O álcool como mal necessário para a manutenção do capitalismo

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CAMPANHA RUSSA – “Não seja um prisioneiro dos velhos hábitos”. (Foto: Reprodução)
Vitória Louise

SÃO PAULO – Uma coisa muito banalizada na sociedade atual é o consumo do álcool. Bebemos quando nos sentimentos tristes, bebemos quando estamos felizes, bebemos para esquecer um dia ruim e também bebemos para celebrar um dia bom. O consumo do álcool está tão enraizado na sociedade que sempre encontramos alguém que bebe até desmaiar, muitas vezes fazendo até piada. O consumo exagerado do álcool atinge as fileiras de luta dos que estão construindo o enfrentamento do capitalismo e buscam uma outra sociedade, livre da exploração do homem pelo homem. Precisamos então refletir sobre a relação entre o papel dos revolucionários e o consumo exagerado do álcool.

O capitalismo é um sistema de exploração que promove as desigualdades que atingem as grandes parcelas da classe trabalhadora e potencializa as opressões que foram estruturadas ao longo da história, isso não é uma novidade pra ninguém. Mas, se o capitalismo é tão ruim, o que impede o povo de se organizar para construir uma nova sociedade livre da exploração do homem pelo homem? O que impede as mulheres trabalhadoras que sofrem a exploração dos patrões pelo capital e a opressão do patriarcado de se organizarem para construir creches, lavanderias comunitárias e restaurantes comunitários, como foi na antiga União Soviética, e libertar-se do terrível trabalho doméstico e da dupla opressão? O que impede o nosso povo preto de organizar contra a exploração do trabalho e a atrasada e repugnante opressão do racismo que ainda se mantém firme graças à esse sistema capitalista?

Dos diversos fatores que dificultam a organização do nosso povo para derrubar o sistema, um bastante grave é o abuso do uso do álcool. É claro que não é apenas este problema que entrava a organização da classe trabalhadora, mas é preciso reconhecer, sobretudo entre os revolucionários, como isso tem trazido muitos danos aos nossos coletivos e movimentos.

Para os que lutam pelo fim do capitalismo, um outro tipo de sociedade onde o homem possa construir a sua felicidade real e sem exploração é um dos motivos para se organizar para a luta. Se o escape da realidade implicar em uma anestesia ou perda dos sentidos, não será possível construir um avanço dessa consciência para a luta revolucionária. Pelo contrário, essa anestesia é passageira e terá como papel amortecer o ódio de classe e a indignação contra as injustiças. O álcool, assim como as demais drogas lícitas ou ilícitas, cumprem essa função de aniquilar a indignação da juventude e o potencial revolucionário de transformação da realidade. Pois, se há uma válvula de escape que permite que a nossa consciência não avance e ainda cria uma falsa sensação de bem estar, coloca-se em questão uma dúvida que atormenta os jovens corações revoltados contra o sistema: qual a necessidade de se transformar a realidade?

Sempre que estamos a debater sobre essas questões que foram banalizadas na sociedade, os liberais fazem uma acusação: moralistas. Mas afinal, a moral em si é uma coisa ruim? O ser humano é movido por uma moral, mas o que não podemos deixar de ter em mente é que existem morais diferentes, e essas “morais” são divididas entre as classes. A moral burguesa liberal, não vê problema em consumir o álcool, inclusive, glamoriza esse velho vício. Alguns até admitem que é errado, não porque deixamos de avançar a nossa consciência para transformar a realidade, mas porque consideram um ato de “depravação” ou uma “coisa vulgar”; e geralmente essas acusações têm uma base religiosa.

Quando dizemos que o álcool é ruim e as drogas também não nos fazem bem, não é por considerarmos que simplesmente beber é “errado” ou então é “vulgar”. Quando os revolucionários afirmam isso, é porque sabem que é algo que atrapalha a luta e ajuda na manutenção do sistema de exploração. A moral dos revolucionários condiz com a abnegação do individuo, com a entrega consciente de todas as suas energias à causa coletiva.

