UM JORNAL DOS TRABALHADORES NA LUTA PELO SOCIALISMO

quinta-feira, 20 de novembro de 2025
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Contra o fascismo, autodefesa!

Igreja em São Paulo onde os haitianos são acolhidos.
Igreja em São Paulo onde os haitianos são acolhidos.

Um conjunto de fatos ocorridos nos últimos dias indicam que, pelo menos no estado de São Paulo, estão em um funcionamento um ou mais grupos de extrema direita fascista destinados a realizar ações terroristas de intimidação e agressão contra pessoas, militantes e organizações populares.

No dia 30 de julho ocorreu o primeiro fato. Após as 22h, os ocupantes de um carro escuro arremessaram uma bomba de fabricação caseira contra a portaria do Instituto Lula, organização que representa o ex-presidente e está sediada na capital paulista, no bairro do Ipiranga. A bomba abriu fissuras no portão e seus estilhaços provocaram danos sem deixar feridos.

Dois dias depois, no sábado (1 de agosto), dois ataques foram realizados no centro da capital paulista. O alvo dessa vez foram os imigrantes haitianos que vivem em São Paulo. Eles foram alvejados a tiros na rua do Glicério e na escadaria da Igreja onde funciona a missão religiosa que atende os refugiados em São Paulo. Segundo a reportagem do próprio jornal O Globo, testemunhas declararam que  o atirador gritou enquanto atacava: “Haitianos, vocês roubam nossos empregos!“. Seis haitianos foram atingidos e alguns deles permanecem com balas alojadas no corpo, sem correr risco de morte.

O terceiro fato ocorreu na noite de ontem (8 de agosto). A modelo Viviany Beleboni, transexual militante pelos direitos LGBT – que ficou conhecida nacionalmente após realizar uma performance na última parada gay em São Paulo representando as transexuais crucificadas como o Cristo pela violência transfóbica – foi atacada quando caminhava nas proximidades da sua casa. O agressor portava uma faca e, após luta corporal com Viviane, fugiu deixando a vítima com vários ferimentos.

Os alvos dos três atentados têm em comum o fato de terem motivado fortes ataques nas redes sociais nos últimos meses. Em uma rápida leitura na seção de comentários em notícias relacionadas a haitianos, transexuais e Lula é possível encontrar dezenas de ameaças a integridade, crimes de ódio e injúria. Seria muita ingenuidade pensar que esses crimes ficariam apenas na ameaça virtual.

Não se pode subestimar o potencial de dano desses grupos fascistas, afirmando que são apenas uma minoria inofensiva de lunáticos e fundamentalistas. Na medida em que os setores mais reacionários da extrema direita veem frustrados os seus planos golpistas que incluem uma ‘intervenção militar’, é de se esperar que recorram ao terrorismo como forma de realizar o que desejam. Um de seus ídolos, o deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ), é inclusive suspeito de envolvimento no ataque a bomba ao Pavilhão Riocentro, em 1981.

O objetivo desses grupos é muito claro: intimidar as organizações populares e de esquerda, inibir a livre expressão de ideias e impedir a organização livre e ampla dos movimentos e militantes sociais através do medo. Até o momento, nenhum dos responsáveis pelos três atentados foi identificado e punido, deixando o caminho aberto para novas ações. É evidente que a Polícia de São Paulo e o Ministério Público, tratarão o tema como casos isolados e farão o surrado e conhecido inquérito moroso.

Frente ao fascismo, é necessário organizar a autodefesa. O primeiro passo é formar uma frente de organizações sociais que exija do governo federal uma força-tarefa da Polícia Federal que investigue esses grupos, seus crimes e ligações. Essa exigência, no entanto, não deve guardar nenhuma ilusão. Trata-se de um governo enfraquecido e diposto a ceder a todas exigências da direita do país, e que se recusou, inclusive, a punir os torturadores e assassinos da ditadura militar identificados pela Comissão da Verdade.

Mais importante ainda, é preciso avançar em relação a atitude liberal e desorganizada que hoje temos em relação a organização de atos e reuniões públicas. Nossas atividades não podem ser um alvo falso de ataque para esses grupos. É preciso preparar os esforços de autodefesa e vigilância em cada frente e transformar o famoso slogan ‘Não passarão!‘ em atitudes concretas, e não em apenas uma frase de efeito.

Jorge Batista, São Paulo

Após ocupações, governo federal se compromete com demandas dos sem-terra

20131628219_87a80e09c3_bApós dois dias de mobilizações do MST em todo o país, que ocupou 13 sedes do Ministério da Fazenda contra cortes na Reforma Agrária, o governo anunciou a recomposição do orçamento para a Reforma Agrária.

O compromisso veio logo depois de uma reunião, realizada nesta terça-feira (4), entre integrantes do Movimento e os ministros da Casa Civil, Aloízio Mercadante, da Secretaria-Geral da Presidência da República, Miguel Rossetto, e do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias.

De acordo o ministro Patrus Ananias, a redução no orçamento previsto para a reforma agrária, em decreto de contingenciamento publicado na última semana, pode ser revista.

Em termos proporcionais, o Ministério do Desenvolvimento Agrário é a pasta mais prejudicada pelo contingenciamento do orçamento da União. Com 15,1% de seus gastos afetados, o aporte que antes era de R$ 3,5 bilhões será de apenas R$ 1,8 bilhão. O valor representa uma redução de quase 50% do montante previsto inicialmente na Lei Orçamentária de 2015.

Para Alexandre Conceição, da coordenação nacional do MST, no início do ano o governo se comprometeu em assentar as 120 mil famílias acampadas. Porém, com esse corte no orçamento, o que já era considerado ínfimo passa a ser inviável para o compromisso.

“Se não houver desapropriação de terras para novos assentamentos, não adianta discutir Reforma Agrária. O governo se comprometeu em recompor o orçamento. Nós seguiremos na luta identificando latifúndios e exigindo que sejam desapropriados para Reforma Agrária conforme nossa legislação”, afirmou Conceição.

Com esse novo compromisso do governo de recomposição do orçamento, o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, vai informar o novo valor a ser contingenciado para a reforma agrária no próximo dia 20 deste mês.

Segundo Kelli Mafort, da coordenação nacional do MST, o governo precisa ter mais ação e menos discurso no que se refere à pauta da reforma agrária no Brasil, e que os trabalhadores e trabalhadoras rurais permanecerão em luta permanente.

“O governo tem que ter vontade política e criar condições para fazer a reforma agrária. Precisamos ter ação, o discurso tem que parar de cair no vazio. E nós vamos seguir pressionando nas ruas para que se cumpra o prometido ao povo sem terra”, salientou.

Mobilizações

Segundo Mafort, o cenário político brasileiro exige que o povo esteja em constante mobilização, pois se percebe a existência de um endurecimento e um conservadorismo maior no que se refere às questões econômicas, sem que se resolva os problemas da sociedade.

