UM JORNAL DOS TRABALHADORES NA LUTA PELO SOCIALISMO

quinta-feira, 25 de abril de 2024

O Marxismo e a Mulher: Programa de Formação na Quarentena

O MARXISMO E A MULHER – No Brasil, as mulheres trabalhadoras tem um papel decisivo na luta pela revolução socialista, assim como em qualquer parte do mundo e em qualquer momento da história. (Foto: Jady Oliveira/Jornal A Verdade)
Redação do Piauí e Claudiane Lopes
Jornal A Verdade

O Jornal A Verdade, na programação de formação na quarentena, decidiu abordar o tema “Marxismo e a Mulher”, assunto que nos últimos anos vem ganhando força devido o avanço do movimento de mulheres no mundo. Uma das acusações mais comuns contra o marxismo é que, como teoria, ele se preocupa com a “classe” em detrimento do gênero. Desde o princípio, é importante ressaltar que as obras de Marx inseriram, entre os socialistas e na sociedade burguesa, o entendimento sobre a exploração capitalista e outras formas de opressões que a classe trabalhadora vivia na época. Suas análises contribuíram para a formulação de uma perspectiva nova, que não apenas condenava moralmente a subordinação social das mulheres, mas procurava explicar suas razões a partir das relações sociais historicamente construídas.

Dada importância do debate em torno das relações de gênero em uma perspectiva marxista, para uma real contribuição à luta feminista socialista, selecionamos alguns textos e livros do marxismo clássico que retrataram sobre as condições de exploração das mulheres no século 19 e do início do século 20, entre eles, August Bebel e Friedrich Engels. Os demais textos, são de militantes marxistas da mesma época, Clara Zetkin e Alexandra Kollontai que debateram sobre a opressão das mulheres no capitalismo e a participação das comunistas nessa luta.

A estrutura teórica desenvolvida por estes marxistas unia a luta pela libertação das mulheres à luta pelo socialismo. Suas análises foram construídas sob o ponto de vista do materialismo histórico, através de concepções cientificas sobre o mundo. Indicamos ainda duas autoras contemporâneas que apresentam contribuições marxistas nesse campo, Mirla Cisne e Sofia Ruiz. Ambas abordam a importância da união do feminismo com o marxismo, como duas teorias indispensáveis para emancipação feminina na sociedade capitalista – patriarcal e racista.

O texto do alemão August Bebel, “A Mulher no Futuro”, é um dos capítulos de sua principal obra, “A Mulher e o Socialismo”. O lançamento desse livro foi muito importante para o movimento socialista internacional, em especial, para as militantes socialistas da época e para as trabalhadoras. O intuito de Bebel consistia não somente em atrair as mulheres para o partido comunista, mas igualmente difundir os princípios fundamentais do socialismo para as amplas massas trabalhadoras. O autor dividiu sua obra em três partes, contemplando a situação das mulheres no passado as condições das mulheres no presente e a projeção das transformações operadas dentro de uma futura sociedade socialista.

“A mulher será completamente independente, no aspecto econômico e no social, não conhecerá sequer a sombra de domínio ou de exploração. Será livre, igual ao homem e senhora do seu destino. Será educada como ele, salvo nos casos em que é incontestável a diferença de sexos. Vivendo em condições naturais, ela poderá desenvolver as suas forças físicas e intelectuais conforme as suas necessidades; terá toda a liberdade para escolher a esfera de atividade que melhor corresponde aos seus anseios, inclinações e dotes e trabalhará em condições de igualdade com o homem. Uma parte do dia a operária ocupa-se em algo de prático, na outra parte dedica-se à educação dos jovens ou cuida dos enfermos, a terceira parte emprega-a em problemas de arte ou de ciência e, finalmente, no restante tempo cumprirá qualquer função administrativa. Dedica-se à ciência, trabalha, descansa e diverte-se em companhia de outras mulheres ou homens, conforme for seu desejo e sempre que tenha oportunidade.”

