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domingo, 4 de maio de 2025
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Lia de Itamaracá: “Para chegar aqui, atravessei um mar de fogo”

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  • Nascida Maria Madalena Correia do Nascimento, no dia em 12 de janeiro de 1944, na Ilha de Itamaracá, município da Região Metropolitana de Recife (PE), a cantora, compositora e cirandeira Lia de Itamaracá, recebeu a equipe do jornal A Verdade na Embaixada da Ciranda, para uma manhã de conversa sobre seus mais de 80 anos de vida, sua obra e como ela lutou para fazer de sua arte uma ferramenta de luta. Lia teve que trabalhar desde muito cedo, enfrentar o preconceito antes de ser reconhecida como uma das maiores expressões da música negra brasileira e mundial.

Clóvis Maia e Rafael Freire | Redação


A Verdade – Lia, você começou na música bem cedo. Quais foram seus primeiros passos?

Lia de Itamaracá – Todo o meu sonho era cantar. Sempre achei bonito quem canta, quem dança. E eu dizia: “Jesus, eu quero um dia ser uma cantora, me apresentar no meio de muita gente, cantando pro povo”. Aí eu comecei a me interessar pela música com uns 12 anos de idade. Com 19 anos, eu assumi a responsabilidade de cantar, de compor, de gravar. Aí eu comecei a sair pelo mundo.

Eu venho de uma família de 18 irmãos comigo. Ninguém cantava nem dançava. Minha mãe era empregada doméstica e meu pai era agricultor. Um dia, eles conheceram uma família que viu minha mãe carregando sete filhos. Eles devem ter ficado com pena e ofereceram um emprego pra ela.

Como foi o seu primeiro contato com a ciranda?

Foi no Recife. Eu ia muito ao Pátio de São Pedro. Eu via muito as rodas de ciranda lá. Eu olhava e dizia: “Vou entrar nesse andamento. Vou prestar atenção aqui pra jogar minha linha”. E deu certo. Dizem que a ciranda vem de Portugal, vem da África. Pra mim, a ciranda já existia aqui no Brasil. E eu a consagrei aqui em Itamaracá.

Você foi pioneira em muitas coisas como mulher, negra, cantora, gravando um disco em 1977, em plena ditadura militar. Mas também passou por muitas dificuldades na carreira, como falta de pagamento e a questão do direito autoral sobre o seu maior sucesso. Fala um pouco sobre isso. 

Em 1961 ou 1962, Teca Calazans teve aqui em Itamaracá. Ela já era pesquisadora de música. Ela me ouviu cantar e pediu pra eu cantar pra ela. Seguimos para a praia, eu e ela, e eu solfejei a ciranda “Quem me deu foi Lia”. Então ela me disse: “Lia, essa música é um amor. Vou colocar uma letra nela em sua homenagem”. O tempo passou e depois veio um pessoal do Recife falar da música, e ela disse que nunca teve conhecimento comigo, que nunca me encontrou e disse que essa música era dela.

Aí essa música ficou nessa polêmica grande, que ainda aumentou porque Antônio Baracho, cirandeiro de Abreu e Lima, registrou a música como sendo dele. A coisa pra mim foi difícil, mas eu estou aqui. Eu gravei meu primeiro disco e não ganhei nenhum dinheiro por ele por causa dos direitos autorais. A gente não registrou. Aí eu fazia meus shows aqui e acolá e ainda trabalhando no bar.

Depois que o bar fechou, virei merendeira numa escola. Eu fazia comida para quase 300 crianças. Trabalhar com as crianças pra mim era uma maravilha. Trabalhei lá até me aposentar.

Você se recorda da primeira grande viagem, do primeiro grande show que fez lá fora?

A minha primeira grande viagem que foi para o Rio de Janeiro. Antes, teve o Abril Pro Rock, em 1998, em Recife. Eu gravei esse primeiro disco em 1977, “A Rainha da Ciranda”, depois veio o primeiro CD “Eu Sou Lia” (2000), “Ciranda de Ritmos” (2008) e “Ciranda Sem Fim” (2019). E teve também os filmes, né?! “Sangue Azul”,Recife Frio”, “Bacurau”.

Suas letras falam do cotidiano da gente, a relação com o mar e com a natureza, reforçando a ciranda como uma arte coletiva. Como é o seu processo de criação?

A ciranda não tem preconceito. Ela abraça o branco, o preto, todo mundo. Ela abraça todo mundo. De adulto às crianças, principalmente as crianças. Isso que é bom. A gente ouve muito falar de racismo hoje em dia. A ciranda acaba com isso tudo. Minhas músicas são escritas na areia da praia. Eu sou filha de Iemanjá. Eu sento na beira da praia, escrevo a música, a onda vem e apaga. Eu vou e escrevo de novo. A onda vem e apaga. Eu acendo novamente. Quando a onda vem de novo, a música tá pronta. Eu tenho contato com Janaína, a mamãe Oxum, Iemanjá. Eu sou católica, mas não vejo nenhum problema com religião nenhuma. Respeito e me dou bem com tudinho. E isso vem da ciranda. Abraçar todo mundo sem preconceito. Eu tenho um talento que Deus me deu e eu sou feliz em tudo que eu faço.

Como funcionam a Embaixada da Ciranda e o Centro Cultural Estrela de Lia?

A gente faz oficina de cabelo afro com as doceiras, as marisqueiras da comunidade, organiza cineclubes. A Embaixada é um Ponto de Cultura, mas, no momento, está sendo mantida por nossa própria conta. No Centro Cultural, fazíamos cirandas todos os sábados, mas está em reforma desde 2014 e parou tudo. Já oferecemos oficinas de fotografia, de cerâmica para as crianças.

Em janeiro deste ano, você completou 80 anos reconhecida mundialmente pela sua arte, com os títulos de doutora Honoris Causa e de Patrimônio Vivo de Pernambuco. Como foram as homenagens?

Foi uma maravilha! A pessoa começar com 12 anos e chegar aos 80, neguinho. Foram três dias de festa… Veio gente do Brasil inteiro pra cá. Teve cortejo, teve circo. Ainda mais porque eu recebi essas homenagens estando viva, né?! Isso que é importante.

Mas tem muita gente da minha geração que ainda enfrenta dificuldades. Tem muitos mestres da cultura no Recife precisando de apoio. Não dá pra esperar a pessoa morrer pra homenagear depois.

Eu fui fazer um show no Pátio de São Pedro outro dia desses, e estava tudo acabado. Eu fico me perguntando onde é que estão os gestores que não veem isso. No centro da cidade, o foco da brincadeira. Eu acho que deveriam olhar o lado dos mestres, especialmente os mais necessitados.

O povo vem de fora buscar as coisas da gente e tem um monte de gente de braços cruzados precisando de ajuda. Onde eu chego, eu falo deles. Faço questão de falar de nossa cultura por todo lugar que eu piso.

Eu, há mais de 20 anos, conheci o Beto Hess, meu produtor e hoje temos uma equipe de produção, tudo cabeça feita, que trabalha com união, com respeito, e a gente continua produzindo. Vamos ver até onde a gente vai… A canção “Dorme, pretinho”, que Beto adaptou [da canção “Duerme, negrito”, de Atahualpa Yupanqui, gravada por Mercedes Sosa], foi premiada e tudo.

É como diz aquela música: “Para chegar aqui, atravessei um mar de fogo/ Pisei no fogo, o fogo não me queimou/ Pisei na pedra, a pedra balanceou”. Isso é um ponto de Exu. É muita história, muita estrada, muita luta. É chão. E eu, com meu pouco estudo, levantei a bandeira e sigo levantando. Atravessei um mar de fogo. Vê que braseiro danado!

Racismo e ditadura militar

Em certa altura da entrevista, Lia nos contou a situação envolvendo os direitos autorais da música “Ciranda de Lia”, que foi divulgada pela cantora, atriz e pesquisadora pernambucana Teca Calazans, em 1964. Acontece que apesar da letra falar explicitamente de quem é a canção, Lia teve sua autoria negada em uma época em que os direitos autorais não eram respeitados.

Em uma reportagem no Diário de Pernambuco, de 23 de julho de 1973, o jornal tratava de “descobrir” quem era a tal Lia da canção, na época, com 29 anos. No ano mais violento do regime militar, em que imperava a censura ao jornalismo e à cultura, não houve nenhum editor ou sensor para questionar o conteúdo da reportagem escrita por Selênio Homem de Siqueira, definia Lia com termos como “crioula”, “escurinha”, “empregadinha” e “boneca de piche”, evidenciando o racismo presente no país governado pelos militares.

