudantil

O vício em celulares tem afetado até mesmo a percepção dos estudantes sobre os problemas das escolas e o consequente envolvimento dos estudantes nas atividades do movimento estudantil. Por vezes, o celular se faz mais presente do que o que está sendo discutido em uma assembleia ou na reunião do Grêmio. Nas passagens em salas, testemunhamos que avisos importantes para as lutas, atos e ocupações competem com os chamados “vídeos curtos”.

Cabe, portanto, às entidades estudantis trabalharem para estimular a conscientização sobre os problemas que esse vício traz. É preciso despertar sobre nossa própria realidade e equilibrar os avanços tecnológicos com e a saúde da juventude, alinhada à organização da luta pela transformação da educação e da sociedade.

Quando os milhões de estudantes secundaristas tirarem os olhos das telas, poderão se indignar com a realidade da educação e lutar para transformá-la.

Lutar para transformar a educação

As escolas públicas estão abandonadas, com muitos problemas de infraestrutura, desde a falta de sabonete nos banheiros até a interdição de prédios pela falta de manutenção. A reforma do Novo Ensino Médio aprofundou as desigualdades, piorou o ensino público e destruiu a possibilidade de um ensino crítico e emancipador nas escolas.

A direita e os fascistas que ocupam o Congresso Nacional e os Governos Estaduais trabalham ativamente para impulsionar o desmonte da educação. Os recentes ataques têm como objetivo firmar o poder do lucro acima dos direitos da comunidade escolar, com a privatização do ensino. Nessa mesma lógica, a militarização impõe a repressão e a violência dentro das escolas.

E, diante de todos estes problemas, o Governo Federal, que deveria defender a educação, escolhe reduzir o seu orçamento com o Arcabouço Fiscal. Isso quer dizer que a restrição do uso de celulares é uma medida urgente de saúde pública, mas não vai resolver todos os problemas da educação. Além da revogação do Novo Ensino Médio, da militarização e privatização das escolas, queremos mais verbas para a educação pública brasileira.

É preciso que essa medida venha acompanhada de uma política séria de incentivo à cultura, ao esporte e ao lazer; contratação de mais professores, psicólogos e assistentes sociais; promoção de aulas de artes; abertura das quadras e bibliotecas durante os intervalos e liberdade de organização dos grêmios estudantis.

Precisamos de uma juventude forte, unida e saudável, capaz de edificar uma nova escola e, consequentemente, uma nova sociedade. Vamos à luta em defesa das nossas vidas e das escolas!

Matéria publicada na edição nº 306 do jornal A Verdade

Estudantes fazem greve por mais verbas no Hospital Veterinário da UFRPE

0

Falta de materiais básicos para o funcionamento do Hospital Veterinário da UFRPE, quedas de energia e outras precariedades motivaram a paralisação das atividades de médicos e residentes

Cassiano Bezerra |  Diretor de Assistência Estudantil da UNE


No dia 13 de janeiro, médicos e estudantes residentes do Hospital Veterinário da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), em Recife, importante centro de pesquisa e de formação dentro da instituição, entraram em greve. O motivo é a falta de materiais básicos (seringas, álcool e etc.), que a universidade não recebe há mais de um ano. Os médicos precisam arcar com a compra junto aos residentes e pesquisadores do hospital. Além disso, de acordo com residentes, o hospital também sofre com frequentes quedas de energia, ocasionando, por exemplo, na perda de um equipamento de raios-x.

O centro de diagnóstico (onde ficam as máquinas de raios-x) também está interditado para uma reforma que nunca aconteceu e, desde então, o hospital não realiza nenhum tipo de tomografia nos animais, mesmo a universidade tendo recebido um tomógrafo de última geração.

“Os atendimentos no Hospital Veterinário são de caráter público, destinado a pessoas de baixa renda que dependem do nosso serviço. Porém, para que a gente continue ofertando esse trabalho, precisamos pedir doações aos tutores. Esses donativos viabilizam a realização de procedimentos cirúrgicos e anestésicos”, afirma Rebeca Paes, uma das residentes em greve.

Após a deflagração da greve, os participantes realizaram várias atividades. No dia 14, realizaram reunião interna para montar um cronograma. A organização da greve pressionou a universidade e conseguiu alcance na mídia local. Já no dia 16, houve uma reunião com o Departamento de Medicina Veterinária, a Reitoria e Pró-reitorias para exigir uma resposta.

Cortes afetam diretamente

É importante lembrar que o Governo Federal aprovou a Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2024 com R$30 milhões a menos do que em 2023 e tem seguido uma política econômica neoliberal com o Arcabouço Fiscal (a continuidade do Teto de Gastos dos Governos Temer e Bolsonaro). Nessa mesma linha, em agosto de 2024, contingenciou cerca de R$1,5 bilhão que iriam para saúde e educação. Enquanto isso, o Governo segue pagando cerca de R$ 1 trilhão (47% do PIB do país) para o pagamento da dívida pública, enquanto investe apenas 2% do PIB para áreas como educação e ciência.