“O MST mostrou sua força ao mobilizar inúmeras famílias Sem Terra contra o ajuste fiscal e suas medidas que têm afetado diretamente as conquistas e os direitos dos trabalhadores”, disse a dirigente.

Principal responsável pela Reforma Agrária, com este corte de verbas nas chamadas despesas discricionárias do MDA, a tendência é impactar diretamente a política de desapropriação de terras e assentamentos de famílias acampadas.

É neste cenário que o MST mobilizou 18 estados, além da capital federal, com ocupações do Ministério da Fazenda em 13 estados. Além de diversas outras mobilizações, como ocupações de terras, trancamento de rodovias e ferrovias e marchas pelas cidades do país.

O Ministério da Fazenda é a casa responsável pelos ajustes fiscais, programas e medidas que tem, insistentemente, impossibilitado que os investimentos públicos priorizem a educação, a saúde, a reforma agrária, dentre tantas outras políticas que são necessárias para melhorar as condições de vida do povo.

Segundo Alexandre, a sociedade brasileira precisava saber que é no Ministério da Fazenda que se coloca em prática a política econômica ditada pelo capital e pela burguesia, e contra o povo brasileiro.

“Esse Ministro não representa o povo brasileiro e sim a elite burguesa desse país. Irmos à luta com ocupações na casa responsável pelos ajustes fiscais possibilitou colocar em foco o arroxo que a classe trabalhadora vem sofrendo. Por isso, a vitória é nossa, porque a vitória pertence aqueles que sabem botar os pés e o coração no caminho da luta por uma sociedade mais justa e igualitária”, frisou.

Iris Pacheco, em site do MST (www.mst.org.br)

Estudantes vão às ruas contra o cortes de verbas no dia 11 de Agosto

Katerine Oliveira, vice-presidente da UNE
Katerine Oliveira, vice-presidenta da UNE

Nas principais cidades do país estão sendo programadas manfestações contra os cortes de verbas na educação na próxima terça-feira, 11 de agosto (Dia do Estudante). São  manifestações impulsinoadas por Diretórios Centrais, Entidades estudantis combativas e diferentes coletivos de estudantes.

A educação pública brasileira vive hoje seu pior momento desde o governo FHC. O corte realizado pela presidenta Dilma e seu ministro Joaquim Levy de mais de R$ 10 bilhões nos recursos para essa área, atingiu em cheio a capacidade de financiamento e expansão das principais universidades do país.

Os programas de permanência estudantil e as bolsas do Programa de Incentivo à Docência estão seriamente ameaçados. Os juros para acessar o Financiamento Estudantil duplicaram e muitos estudantes foram impedidos de acessar o programa.

Servidores, professores e estudantes têm respondido com greve e mobilizações a esses ataques do governo. Na UFRJ a greve dos estudantes já dura dois meses. Em Juiz de Fora (Minas Gerais) o reitor da UFJF foi obrigado a cancelar o início do semestre em virtude da falta de condições estruturais.

Para Katerine Oliveira, vice-presidente da UNE e militante da União da Juventude Rebelião – UJR. “Nós vamos viver um período onde várias universidades não vão conseguir iniciar as aulas devido a falta de verbas. A UNE precisa dar uma resposta enérgica para que a gente consiga reverter essa situação”.

Da Redação

Alckmin continua a fechar salas de aula em São Paulo

mais-de-um-mes-720x320Depois de fechar mais de 3000 salas de aula no começo do ano e da greve mais longa da história da categoria dos professores de São Paulo, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) intensificou o projeto seu e do seu partido de acabar com a educação pública do estado de São Paulo.

As recentes vitórias da categoria que conseguiu na justiça, por decisão do Superior Tribunal Federal e do Tribunal de Justiça de São Paulo, a obrigação do pagamento imediato dos dias parados para todos os grevistas parecem não intimidar o governo de São Paulo. Faltando apenas uma semana para o retorno dos estudantes para as escolas, a ordem foi fechar todas as salas que não tivessem o mínimo de 36 estudantes.

A concepção de educação do governo do PSDB é de que a escola é um gasto e o salário dos(as) professores(as) um prejuízo a serem eliminados. No início do ano mais de 20 mil professores temporários foram demitidos e das 59 mil vagas anunciadas no “maior concurso para professores da história”, nem mesmo 40% foram preenchidas. Enquanto isso, milhares de professores(as) são impedidos de trabalhar por causa da duzentena e outros vivem em situação precária trabalhando como eventuais ou temporários, esperando a convocação dos aprovados no concurso.

O fechamento das salas precariza ainda mais o ensino. De um lado as salas com menos alunos voltam a ficar superlotadas, ensinar e aprender se torna quase impossível e os(as) alunos(as) que já estavam adaptados(as) aos seus colegas de sala e aos professores das matérias, terão que passar por um processo  atropelado de mudança, já que nenhuma discussão foi feita com estudantes, professores ou a comunidade escolar.

O sistema de organização da educação em São Paulo, fruto dos vinte anos de governo do PSDB no estado, é tão confuso que nem mesmo os(as) professores(as), a direção da escola ou a diretoria de ensino sabem dizer qual o futuro do professor que perde as aulas quando uma sala é fechada.

Para se ter idéia, uma professora de uma escola na Zona Norte de São Paulo (mas que fica sob jurisdição da diretoria de ensino da região central da cidade) perdeu duas aulas de física com o fechamento de uma sala. Ela deveria então tomar duas aulas de outro professor não efetivo, mas esse professor que ela deve tomar as aulas é ela mesma, que atua como professora suplementar na mesma escola na disciplina de matemática. Ou seja, ela perde as aulas como professora efetiva, depois toma as aulas dela mesma, que perde as aulas para ela mesma. E essa confusão vai se estendendo infinitamente em diversas escolas como a Teoria do Caos ou o “efeito borboleta”, que se é apenas uma teoria na física, é um fato comprovado na educação estadual paulista.

Fica claro que essa é uma medida para prejudicar e dividir ainda mais a categoria depois que ela “se atreveu” a mostrar sua força e combatividade em mais de 90 dias de greve. Por isso, é de grande importância a unidade entre professores(as) dentro da sala dos professores e em torno do sindicato, com medidas judiciais contra o fechamento das salas para vencermos coletivamente o (des)governador Alckmin.

Lucas Marcelino, São Paulo

O dinheiro que corrompe todas as coisas

O texto abaixo foi escrito pelo professor Christian Dunker* e originalmente publicado no site da revista Fórum (www.revistaforum.com.br):

“Daí que até hoje muitos pensem que segurança e proteção sejam bens que podemos comprar com o dinheiro e não sentimentos que precisam ser socialmente construídos e partilhados. Este retrato conjugal foi descrito por Freud, no longínquo ano de 1911, como um projeto necessariamente fadado à degradação. O homem vê sua linda princesa transformar-se em um dragão de ressentimento, retorna então para a mesa do bar, onde encontrará consolo semelhante ao que a esposa busca no amor das crianças. Quando questionado em sua virilidade ou parca contribuição para a vida doméstica responderá com violência. Sua parte está feita.”