Matéria publicada na edição impressa nº 303 do jornal A Verdade

O centenário de Amílcar Cabral

“Jurei a mim mesmo dar a minha vida, toda a minha energia, toda a minha coragem, toda a capacidade que posso ter, até ao dia em que morrer, ao serviço do meu povo da Guiné e Cabo Verde. Ao serviço da causa da humanidade, para a vida do homem se tornar melhor no mundo”. (Amílcar Cabral)

José Levino


“Um dos líderes mais lúcidos e brilhantes da África” (Fidel Castro)

Guiné-Bissau é um pequeno país caracterizado por grande diversidade de línguas, costumes e religiões, contando com integrantes de crenças africanas tradicionais, do islamismo e do cristianismo.  Os portugueses chegaram ao país em 1446 e começaram sua colonização em 1558. Próximo, está situado o arquipélago de Cabo Verde, um conjunto de 10 ilhas, onde os portugueses chegaram em 1460 e iniciaram sua colonização em 1462. Tornou-se um entreposto do tráfico de escravos e teve, a partir da ocupação portuguesa, uma relação próxima e tensa com Guiné-Bissau. Essa tensão se deve ao fato de que Portugal formou em Cabo Verde uma elite local a quem capacitava para exercer funções administrativas nas colônias da região.

A família Cabral

Juvenal Lopes Cabral pertencia a uma dessas famílias da elite caboverdiana. Foi ainda criança para Portugal, onde começou seus estudos e terminou-os em Santiago, principal cidade do Cabo Verde. Aos 22 anos, mudou-se para Guiné-Bissau, onde trabalhou como professor durante 21 anos. Foi aí, na cidade de Bafatá, que nasceu Amílcar, seu filho, fruto da união com Iva Pinhel Évora. Amílcar nasceu no dia 12 de setembro de 1924. Aos oito anos, sua família retorna para Cabo Verde, onde inicia seus estudos e vai terminá-los em Lisboa. A família Cabral se sentia portuguesa, mas Juvenal, que foi um estudioso e escritor renomado, tinha críticas à administração colonial no arquipélago.

Na capital portuguesa, Amílcar, além de estudar Agronomia, vai aprofundar essa visão crítica, a qual evoluirá para a necessidade da luta pela independência, não só de Cabo Verde e Guiné-Bissau, mas de todo o continente africano. E não apenas de independência formal, mas de construção de uma sociedade justa, sem exploração do homem pelo homem.

A Casa dos Estudantes do Império (CEI) foi criada para acolher os estudantes procedentes das colônias portuguesas na África, para facilitar o controle e promover o fortalecimento da visão colonialista entre eles. Facilitou também o desenvolvimento de uma visão anticolonial e anti-imperialista com a ajuda do Partido Comunista Português (PCP), que, apesar das condições duras da clandestinidade imposta pela ditadura salazarista, conseguiu colocar alguns militantes na entidade.

Além dos estudos teóricos, a CEI proporcionou conhecimento, troca de experiências e articulação entre estudantes de diversos países africanos, entre os quais líderes como Amílcar Cabral (Guiné-Bissau e Cabo Verde), Marcelino dos Santos (Moçambique) e Agostinho Neto (Angola).  Eles criaram, com apoio do PCP, o Centro de Estudos Africanos (CEA) com o objetivo, segundo um dos seus fundadores, Mário Pinto de Andrade (Angola), de “racionalizar os sentimentos de se pertencer a um mundo de opressão e despertar a consciência nacional através de uma análise dos fundamentos culturais do continente”.

No CEA, os estudantes africanos estudaram o marxismo-leninismo, as experiências socialistas da União Soviética e da Europa Oriental, compreenderam que a colonização era resultado do avanço do capitalismo e que a verdadeira libertação da África não seria apenas anticolonial, mas anticapitalista. Amílcar assimilava e digeria esse aprendizado, mas não se envolvia na política em Portugal. É tanto que um relatório da PIDE, a famosa polícia política salazarista, afirma sobre ele: “Moral e politicamente, nada se apurou em seu desabono”.

Os primeiros passos

Formado como engenheiro agrônomo, o Ministério da Ultramar nomeia Amílcar Cabral para o cargo de Adjunto dos Serviços Agrícolas e Florestais na Guiné-Bissau. E, assim, ele volta para a África em 1952. Percorre todo o país, buscando prestar um serviço eficaz, ao mesmo tempo em que aprofunda o conhecimento da realidade e mantém contato com os camponeses, especialmente ao realizar o recenseamento agrícola, considerado, até hoje, como a melhor fonte de conhecimento global da agricultura guineense.

Seu primeiro passo para a ação foi a criação de uma Associação Esportiva e Cultural onde se desenvolviam reflexões e estudos em vista da conscientização política para a libertação de Guiné. Denunciado ao Ministério de Ultramar, é demitido das funções e proibido de permanecer na região, obrigado a retornar para Lisboa. Foi autorizado a visitar a família uma vez por ano. É numa dessas visitas que, em 19 de setembro do ano de 1956, funda, com um grupo de companheiros, o Partido Africano para a Independência (PAI) que, em 1959, se tornaria o Partido Africano para a Independência de Guiné e Cabo Verde (PAIGC).

No período de 1956 a 1959, trabalhou em Angola, contratado por grandes empresas para fazer estudos sobre o solo angolano. Este serviço lhe proporcionou maior conhecimento sobre a realidade angolana e a aproximação com os movimentos de libertação locais, tendo participado do encontro de fundação do Movimento Popular para a Libertação de Angola (MPLA).

Em Angola constatou a forte exploração dos trabalhadores, realidade que ele classificou como “nova forma de escravatura”. Percorreu outros países africanos e esse conhecimento direto da exploração colonial lhe motivou a integrar-se definitivamente à luta de libertação de Guiné-Bissau, Cabo Verde e todo o continente africano. Concluiu que a estratégia de libertação precisa se fundamentar na história e na realidade de cada país. Escreveu: “Só poderemos transformar verdadeiramente a nossa própria realidade com base no seu conhecimento concreto e nos nossos esforços e sacrifícios próprios. Por maior que seja a similitude dos casos em presença e a identificação dos nossos inimigos, a libertação nacional e a revolução social não são mercadorias de exportação”. Amílcar Cabral foi capaz de compreender e aplicar o método dialético marxista à realidade concreta da África colonizada.

Da ação sindical à luta armada

O PAIGC começou sua agitação nacionalista por meio do Movimento Sindical Urbano, caminho que se mostrou inviável com o massacre dos trabalhadores portuários em greve no Porto de Pindijiquiti, no dia 03 de agosto de 1959.  A Conferência do PAIGC, realizada em Dacar, capital do Senegal, em 1960, conclui pela impossibilidade de conquistar a independência por vias legais e definiu a estratégia da luta armada a partir do campo.

Logo após a conferência, tem início a preparação dos militantes para esse fim e a busca de apoios internacionais, especialmente na ONU e nos países socialistas. Em 1961, o Partido anuncia “a passagem da fase da luta política para a luta insurrecional contra as forças coloniais”. Informa que ações de sabotagem econômica têm sido um sucesso, pois “estão levando insegurança aos colonizadores e paralisando a exploração do nosso povo”. Amílcar Cabral consegue falar na ONU, onde explica que a luta não é contra Portugal, e sim a favor da libertação do povo guineense e caboverdiano.

Depois de um período de recomposição, a luta armada é retomada com toda força em 1963, estendendo-se a todo o território nacional. O PAIGC dispunha de mais homens que armas. Mesmo assim, pesadas derrotas foram sendo infligidas às forças coloniais portugueses, a ponto de Guiné-Bissau ter sido denominada de “Vietnam dos Portugueses”.

Foram 11 anos de guerra, vitoriosa, com a independência proclamada unilateralmente pelo PAIGC em 24 de setembro de 1973 e reconhecida por Portugal no ano seguinte, depois da Revolução dos Cravos.