A consequência disso são situações como a do Hospital Veterinário da UFRPE, falta de estrutura, insumos e quedas de energia, comuns em várias universidades do país. Não é de hoje que estudantes e residentes da universidade sofrem com problemas estruturais, vários prédios da universidade têm problemas nas janelas e também falta de ares-condicionados. Mas o principal é a falta de bolsas na universidade, que abarca apenas cerca de 2% da comunidade universitária, mas com uma demanda de mais de 60% dos estudantes.

A saída é a luta

Como mostraram os residentes que organizaram a greve, a saída é a luta. Lutar para ter uma entidade estudantil na UFRPE que garanta os interesses dos estudantes a nível geral e consiga ter força para reivindicar frente a reitoria as melhoras da universidade. O Diretório Central dos Estudantes (DCE) é essa ferramenta. Reabrir o DCE, que está fechado há seis anos é uma urgência para garantir as necessidades básicas para a formação discente.

Além disso, apenas criando uma mobilização nacional pela recomposição orçamentária e contra políticas de austeridade como o Teto de Gastos do Governo Federal é possível garantir uma universidade de fato pública, gratuita e de qualidade. Por isso, se organizar no movimento estudantil, com o Movimento Correnteza, é urgente para termos a universidade que queremos.

Matéria publicada na edição impressa nº 306 do jornal A Verdade

Servidores denunciam interferência política e práticas antissindicais da presidência do IBGE

0

A criação de uma entidade paralela para captar recursos privados e a falta de diálogo com os trabalhadores do IBGE durante a gestão de Márcio Pochmann são duramente criticadas pelo sindicato dos servidores do órgão

Raul Bittencourt Pedreira | Presidente do Sindsep-RJ


O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) enfrenta uma crise institucional que tem gerado debates acalorados sobre a autonomia da instituição e a qualidade dos dados produzidos. A gestão do presidente Márcio Pochmann tem sido alvo de críticas por parte dos servidores, que denunciam interferência política e falta de diálogo.

A Fundação IBGE+, uma entidade paralela ao instituto, criada às escondidas e sem qualquer diálogo interno, para captar recursos e desenvolver projetos junto a grupos privados, é um dos principais problemas gerados pela gestão Pochmann. Servidores e setores da sociedade civil temem que a fundação possa interferir na autonomia técnica do IBGE e direcionar recursos públicos para projetos privados alheios às suas atribuições tradicionais.

Além disso, mudanças na estrutura organizacional do IBGE, como a centralização de decisões e a falta de diálogo com os servidores, têm gerado insegurança e fragilizado a capacidade operacional da instituição. A credibilidade dos dados produzidos pelo IBGE também tem sido questionada, com temores de que o perfil autoritário da gestão possa comprometer a imparcialidade das informações estatísticas. Exemplos de autoritarismo não faltam, como a tentativa transferência da sede do IBGE para o Horto, na Zona Sul do Rio de Janeiro, e um corte massivo no trabalho remoto, tudo sem qualquer diálogo prévio.

O sindicato dos servidores do IBGE, o ASSIBGE, tem sido um crítico ferrenho da gestão Pochmann, defendendo a autonomia técnica do instituto e a necessidade de um diálogo aberto e transparente. O sindicato também tem alertado para os riscos da criação do IBGE+, que poderia desviar os já limitados recursos (humanos e financeiros) do instituto para priorizar a demanda de clientes privados, esvaziando a finalidade pública e comprometendo tanto a qualidade das informações estatísticas, quanto a credibilidade do instituto junto à sociedade.

Em meio à crise, o presidente Márcio Pochmann tem questionado o uso da sigla “IBGE” no nome do sindicato, alegando que a associação direta com o instituto não seria respaldada pelas atividades estatutárias do sindicato. O sindicato, por sua vez, argumenta que o uso de siglas de órgãos públicos em nomes de sindicatos é uma prática comum e legítima, que nunca foi questionada, nem mesmo no governo do fascista Bolsonaro.

A falsa disputa pelo uso da sigla IBGE é apenas mais um sintoma da crise que tem abalado o instituto e tensionado a relação entre o governo e os servidores. Pochmann, indicação pessoal do Presidente Lula, por sua vez, busca desviar a atenção da sociedade do problema central, o caráter autoritário de sua gestão. Mas não é um caso isolado, as direções do Arquivo Nacional e do Museu do Índio (Funai), ambos no Rio de Janeiro, também tem se mostrado aversos ao diálogo com os servidores e seus sindicatos.

A crise no IBGE é um reflexo da crise de identidade do Lula. Márcio Pochmann, recebido no IBGE como um nome progressista depois de todos os infortúnios do desastre Bolsonaro. Porém, o discurso inicial de aproximação com os servidores não se sustentou e agora busca impor sua vontade de forma autoritária, com uma gestão de visão liberal e privatista, que ataca o sindicato e direitos dos servidores.

Matéria publicada na edição impressa nº 306 do jornal A Verdade