Christian Dunker
Christian Dunker

Durante muito tempo a divisão social do trabalho impôs uma diferença marcante no Brasil. Enquanto nas classes altas o homem devia trabalhar e a mulher tomar conta da casa, entre os pobres, ambos trabalhavam, inclusive crianças, e o quanto antes. Estabeleceu-se então uma conhecida relação conjugal baseada na tutela, que deu cor e forma à servidão feminina. A equação doméstica, assim configurada, prescrevia uma espécie de contabilidade infinita baseada no fato de que dinheiro é poder. Um tipo e poder que compra outros poderes. Diante desta forma de poder erguia-se uma resistência espontânea, como que um último reduto defensivo, uma estratégia sem estrategista: o sexo. A obrigação do homem, trazer dinheiro para casa, contrapunha-se à resistência feminina, que desde então será condenada quando parecer “fácil demais”. Pai protetor e a mãe nutriz são as figuras freudianas desta troca, pela qual entregávamos a autonomia em troca de proteção. Recobrindo esta troca hobbesiana surge a moral do amor infinito, que veio a estabelecer que quem ama perde, logo, quem ama mais perde mais. Sacrifício, inequidade devocional e vulnerabilidade tornaram-se assim a gramática compulsória do amor que uma mulher deve praticar. Daí que até hoje muitos pensem que segurança e proteção sejam bens que podemos comprar como dinheiro e não sentimentos que precisam ser socialmente construídos e partilhados. Este retrato conjugal foi descrito por Freud, no longínquo ano de 1911, como um projeto necessariamente fadado à degradação. O homem vê sua linda princesa transformar-se em um dragão de ressentimento, retorna então para a mesa do bar, onde encontrará consolo semelhante ao que a esposa busca no amor das crianças. Quando questionado em sua virilidade ou parca contribuição para a vida doméstica responderá com violência. Sua parte está feita. Em casos específicos lhe parecerá natural que a mãe de seus filhos permaneça pura como uma santa enquanto ele faz valer o valor do dinheiro nos prostíbulos, formais ou informais. Dependente, tiranizada e espoliada por seu marido, não lhe ocorreria outra coisa à mulher senão transmitir o legado da lei do mais forte aos seus filhos … e filhas.

Muitos dirão que este retrato do laço conjugal ficou para trás. Outros tantos nos lembrarão de que ele se aplica com muita dificuldade ao casamento homoafetivo, às famílias monoparentais e às combinações crescentes entre filhos, enteados, madrastas, sem falar na típica família brasileira formada pela mãe e seus filhos. Uma posição lúcida perguntará afinal por quê precisamos de um conceito de família dotado de valência normativa? Já no século XVIII Kant descreveu o casamento como um contrato paradoxal, que inverte e combina a noção de justiça que usamos para regular a relação entre pessoas e o direito que estabelecemos acerca do bom uso das coisas. Neste regime o corpo do outro é tratado como uma quase-coisa. É assim também que os bens são tematizados para efeito de herança: como quase-pessoas.

Picketti mostrou, aparentemente de modo irretorquível, e contra os estatísticos americanos, que a herança é mais forte que o trabalho. Este efeito quase-pessoa do casamento é a fonte de um desequilíbrio que já em 2016 levará os 1% mais ricos do mundo a deter mais dinheiro do que os outros 99% somados1. Poderia-se imaginar que este 1% é majoritariamente dinheiro masculino, que tende a se distribuir mais equitativamente, na medida em novas mulheres ricas se somam às antigas mulheres pobres trabalhadoras. Mas, pelo menos no Brasil, isto não é verdade. Uma série de estudos está tentando entender porque a participação de mulheres em cargos de direção e poder cresce, mas cresce só até certo ponto, depois disso tende a se estabilizar, deixando, por exemplo, em cargos altíssimos, como os boards decisórios de grandes empresas uma proporção não compreensível de homens2. Em cargos gerenciais há um dilema importante relativo à compatibilidade entre trabalho e casamento, particularmente quando estão envolvidas viagens e jornadas mais extensas de trabalho. Isso poderia ser ajustado por meio de legislação protetiva ou de ações afirmativas, mas o problema parece ser mais insidioso e toca às raízes do retrato que apresentei anteriormente, a saber, o papel corruptor do dinheiro nas relações humanas.

Freud fez uma de suas observações clínicas mais precisas de modo quase lateral em um de seus artigos sobre a técnica da psicanálise: a forma como alguém lida com dinheiro é a forma como ele lida com a sexualidade. Uma profecia clínica ainda em vigor, para o bem e para o mal. Isso é óbvio para atitudes mais óbvias como generosidade ou avareza, controle ou dissipação. Aliás, em muitas línguas, as próprias palavras que usamos para designar aspectos da sexualidade, são derivações metafóricas ou eufêmicas do vocabulário econômico: Comertz (comércio), em alemão se diz para a troca sexual, o mesmo para intercourse em inglês e também o nosso prosaico transar, que alude a transação.

Lembremos agora que o retrato maldito, que nos surge hoje quase como anti-modelo do laço conjugal desejável, formou-se na matriz romântica que evoluiu ao longo do século XIX, determinando nosso entendimento clássico do casamento (que é bem mais recente e classe-específico do que poderíamos imaginar) como uma solução para duas séries divergentes: o desejo e o amor. Notemos também como o dinheiro aparecia como vilão exterior, que não devia ter nenhuma relação com a lógica de nossa escolha amorosa, aliás, sua interveniência, ainda que indireta, era suficiente para colocar em dúvida a pureza e a autenticidade da escolha amorosa. Formou-se assim uma espécie de aliança entre o laço conjugal e a antiga teologia religiosa que afirmava, insistentemente, o caráter corruptor ou salvacionista do dinheiro, seja ele de fonte impura do desejo em forma de cobiça (catolicismo) ou fruto do merecimento pelo amor ao trabalho (protestantismo). Ou seja, o mesmo discurso que amaldiçoava o dinheiro reprimia o sexo, o mesmo discurso que santificava o amor materno, privava a mulher do dinheiro.

Um grande desafio para os clínicos de hoje é uma espécie de epidemia de casamentos desfeitos, simplesmente porque não parece possível que um homem sobreviva a uma mulher que ganhe mais que ele ou que o sustente. Aparentemente nossa cultura não conseguiu criar dispositivos simbólicos capazes de nos fazer admirar um homem que não se coloque como autônomo ou que se apresente como dependente de uma mulher. Este homem, ainda que pouco viril ou menos macho, não pode prescindir de seu falo cifrado. Esta mesma cultura, tantas vezes descrita como hedonista e destituída de opressão sexual, também não parece permitir que uma mulher suporte ser amada, pelo e com o seu dinheiro. Para ela, ele ainda não é um afrodisíaco.