O segundo, é o clássico do marxismo “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado”, escrito por Friedrich Engels lançado em 1884. O livro é considerado como um dos primeiros grandes trabalhos que retrata sobre ponto de vista científico o surgimento da opressão da mulher. Foi um livro revolucionário para época, pois explicava que as condições de opressão e de vida das mulheres se modificavam em diferentes sistemas econômicos vividos pela humanidade. Ele utiliza o método do materialismo histórico para analisar a derrocada da família primitiva que era o epicentro da economia de subsistência, ela organizava grupos, ligados por laços de parentesco para garantir a sobrevivência harmoniosa (tanto nas relações do homem com o meio ambiente quanto nas relações intra-humanas).

Essa sociedade primitiva com seu desenvolvimento deu origem a uma sociedade produtora de excedentes, valorizadora do comércio e do acúmulo de riquezas, e assim iniciaram os conflitos distributivos e pela terra; como também a formação do Estado e a constituição de uma sociedade dividida em classes sociais antagônicas. Friedrich Engels desenvolveu em “A origem da família, da propriedade privada e do Estado”, publicado em 1884, que a origem da sujeição das mulheres não estaria nas causas biológicas – capacidade reprodutiva ou constituição física – mas social. Especificamente, no surgimento da propriedade privada, com o surgimento do patriarcado.

MULHER TRABALHADORA – Zetkin considerava essa tarefa a mais primordial das feministas socialistas e teve grande participação na campanha de sindicalização das operárias, parcela que representava mais da metade da mão de obra industrial da Alemanha, sem a qual não se poderia pensar uma nova sociedade. (Foto: Reprodução/Arquivo)

Os fundamentos para um movimento de mulheres socialistas foram, principalmente, formulados pela comunista alemã, Clara Zetkin, (1854-1933) e por isso escolhemos um discurso da comunista alemã Clara Zetkin no congresso do Partido da Social Democracia da Alemanha, em 1896. Com o título “Apenas Junto Com as Mulheres Proletárias o Socialismo Será Vitorioso”, fala sobre a importância de os Partidos Comunistas organizarem as mulheres trabalhadoras, diante do aumento da sua exploração e opressão no sistema capitalista. Ela faz uma reflexão de que a situação de opressão das mulheres era diferente em determinadas classes sociais, e que por isso, a condição de gênero unia as mulheres, porém a condição de classe as separava, justamente para manter os privilégios das mulheres da grande elite. Afirma Clara Zetkin:

“No que diz respeito ao proletariado feminino, foi a necessidade do capitalismo de explorar e buscar incessantemente por uma força de trabalho barata que criou a questão das mulheres. Essa também é a razão pela qual o proletariado feminino se tornou parte do mecanismo da vida econômica de nosso período e foi para as oficinas e para as máquinas. Elas saíram para a vida econômica para ajudar seus maridos na subsistência, mas o sistema capitalista as transformou em competidoras desleais. Elas queriam trazer prosperidade para a família, entretanto, a miséria se estabeleceu. As mulheres proletárias se empregaram porque queriam construir uma vida feliz e prazerosa para seus filhos, entretanto, elas ficaram totalmente separadas deles. Elas se tornaram iguais aos homens como trabalhadores; as máquinas davam as forças necessárias e em qualquer lugar o trabalho das mulheres gerava o mesmo resultado que o dos homens. E como as mulheres constituem uma força de trabalho barata e acima de tudo submissas, tanto que apenas raros casos se colocam contra a exploração do capitalismo, os capitalistas aumentaram as possibilidades de trabalho das mulheres na indústria.”

Outra pioneira sobre o debate da realidade das mulheres no movimento proletário internacional foi Alexandra Kollontai. Líder revolucionária e teórica do marxismo, foi militante do partido bolchevique e participou ativamente da Revolução Russa de 1917.