A moralidade revolucionária exige sacrifícios conscientes. Exige também uma entrega maior à luta. Pois não sabemos quando esse sistema pode nos atacar, mas sabemos que ele o faz de diversas formas, seja através da sua polícia militar fascista, assassinando mais um dos nossos em qualquer momento do dia ou da noite, seja através de outras formas de repressão. Um revolucionário precisa se manter são para enfrentar o que a luta exigir dele, sempre atento e forte como diz a música de Elis Regina.

Quando um revolucionário decide parar de consumir quaisquer substâncias que impliquem na anestesia da consciência, é porque se internalizou que a causa exige uma outra postura, exige a construção de uma nova mulher e de um novo homem. Já afirmava Ho Chi Minh, líder revolucionário vietnamita: “Fazer a revolução para transformar a sociedade antiga em uma nova sociedade é uma obra gloriosa, mas é também tarefa pesada, uma luta extremamente complexa, longa e árdua. É preciso ser forte para poder levar grandes cargas e ir longe. Somente tendo a moralidade revolucionária como fundamento é que o revolucionário pode cumprir sua tarefa de maneira honrosa.”

No artigo “O gigante pode estar de ressaca: ensaio sobre o uso do álcool e as lutas das esquerdas”, Erahsto Felício expõe dados sobre a quantidade de riqueza que a indústria do álcool promove. Vale fazer a citação do artigo: “E esse ciclo de geração de riqueza para eles e miséria para nós tem seu melhor exemplo no homem mais rico do país (ou segundo mais rico, eles se revezam lá em cima). Jorge Paulo Lemman é o dono da AmBev, principal indústria do ramo de cervejas de nosso país. Em 2017, a revista Forbes estimava que ele ganhava quase quinhentos mil reais por hora. No ano seguinte, a imprensa informava que ele acumulava uma fortuna de 105,9 bilhões de reais.” E mais adiante, o autor do artigo complementa: “O Brasil já é o terceiro maior produtor de cervejas do mundo, perdendo apenas para China e EUA. Produzimos 13,3 bi de litros de cerveja, segundo o Sindcerv. São R$ 77 bi em faturamento, que corresponde a 2% do PIB nacional. É um grande mercado do qual nós só atuamos como trabalhadores explorados e os principais consumidores.”

Outra reflexão a fazer é a propaganda gratuita que se faz na sociedade para a manutenção desse tipo de exploração da nossa classe. Fora a propaganda paga, em comerciais de cerveja extremamente machistas que objetificam as mulheres, é muito comum observarmos a juventude propagar uma tal “felicidade”, em suas redes sociais, com atualizações que associam o consumo de álcool como alguma recompensa por ter enfrentado uma semana ruim ou uma situação pesada.

Fazendo propaganda de graça, influenciamos as pessoas ao nosso redor a também consumirem e a movimentarem essa rede de fabulosos lucros bilionários para esses grandes capitalistas. A verdade é que precisamos também combater esse tipo de atitude principalmente dentro das fileiras revolucionárias, pois ainda relembrando Ho Chi Minh: “As palavras e os atos dos membros do Partido repercutem na luta revolucionária, pois influenciam muito as massas.”

Por isso mesmo, precisamos aumentar a vigilância revolucionária em nós mesmos, a fim de influenciar as pessoas para a luta consciente e não propagar uma ideologia que mantém a sociedade e as coisas como estão.

É importante cada revolucionário refletir sobre o seu papel e seu compromisso com os trabalhadores. Refletir com consciência sobre o seu próprio consumo e se a decisão for de abandonar completamente o uso do álcool, que seja movido pelo espírito de sacrifício consciente e de abnegação. Como diria nosso eterno comandante Che Guevara: “Nosso sacrifício é consciente. É a cota a pagar pela liberdade.”

Ainda fazendo referência ao comandante, precisamos sempre “estudar e lutar, lutar e estudar”. Pois é se tornando cada vez mais consciente da realidade, menos alienado, que realizaremos mais ações para transformar essa sociedade e destruir esse sistema capitalista que nos sufoca!