As variações deste problema atingem casais homossexuais, famílias estendidas e quase todas as outras modalidades de união, comunhão ou vida comum. Ao que parece não estamos em uma situação em que a história nos teria ensinado que há uma forma feminina (ou pelo menos não masculina) de lidar com o poder e o dinheiro de tal maneira que a injustiça e a inequidade seriam mitigadas por uma espécie de saber acumulado pela experiência histórica. Sem isso a inversão entre opressores e oprimidos parecerá como única solução. Sem isso a obsessão pela procura da vítima perfeita, como anti-modelo, nos afundará em uma espécie de lei social do masoquismo. O ressentimento social, neste caso expresso como ressentimento de gênero, parece impor sua força apesar das exceções e das disposições em contrário. Se o lado quase-pessoas do casamento parece ter ficado visível demais quando pensamos na transmissão e acumulação de patrimônio, ainda poucos e fez quanto aos destinos do lado quase-coisa do laço conjugal. Não basta apelar para uma nova idealização do tipo, o verdadeiro amor supera as diferenças econômicas. Para tratar este problema clínico e social precisamos urgentemente inventar uma nova maneira de experimentar relações de propriedade. Uma maneira na qual o sentimento de propriedade não se reduza à posse, uso e abuso, nem esteja baseado apenas em uma perversão da lógica do contrato.

Em tempos de crise vindoura onde desempregos se avistam, parece profundamente injusto que grandes amores ou sólidas e estáveis uniões se desfaçam pela mera interveniência deste elemento corruptor de todas as coisas, o dinheiro. E quer excluí-lo da equação da vida é quase tão tolo quanto os que quiseram nos impor uma vida sem sexualidade.

*Christian Ingo Lenz Dunker é psicanalista, professor livre-docente do Instituto de Psicologia da USP, analista membro do Fórum Lacaniano e fundador do Laboratório de Teoria Social, Filosofia e Psicanálise da USP. 

1# http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/01/150119_riquezas_mundo_lk
2#Belmonte, R.L.C. (2014) Quotas para mulheres em Conselhos de Administração de empresa, à luz da Teoria Feminista do Direito. Faculdade de Direito da USP.

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Nota da UP sobre a situação política do Rio Grande do Sul

O estado do Rio Grande do Sul atravessa um momento político único. De todo o país, a população olha com curiosidade para entender melhor a situação financeira, política e social que desenrola desde o final do último mês. Crise financeira, parcelamento de salários, política de desresponsabilização por parte do governo de José Ivo Sartori (PMDB), e possibilidade de greve de todo o serviço público do estado, são alguns dos debates que estão sobre a mesa dos lares gaúchos.

Não é novidade pra ninguém que o serviço público estadual não ia ter um tratamento respeitos por parte do atual governador. Quem não lembra que ainda antes da campanha que o elegeu em 2014, ao ser perguntado sobre a luta dos professores estaduais pelo pagamento do piso salarial previsto por lei, Sartori pediu que o magistério fosse atrás do ‘piso’ na Tumelero (uma das maiores lojas de construção do RS)?

Após ser eleito e empossado em 1 de janeiro de 2015 o governador demorou quase 100 dias para apresentar os primeiros projetos à Assembléia Legislativa e logo sucedeu a votação e aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2016 que estabelece entre outras coisas que os gastos do próximo ano não serão maiores do que 3% em relação a 2015 e isso significa, na pratica, o congelamento dos salários dos servidores.

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Como se não bastasse, no fim de julho, o funcionalismo estadual da área de saúde, educação, segurança, administração e demais serviços públicos, receberam a notícia de que teriam os salários atrasados (ou “parcelados” como diz o governo). Receberam então R$ 2150,00 até dia 5, receberiam outros R$ 1 mil no dia 13 e, para os que recebem mais do que isso, o restante no dia 21. A exceção seriam os trabalhadores da Defensoria Pública e regidos pela CLT das Fundações do Direito Privado.

Com essa política, a própria constituição do estado é contrariada, pois o artigo 35 é bastante claro ao colocar que os salários devem ser pagos até o último dia do mês. Ainda mais contrariados ficam os trabalhadores sabendo que Sartori sancionou um reajuste de 46% para ele próprio e de 64% para os seus secretários, ao mesmo tempo em que afirma não ter dinheiro para pagar os salários dos servidores.

Esse foi o estopim que está desencadeando uma grande unidade entre todas as categorias e uma grande mobilização que já paralisou o estado e ocupou as ruas de Porto Alegre no último dia 03 de agosto para denunciar a política nefasta do Palácio Piratini. Essa mobilização continuará acontecendo e culminará com a reunião de dezenas de milhares de trabalhadores no dia 18 de agosto, quando, em Assembleia Unificada no Largo Glênio Peres, poderão aprovar uma Greve Geral.

O atraso do salário está longe de ser a única pauta. O funcionalismo também luta contra o desmonte proposital do estado do Rio Grande do Sul que visa privatizar empresas importantes como a CEEE, o Banrisul, a Corag, a Corsan, bem como enfraquecer serviços como saúde e educação, continuando o desmonte que o governo Britto começou mas não conseguiu terminar. Transformando assim, serviços essenciais em fonte de lucro para as elites e não de bem estar para as camadas populares. Além disso o governo do PMDB prefere continuar pagando a dívida do estado, mesmo que os gaúchos já tenham pago com seu dinheiro, mais de três vezes o valor real dessa dívida, jogando assim a crise e a incompetência do governo nas costas da imensa maioria do povo.

A Unidade Popular pelo Socialismo (UP), novo partido político que está em fase de legalização e que surge em nosso país como alternativa de luta e organização do povo trabalhador por uma vida digna e por serviços públicos, gratuitos e de qualidade, se coloca ao lado dos servidores que estão em luta. Estaremos presentes em todas as mobilizações, paralisações, assembleias e greves, contribuindo com a unidade que está se forjando no fogo da luta contra os atrasos e por melhores salários. Assim como também fortaleceremos a luta contra o desmonte do serviço público arquitetado pelo governo do estado e contra as privatizações.

UNIDADE POPULAR PELO SOCIALISMO – RS

Partidos comunistas proibidos na Ucrânia

Foto 04O governo  golpista ucraniano proibiu, no dia 24 de julho, a atividade dos partidos comunistas do país e a sua participação em eleições. O Partido Comunista da Ucrânia considera a decisão anticonstitucional. A medida, confirmada pelo ministro da Justiça Pavel Petrenko, foi tomada baseada em uma lei aprovada em abril na Rada Suprema (parlamento) de Kiev e que entrou em vigor na sexta-feira passada. A proibição atinge o Partido Comunista da Ucrânia (PCU), o Partido Comunista (renovado) e o Partido Comunista dos Trabalhadores e Camponeses da Ucrânia. O Ministério da Justiça já anunciou que o próximo passo é a ilegalização dos três partidos.