Eleita membro do Comitê Central no VI Congresso do Partido Comunista (Bolchevique) da URSS, torna-se “Comissária do Povo para Assuntos do Bem-Estar Social”. Ela trabalhou pelos direitos e liberdades das mulheres, modificando aspectos das leis que as subordinavam aos homens, como a negação do direito ao voto e a imposição de piores condições salariais, como também, o direito ao divórcio e ao aborto. Além disso, numerosos benefícios sociais para a maternidade, restaurantes e lavanderias públicas, habitação popular e creches foram conquistas fundamentais para emancipar as mulheres soviéticas.

ALEXANDRA KOLLONTAI – A dirigente bolchevique faz uma crítica dura ao reflexo do capitalismo nas famílias, apontando algumas características desta família constituída numa sociedade burguesa. (Foto: Reprodução/Klimbim)

Selecionamos o seu livro, “A Nova Mulher e a Moral Sexual” que é composto por dois textos. O primeiro, escrito em 1918, apresenta uma crítica à situação da mulher na sociedade burguesa, comprimida por um código moral em que a propriedade privada era prioridade. Já o segundo artigo, de 1921, Kollontai trata da necessidade de uma reorientação no comportamento do homem e da mulher na nova estrutura social que surge a partir da revolução bolchevique.

Apresentamos os dois capítulos do livro que reflete o aprendizado político e as conquistas da revolução na construção das novas relações de classe e gênero. Faz uma análise da situação da mulher na sociedade burguesa, comprimida por um código moral em que a propriedade privada era – e ainda é – para ela prioridade. E, a partir das conquistas da revolução, apresenta a necessidade da reorientação no comportamento do homem e da mulher, participantes da nova estrutura social que a revolução engendrou: um amor-companheiro, com direitos e responsabilidades iguais, com respeito à individualidade, com apoio mútuo.

O segundo texto selecionado de Kollontai, “Comunismo e a Família” foi escrito em 1920, e mostra a nova fisionomia da família no estado socialista, em particular, a nova realidade da mulher soviética. Assim, ela descreve:

“Não existe nenhuma razão para pretender enganar a nós mesmos: a família normal dos tempos passados na qual o homem era tudo e a mulher nada – posto que não tinha vontade própria, nem dinheiro próprio, nem tempo do qual dispor livremente –, este tipo de família sofre modificações dia após dia, e, atualmente é quase uma coisa do passado, do qual não deve nos assustar […] Na Rússia Soviética, a vida da mulher trabalhadora deve estar rodeada das mesmas comodidades, da mesma limpeza, da mesma higiene, da mesma beleza, que até agora constituía o ambiente das mulheres pertencentes às classes abastadas. Em uma sociedade comunista, a mulher trabalhadora não terá que passar suas escassas horas de descanso na cozinha, porque na sociedade comunista existirão restaurantes públicos e cozinhas centrais nas quais todo mundo poderá comer.”

Vale destacar que os marxistas, em todos os tempos, sempre se preocuparam com o tema acima exposto e deram uma interpretação científica, ao afirmarem: “A questão feminina é uma questão social e só com uma profunda transformação na sociedade poderá ser resolvida”. Os estudos sobre as questões de gênero vêm crescendo nas universidades, como também, fruto do próprio movimento feminista que volta a ser uma força política vital e relevante ao mundo. São milhares de artigos acadêmicos, revistas, livros. Nós, do Jornal A Verdade, abordamos mensalmente essa temática.