Não pôde comemorar

Amílcar Cabral não pôde comemorar a vitória, que tanto deveu à sua capacidade como liderança e estrategista. Infelizmente, não caiu em combate ao inimigo, mas foi covardemente assassinado por um grupo de traidores do próprio partido, em 20 de janeiro de 1973. Seu sucessor na direção do PAIGC e primeiro presidente da República, depois da Independência, foi seu irmão Luís Cabral.

Na fase da luta, a unidade se manteve após a morte de Amílcar. Entretanto, com a Independência, a proposta de unidade nacional de Guiné-Bissau e Cabo Verde se esvaiu. Certamente, o fato de Luís Cabral ser caboverdiano foi combustível para o golpe de Estado em 1980, promovido pelo Movimento Reajustador, liderado por João Bernardo Vieira (Nino), então primeiro-ministro. Os caboverdianos se desligaram do PAIGC e fundaram o Partido para a Independência de Cabo Verde (PAICV). O arquipélago teve sua independência reconhecida em julho de 1975.

Ambos – Guiné-Bissau e Cabo Verde – vivem em situação de crise e pobreza, integrados ao sistema capitalista na condição de países dependentes. Portanto, a verdadeira independência preconizada pelo herói do povo, Amílcar Cabral, não se concretizou.

O coronel reformado Júlio Monteiro tinha 24 anos quando foi escolhido para hastear a bandeira no dia 05 de julho de 1975. Entrevistado recentemente, disse ao repórter que tem a percepção que “os ideais de Amílcar Cabral morreram com ele”.

Discordo, coronel. Ideais justos não morrem. São como sementes lançadas ao solo, que só esperam o momento propício para renascer, crescer, dar flores e frutos.

Amílcar Cabral vive! Até a vitória sempre!

Matéria publicada na edição impressa nº 303 do jornal A Verdade

A Verdade completa 25 anos de muita luta

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Como diz nosso lema, somos “Um jornal dos trabalhadores na luta pelo socialismo”. Por isso, A Verdade cresceu e chega, neste mês de dezembro de 2024, ao seu aniversário de 25 anos maior do que nunca.


EDITORIAL – O Jornal foi fundado no final do ano de 1999, no auge das políticas neoliberais implementadas no Brasil pelos governos do PSDB, tendo à frente o então presidente Fernando Henrique Cardoso. Nossa primeira capa estampou: “FHC, o professor que virou fazendeiro”. E assim prosseguiu nas edições seguintes: “Salário mínimo de R$ 136,00 é mais um crime de FHC contra os trabalhadores”; e “Governo Federal expulsa 400.000 famílias do campo”. Em 2000, nos marcos dos 500 anos de invasão europeia a estas terras batizadas de Brasil: “500 anos de genocídio e resistência indígena”. Enfrentamos em nossas páginas e nas ruas as privatizações de setores estratégicos, como bancos, energia, siderurgia, petróleo e outros. Chamamos a juventude, as mulheres e os trabalhadores para se organizarem para lutar para derrubar o capitalismo e construir uma Revolução Socialista.

Em 2003, Lula tomou posse na Presidência da República, mas os quatro governos do PT que se seguiram mantiverem a mesma política econômica neoliberal dos governos anteriores. Neste mesmo ano, os EUA invadiram o Iraque para expandir seu domínio no Oriente Médio, rico em petróleo e gás natural, e A Verdade denunciou os planos do imperialismo. Diga-se de passagem, estratégia que os governos norte-americanos buscam implementar até hoje, como mostra o genocídio do povo palestino, que, há mais de um ano, sofre um contínuo massacre executado pelo Estado terrorista de Israel.

Assim, seguindo com sua linha editorial revolucionária, o Jornal criticou a conciliação de classes dos governos social-democratas e o aumento das desigualdades no Brasil e no mundo. Em 2008, estourou mais uma gigantesca crise de superprodução do sistema capitalista, a partir dos EUA, com consequências mundiais, especialmente para a classe trabalhadora, que foi abatida por ondas de desemprego e de pobreza.

O Brasil foi atingido por esse tsunami no segundo mandato presidencial de Dilma Rousseff, que implementou o famigerado Plano Levy, pensando na “austeridade econômica”, mas, na verdade, preservando os lucros da burguesia, enquanto o povo amargava uma crescente inflação.

Não deu outra: as elites reacionárias se aproveitaram do descontentamento popular e promoveram mais um golpe de Estado, em conluio com o Congresso Nacional antipovo e a grande mídia capitalista, empossando na Presidência o vice, Michel Temer (MDB). Assim, impuseram as Reformas Trabalhista e da Previdência, acabando com direitos históricos conquistados pela classe trabalhadora ao longo de décadas. A Verdade estampou em sua capa: “Impeachment de Dilma: um retrocesso anunciado”.

Temer abriu o caminho para que o fascista Jair Bolsonaro vencesse as eleições de 2018 e montasse o governo mais reacionário e militarizado desde a Ditadura Militar (1964-1985). Enquanto isso, aumentamos a cobrança pelo direito à memória, verdade e justiça sobre os crimes da ditadura fascista.

Durante seus quatro anos como presidente, o ex-capitão foi responsável pelo aumento da miséria do povo brasileiro e pelo genocídio de mais de 700 mil brasileiros na pandemia de Covid-19, devido a seu esquema das vacinas. Agora, como fartamente comprovado, ele e as Forças Armadas articularam um golpe (ver Página 3) após serem derrotados pelo povo nas eleições, com o intuito de assassinar o presidente Lula e outras autoridades e de tomar a sede dos três poderes, episódio conhecido como 08 de Janeiro (2023).

Enquanto vários setores da esquerda vacilaram nesses momentos cruciais da vida do Brasil, A Verdade agitou abertamente pelo “Fora Bolsonaro”, pela prisão dos golpistas de ontem e de hoje e apontou que estava em curso um projeto fascista da burguesia para implantar um governo autoritário de banqueiros, latifundiários e generais.

Em meio a todos esses fatos recentes, o atual governo do PT se mostra subserviente ao capital, mantendo fielmente o pagamento dos juros da dívida pública (que consome quase metade do orçamento anual da nação) e impondo mais arrocho salarial.

De fato, limitar o aumento do salário-mínimo quando nosso país tem um dos mais baixos salários do mundo; reduzir o número de beneficiários do Benefício de Prestação Continuada (BPC), que é pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda; criar obstáculos ao abono salarial, em particular as mudanças no seguro-desemprego; são medidas que mostram o quanto o PT abandonou um programa de esquerda e se abraçou de vez com as políticas econômicas neoliberais e com o Centrão, que lhe dá, em troca, sustentação política.

A Verdade 25 anos. Arte: Gabriel Vesúvio (JAV/PR)
Arte: Gabriel Vesúvio (JAV/PR)

Assim, chegamos aos nossos 25 anos com mais energia ainda para denunciar os crimes do capitalismo e propagandear o socialismo. Os brigadistas de A Verdade estão espalhados pelos quatro cantos do país, agitando e organizando novas pessoas para se somarem à construção da Revolução Brasileira, sem conciliação de classes e guiados pela teoria marxista-leninista.

Tribunal internacional emite mandado de prisão contra Netanyahu e ex-ministro sionista

Tribunal Penal Internacional, sediado em Haia, emitiu mandado de prisão contra Benjamin Netanyahu, dois genocidas acusados de terem cometido crimes de guerra contra a humanidade.

Redação


INTERNACIONAL –  Mais de um ano após o início do genocídio em Gaza, na Palestina, que já deixou mais de 52 mil pessoas mortas e outras 100 mil feridas ou mutiladas, o Tribunal Penal Internacional, sediado em Haia, na Holanda, decidiu emitir um mandado de prisão contra o primeiro-ministro fascista de Israel, Benjamin Netanyahu, e o ex-ministro da guerra daquele regime, Yoav Gallant.

Os dois genocidas são acusados de terem cometido crimes de guerra e contra a humanidade. Pela decisão do Tribunal, todos os países que fazem parte da corte são obrigados a executar a sentença.

Este é o caso do Brasil, da maior parte dos países da América Latina, de todos os países da União Europeia e uma série de países asiáticos. EUA, China, Rússia e Israel não reconhecem o Tribunal. 

A Frente Popular de Libertação da Palestina (FPLP), uma das organizações políticas que está à frente da resistência armada no país ocupado, saudou a decisão do tribunal, mas lembrou que os crimes dos sionistas são muito mais graves. 