A Rada aprovou ainda outra lei que legaliza todas as organizações políticas e paramilitares que lutaram contra o regime soviético durante a Segunda Guerra Mundial, inclusive as que colaboraram com os ocupantes nazis. “O Estado reconhece que os lutadores pela independência no século XX desempenharam um papel fundamental na restituição do Estado ucraniano, proclamado em 24 de Agosto de 1991”, refere o texto da lei. A legislação, promulgada em maio pelo presidente Petro Poroshenko, prevê ainda a retirada de todos os monumentos erguidos em homenagem a dirigentes soviéticos, incluindo as estátuas de Lenin. As autoridades golpistas pretendem ainda rebatizar todas as ruas, cidades e organizações cujos nomes tenham referências soviéticas.

Segundo o ministro Petrenko, segundado pelo chefe do Conselho de Segurança e Defesa da Ucrânia, Alexander Turchinov, “este é um momento verdadeiramente histórico para o país”.

Para o PCU a proibição é ilegal e põe a nu a verdadeira face das forças pretensamente democráticas que tomaram o poder na Ucrânia. “Isto é corrupção política, imoralidade política. É uma tentativa de estabelecer uma ditadura”, disse o presidente do PC da Ucrânia, Petro Simonenko.

Se analisarmos a situação fica evidente que tudo isto foi feito às pressas e ditado pelo medo. Decisões como estas demonstram que se aproxima o momento do colapso do país, caso esta gente continue no poder. Isto revela a verdadeira face dos que dizem ter ideias democráticas. “O governo proíbe o povo de escolher uma alternativa e proíbe os seus representantes que se opõem às políticas de empobrecimento. Isto é, a população foi privada da liberdade de eleger e de apoiar os ideais de esquerda”, declarou Simonenko ao site Golos.ua.

“O direito constitucional não pode ser anulado por uma ordem do ministro de Justiça”, frisou o dirigente ucraniano. “O Ministério da Justiça proibiu-nos de participar no processo eleitoral, mas o direito constitucional não foi anulado e a ordem do ministro não se sustentará”, sublinhou, garantindo que o PCU “está decidido a participar nas eleições” previstas para 25 de Outubro.

Matéria traduzida do site www.diarioliberdade.org

Bruno Melo, militante da UJR

Aumenta tensão racial nos Estados Unidos

Partido  panteras-negrasA tensão racial nos Estados Unidos sempre foi alta, já faz parte da história do país. Mas, no último ano ela tem se intensificado com o aumento da violência policial contra os negros. Em Ferguson, no Estado do Missouri, a população protestou massivamente depois que um policial branco matou um jovem negro desarmado, em agosto do ano passado. Em Nova Iorque, foi o caso do estrangulamento de Eric Garner, em julho do ano passado, também por um policial branco que depois foi absolvido, o que revoltou a comunidade. Em Ohio, também no ano passado, um menino de 12 anos com uma pistola de brinquedo foi morto por policiais brancos que alegaram legítima defesa. A prisão, no Texas, da militante do movimento “Black Lives Matter” (A Vida dos Negros Importa, em tradução livre), Sandra Bland, que foi imobilizada no chão e algemada por não ter sinalizado adequadamente ao mudar de faixa no trânsito e apareceu morta em sua cela três dias depois sem uma explicação plausível.

O ataque terrorista à igreja afro-americana batista de Birmingham, no Alabama, em 1963, em que o grupo racista Ku Klux Klan explodiu 15 bananas de dinamite na escadaria, matou quatro meninas e feriu outras 22 pessoas, gerou uma onda tão grande de protestos que conseguiu forçar a aprovação, no ano seguinte, da lei federal que criminalizou o racismo e baniu o sistema de segregação que existia no país. Cinquenta e dois anos depois da aprovação da lei, a bandeira dos Estados Confederados, que ainda é um símbolo forte da escravidão e da segregação que ocorria no Sul dos Estados Unidos durante a Guerra Civil Americana, ainda tremulava no Parlamento da cidade de Columbia, na Carolina do Sul, onde ocorreu o assassinato de nove negros por um homem branco, na Igreja Metodista Episcopal de Charleston, no dia 17 de junho. A população saiu às ruas para exigir a retirada da bandeira e outros símbolos que representam o passado escravista. No dia 10 de julho a retirada da bandeira foi aprovada pelo Congresso Estadual e sancionada pela governadora Nikki Haley.

Após a retirada da bandeira, terroristas da organização racista Ku Klux Klan, que proclama a supremacia branca, foram às ruas no sábado (18 de julho) protestar contra a decisão do Parlamento. Durante a marcha mostraram faixas confederadas – algumas chegando a conter a suástica nazista no meio – e proferiram insultos aos negros que passavam pelo lugar. Apesar do aumento do policiamento na região, o conflito se tornou inevitável e foi tão intenso que a governadora do Estado emitiu um comunicado pedindo para as pessoas ficarem em suas casas. Agressões verbais racistas e físicas foram desferidas contra a comunidade negra, que revidou, deixando alguns feridos e pelo menos dois detidos.

 No mesmo dia, no entanto, a população mobilizada pelo Novo Partido dos Panteras Negras, partido que defende a luta revolucionária para a libertação e emancipação do povo negro, e vários negros ligados a movimentos por direitos civis foram às ruas defender o fim do racismo nos EUA. Cerca de 400 pessoas do Novo Partido Panteras Negras, criado para autodefender e impulsionar uma luta revolucionária para libertação e emancipação dos negros, inspirado no antigo Partido dos Panteras Negras, marcharam nas ruas uniformizados e carregando bandeiras do movimento e proferiram sua palavra de ordem: “Pela auto-organização popular e individual, para a autodefesa e para uma luta revolucionária de caráter político, econômico e social autônomo! Todo poder ao povo!”.

Andrea Moura, Pernambuco.

Espetáculo Resgata História de Lampião

Foto 03 Entre os dias 22 e 26 de Julho ocorreu a 4ª temporada do espetáculo “O Massacre de Angico- A Morte de Lampião”. O texto é escrito por Anildomá Willans de Souza¹ e é dirigido pelo ator e diretor pernambucano José Pimentel², e já é considerado o maior espetáculo ao ar livre do sertão nordestino, além de ser gratuito. O texto resgata a história de Virgulino Ferreira, o Lampião, sua trajetória, paixão e morte em julho de 1938 em Angico, Sergipe. A Verdade entrevistou Karl Marx, ator, produtor cultural e filho do autor do texto e interpreta Lampião no espetáculo.

 A Verdade- “O Massacre de Angico” já é o maior espetáculo ao ar livro do sertão nordestino, qual a importância do espetáculo para a região?

Karl Marx- O espetáculo tem uma importância muito grande, tanto aqui em Serra Talhada quanto pra região, por abordar a vida de Lampião, que é um personagem muito marcante, que gera muita polêmica e por ser um personagem que retrata nossa história.