Indicamos, ainda, o livro “Feminismo e Consciência de Classe no Brasil” de Mirla Cisne, Professora da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte – UERN. Ela aborda o marxismo como uma teoria indispensável à luta feminista, pois ele está ancorado em uma perspectiva materialista, histórica e dialética, tendo como horizonte para sua ação política, a luta pela emancipação das mulheres e da classe trabalhadora. Ela faz um estudo sobre a realidade das condições de classes sobre uma perspectiva de raça, etnia e sexo. A reflexão não tem a intenção de isolar identidades, mas a de analisar a classe trabalhadora como sujeito totalizante, reconhecendo-se diferenças e diversidades sem perder de vista os sujeitos coletivos, ponto comum nas lutas pelo fim das desigualdades sociais. Se utiliza da teoria marxista para contrapor as teorias pós-modernas que fazem esse estudo histórico de forma isolada e desconectada com as condições materiais da humanidade.

“A emancipação feminina acontecerá ao se perceber que […] a mulher necessita de uma ruptura radical com a ideologia de naturalização dos sexos e toda a alienação a ela associada, a começar pela descoberta de si como sujeito, deixando de ser ‘o outro’, de ser apropriada para se autogovernar, ou melhor, para apropriar-se de si. Com isso, a descoberta da força individual das mulheres, torna-se, ao mesmo tempo, força política coletiva, posto que essa apropriação de si, mexe com estruturas sociais como a família, as igrejas, as escolas, instituições jurídicas etc. Há, portanto, o estabelecimento de conflitos e enfrentamentos à medida que a mulher sai da invisibilidade, entra na cena política e se constitui sujeito histórico ou, simplesmente, passa a existir politicamente, tendo voz no lugar do medo.”

Por último, apresentamos um capítulo da revista Unidade e Luta, órgão da Conferência Internacional dos Partidos e Organizações Marxistas (CIPOML), com título “Karl Marx e a Mulher”, escrito por Sofia Ruiz, militante do Partido Comunista da Espanha (Marxista-leninista). No texto, ela faz referência o legado de Karl Marx na análise da opressão da mulher em suas obras, em especial, no livro “O Capital”. A autora aborda sobre o trabalho produtivo (aquele que produz riqueza e está diretamente ligado a extração de mais-valia e a acumulação do capital na sociedade capitalista) e o trabalho reprodutivo é aquele ligado aos serviços ou que estão relacionados à reprodução da força de trabalho, estes fazem parte de duas categorias marxistas de divisão do trabalho que são parte constituintes e necessárias para a continuidade do modo de produção capitalista como uma condição essencial para dinâmica do sistema capitalista.

As feministas marxistas, desde as últimas décadas do século 20, vêm buscando desenvolver uma análise em que exploração de classes e opressão de gênero se combinam numa perspectiva unitária, totalizante, da sociedade capitalista. A expressão “teoria da reprodução social” tem sido a mais empregada para definir esse campo de análise. Contudo, a classe trabalhadora não trabalha somente no seu local de trabalho. Uma mulher trabalhadora também dorme em sua casa, seus filhos jogam no parque público e vão à escola local e, algumas vezes, pedem ajuda a sua mãe aposentada para cozinhar. Em outras palavras, as principais funções que reproduzem a classe trabalhadora ocorrem fora do local de trabalho. Quem entende melhor este processo? O capitalismo. Esta é a razão pela qual o capitalismo ataca brutalmente a reprodução social para ganhar a batalha na produção. Ela reafirma no texto:

“A classe trabalhadora deve lutar na esfera da reprodução. No entanto, só poderá ganhar o poder político contra o sistema na esfera da produção. Algumas das lutas mais importantes na história da classe trabalhadora começaram fora da esfera da produção. As duas revoluções mais importantes do mundo moderno, a francesa e a russa, começaram como revoltas por pão, dirigidas por mulheres.”

Seguindo essa teoria foi criado em 2011, o Movimento de Mulheres Olga Benario. Atualmente existe em 18 estados e através do feminismo-marxista organiza mulheres trabalhadoras da cidade e do campo, jovens, periféricas, negras, LBTs e mulheres com deficiência para lutar pelos seus direitos e pelo socialismo. Você pode conhecer mais, através da “Cartilha do Movimento de Mulheres Olga Benario” e dos contatos nas redes sociais.

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