140 anos: o que Stálin representa para trabalhadores pobres no Brasil hoje?

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O prestígio de Stálin entre a classe trabalhadora cresce, principalmente entre trabalhadores pobres organizados. Esse prestígio ascendente é resultado da capacidade de todo um conjunto de classe de se reconhecer nele enquanto indivíduo marginalizado, oprimido, explorado, roubado e bestializado cultural e economicamente.

Thales Caramante


MEMÓRIA – Stálin foi relembrado e homenageado hoje por diversos trabalhadores no mundo.

SÃO PAULO – Em 21 de dezembro de 1879, nasceu Josef Stálin na cidade de Gori, Geórgia. Ao longo da sua vida, Stálin foi estudante, operário, professor e dirigente da classe operária. Conseguiu pela sua capacidade organizativa, oriunda de sua origem de classe, ser o principal dirigente de vitórias de uma classe que até então não sabia o que era governar em si para si.

Após a Segunda Guerra Mundial, a fama de Stálin ultrapassava a de figuras como Che Guevara e Fidel Castro hoje. Era um prestígio que atingia camponeses, operários e todas as camadas sociais de seu tempo. Stálin foi o líder reconhecido por derrotar o nazismo e libertar o mundo de campos de concentração. Isso possuía – e ainda possui – um significado político altamente representativo para todos aqueles que seriam subjugados pelo nazismo hitlerista. Citando Mauricio Grabois, “falar de Stálin era o mesmo que falar em liberdade, democracia e paz.”

Em 1949, o 70º aniversário de Stálin marcou o mundo inteiro com diversos eventos entre os povos. O Partido Comunista Francês lançou o evento nacional “Longue vie a Staline pour son 70eme Anniversaire e foram relembradas todas as vitórias e feitos do povo soviético sob direção de Stálin. Como se não bastasse, o povo francês ainda produziu um pequeno documentário, “Homme Que Nous Aimons le Plus” (O Homem que Mais Amamos), feito especialmente em homenagem ao “Marechal Stálin”.

HOMENAGEM – Evento histórico do Partido Comunista Francês comemorando o 70º Aniversário de Stálin em Paris.

O Partido Comunista do Brasil, durante a legalidade, passou a lançar anualmente edições especiais dos jornais “A Classe Operária” e “Voz Operária”, relembrando feitos do povo soviético e Stálin, seja na educação ou nos planos quinquenais. Pela primeira vez, lançou o conjunto de Obras Completas de Stálin junto com a campanha “Caderno de Stálin”, um caderno que todo militante deveria possuir para estudar os textos do “campeão da luta pela paz e guia do campo democrático”.

Naquele mesmo período, Diógenes Arruda Câmara escreveu o artigo “Como Festejará Você o Aniversário de Stálin?”, no qual demonstra todos os esforços dos trabalhadores do mundo para homenagear Stálin ou presenteá-lo com cartas, poemas, músicas, simples desenhos e pinturas. 

Porém, não compete ao A Verdade ser o jornal que falará de Stálin para a classe trabalhadora ou que recolherá e divulgará estatísticas sobre a fama de Stálin hoje, mas ser o instrumento que a própria classe trabalhadora utilizará nesta ocasião para que fale sobre si. Que Stálin seja uma inciativa sua, um resultado natural de sua própria consciência de classe.

Assim, A Verdade recolheu com exclusividade diversas declarações de trabalhadores de origem periférica sobre o que o georgiano representa para eles enquanto assalariados, pobres e, alguns, marginalizados; a alguns foi perguntado o que ele representa enquanto comunista. Esse recolhimento de informações não mostrou apenas que há um sentimento proativo de admiração, mas que ele é igual a do passado, mesmo que inconscientemente.

Um operário georgiano, Osman Gurgenizde, que conheceu Stálin antes da tomada do poder, registra que ele falava “sobre coisas próximas ao coração do trabalhador, sobre as razões pelas quais os operários, trabalhando além de suas forças, recebem somente essa ninharia que é suficiente só para não morrer de fome. O camarada Stálin estava perfeitamente conectado com as massas dos operários e conhecia em detalhes a vida da nossa classe. Tudo o que ele explicou, ele intimamente conhecia, com fatos específicos e, por isso, seu discurso foi tão claro para nós.”

Apoiando a afirmação de Gurgenizde de forma inconsciente, Matheus, químico da cidade de Santo André, relembrou como Stálin conseguia “fazer essa transposição didática do trabalho coletivo, da produção social… como ele trouxe isso para o dia a dia das pessoas.”, fazendo uma alusão aos discursos e à simplicidade dos livros do dirigente.