A Verdade- Essa polêmica ainda é muito recente aqui na região. Fale um pouco mais sobre ela.

Karl Marx- Quando a gente fala na história do cangaço, também estamos falando de personagens que foram nossos avós, bisavós, uma história muito recente e, de certa forma, uma ferida ainda aberta e que gera muita polêmica. Muita coisa contraditória até. Lampião é um personagem que representa muito para a imagem do nordeste. Quando se pensa no nordeste a gente logo imagina um chapéu de couro, a primeira imagem que vem é um chapéu de cangaceiro, e isso se deve a história de Lampião, a história do cangaço. O espetáculo representa isso tudo. Ele marca um capítulo importante na história do nordeste.

A Verdade- A proposta do espetáculo é muito ousada, ainda mais por ser ao ar livre. Como foi pensado em apresentar essa história para um grande público nesse projeto de espetáculo ao ar livre?

Karl Marx- A nossa proposta de encenação é diferente, até porque a gente tenta humanizar Lampião e isso é uma coisa pouco explorada no cinema, teatro, televisão. Sempre que se fala no cangaço se fala de uma maneira muito caricata. É sempre aquela coisa, explorando o imaginário. No espetáculo buscamos justamente o contrário, o oposto: humanizar o personagem Lampião, mostrar a figura humana, mostrar como o sertanejo, o homem, o cidadão Virgulino se tornou Lampião e, depois, essa figura lendária, que extrapolou o estereótipo de ser bandido ou herói. Ele foi além disso.

 A Verdade- No livro “Lampião: Nem Herói nem Bandido: A História” traz essa discussão acerca do mito feito em torno do cangaço enquanto movimento histórico e de Virgulino em um processo histórico. Ainda hoje há esse debate se Lampião foi bandido ou herói. O que você pensa quando diz que ele foi além disso?

Karl Marx- Ele se tornou uma figura lendária. Uma referência para os movimentos culturais, para os movimentos sociais; até os movimentos de esquerda acabaram tendo nele uma referência. Isso mostra a força da história. A força do personagem que foi, por inteiro, um líder, um exemplo de luta. Afinal, ele enfrentou a classe dominante de sua época, organizou um grupo de homens para combater o coronelismo, combater o governo e, mesmo que ele não tenha tido uma ideologia política formada, ele tinha a capacidade de luta, de liderança, e isso sem dúvida ajudou a transformar o nordeste e até hoje ajuda a construir coisas boas e melhores para nossa sociedade.

A Verdade- Mais a pergunta não cala: “Bandido ou Herói?”.

Karl Marx- Ele era bandido. Existia uma lei que dizia que ele era bandido. Mas, no ponto de vista das pessoas daquela época do Cangaço, das pessoas que conviveram com ele não o viam como um bandido. Tinha uma lei que apontava isso. Mas as ações dele, as ações dos cangaceiros não tinham como propósito fazer o mal. Outro dia eu estava vendo um depoimento de J. Borges, dizendo que Lampião foi o maior herói do sertão, que os políticos, o povo que estão no poder não reconhecem isso, mas ele foi, sim, o maior herói do sertão. A gente defende que, essa coisa de dizer que ele foi herói ou bandido, é o mínimo dos fatores. Quando Anildomá diz que “Lampião não é herói nem bandido, é história”, é uma forma de dizer que ele representa para a história do nordeste muito além dessa discussão. Que ele foi bandido, isso sempre vão dizer. Existe uma lei que diz que ele é bandido. Agora, o sentimento do povo e o envolvimento que a população tem em ter Lampião como referência, em querer ver espetáculos sobre ele, ver filmes sobre ele é, pra mim, o referendo de que ele é um herói pro povo. Essa é uma opinião muito pessoal minha, e quanto mais estudo, pesquiso, vejo a história dele, fico convicto disso: para o povo ele é um herói.

A Verdade- É uma proposta do espetáculo trazer essa reflexão sobre essa história recente do sertão nordestino?

Karl Marx- Nós precisamos devolver aos brasileiros os seus heróis. E Lampião, pra mim, é um desses injustiçados, assim como Conselheiro, Lamarca, Garibaldi e tantos outros que a gente tem aqui no Brasil, que lutaram pelo nosso povo, como Frei Caneca, que lutaram, brigaram pelo nosso povo e que, no final das contas, a história oficial vem e diz apenas que foram bandidos. Não reconhecem que o cara lutou. A história do nordeste se divide entre antes e depois de Lampião. O próprio sertão se modificou com Lampião. Foi a luta dos cangaceiros que chamou a atenção das autoridades e governantes para as necessidades de desenvolvimento, estradas, energia elétrica. . . Essas coisas não vinham pra cá até então.

A Verdade- Ou seja: um olhar sobre o cangaço como movimento social e histórico?

Karl Marx- Com o surgimento do cangaço os sertanejos, agricultores, vaqueiros, homens do campo que se sentiram injustiçados, que não encontravam um meio de vida, soltavam o cabo da enxada para pegar em rifles, iam pras veredas do cangaço brigar. E isso que chamou a atenção do governo, trouxe a necessidade que havia na região. Isso não tem como se contestar. Isso é história. Escrita com sangue? Sim. Mas qual foi a história da humanidade que não foi escrita com sangue? Veja a história de Roma; e hoje todo mundo tem que estudar, aprender, admirar. . . A história também é escrita a sangue. Aqui não foi diferente.

A Verdade- Como tem sido a recepção do espetáculo?

Karl Marx- A produção ainda sofre por ser do interior, por incrível que pareça. Quando a imprensa vem aqui das capitais, não dá a atenção que deveria dar, e até desprestigia um pouco. Mas quando vem e olham o tamanho da produção ficam admirados. Detalhe: é um trabalho feito com mão de obra local. O espetáculo é produto da luta do movimento desenvolvido pelos “Cabras de Lampião”, aqui em Serra Talhada. Um trabalho feito há mais de 18 anos, um trabalho de resistência, de militância com o movimento cultural e que também tem um trabalho social com crianças, com aulas de dança, teatro, música. . . O grupo já se apresentou em todas as regiões do Brasil, inclusive fora do país. Conquistamos o Museu do Cangaço depois de ocupar o prédio que vivia abandonado. O espetáculo é um sonho de mais de 30 anos que hoje se tornou uma realidade.

 Cloves Silva, estudante de Letras da UFRPE/ MLC-PE

  ¹ Anildomá Willans de Souza é pesquisador do Cangaço e autor de quatro livros sobre o tema: “Lampião, O Comandante das Caatingas”, “Nas Pegadas de Lampião”, “Lampião: Nem Herói nem Bandido: A História” e “Xaxado: Dança de Guerra dos Cangaceiros”;

² José Pimentel: ator e diretor pernambucano. Dirigiu entre outros a Paixão de Cristo do Recife e A Batalha dos Guararapes.

