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sexta-feira, 19 de abril de 2024

A reforma trabalhista e a mentira da livre negociação

Daqui a 90 dias, começa a vigorar a Reforma Trabalhista aprovada de forma forjada pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados. Com a reforma, os patrões, a classe capitalista, irão pagar salários mais baixos, poderão impor a jornada de trabalho que desejarem ao operário, implantar a terceirização em todos os setores da economia e até obrigar mulheres grávidas e lactantes a trabalharem em condições insalubres. Trata-se do maior retrocesso nos direitos dos trabalhadores brasileiros nos últimos 100 anos.

Um dos absurdos dessa reforma é adotar jornada intermitente em pleno século 21. Ou seja, em vez de o trabalhador ser contratado para uma jornada de oito horas por dia, como está na Constituição, o patrão tem as mãos livres para explorá-lo como quiser, podendo convocá-lo apenas alguns dias por semana e sem continuidade, além de não ser obrigado a depositar o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), a Previdência ou o pagamento das férias. O trabalhador fica totalmente desprotegido, sem nenhum direito, e terá enormes dificuldades para comprovar o tempo de trabalho para se aposentar. Este é um dos maiores crimes que já se cometeu em nosso país contra o trabalhador.

Aumento dos privilégios dos patrões

Também não será mais necessário que a homologação das demissões passe pelos sindicatos, o que significa que os patrões poderão pressionar e roubar os trabalhadores sem nenhuma fiscalização. A reforma ainda permite ao patrão alegar que a demissão foi de comum acordo e pagar apenas metade da indenização devida. Tem mais: com a reforma, os trabalhadores, embora sejam pobres, serão obrigados a pagar mais de dois terços das custas do processo para reclamar seus direitos na Justiça do Trabalho, embora tenha sido o empresário quem demitiu e não pagou o que era correto. Na prática, com a reforma, joga-se no lixo a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Até a Organização Internacional do Trabalho (OIT) denunciou que essa mudança da legislação trabalhista no Brasil “desrespeita as convenções internacionais de número 98 (negociação coletiva) 151 (servidores públicos) e as convenções 154 e 155 (segurança e saúde dos trabalhadores)”. Para a OIT, os Estados membros têm a obrigação de cumprir e garantir os acordos ratificados e não desrespeitá-los.

Na realidade, a Reforma Trabalhista foi feita exclusivamente para atender os interesses da burguesia, da classe capitalista. Prova disso é que 74% dos senadores que votaram a favor da reforma são empresários. O restante, os outros 13%, embora não declarem, têm empresas em nomes de seus familiares. Aliás, o atual presidente do Senado, senador Eunício Oliveira (CE) é dono, entre outras, de uma empresa de limpeza, transporte e segurança.

A mentira da livre negociação

Os empresários e seus economistas dizem que com a reforma haverá uma livre negociação entre patrão e empregado.

Acontece que na sociedade capitalista os meios de produção, as fábricas, as máquinas, as terras e também bancos, lojas e empresas em geral, são propriedade de uma classe muito reduzida de pessoas, a burguesia. Logo, os operários, para trabalharem, são obrigados a vender sua força de trabalho aos donos das empresas. Do contrário, não têm trabalho, viram pedintes ou morrem de fome. Vejamos, então, como será essa “livre negociação”:

“Os patrões dirão: operário, você quer trabalhar?  Temos um emprego para você. Agora, as condições são essas: jornada intermitente, não assinarei sua carteira de trabalho, você não poderá comprovar que trabalhou e só receberá pelas horas que eu o convocar.

– Ah, você é mulher e está grávida, então vai trabalhar em condições insalubres. Bem, estamos numa democracia, você tem o direito de dizer não. Diga logo se aceita a vaga ou não? Lembre-se, que a fila anda”.

Essa é a modernização das relações de trabalho imposta pelo Governo Temer, as Forças Armadas e o Congresso Nacional e que foi entusiasticamente comemorada pela Rede Globo e por todos os grandes meios de comunicação da burguesia.

Para se beneficiar da nova legislação, os patrões já começaram a demitir trabalhadores e trabalhadoras, deitando por terra a mentira de que a reforma trabalhista geraria mais empregos. De fato, o único emprego que tem aumentado no país é o informal (aquele em que o trabalhador não tem carteira assassinada) e o chamado por conta própria, ambos em condições extremamente precárias. Somente nos últimos dois anos, 2,7 milhões de empregos com carteira assinada foram eliminados no Brasil e várias empresas estão demitindo para contratar quando a nova lei passar a vigorar. As empresas do chamado setor automotivo, por exemplo, demitiram mais de 6.000 trabalhadores nos últimos meses. Os bancos, os supermercados e várias outras empresas também estão dispensando para contratar com base na draconiana reforma trabalhista, e o Governo Federal quer demitir 5.000 servidores públicos.

Tudo isso, quando se sabe que o país tem quase 14 milhões de trabalhadores desempregados (24 milhões se incluirmos aqueles que estão fazendo bicos ou que cansaram de procurar emprego e não encontrar) e 61 milhões de pessoas estão na lista de devedores porque não têm dinheiro para pagar suas dívidas.