“Apesar da importância da decisão do Tribunal e das acusações contra estes dois criminosos, continuam a ser acusações pequenas à luz da enorme escala dos crimes que cometeram contra o nosso povo e que ainda cometem, que incluem genocídio, limpeza étnica, fome, violência indiscriminada bombardeios e outros crimes que são considerados uma violação flagrante de todas as leis internacionais e humanitárias”, afirmou FPLP em nota à imprensa.

Genocídio continua

Como lembrou a resistência palestina, as atrocidades de Israel continuam diariamente. Em Gaza, os massacres diários em campos de refugiados, escolas e hospitais são a rotina. No Líbano, a tentativa de invasão de Israel continua a sofrer com a forte resistência dos libaneses.

Em apenas um dia, 21 de novembro, Israel matou 22 palestinos em Gaza e mais de 40 libaneses no leste do país. Sem ter como vencer a resistência, Israel opta por bombardeios indiscriminados.

Netanyahu se sente empoderado com a eleição de Donald Trump, nos EUA, e continua sem qualquer sanção dos demais países, cenário que coloca o Oriente Médio diante da possibilidade concreta de expansão dos conflitos militares nos próximos meses.

O anúncio mais grave foi feito no início do mês de novembro, por militares israelenses: “Não há intenção de permitir que os moradores do Norte da Faixa de Gaza retornem às suas casas”, falou abertamente o brigadeiro-general sionista Itzik Cohen. O cerco sionista ao Norte da Faixa de Gaza é mais uma evidência de que esta parte do território palestino será anexado por Israel. 

Agressões no Líbano

No Líbano, as incursões israelenses continuam. Vilas libanesas são destruídas diariamente e os milhões de deslocados estão proibidos de voltar às suas casas. No entanto, a resistência libanesa tem conseguido impor baixas cada vez maiores ao Exército sionista.

Para esconder essa realidade, Israel tem optado por ampliar os bombardeios em Beirute, a capital. Lá, bairros populares, escolas e o aeroporto são alvos constantes de ataques. Segundo a Unicef, 200 crianças libanesas já foram assassinadas por Israel desde o início da invasão.

A guerra no Oriente Médio impõe a necessidade de se ampliar o enfrentamento ao imperialismo no mundo. O retorno do fascista Donald Trump à Presidência dos EUA impõe aos povos do mundo que se amplie a solidariedade, forçando os governos capitalistas a romperem relações diplomáticas e comerciais com o regime sionista.

Assim como em outros momentos na História, Israel e o imperialismo estadunidense não conseguem derrotar os palestinos e, por isso, tentam exterminá-los. Cabe aos povos do mundo se mobilizar para impedir isto.

Fascista Trump monta governo antipovo nos EUA

Donald Trump, que governou de 2017 a 2021, promete aprofundar políticas autoritárias e nomeia uma equipe composta por bilionários e negacionistas.

Redação


INTERNACIONAL – Cerca de um mês após a realização das eleições gerais dos EUA, fica mais evidente a falta de democracia na principal potência imperialista do mundo. O candidato que ganhou, o fascista Donald Trump, se esforça agora em montar um governo com pessoas comprometidas com as guerras e a burguesia imperialista bilionária.

Eleito numa eleição em que os partidos de esquerda são perseguidos e proibidos de concorrer em vários estados e sem qualquer fiscalização oficial, com várias fraudes legalizadas, Trump promete agora aprofundar a política fascista que aplicou em seu primeiro mandato (2017-2021).

Nos EUA, é permitida a compra de votos ou a alteração arbitrária na lista de eleitores. O caso mais escandaloso foi a compra de votos de eleitores da Pensilvânia, Michigan e Minnesota, realizada pelo bilionário Elon Musk. Trump venceu em todos esses estados, combinação que fez com que tivesse mais delegados que a candidata democrata, a direitista Kamala Harris.

Os Democratas e as guerras

A vitória de Trump é resultado da política neoliberal e imperialista do partido Democrata, da candidata Kamala Harris. Ela, que é a atual vice-presidente dos EUA, é uma das responsáveis pela política de guerra estadunidense na Ucrânia e de apoio ao genocídio palestino cometido por Israel.

No Governo Biden, a indústria de armas lucrou como nunca, enquanto a população dos EUA continua a sofrer com a falta de moradia e os baixos salários, com milhões de pessoas na miséria. A derrota de Trump nas eleições de 2020 foi por conta da luta antirracista e contra o negocionismo na pandemia.

Gangue de bilionários

Trump está aproveitando o período de transição para nomear um corpo de secretários (equivalente a ministros) composto por bilionários e pessoas acusadas de vários crimes. É o caso do próprio bilionário Elon Musk, que, depois de comprar milhares de votos, garantiu uma posição como secretário de Eficiência Governamental, cargo de onde poderá garantir mais contratos entre o governo e suas empresas.

Na pasta da saúde, Trump nomeou Robert F. Kennedy Jr., um reconhecido negacionista de vacinas e de qualquer método de saúde cientificamente comprovado. Na educação, Trump nomeou Linda McMahon, bilionária dona de uma empresa de entretenimento que defende entrega de vales para as pessoas estudarem em escolas particulares e o fim das escolas públicas.

Outro criminoso nomeado é Thomas Homan, que será responsável pela política de deportação em massa de imigrantes. Homan foi o responsável pela política de separação de famílias imigrantes e de colocar crianças imigrantes em jaulas no primeiro mandato de Trump.

Com essa equipe de negacionistas e bilionários antipovo, Trump promete colocar em prática seu programa fascista. O primeiro ponto é a efetiva deportação em massa dos imigrantes sem documentos. O objetivo do fascista é expulsar 11 milhões de pessoas do seu país, mesmo aquelas que já têm família nos Estados Unidos.

América Latina e mundo

Outro secretário já nomeado é Marco Rubio, filho de cubanos ligados a organizações terroristas de extrema-direita. O atual senador pelo Texas deve ocupar a Secretaria de Estado, equivalente ao Ministério de Relações Exteriores.

Essa indicação representa um ataque aos países latino-americanos, em especial à Venezuela, a Cuba e ao Brasil, dado às relações de Rubio com a extrema-direita golpista nesses países.

Além disso, Rubio é forte defensor do criminoso de guerra Netanyahu e do regime sionista de Israel. Essa posição deve levar a uma ampliação da política de envio de armas e recursos para o exército sionista continuar a cometer o genocídio contra os palestinos.

Essa situação impõe a necessidade de se ampliar a denúncia e a mobilização contra o imperialismo norte-americano. A chegada de Trump amplia as contradições do imperialismo mundial, por isso, nossa mobilização contra as guerras e a interferência dos EUA na vida dos povos do mundo é cada vez mais importante.

MLB conquista reforma de edifício em João Pessoa

Após dois anos e sete meses de luta, a Ocupação João Pedro Teixeira, no Centro de João Pessoa (PB), alcançou uma conquista importante: as 39 famílias que viviam no Edifício Nações Unidas desocuparam o prédio para que ele passe por reforma e se transforme em moradia popular.

Redação PB


LUTA POPULAR – A Ocupação João Pedro Teixeira, realizada pelo MLB há dois anos e sete meses, no Centro da cidade de João Pessoa (PB), deu mais um importante passo rumo à moradia digna para as 39 famílias que ocupavam o Edifício Nações Unidas. Após muita pressão, lutas e negociações junto da Secretaria Municipal de Habitação (Semhab), o prédio foi totalmente desocupado com o objetivo de passar por uma grande reforma e revitalização e transformá-lo em moradia popular. “Uma coisa muito importante, que mostra que o povo unido conquista sua moradia digna”, diz Larissa, militante do MLB e moradora da Ocupação.

Em maio deste ano, foi lançado o filme curta-metragem “Deus criou o mundo, e o diabo o arame farpado”, uma produção da produtora independente “Choraboy Filmes”, em conjunto com a Redação do jornal A Verdade na Paraíba e outros profissionais do cinema paraibano. O filme denuncia o esvaziamento do Centro da cidade e ressalta a importância da Ocupação João Pedro Teixeira para a região.

Outro parceiro importante do MLB nessa luta foi o Projeto de Extensão da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) “Ocupar é habitar”, que intermediou as negociações com a Prefeitura Municipal. “É importante essa parceria entre a Universidade, o Movimento e a Prefeitura, porque a gente mostrou como vai ficar o projeto dentro das diretrizes do Programa Minha Casa, Minha Vida e a importância que é trazer moradia para o Centro Histórico”, afirma a arquiteta Glauciene Aquino, da Semhab.

