Luis Almeida
SÃO PAULO – A revogação da Lei de Segurança Nacional, ocorrida em setembro de 2021, foi um esforço necessário à superação dos dispositivos jurídicos herdados do regime militar fascista de 1964. Entretanto, ainda mais importante para essa superação é a reinterpretação da Lei da Anistia.
Promulgada ainda sob o jugo da Constituição da ditadura a Lei 6683/79 surge como dispositivo de reconciliação entre os setores autocráticos e fascistas no poder e seus opositores políticos no exílio, permitindo que estes últimos pudessem retornar ao país.
Entretanto, a interpretação distorcida de seu conteúdo acabou por estender o perdão “amplo, geral e irrestrito” a todos os agentes repressores da ditadura, responsáveis pela tortura e pelo assassinato de centenas de trabalhadores que dedicaram suas vidas pela libertação de sua classe, dentre os quais ilustres camaradas como Manoel Lisboa de Moura, Emmanuel Bezerra, Helenira Resende e Carlos Marighella.
O perdão aos torturadores, no entanto, vale-se apenas da contínua hegemonia do poder político nas mãos das elites para continuar em vigor, visto que há claros precedentes e dispositivos jurídicos que permitem tanto a anulação de qualquer perdão aos agentes repressivos quanto a aplicação de severas penas e medidas de reparação aos crimes contra a humanidade cometidos entre 1964 e 1985.
Em 2010, a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o estado brasileiro, no caso Gomes Lund, a punir os agentes da repressão e criar políticas públicas de reparação aos parentes dos militantes assassinados e à sociedade civil, pelas atrocidades cometidas durante a ditadura militar.
Embora um grande avanço, pequenas foram as medidas implementadas pelo governo.
Foi criada à época a Comissão Nacional da Verdade, pela qual o desfecho do desaparecimento de muitos foi resolvida, mas atitude nenhuma foi feita no sentido de punir os torturadores.
Usando das doutrinas jurídicas modernas, o fato da Lei da Anistia ter sido promulgada antes da decisão do caso Gomes Lund inabilitaria quaisquer ações no sentido de punições diretas aos torturadores.
O que a doutrina esquece – e de propósito – é que o próprio Supremo Tribunal Federal já havia decidido, em 2008, que tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário são sempre superiores (isto é, revogam leis cujo conteúdo é contrário ao seu) a qualquer lei criada dentro do nosso território nacional e, ainda, se aplicam a leis tanto anteriores quanto posteriores à sua promulgação.
Muitas outras contradições jurídicas poderiam ser também elencadas, mas apenas os fatos aqui postos já nos expõem uma conjuntura política bastante concreta: a de que a Lei da Anistia serve apenas à manutenção do Estado moderno burguês e suas origens autoritárias e fascistas, acobertando seus hediondos crimes contra o povo trabalhador.
Esse projeto político se mostra verdadeiro não somente pela impunidade dos agentes da repressão como também pela atual composição do governo que empossou como presidente um produto direto do partido fardado fascista, alinhado ao Imperialismo norte-americano.
A ascensão de Jair Bolsonaro só serve para explicitar esse desprezo que tem os mais ricos por toda tentativa de luta dos trabalhadores em busca de uma realidade mais justa e solidária.
Portanto, urge a todos nós, militantes pela libertação de nosso povo, a missão histórica de pressionar os polos de poder atuais pela reinterpretação da Lei da Anistia, abertura dos arquivos da ditadura e severa punição aos torturadores.
Missão esta que nos cai tanto como um passo a mais na construção do socialismo, quanto como forma de se honrar os revolucionários que tanto lutaram e deram suas vidas pela libertação do povo que tudo constrói e edifica em nosso país.