Saiba mais sobre o espetáculo:

Vídeo do espetáculo completo (https://www.youtube.com/watch?v=rX0M4UEsTCE)

Site da fundação Cabras de Lampião (http://cabrasdelampiao.com.br/)

 

O covarde massacre de Hiroshima e Nagasaki

hiroshimaA rendição não tardaria. O Japão, único país do tripé nazifascista a resistir, não aguentaria por muito tempo. O fascismo italiano já havia sido nocauteado, mais pela luta popular (foram os guerrilheiros partisans que prenderam e executaram Mussolini), que por intervenção externa. A Alemanha assinara a rendição a 8 de maio de 1945, após a tomada de Berlim pelo Exército Vermelho Soviético (leia A Verdade, nº 172). A União Soviética declarara guerra ao Japão, fato que pesou mais que qualquer outro para a rendição japonesa, como afirmaram explicitamente historiadores e membros do governo na época.

Na verdade, o lançamento das bombas atômicas sobre as cidades interioranas de Hiroshima e Nagasaki não tem justificativa do ponto de vista estratégico. Seu objetivo foi apenas impedir que a União Soviética, a principal vítima da Segunda Guerra, com 20 milhões de mortos, e a responsável pela derrocada da Alemanha, o fosse também pela rendição japonesa.

Na verdade, para conter a hegemonia do comunismo no mundo, os Estados Unidos, sem consultar nenhum dos países aliados, praticaram, há exatos 70 anos, o maior atentado terrorista da História da Humanidade, e demonstrou que se equiparava ao monstro nazista agonizante em termos de desprezo pelo povo, pela vida.

O massacre covarde 

Os habitantes de Hiroshima (350 mil) sofriam as consequências da guerra, naturalmente, mas não tinham sofrido nenhum ataque. Nem esperavam por aquele. Às 8 horas da manhã, viviam a rotina das primeiras horas do dia 6 de agosto de 1945. De repente, uma explosão violenta, uma claridade ofuscante e uma nuvem imensa, em forma de cogumelo, transformam tudo num inferno. Crianças, idosos, mulheres, homens, sem distinção, são atingidos pelas ondas radioativas das mais diferentes formas. Difícil contar, mas cerca de um terço da população morre de imediato. Quem sobrevive, implora para morrer, pois a situação, as dores são insuportáveis. “Pensem nas crianças mudas, telepáticas/pensem nas mulheres rotas, alteradas…”. Poucos sobrevivem. Um desses, Sumie Karamoto, que tinha 16 anos, relata:

Houve um estrondo, uma explosão reverberante e, no mesmo instante, um clarão de luz amarelo-alaranjado entrou pelo vidro do telhado. Ficou tudo tão escuro como noite. Um golpe de vento atirou-me no ar e a seguir no chão, contra as pedras. A dor estava apenas brotando quando o prédio começou a ruir em torno de mim… Aos poucos, o ar se aclarou e eu consegui sair dos destroços. No caminho para um dos centros de emergência vi muita confusão. As ruas estavam tão quentes que queimavam meus pés. Casas ardiam, os trilhos de bonde irradiavam uma luz sinistra e no local de um templo pessoas se amontoavam. Algumas respiravam, a maioria estava imóvel. No pronto-socorro chegava gente correndo, as roupas rasgadas, chorando, gritando. Alguns tinham o rosto ensanguentado e inchado, outros tinham a pele queimada caindo aos frangalhos de seus braços e pernas. Em um bonde vi fileiras de esqueletos brancos. Havia também os ossos de pessoas que tentaram fugir. Hiroshima tinha se tornado num verdadeiro inferno.”

O mundo emudece. Mas não bastava; um espetáculo apenas de horror não foi suficiente para satisfazer a sanha assassina da nova besta imperialista. Nagasaki (266 mil moradores) era uma cidade industrial, portanto, com maioria da população operária. Já havia sofrido alguns bombardeios com resultados ínfimos diante do que estava para acontecer no dia 9 de agosto, quando é lançado sobre a cidade, perto do meio dia, o mesmo artefato que destruíra Hiroshima. E o inferno se repete. “Senhor Deus dos desgraçados, dizei-me vós, Senhor Deus, se é mentira, se é verdade, tanto horror perante os céus”, teria repetido o nosso poeta-maior da liberdade, Castro Alves.

Setenta anos depois, a “rosa radioativa, estúpida e inválida” continua fazendo vítimas, descendentes dos sobreviventes, que sofreram mutações genéticas, provocando doenças como câncer e leucemia. Os memoriais nas duas cidades atualizam anualmente o número de vítimas até os dias atuais, registrando, em 2014, 260 mil em Hiroshima e 160 mil em Nagasaki.

 

Como será a Terceira Guerra Mundial?

 

Deprimido, com certo remorso por ter ajudado a criar a bomba atômica, o grande cientista Albert Einstein afirmou, dias depois dos atentados: “Não sei com que armas se fará a terceira guerra mundial, mas a quarta será com paus e pedras”.

É que ele previa a evolução da “Little Boy” (nome com o qual cinicamente foi batizada a primeira bomba). O seu poder de destruição é café-pequeno ante as modernas bombas nucleares que compõem o arsenal das superpotências capitalistas (Estados Unidos, Rússia, China) e dos aliados dos EUA: França, Índia, Paquistão e Israel.

O aprofundamento da crise do capitalismo acirra a disputa de mercado entre as potências capitalistas, como aconteceu no século 20. Portanto, a possibilidade de uma Terceira Guerra Mundial não é algo improvável (segundo o papa Francisco, ela já começou). Hoje, o arsenal existente é capaz de destruir, em poucos dias, toda a Humanidade e extinguir a vida sobre a Terra.

Portanto, ou a Humanidade destrói o capitalismo ou o capitalismo destruirá a Humanidade. Este é o desafio do nosso tempo e, por isso, como alertou o poetinha Vinícius de Moraes, “Não se esqueça da rosa de Hiroshima, a rosa hereditária, a rosa com cirrose, a antirrosa atômica, sem cor, sem perfume, sem rosa, sem nada…”.

(José Levino é historiador)

19º Seminário de Quito – As lutas interimperialistas e as tarefas dos povos

Com a presença de organizações da Europa, Ásia, Canadá e Estados Unidos, além de dezenas de organizações da América Latina e Caribe, aconteceu de 27 a 31 de julho, em Quito, Equador, o 19º Seminário Internacional Problemas da Revolução na América Latina, sob o tema das “Lutas interimperialistas e as tarefas dos povos”.

A Declaração Final denuncia o nível de exploração e submissão que vivem os países da região, a disputa dos governos imperialistas e suas multinacionais pela partilha das nossas riquezas, pela exploração da força de trabalho e do conhecimento aqui acumulados e como tudo isso leva a lutas intestinas entre esses países.