“Uma grande mudança de vida para mim, que passei mais de cinco anos morando na rua, conquistar nosso apartamento na luta. É uma vitória muito grande”, diz Alvinho, coordenador da Ocupação.

Com muita emoção e companheirismo, as famílias celebraram a vitória coletiva após anos de luta. “Uma emoção muito grande! A gente tá saindo com a certeza da vitória, da nossa luta, resistência, organização. Passei 21 anos inscrita nos programas habitacionais, mas só quando ocupei é que consegui minha moradia”, relata Josiane Soares, também coordenadora da Ocupação.

Ocupação Expedito Xavier conquista compromisso de casas após resistirem à repressão

Nasce a ocupação Expedito Xavier, com mais de 80 famílias ocupando um prédio abandonado há sete anos em Brasília no dia 6 de novembro, lideradas pelo Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), em busca de moradia e expondo a gravidade da crise habitacional e a força da organização popular.

Alexandre Ferreira | Brasília – DF


LUTA POPULAR – O Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) organizou sua primeira ocupação em Brasília. Foi no dia 06 de novembro, com mais de 80 famílias para garantir moradia para trabalhadores e trabalhadoras que não têm esse direito garantido. A Ocupação sofreu dura repressão do governador Ibaneis Rocha (MDB) e de sua vice, Celina Leão. A polícia fez um cerco de 24 horas, impedindo a entrada de água, comida e até fraldas para as crianças. O prédio ocupado estava abandonado há mais de sete anos.

“A Ocupação Expedito Xavier é formada por famílias de Sol Nascente, Ceilândia e Arapoangas, que vivem de favor ou escravos da especulação imobiliária. A Ocupação é uma ação pela sobrevivência contra a fome e por um teto”, afirma Ellica Aguiar, coordenadora do MLB.    

Mas toda essa repressão não desanimou as famílias e despertou importante solidariedade, com grande repercussão em todo Distrito Federal. Centenas de pessoas fizeram uma vigília do lado de fora do prédio e, com muita combatividade, resistiram. Também foi realizada uma coletiva de imprensa com as principais emissoras de televisão, jornais e sites repercutindo a luta das famílias e a intransigência do Governo. Durante a madrugada, a polícia, de forma covarde, prendeu e agrediu um apoiador da ocupação por tentar levar fraldas para o prédio ocupado e, logo após, jogou bomba nas pessoas que estavam na vigília, tentando intimidar e dispersar.

Apesar de tudo isso, a ocupação e a vigília resistiram e mantiveram a pressão por um caminho negociado que resolvesse a moradia das famílias. Foram realizadas duas reuniões. A primeira com o deputado distrital Wellington Luiz, presidente da Câmara Legislativa (CLDF), junto ao conselho de líderes dos partidos e com representantes do Governo do Distrito Federal. A segunda, com o presidente da Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal (Cohab), na qual foi arrancado o compromisso de disponibilizar imóveis para as famílias da Ocupação Expedito Xavier.

“Toda essa luta deixou claro que o único caminho para as famílias pobres é lutar. E que, para ter êxito, essa luta precisa ser organizada, como é o exemplo do MLB”, ressaltou Hanna Skarlety, coordenadora da Ocupação.

Homenagem aos candangos

O MLB escolheu batizar a ocupação relembrando os candangos, trabalhadores que vieram de várias regiões do Brasil, especialmente do Nordeste, para construir Brasília. Entre eles estava Expedito Xavier Gomes, cearense que veio trabalhar na construção de Brasília. Porém, seu sonho de dar melhores condições para a esposa e os três filhos, que ficaram em Itu, Ceará, acabou em morte, humilhação e abandono.

Era por volta das 13h00 de uma terça-feira (03/04/1962), quando dois operários foram soterrados em um buraco de cinco metros de profundidade na construção da Universidade de Brasília (UnB). Expedito Xavier Gomes e Gildemar Marques Pereira, empregados da Construtora Martins de Almeida S/A (Comasa), não viram a inauguração realizada 18 dias após suas mortes. Darcy Ribeiro foi quem pediu uma homenagem: que aquele local se chamasse “Auditório Dois Candangos”. Ainda hoje, poucos conhecem sua história e de tantos outros mortos e expulsos das áreas centrais de Brasília.

A memória dos candangos é resgatada pelo MLB, que busca honrar e dar visibilidade aos trabalhadores anônimos que deram suas vidas pela capital do país.

Apoie a Ocupação doando qualquer quantia para o pix: ocupacaoexpedito@gmail.com.

Candangos vivem! Expedito Xavier Gomes, presente!

Opinião: Despejar a Ocupação Eliana Silva é absurdo dos absurdos

Assessor da Comissão Pastoral da Terra, frei Gilvander Moreira denuncia a tentativa do Estado de despejar a Ocupação Eliana Silva, organizada pelo MLB em Belo Horizonte (MG). 400 famílias estão consolidadas no terreno há 12 anos, mas mesmo assim o poder público quer despejá-las

Frei Gilvander Comissão Pastoral da Terra


Ficamos estarrecidos ao recebermos a confirmação de que uma juíza de uma Vara Pública Municipal de Belo Horizonte (MG) havia exarado decisão para despejar mais de 400 famílias da Ocupação-Comunidade Eliana Silva, coordenada pelo Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) na região do Barreiro, na capital mineira. Trata-se de absurdo dos absurdos, uma das decisões mais brutais que já vi em 30 anos lutando ao lado dos camponeses/as por terra e ao lado dos sem-teto por moradia digna e adequada. Eliana Silva, como carinhosamente é conhecida a comunidade, tem sido há 12 anos um extraordinário exemplo de organização e de conquista de direitos para todas as Ocupações do Brasil e de outros países. Intuo que se a juíza for visitar Eliana Silva ou pelo menos assistir alguns dos vídeos que gravamos lá dia 7 de dezembro último, na hora ela voltará atrás e cancelará a decisão de despejo. Só se ela não tiver coração.

A Ocupação Eliana Silva é uma Ccmunidade com 12 anos de luta e com inúmeras conquistas que já a transformou em um bairro consolidado muito mais organizado do que centenas de bairros da capital mineira. Seguindo Plano Urbanístico feito por professoras/es doutores em Arquitetura da UFMG em conjunto com as famílias, Eliana Silva já tem todas suas ruas asfaltadas, todas as casas construídas de alvenaria, sendo a maioria das casas de 2 ou 3 andares, com rede de água e esgoto instalada pela COPASA, rede de energia instalada pela CEMIG, coleta de lixo feita por caminhões da prefeitura de Belo Horizonte e conta com a Creche Tia Carminha, que atende há 12 anos mais de 30 crianças, viabilizando que as mães possam ir trabalhar e deixar as crianças sendo bem cuidadas. Tem também Centro Cultural da Quebrada. Ou seja, Eliana Silva está no nível da Vila Santa Rita, ao lado. Quem desconhece a história não percebe que Eliana Silva foi fruto de ocupação, tamanha a evolução da comunidade.

Qualquer pessoa sensata ou autoridade que chegar lá e ver dirá na hora: “É impossível despejar mais de 1300 pessoas de um bairro consolidado como Eliana Silva.” Para além do grau de consolidação que impede despejo e reintegração de posse, a decisão que manda despejar está eivada de ilegalidades e é inconstitucional sob muitos aspectos legais e éticos.

Processos questionáveis

Três processos de reintegração ainda existem como uma espada de Dâmocles na cabeça das mais de 400 famílias da Comunidade Eliana Silva: um do empresário Fernando Rehfeld, outro do Newton Pedrosa, dono de um ferro velho, e outro da Prefeitura de Belo Horizonte. Estão em duas Varas diferentes. Precisam ser reunidos com o juízo prevento, o que recebeu o primeiro processo. Não sei se o primeiro processo protocolado fisicamente ou o primeiro no sistema eletrônico, que são diferentes. Tem que decidir isto também, reunir os processos para que não se tenham decisões discrepantes.

