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sábado, 12 de outubro de 2024

“O Capitão que nos inspira! Em nome de Lamarca, capitão do exército brasileiro, pai, revolucionário e guerrilheiro”

Homenagem ao guerrilheiro revolucionário que tombou no mês de setembro.

Pedro Dragoni


Foto: Reprodução/Jornal A Verdade

CARTA – Carlos foi um homem apaixonando; seja pelos seus filhos César e Cláudia, seja por Iara, assim como pela vontade apaixonada inquebrantável na luta pela liberação de seu país.

Lamarca teve sua “revelação” quando esteve em missão no Egito quando do conflito durante o processo de nacionalização do canal de Suez (efetuado pelo então governo nacionalista de Al Nasser nos anos 50) e a posterior guerra na chamada Crise de Suez. Ali no meio do deserto e presenciando a fome e a brutal miséria e exploração sofrida pelo povo, entendeu que a ONU e o Ocidente “civilizado” não estavam lá por nenhuma “democracia”, mas sim para se apoderaram das riquezas naturais do Oriente Médio.

Lamarca volta outra pessoa dessa missão: convicto de que o capital monopolista internacional era o grande carrasco dos povos e nos anos subsequentes (após o golpe de 1964) de que o Brasil estava vivendo de fato uma ditadura empresarial-militar feroz e a serviço do imperialismo norte-americano.

VAR-Palmares, VPR, MR-8. Carlos passou por essas organizações, errou, debateu, buscou se aprofundar em teoria revolucionária marxista para melhor delinear qual melhor caminho a seguir não somente na luta armada, mas na luta revolucionária em geral.

Ao contrário do senso comum de que Lamarca teria uma “tendência militarista”, ao se aprofundar na compreensão da dinâmica das lutas sociais, percebeu que somente o trabalho pela base com o protagonismo da classe operária, é que se poderia construir um instrumento de massas para enfrentar a ditadura militar. Mesmo que sua atuação – devido às condições concretas e a interpretação em voga muito mal interpretada por sinal, da experiência de Cuba –, tenha sido a de buscar criar focos guerrilheiros a partir da zona rural emulando o processo da revolução cubana, ao final de sua vida no interior baiano lendo Marx e Lênin, pôde rever suas posições, mas que infelizmente não puderam ser colocadas em prática dado o endurecimento do regime e o isolamento total e aniquilamento das esquerdas armadas naquele início de década de 70.

Costuma-se evidenciar o caráter “personalista” de Lamarca, entretanto o mesmo declarou:

“A guerrilha não deve ser considerada coisa para super-homens”. Devemos considerá-la sem romantismo. O treinamento mostra que aquele que mais produz é o que possui o mais alto nível ideológico; as capacidades físicas formam-se pouco a pouco e o problema das limitações individuais é resolvido pelo conjunto. Insistimos sobre o fato de que levar a guerrilha pra frente não é um problema de heroísmo, mas de técnica, e esta pode ser assimilada por qualquer pessoa. Em lugar de dizer, como Brecht, ‘infeliz o país que precisa de heróis’, nós diríamos ‘triste a guerrilha que precisa de heróis’”.
– Emiliano José e Oldack de Miranda: Lamarca, o Capitão da Guerrilha.

A coragem e disposição de Carlos eram maiúsculas. Sua decisão revolucionária de desertar do exército burguês expropriando fuzis e munições para a construção da guerrilha, sua presença em ações como a expropriação do cofre do folclórico e corrupto político burguês Ademar de Barros conhecido como o “rouba, mas faz” e fundador da Rede Bandeirantes ou da captura do diplomata suíço Giovanni Enrico Bucher em troca da libertação de companheiros presos sujeitos à tortura e morte. Ou mesmo suas tentativas de instalar bases guerrilheiras no Vale do Ribeira e na Bahia. Lamarca foi de uma entrega total à causa da revolução. Em emocionante carta aos filhos que haviam se refugiado em Cuba, escreveu:

“O que é um revolucionário? É toda a pessoa que ama todos os povos, ama a Humanidade, tem uma imensa capacidade de amar, ama a justiça, a Igualdade. Mas ele tem de odiar também, odiar os que impedem que o revolucionário ame, porque é uma necessidade amar. Odiar aos que odeiam o povo, a Humanidade, a Justiça social. Odiar aos que dominam e exploram o povo, odiar aos que corrompem, ameaçam e alienam as mentes, aos que degradam a Humanidade, aos injustos, falsos, demagogos, covardes. O revolucionário ama a Paz, faz a guerra como instrumento para ter a Paz, a Paz justa, sem exploração do homem pelo homem. O revolucionário tem que ser capaz de todos os sacrifícios pela causa, de até se separar dos seus filhos para libertar todos os filhos, de se separar dos pais porque outros pais precisam dele. Quando vocês sentirem saudades de mim, se lembrem de que aqui no Brasil existem muitas crianças que passam fome, que andam descalças, sem escolas, que sofrem e veem seus pais sofrerem. Lembram-se quando conversei com vocês no quarto e pedi a vocês que deixassem eu lutar para acabar com isso. Eu lembro bem que a Claudinha bateu palmas e o César disse: “Muito bem, papai”. Combinamos que tínhamos de ficar longe um do outro, e que guardaríamos no coração a esperança de nos encontrarmos novamente.”

Carlos Lamarca, em 17 de setembro de 1971, com então 37 anos, deixou a vida entrando para a história como um dos maiores revolucionários que tivemos em nosso país. Deu seu valoroso sangue em uma luta sem tréguas por uma sociedade sem exploradores e explorados, compreendeu ao fim de sua curta trajetória o papel fundamental da classe operária, de organização desde baixo e que a luta armada só teria chances reais de êxito se ela emanasse do desenvolvimento das próprias lutas populares.

Carlos foi e será sempre exemplo. Um herói eterno do panteão dos (as) grandes revolucionários (as) da história do Brasil.

Que seu afinco pela libertação do povo possa nos inspirar nas lutas diárias que travamos por uma sociedade igualitária e fraterna.

E como ele mesmo fazia ao final de todas as suas cartas: “Ousar lutar! Ousar vencer!”.

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