Já Marcelo, trabalhador da SABESP e sindicalista, diz que Stálin foi “o cara que deu condições de acreditar que [o socialismo] é possível, porque conduziu na prática uma revolução social. Não a parte beligerante da revolução, mas a fase das transformações materiais da vida.”

Acrescentando comentários sobre a tomada do poder, Manoel, operário piauiense morador do Jardim Pantanal (zona leste de São Paulo), bairro que tem grandes problemas de infestação de carrapatos e ratos, afirma que Stálin, como proletário, “mostrou que os trabalhadores não só podem governar, como devem. […] Stálin foi um operário, pobre, e chegou [ao poder]. O trabalhador sempre pôde fazer isso.”

Coincidentemente usando as mesmas palavras de Manoel, Queops, morador de um bairro do Tamanduateí (São Paulo), onde há inúmeras casas de madeirite e rua cascalhada, e a ampla maioria do povo é marginalizada pela prefeitura, seja por sua raça ou classe, diz “[Stálin] mostra que a classe trabalhadora, a classe operária pode, e deve, governar o mundo – e governará como ninguém. De que um homem simples, pobre, um homem trabalhador, filho de pessoas pobres, de um pai um tanto quanto comum, alcoólatra, de uma mãe bastante simples, enfim… de profissões bem simples também, de que esse homem vindo dessas condições pode e deve […] ser um dos responsáveis pela verdadeira felicidade coletiva, que será fruto de um mundo governado por essas pessoas simples, por essa classe operária. O Stálin representa, sobretudo, isso para mim.”

Outro morador da zona leste de São Paulo, Gustavo, metroviário, destacou não só a figura de Stálin como um trabalhador que subiu ao poder e liderou a nova sociedade socialista, mas “que quem tem melhor condições de conduzir nosso povo é o nosso próprio povo. Os melhores representantes são aqueles que vieram das partes mais marginalizadas, porque são elas que sabem quais são as reais demandas da grande maioria da população, são essas pessoas que estão mais dispostas a construir uma sociedade nova e estão dispostas até as últimas consequências […] O exemplo que ele nos dá é que você precisa, para ser um revolucionário, é  ser um filho do nosso povo e estar inserido diretamente [nele], entendendo suas demandas, reconhecendo seu linguajar, suas rotinas, suas práticas […] porque é isso que lhe dá autoridade moral para conduzir esse povo à revolução.”

Giulia, aprendiz da ferrovia, de maneira sucinta, pontuou o papel de Stálin na história, não por seus principais feitos políticos, militares e econômicos, mas seu aspecto simbólico: “vejo Stálin como exemplo, como a personificação de que o povo, quando se organiza, é capaz de ser protagonista de sua própria história.”

Da mesma forma, fala Jorge, estamparista no ABC Paulista. Ele diz que Stálin “é uma referência para contrapor a narrativa dominante […] de que quem vai estar no centro da revolução brasileira, de quem vai ditar os caminhos da revolução, serão os intelectuais, os acadêmicos. […] [Stálin] mostra que é possível, como é necessário, que a própria classe operária, aqueles mais fodidos, aqueles que não têm nada, aqueles que são miseráveis, se formem enquanto quadros, estudem, trabalhem, militem e ainda sejam os comandantes da revolução brasileira. Esse é o principal aprendizado.”

No aspecto moral, na superação de velhas concepções e na construção de uma nova ética e moral coletiva socialista soviética, Isis, universitária e bolsista, pauta que “ele é o exemplo que é possível  construir um homem e uma mulher de novo tipo, com valores ligados ao trabalho coletivo, ligados à solidariedade, à defesa do socialismo, do combate à exploração […], e esses homens e mulheres estão entre nós.”

Falando em um aspecto particular à vida das mulheres, Samira, auxiliar administrativa em Mogi das Cruzes, trabalhadora negra, destacou “as fábricas com creche, a preocupação com o povo nos mínimos detalhes.” Para ela, essa política com as mulheres, construída com conjunto de milhares de trabalhadoras “fazia do Stálin uma figura incrível por gerenciar isso junto com o povo.” Não fugindo da educação e do trato sempre carinhoso com as massas, Samira coloca também que “uma das coisas que me faz admirar [Stálin], é a forma como sintetiza teorias tão difíceis e torna elas acessíveis a qualquer pessoa.”