Há seis Ações Civis Públicas (ACPs) da Defensoria Pública de Minas Gerais e do Ministério Público de Minas Gerais, ações estranhamente não julgadas até hoje, ações que colocam como réus a Prefeitura de Belo Horizonte, o Estado de Minas Gerais, Bradesco e empresários. Todas defendem o direito das famílias de continuarem ocupando as áreas ocupadas e exigem a anulação dos contratos de alienação de terras públicas (devolutas) até a década de 1990, mas que foram repassadas para empresários pelo Governo de Minas Gerais, através da empresa CIA de Distritos Industriais de Minas Gerais (CDI/MG) e posteriormente CODEMIG, de forma ilegal, sem licitação e a preço irrisório, com cláusula contratual que previa que os empresários teriam que em 12 ou 24 meses, de acordo com cada contrato de venda dos terrenos, comprovar que estavam gerando emprego no aludido Distrito Industrial do Vale do Jatobá. Com a cumplicidade do Governo de Minas Gerais, Marcos Valério, Banco Real, Bradesco e muitos empresários se apossaram, de forma ilegal, de 1,5 milhão de metros quadrados de terra nas imediações da Comunidade Eliana Silva, mas poucas empresas prosperaram.

A maioria dos empresários deixou os terrenos abandonados sem cumprir a função social por interesses especulativos. Por isso, a região se transformou no Vale das Ocupações, com uma ocupação acontecendo após a outra: em 1996, Ocupação Corumbiara; em 2008, Ocupação Camilo Torres; em 2010, Ocupação Irmã Dorothy; em 2012, Ocupação Eliana Silva (a 1ª Ocupação Eliana Silva resistiu três semanas e foi despejada por 500 policiais militares com uso de caveirão, inclusive, mas três meses após as famílias despejadas ocuparam outro terreno a 1 km de distância. O terreno da 1ª Eliana Silva está abandonado até hoje); no carnaval de 2014, Ocupação Nelson Mandela; Em 2015, Ocupação Paulo Freire; e Ocupação da Horta. Na luta coletiva, os movimentos sociais, como o MLB, tem construído muito mais moradia do que o poder público.

As Ações Civis Públicas devem ser julgadas primeiro, pois os direitos do povo devem estar acima dos interesses dos empresários que mesmo deixando os terrenos abandonados e sendo usados para especulação, pleiteiam judicialmente a reintegração em uma posse que nunca estiveram, pois se estivessem na posse e dando função social para a propriedade, não teriam acontecido ocupações. Empresários responsáveis que construíram empresas em vários dos terrenos estão tocando seus negócios e não tiveram suas propriedades ocupadas.

Decisão desrespeita ADPF 828

A decisão que manda despejar as famílias da Ocupação Eliana Silva viola e desrespeita também a decisão do plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) na ADPF 828 que obrigou os tribunais estaduais e federais a criarem Comissões de Conflitos Fundiários e a encaminharem processo de negociação que impeça despejo sem alternativa prévia e digna. É preciso que a Comissão de Conflitos Fundiários do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) faça uma Visita Técnica na Ocupação Eliana Silva e convoque a prefeitura de Belo Horizonte, o Governo de Minas Gerais e o Governo Federal para audiências de tentativas de conciliação que apontem que o correto, justo e necessário a fazer é a Prefeitura de Belo Horizonte desapropriar o terreno da Ocupação Eliana Silva e encaminhar o processo de Regularização Urbana e Fundiária Social (REURBs), expedindo ao final a escritura e Registro de posse e propriedade para as famílias que moram na Comunidade Eliana Silva há 12 anos com todas suas casas construídas já pagando contas de água e energia.

Caso a Prefeitura de Belo Horizonte se negue a fazer o que é obrigação dela, que é fazer a REURBs na Comunidade Eliana Silva, a Defensoria Pública de Minas Gerais deve entrar com Ação Civil Pública exigindo a desapropriação indireta da área, ou seja, o juiz deverá acolher o pedido e determinar que a Prefeitura e Estado de Minas Gerais pague em dinheiro certo valor para os empresários que pleiteiam reintegração de posse.

Sobre isto, já temos várias jurisprudências do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que proíbem despejar ocupação- omunidade consolidada, inclusive decisão do TJMG que determinou desapropriação indireta no caso da Ocupação Fidel Castro na beira do Anel Rodoviário em Belo Horizonte, o que impediu o despejo de centenas de famílias e a prefeitura de Belo Horizonte foi condenada a pagar em dinheiro o pretenso proprietário da área.

Há precedente para desapropriar terreno

Temos muitos exemplos que podemos citar de casos em que o Estado (Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo) reconheceu a comunidade e o despejo não aconteceu. Por exemplo, em abril de 2016, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Recurso Especial 1.302.736, confirmou decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que negou reintegração de posse contra Ocupação que tinha se tornado bairro em Uberaba (MG). Diante da existência de inúmeras edificações e moradores no local, após tantos anos de disputa judicial, a justiça mineira reconheceu e negou o direito à reintegração de posse em prevalência do interesse público, social e coletivo. A decisão judicial de reintegração foi convertida em perdas e danos a ser paga em dinheiro.

Em voto repleto de doutrinas, teses e precedentes, o ministro do STJ, Luis Felipe Salomão, discorreu sobre os princípios da proporcionalidade e da ponderação como forma de o Judiciário dar aos litígios solução serena e eficiente. O ministro relator ressaltou que “o imóvel originalmente reivindicado não existe mais, já que no lugar do terreno antes objeto de comodato surgiu um bairro com vida própria e dotado de infraestrutura urbana.” Segundo a decisão do STJ, não pode ser desconsiderado o surgimento do bairro, onde inúmeras famílias construíram suas vidas, sob pena de cometer-se injustiça maior a pretexto de fazer justiça.

Outro caso julgado pelo STJ é o do Acórdão da Favela do Pullman, em Santo Amaro, SP, que inicialmente era área destinada a um loteamento, mas foi ocupada pouco a pouco e se tornou um bairro em franco processo de consolidação e o Poder Judiciário reconheceu ao final o “perecimento do direito à propriedade”, ou seja, negou o direito de reintegração. Em 2005, o ministro do STJ, Aldir Passarinho Júnior (Relator) decidiu negar a reintegração de nove lotes com 30 famílias na Favela do Pullman.

Na decisão, o ministro Aldir afirma: “Trata-se de favela consolidada, com ocupação iniciada há cerca de 20 anos. Está dotada, pelo Poder Público, de pelo menos três equipamentos urbanos: água, iluminação pública e luz domiciliar. Fotos mostram algumas obras de alvenaria, os postes de iluminação, um pobre ateliê de costureira etc., tudo a revelar uma vida urbana estável. No caso da Favela do Pullman, a coisa reivindicada não é concreta, nem mesmo existente. É uma ficção. Os lotes de terreno reivindicados e o próprio loteamento não passam, há muito tempo, de mera abstração jurídica. A realidade urbana é outra. A favela já tem vida própria, está, repita-se, dotada de equipamentos urbanos. Lá vivem muitas centenas, ou milhares, de pessoas. Só nos locais onde existiam os nove lotes reivindicados residem 30 famílias. Lá existe uma outra realidade urbana, com vida própria, com os direitos civis sendo exercitados com naturalidade. A realidade concreta prepondera sobre a ‘pseudo-realidade jurídico-cartorária’. Segundo o art. 77 do Código Civil, perece o direito perecendo o seu objeto. E nos termos do art. 78, I e III, entende-se que pereceu o objeto do direito quando fica em lugar de onde não pode ser retirado. Razões econômicas e sociais impedem a recuperação física do antigo imóvel. O desalojamento forçado de trinta famílias, cerca de cem pessoas – na Favela do Pullman -, todas inseridas na comunidade urbana muito maior da extensa favela, já consolidada, implica uma operação cirúrgica de natureza ético-social, sem anestesia, inteiramente incompatível com a vida e a natureza do Direito. É uma operação socialmente impossível. E o que é socialmente impossível é juridicamente impossível. Em cidade de franca expansão populacional, com problemas gravíssimos de habitação, não se pode prestigiar o comportamento de proprietários que deixam o terreno abandonado sem cumprir sua função social e depois exigem judicialmente reintegração de posse”.

Justiça para a ocupação Eliana Silva!