Ao mesmo tempo, a Declaração afirma o crescimento da resistência e luta dos trabalhadores e dos povos latino-americanos na busca de uma alternativa de mudança popular e revolucionária, longe das tentativas oportunistas dos variados setores do capital financeiro de envolvê-los em seus “contos da carochinha”.

Declaração Final

19º Seminário Internacional Problemas da Revolução na América Latina

As lutas interimperialistas e as tarefas dos povos

O mundo de hoje continua sua marcha consumido em meio de agudas e insolúveis contradições, localizadas em posições distintas e opostas, de quem aspira manter o status quo devido aos enormes benefícios que este lhes outorga, e de quem luta para que as coisas mudem – de maneira total e definitiva – em benefício dos trabalhadores e dos povos.

A riqueza que o planeta encerra e as incalculáveis utilidades que seu aproveitamento e exploração produzem com o trabalho e o conhecimento desenvolvido pela humanidade, provocam que aqueles que se apropriam delas mantenham permanentes disputas e conflitos para ser os principais beneficiários em sua partilha. Assim se explicam as lutas, os conflitos políticos e até bélicos que enfrentam os Estados imperialistas, por trás dos quais tentam alinhar todos os países e povos do mundo. As guerras no Oriente Médio (Síria, Irã, Iraque, Palestina), Europa Oriental (Ucrânia), Ásia (Iêmen, Paquistão, Afeganistão), África (Sudão do Sul, Nigéria, República Democrática do Congo) são manifestações das contradições interimperialistas ou agressões imperialistas.

Ao mesmo tempo, e contra o domínio imperialista e sua partilha de zonas de influência, desenvolve-se a luta dos trabalhadores e dos povos que resistem a continuar na condição de vítimas do sistema capitalista-imperialista que os explora e os oprime através dos mais diversos mecanismos. Assim vemos também um mundo no qual as contradições entre os donos do capital e os que unicamente possuem a força de trabalho se aguçam, tomando forma nos transcendentes combates que desenvolvem os trabalhadores da cidade e do campo, os camponeses, a juventude, os povos originários, os povos negros, as mulheres em cada um de nossos países.

Nosso continente expressa de maneira viva e clara estes fenômenos. Nele se trava uma guerra surda entre os donos do capital financeiro, que tecem suas redes sobre nossos países para crescer seus dividendos. Capitais americanos, chineses, alemães, japoneses, russos, ingleses, franceses, canadenses e de outras potências percorrem a geografia americana para se valer de nossas riquezas naturais e explorar a força de trabalho de seus homens, mulheres, jovens e até crianças.

A hegemonia que durante as últimas décadas detêm os capitais ianques na região sente o peso do acelerado crescimento dos investimentos chineses, que tiveram e têm como principais aliados para sua presença os governos denominados progressistas; os monopólios agrupados na União Europeia participam desta lide promovendo, principalmente, a assinatura de Tratados de Livre Comércio.

Aqueles que enaltecem esses investimentos chineses o fazem em nome de uma suposta política soberana e antiestadunidense, mas em realidade estão provocando um processo de renegociação da dependência, mas de nenhuma maneira rompem as redes do controle externo. O capital financeiro por sua natureza é espoliador: não existe capital financeiro que chegue para garantir o desenvolvimento, o bem-estar, e menos ainda para libertar os povos.

O sistema capitalista-imperialista é um só e seu domínio cobre todo o planeta, o que não impede que uma ou outra potência adote políticas específicas em função de seus interesses: estabelecem acordos, alianças, constituem blocos; em uns lados se coligam e em outros, entre eles mesmos, se confrontam; fenômenos que as organizações políticas revolucionárias devem ter presente e entendê-los para o impulso de nossa atividade e luta.

Anos, décadas de história, confirmam que o domínio total do capital traz consigo exploração, opressão, discriminação, destruição da natureza. A libertação dos povos exige necessariamente acabar com a dominação imperialista, liquidar o poder dos donos do capital. Combater o imperialismo, seja da cor que for, os representantes e lacaios de seus interesses econômicos e políticos em cada um dos países, as classes dominantes nativas, são tarefas simultâneas que andam de mãos dadas, indispensáveis para o triunfo da revolução e da luta pelo socialismo.

Entendemos a necessidade inevitável de desenvolver a consciência anti-imperialista dos trabalhadores, da juventude e dos povos em geral, de maneira que essas bandeiras estejam presentes em todos e cada um de seus combates.  Assim, nas ações, irá se forjando uma frente anti-imperialista de caráter internacional, indispensável para o triunfo da revolução social em cada um dos países e em nível mundial.

Os desafios que os revolucionários da América Latina e do mundo enfrentam no caminho para conquistar uma sociedade de liberdade, em que os trabalhadores da cidade e do campo sejam os donos e protagonistas de seu próprio destino, expõe-nos também a necessidade de trabalhar pela unidade local e internacional dos povos e pela unidade das organizações políticas e sociais que lutam pelos mesmos objetivos.

Expressamos nossa solidariedade com os trabalhadores, os camponeses, a juventude, as mulheres, enfim… com quem luta por seus direitos, pelo pão, por justiça, por liberdade. Particularmente, expressamos nossa solidariedade com a luta anti-imperialista do povo curdo contra o Estado Islâmico fascista; e assim como também com a resistência do povo palestino.

Somos revolucionários, anti-imperialistas, antifascistas; somos lutadores consequentes contra o domínio dos donos do capital e estamos nas lutas dos povos que se puseram de pé para libertar a humanidade.

Quito, 31 de julho 2015

Partido Marxista Leninista da Alemanha, MLPD

Partido Comunista Revolucionário, PCR, Argentina

Partido Comunista Revolucionário, PCR, Brasil

Unidade Popular pelo Socialismo, UP, Brasil

Movimento Luta de Classes, MLC, Brasil

União da Juventude Rebelião, UJR, Brasil

Reconstrução Comunista, Canadá

Partido Comunista da Colômbia (marxista-leninista) PCdeC (ml)

Partido dos Comunistas dos Estados Unidos

Sindicato de Trabalhadores Independentes de Ofícios Vários, STINOVES, El Salvador

Juventude Revolucionária do Equador, JRE

Frente Popular, Equador

Mulheres pela Mudança, Equador

Partido Comunista Marxista-Leninista do Equador, PCMLE

Frente Popular Revolucionário, México

Partido Comunista do México (marxista-leninista) PCM(ml)

Partido Comunista Peruano (marxista-leninista), PCP(ml)

Frente Democrático Popular do Peru, FEDEP

União da Juventude Estudantil do Peru, UJE

Partido Marxista Leninista do Peru

Coordenadora Caribenha e Latino-americana de Porto Rico

Partido Comunista do Trabalho da República Dominicana, PCT

Partido Comunista (bolchevique) da Rússia

Partido Comunista (bolchevique) da Ucrânia

Frente de Participação Estudantil “Susana Pintos”, Uruguai

Movimento Gayones, Venezuela

Partido Comunista Marxista-Leninista da Venezuela, PCMLV