Não bastasse, segundo a Fundação Abrinq, 23 milhões de brasileiros de até 14 anos vivem na pobreza, o dobro da população de Portugal. Mais: enquanto nega um reajuste de 4,6% no Bolsa Família, um custo que foi estimado em R$ 800 milhões, o governo federal gasta R$ 407 bilhões com o pagamento de juros para enriquecer ainda mais os banqueiros nacionais e internacionais.

Mas enganam-se os patrões e seu governo ao pensarem que os trabalhadores baixarão a cabeça a esse ataque aos seus direitos. O número de greves tem crescido e irá aumentar ainda mais após essa agressão dos patrões. No dia 29 de abril, 40 milhões de trabalhadores cruzaram os braços, foram às ruas e deixaram claro o tamanho da sua força. Uma nova greve geral foi marcada para o dia 30 de junho, mas as centrais sindicais subornadas pela classe capitalista boicotaram a greve.

Entretanto, a maior traição ainda não é essa. A Reforma Trabalhista e a Reforma da Previdência são apenas dois dos golpes que a grande burguesia nacional tem realizado contra a classe operária e os pobres em nosso país. Essa mesma burguesia entregou Olga Benario a Hitler, cedeu as riquezas do Brasil ao capital estrangeiro, permitiu que multinacionais e latifundiários tomassem posse das terras indígenas e dos camponeses, organizou uma das Forças Armadas mais reacionárias da América Latina, promoveu diversos golpes militares ao longo de nossa história, inclusive o de 1964, que assassinou homens e mulheres da estatura de Manoel Lisboa, Carlos Marighella, Manoel Aleixo,  Iara Iavelberg, Sônia Angel, Margarida Maria Alves, além de ter apoiado regimes como de Pinochet no Chile e ditaduras militares na Argentina e no Uruguai.

Deploravelmente, várias organizações e partidos políticos que se dizem de esquerda defendem como solução para os problemas do país a aliança com essa burguesia nacional. O próprio presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), que retirou dos porões do Congresso essa reforma trabalhista, foi eleito com o apoio do PCdoB. Não se trata de algo circunstancial. Um dos líderes desse partido, Aldo Rebelo, lançou recentemente um manifesto defendendo a união nacional com a burguesia. O próprio Michel Temer chegou à Presidência porque deu um golpe, mas também porque era vice-presidente de Dilma e do PT. Também o atual ministro da Fazenda, o banqueiro Henrique Meirelles, autor intelectual das reformas, foi presidente do Banco Central durante os dois governos de Lula. E a justificativa para essa aliança com a grande burguesia (pasmem) é que é necessário garantir a governabilidade. Agora, propagam que “Diretas Já!” é a solução para a crise. Não custa lembrar:  desde 1989, temos eleições diretas, mas a escravidão assalariada e a pobreza não acabaram e a classe capitalista aumentou ainda mais sua fortuna.

Exploração ou libertação

Também há outras organizações de esquerda que falam em socialismo, mas defendem a continuidade do sistema capitalista, alegando que é necessária uma política ampla na atual correlação de forças. Esquecem que a mudança na relação entre as classes depende de um árduo trabalho, de uma linha política correta, que só o marxismo-leninismo garante, e de nunca esconder a verdade da classe operária, a única classe verdadeiramente revolucionária, como já alertava Marx e Engels, em 1848: “Os comunistas rejeitam dissimular as suas perspectivas e propósitos”.

Além disso, a Reforma Trabalhista demonstra que os interesses da burguesia são opostos aos dos trabalhadores. De fato, o patrão é rico não porque Deus quer, mas porque ele explora o operário. O operário trabalha para os patrões, em troca de um pequeno salário, mas tudo o que ele produz com seu trabalho, o automóvel, o prédio, o sapato, etc, fica com o burguês, que vende o produto e se apropria do lucro. Esta é a razão do patrão ser rico e o operário continuar pobre. Com efeito, o regime capitalista é o pior sistema existente no mundo. Nele, apenas o burguês enriquece, o trabalhador morre de trabalhar, passam várias gerações e sua família continua vivendo na pobreza. A tão propagada modernização do capitalismo, como vemos com essa reforma, em vez de trazer progresso para o trabalhador aumenta seu sofrimento, retira seus direitos, destrói milhões de famílias e joga milhares de crianças na pobreza, obrigando-as a viver pedindo esmolas nas ruas.

Por isso, não é possível aos trabalhadores conseguirem uma vida melhor enquanto persistir o capitalismo, a exploração do homem pelo homem, a propriedade privada dos meios de produção. Os conciliadores, os defensores da harmonia entre a burguesia e o proletariado, querem e esperam que os empresários tenham uma consciência mais humana, sejam bondosos, mas agindo assim apenas impedem o avanço da consciência revolucionária nas massas populares. Sem dúvida, a única maneira de o trabalhador alcançar sua liberdade é se unindo aos seus companheiros e companheiras e lutando para acabar com a exploração capitalista, para conquistar o poder e substituir o sistema capitalista pelo socialista. Para avançar e mudar o atual quadro político em nosso país, é necessário fortalecer o movimento operário contra o movimento da burguesia, ter a doutrina da luta de classes como um princípio e um guia para as ações, defender o socialismo científico e lutar por um novo poder e um novo governo sem a participação da classe dos exploradores.

Lula Falcão é membro do Comitê Central do Partido Comunista Revolucionário e diretor de A Verdade

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