Tal julgado do STJ é inclusive citado pelo TJMG, que em julgamento de recurso (nº 1.0024.13.304260-6/001) envolvendo as ocupações da Izidora, em Belo Horizonte, registrou que o direito de propriedade deve ter correspondência no atendimento à função social, que lhe é inerente, de maneira a buscar a proteção da dignidade humana, fundamento da República (art. 1º, III, da Constituição Federal). Concluiu o desembargador Correia Júnior que prevalece o postulado da dignidade humana em se tratando de questões que envolvem a coletividade da população, mormente por se tratar de desocupação de casas, em que vivem idosos e crianças, com o uso prematuro e inadmissível da força policial, não devendo ser concedida ordem de despejo que favorece o direito de propriedade com violação aos direitos fundamentais.

Essa situação por que passa a Comunidade Eliana Silva exige atenção e solidariedade. Conclamamos a todas as pessoas de boa vontade que unam-se a nós nessa luta urgente, justa e necessária, para impedir esse despejo absurdo! Que a justiça aconteça! Que a Ocupação-Comunidade Eliana Silva resista mais uma vez! Que venha a regularização urbana e fundiária social (REURBs)!

As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 – Frei Gilvander: “DECISÃO DE DESPEJAR A OCUPAÇÃO-COMUNIDADE ELIANA SILVA, DO MLB, É INCONSTITUCIONAL E VIOLA A DECISÃO DO STF NA ADPF 828. A COMISSÃO DO TJMG DEVE FAZER VISITA TÉCNICA NA ELIANA SILVA E A PBH TEM O DEVER DE FAZER REURBS”, 07/12/24

https://www.youtube.com/watch?v=H9Cs8cSxIfM

2 – “ABSURDO TENTAR DESPEJAR A OCUPAÇÃO-COMUNIDADE ELIANA SILVA, DO MLB = BAIRRO CONSOLIDADO, 500 famílias com casas de até 3 andares, com Redes de água e esgoto da COPASA, e energia da CEMIG, ruas asfaltadas, Centro Cultural, Creche Tia Carminha…”, Vídeo 2 – 07/12/24

https://www.youtube.com/watch?v=J1hXRzVRmCw

3 – PALAVRAS DE FOGO na OCUPAÇÃO-COMUNIDADE ELIANA SILVA, DO MLB = BAIRRO CONSOLIDADO. DESPEJO? Vídeo 3

https://www.youtube.com/watch?v=kXUiYfAF1IQ

4 – AVÓS, MÃES, CRIANÇAS: “PELO AMOR DE DEUS, NÃO NOS DESPEJE!” OCUPAÇÃO-COMUNIDADE ELIANA SILVA/Vídeo 5

https://www.youtube.com/watch?v=oDLT3IhMHCU

5 – PBH TEM q FAZER REURBs na OCUPAÇÃO-COMUNIDADE ELIANA SILVA do MLB, BAIRRO CONSOLIDADO, BH/MG Vídeo 6

https://www.youtube.com/watch?v=csUt1pqxL_o

EMEP (Turquia): Precisamos nos unir contra as forças imperialistas e seus colaboradores!

Veja a nota publicada pelo Partido do Trabalho da Turquia sobre a queda de Assad na Síria, onde faz um chamado à luta anti-imperialista.

Seyit Aslan | Presidente do Partido do Trabalho da Turquia (Emek Partisi)


A guerra civil na Síria entrou em uma nova fase. Forças armadas jihadistas, lideradas pelo Hayat Tahrir al-Tahriri al-Sham¹ [Frente de Libertação do Levante, no nome em árabe], entraram na capital síria Damasco. Bashar al-Assad fugiu. O Exército Sírio se rendeu.

A mídia pró-AKP² aplaudiu esses eventos. Ele dizem que o ditador foi derrubado e a democracia prevaleceu. A democracia realmente venceu? O HTS trouxe a democracia para a Síria? O regime de Assad não era com certeza democrático, mas o regime do HTS tampouco será. Até hoje não houve nenhum regime islamista democrático no mundo. Não é possível que este será o primeiro.

A entrada do HTS em Damasco não significa que ele domina toda a Síria. No nordeste está a SDF/PYD [Frente Democrática da Síria/Partido de União Democrática, ligado a população curda], que controla 40% do país, e no noroeste estão as forças armadas chamadas “Exército Nacional Sírio” [força financiada e armada pela Turquia]. De agora em diante a luta política e armada continuará entre esses grupos. 

Claro que uma nova onda migratória começará neste novo período. Grupos pró-Assad e árabes alauítas³ fugirão do regime do HTS. 

Com as dificuldades da Rússia na sua guerra com a Ucrânia e o enfraquecimento do Hezbollah e do Irã na sua luta contra Israel este era o tempo certo para o HTS agir. Nesta conjuntura, os EUA, Israel e seus aliados venceram na Síria junto com os jihadistas do HTS. O próximo alvo dos EUA, Israel e seus aliados será provavelmente o Irã.

Com o slogan de tornar a situação atual numa oportunidade, alguns círculos no nosso país [Turquia] estão defendendo que a Turquia ataque as regiões curdas com o “Exército Nacional Sírio” e se expanda. Uma política dessas significa que a Turquia será dragada também para a guerra. A Turquia deve retirar suas forças armadas da Síria, defender a autodeterminação do povo sírio e desenvolver uma relação fraternal com eles.

Os povos do Oriente Médio devem se unir e lutar contra as forças imperialistas ao invés de lutar uns contra os outros e entre eles mesmos.

Os imperialistas e as tropas estrangeiras, incluindo as turcas, devem sair da Síria imediatamente. O povo sírio, composto de diferentes identidades nacionais e crenças, deve determinar o seu próprio destino.

O presente e o futuro da Síria pode apenas ser garantidos através de uma soberania popular, anti-imperialista, pacífica e democrática. Qualquer outra iniciativa significa a continuação da guerra civil.

Nas condições em que o Oriente Médio e a região estão sendo tragados mais e mais para um atoleiro de guerras, o dever de todas as forças democrática e dos trabalhadores é de se unir mais e de unir a luta.

Traduzido do inglês por Felipe Annunziata (link da nota em inglês aqui, original em turco aqui)

Notas:

¹ HTS (Hayat Tahrir al-Tahriri al-Sham) ou Frente de Libertação do Levante é um grupo de extrema direita fundamentalista islâmico que se formou a partir de uma dissidência da Al-Qaeda.

² Partido islamista de direita do presidente autoritário turco Recep Erdogan.

³ Alauítas: minoria étnico-religiosa com grande presença na Síria e no Líbano e que era ligada ao partido do presidente deposto Bashar Al-Assad.

Fim da escala 6×1: uma das luta das mulheres

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A luta pelo fim da escala 6×1 e a redução da jornada do trabalho é central para as mulheres trabalhadoras de todo o Brasil, que se vêem exploradas pelo capital em seus empregos e no trabalho doméstico não-pago

Rede JAV SP


No último período, a mobilização pelo fim da escala 6×1 e a redução da jornada de trabalho ganhou fôlego no Brasil. Com essa força, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que transformaria o fim dessa escala exaustiva em lei, protocolada pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP), conseguiu as assinaturas necessárias para tramitar no Congresso Nacional. A PEC prevê também a redução da jornada de trabalho para 36 horas semanais, distribuídas na escala 4×3 (trabalham-se quatro dias, folgam-se três).

Trata-se de um passo significativo na história da luta de classes brasileira, tendo em vista que a última redução de jornada aconteceu em decorrência da implementação da Constituição Federal de 1988, fortemente influenciada pela luta operária que derrubou a ditadura. A pauta tem ganhado muita força de maneira orgânica no seio da classe trabalhadora, como demonstrou a luta dos trabalhadores da PepsiCo no estado de São Paulo.

Trabalhadoras lidam com escala 6×1 e trabalho doméstico

As mulheres trabalhadoras, sobretudo as mulheres pretas, estão entre as que mais sofrem com essa escala. Para além dos 6 dias que lhe são tomados de suas vidas todas as semanas e das 4 horas em média que se gasta de transporte entre casa e trabalho, as mulheres encaram dentro de casa sua segunda jornada: o trabalho doméstico.

Mas por que abordar o debate do fim da escala 6×1 a partir desse ponto de vista? A resposta é simples: uma pessoa, para poder se apresentar ao trabalho precisa, antes de mais nada, estar apta ao trabalho. Só é possível explorar o trabalhador continuamente se esse se apresentar ao seu posto nas condições mínimas de subsistência todos os dias. Em outras palavras, a venda da força de trabalho pressupõe a reprodução dessa mesma força de trabalho; a garantia e manutenção das condições materiais para que essa força de trabalho seja reproduzida.