Karen, trabalhadora da cultura, corrobora com Isis e Samira ao opinar que “Stálin foi um homem do povo, exemplo de abnegação, que dedicou sua vida para a libertação da classe trabalhadora. Stálin e a URSS nos mostram que não precisamos nos contentar com o desemprego, baixos salários, falta de moradia digna, não ter o que comer, não ter uma educação de qualidade, falta de saneamento básico.”

Pontuando também a questão moral, Ricardo, metroviário, relembra os tempos da guerra. “Nenhum passo atrás. Acho que essa não rendição me motiva muito. Essa ideia de não se render é uma ideia que fiz dela minha. Às vezes, a gente está com alguma dificuldade, algum problema, alguma derrota… [com essa ideia] eu tenho para mim que eu não vou me render. Então a União Soviética, o povo soviético não se rendeu, o povo vietnamita não se rendeu, nossos heróis não se renderam, então a gente não vai se render. Eu penso em Stálin e penso nisso: não se render e continuar a procurar um caminho nos momentos bons, ruins e nos mais difíceis. Stálin é isso para mim.”

Cabe reforçar que em todas as declarações, os entrevistados buscavam falar na primeira ou terceira pessoa do plural. Obviamente que destacavam seus feitos individuais, mas reforçaram a ideia de que Stálin não era um ser que terminava em si mesmo, um homem isolado de seu coletivo – ele era parte de um contingente interminável de revolucionários e revolucionárias, de operários e operárias que construíram coletivamente o socialismo, sendo Stálin um representante e, não, a totalidade. Stálin era consequência e não a causa.

Edival Nunes Cajá sintetiza com muita clareza. “[Stálin] começa a investigar [as injustiças da sociedade] no campo da sociologia, da história, da economia, conhece o Marxismo e se identifica profundamente. Percebe que Marx conseguiu identificar não apenas a classe que trabalhava e sofria, mas viu nessa classe o sujeito histórico da transformação de toda a humanidade: o proletariado. Uma vez tomada a consciência de classe, poderá transformar objetivamente a história [de toda] a humanidade. Não é uma revolução burguesa, derrotar uma classe para promover outra. […] Pelo contrário, o proletariado derrubará a classe da burguesia, dos ricos, do capital, dono dos bancos, das indústrias, não apenas para instalar a classe operária no poder, mas para acabar com as classes sociais, não é para remendar a sociedade de classes, mas para transformá-la em uma sociedade sem classes. […] Os homens serão todos técnicos e sábios ao mesmo tempo, trabalhando apenas quatro horas por dia – que é necessário para produzir o que necessita e ainda ter o excedente para cuidar das crianças e dos idosos. Assim é a concepção da sociedade comunista. Então, Stálin não foi só um grande militante na clandestinidade, mas também foi um grande estadista com o triunfo da Revolução de Outubro de 1917. Como Ministro das Nacionalidades, ajudou muito a Lênin, a quem coube a tarefa de construir o Estado socialista. E ele prosseguiu, enfrentou a pior crise do sistema capitalista mundial – que foi o nazifascismo, que foi a Segunda Guerra Mundial. Infelizmente perdemos muitos quadros na guerra, milhões de quadros, o que desfalcou bastante o partido e houve toda uma campanha depois da vitória do socialismo, da vitória da União Soviética […] e esta campanha [contra Stálin e a URSS] foi o cavalo de troia do anticomunismo que se vive hoje no mundo. Esta euforia da direita e do anticomunismo não é senão uma consequência de toda uma campanha contra a experiência socialista mais exitosa no mundo que era a União Soviética, […] muitas vezes promovendo o trotskismo. Entretanto, podemos afirmar que há uma nova experiência retomando as lutas por meio da CIPOML [Conferência Internacional de Partidos e Organizações Marxista-leninistas] e em vários países do mundo ressurge uma nova forma de organização dos partidos e organizações marxista-leninistas no sentido de reconstruir a experiência internacionalista e a experiência soviética.”

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Não há conclusão mais óbvia, o aniversário de 140 anos de Stálin demonstrou que ele ainda continua e continuará imortalizado na memória das lutas do proletariado e amplamente conhecido e referenciado entre os trabalhadores organizados, sempre lembrado por sua humildade e sacrifícios pela libertação de toda a humanidade junto aos milhares de operários e operárias dos diversos partidos comunistas no mundo.

Tais declarações mostram, inclusive, que a campanha anticomunista contra a URSS falha, porque amplos materiais, memórias, argumentos, documentos continuam vivos e são lentamente liberados em todos os países para que trabalhadores e trabalhadoras sigam descobrindo a verdade sobre o que foi uma história de produção sua: socialismo, o poder dos explorados.