Essa reprodução da força de trabalho, também chamada de “reprodução social do trabalho”, acontece através do trabalho doméstico. Lavar, passar, cozinhar, cuidar dos filhos e familiares idosos ou enfermos. Todas essas tarefas fazem parte da manutenção básica das condições de nossa existência e são, antes de qualquer coisa, trabalho não pago. Trabalho esse que, segundo dados da Oxfam, é em grande maioria (75%) colocado sobre as costas das mulheres. Em média, uma mulher dedica semanalmente 20 horas a mais que os homens às tarefas de manutenção do lar e da família.

Lutas se complementam

É verdade que a exploração da reprodução social do trabalho não acaba com o fim da escala 6×1 e a redução de jornada. Outras políticas como lavanderias comunitárias e restaurantes populares a preço acessível são necessárias para libertar a mulher do trabalho doméstico não pago. Um projeto de lei (PL 2762/2024) atualmente tramita na câmara para tratar de questões que tocam no assunto, visando criar uma Política Nacional de Cuidados. Embora tenha seus limites, trata-se de um grande passo no debate público sobre essa questão.

O que não se pode ignorar é o fato de que a carga global de trabalho sobre os ombros das trabalhadoras diminuirá consideravelmente caso seja aprovada a PEC do fim da escala 6×1, e esse tempo de vida arrancado de volta será dela novamente para que possa, dentre outras coisas, se organizar politicamente e avançar na conquista de mais direitos.

Na história do movimento operário, a força das mulheres trabalhadoras organizadas é facilmente perceptível. Basta lembrar que foi a mobilização de 90 mil operárias russas em 1917 em defesa melhores condições de vida e de trabalho que abriu a avenida histórica para que a classe trabalhadora – dirigida pelos bolcheviques com as palavras de ordem “Paz, Pão e Terra” – tomasse o poder e construísse o primeiro país socialista da história da humanidade, a Rússia Soviética, que assegurou à mulher seus direitos reprodutivos, socializou o trabalho doméstico e promoveu a igualdade entre os sexos.

A luta pelo fim da escala 6×1 é também uma luta pela liberdade das mulheres, e a luta das mulheres é a luta pela liberdade de toda a classe trabalhadora.

Empresas privadas encarecem e pioram serviços de transporte no Alto Tietê

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Mesmo subsidiadas com milhões de reais pelas prefeituras, as empresas privadas que gerem o transporte público na região paulista do Alto Tietê seguem aumentando o preço das passagens. Privatização também alcança terminais e pontos de ônibus, cada vez mais sucateados

Caique Tosta | Mogi das Cruzes (SP)


Mesmo após a derrota do fascista Jair Bolsonaro na última eleição presidencial, os projetos privatistas seguiram avançando em todos os níveis de governo. Ilustrativa deste cenário é a política do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), controlado pelo Governo Federal, que segue liberando enormes recursos para parcerias público-privadas, como, por exemplo, no caso da privatização de presídios.

Em São Paulo, o governador fascista Tarcísio de Freitas (Republicanos) aprovou de forma ilegal a privatização da Sabesp e agora busca avançar com a concessão das linhas ferroviárias 11, 12 e 13 da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) à iniciativa privada. O projeto privatista segue na mesma linha em diversos municípios do estado, como no âmbito do transporte na região do Alto Tietê, especialmente em Mogi das Cruzes (SP).

Os grandes empresários e os políticos da burguesia tentam enraizar no povo a ideia do “privatiza que melhora”. Apesar disso, com base na experiência da privatização do transporte coletivo na região paulista do Alto Tietê, fica claro que os serviços oferecidos por essas empresas privadas não são bons para os trabalhadores. Além disso, as atividades dessas empresas são fortemente subsidiadas com dinheiro público e, mesmo assim, todos os anos elas buscam impor aumentos abusivos nas passagens de ônibus.

Empresas querem impor tarifas abusivas

Em 2021, nos municípios de Suzano e Poá, a Radial Transporte pediu um aumento de 100% no preço da passagem, chegando a pedir o valor de R$9,00, depois reduzido para R$6,00. Com estas exigências, as negociações com as prefeituras resultaram no valor de R$5,00 (13,63% de reajuste), muito acima da inflação de 2019 e 2020 que, somadas, resultam em um aumento de 8,83%.

No mesmo ano, em Mogi das Cruzes, as empresas de ônibus forçaram uma tarifa abusiva aos mogianos. A Princesa do Norte, por exemplo, defendeu que o valor da passagem fosse R$ 7,04; já a Mogi Mob propôs um reajuste de 57,33%, ou seja, um aumento de R$2,58, sugerindo que a passagem fosse de R$4,50 para R$7,08. Além do elevado preço da passagem, ambas as empresas também pediram uma extensão na isenção do Imposto Sobre Serviço (ISS), regalia com que essas empresas de transporte são contempladas desde 2013.

Apesar das exigências ainda mais gananciosas, em 2021 o reajuste veio, levando a passagem ao valor de R$5,00. Em 2022, houve uma nova tentativa de ampliar essa tarifa já abusiva. Após conversas a portas fechadas entre as empresas e a prefeitura, em 2023, ela saltou para R$5,76.

Em 2024, as ações das empresas de transporte contrárias aos interesses da população continuaram em outras cidades do Alto Tietê, como Suzano, Poá e Ferraz de Vasconcelos: as empresas ATT Transportes e Radial Transportes tentaram aumentar o valor de R$6,30 da passagem, conseguindo em Poá. As ações escancaram que o interesse dessas empresas privadas é apenas o lucro. Por isso, em toda oportunidade, seus donos vão impor valores abusivos para aumentar seus ganhos às custas dos trabalhadores.

Empresários vivem do dinheiro do povo

Para remediar o cenário de aumento da passagem, a prefeitura de Caio Cunha (Podemos) e a Câmara de Vereadores aprovaram um “congelamento” para os próximos dois anos, onde a prefeitura subsidia R$0,76 desse valor, a um custo de R$30 milhões aos cofres públicos municipais. Ou seja, além da passagem que deve ser paga ao passar a catraca, os moradores pagam outra parte dela indiretamente por meio dos impostos da cidade.

De acordo com o G1, desses R$30 milhões que foram aprovados em subsídios, a Mogi Mob recebe R$16,7 milhões. Já a Princesa do Norte recebe o valor de 13,7 milhões.

Depois, a prefeitura de Mogi das Cruzes também aprovou um repasse de R$14 milhões para a Mogi Mob, supostamente relativo à “compressão tarifária relativa aos anos de 2018, 2019 e 2020”. A empresa ainda recebeu mais R$ 42 milhões como “indenização” por suposto desequilíbrio econômico devido à pandemia de Covid-19.

Como se não fosse o bastante, os vereadores que aprovaram esses subsídios também decidiram aprovar um projeto de lei privatizando os terminais e pontos de ônibus de Mogi das Cruzes, entregando mais um serviço público aos empresários que os financiam.

Na prática, a privatização é mais uma forma de aumentar propagandas e anúncios em pontos de ônibus, bem como cobrar mais caro para a população acessar serviços que deveriam ser públicos, não melhorando em nada a realidade dos munícipes.

A prova disso está nas concessões das estações de trem da cidade de São Paulo, onde nenhuma melhoria foi feita, mas foram instalados telões gigantes de propaganda que jogam luz na cabeça dos trabalhadores exaustos. Além disso, em Suzano, onde os terminais já são privatizados, uma catraca foi instalada para cobrar pelo acesso ao banheiro. Nessa lógica da propriedade privada, se não se organizar para barrar esse tipo de avanço e lutar para acabar com o capitalismo, o povo logo será “privado” de tudo.

Lutar pela estatização e gestão popular dos transportes

Em 2018, o ex-vereador de Suzano, Zé Perueiro, e outros sete foram condenados por utilizarem uma cooperativa de vans para lavagem de dinheiro. A situação é similar na capital paulista, onde o crime organizado, por meio de empresas privadas de transporte, lixo e organizações sociais de saúde, está ganhando licitações públicas e desviando dinheiro para financiar suas ações.

Torna-se cada vez mais claro que as empresas privadas sempre transformam o transporte, que deveria ser um serviço público, em fonte de gordos lucros para uma minoria de burgueses, e frequentemente também em ninho de corrupção.

Nunca antes a frase “lucros privados e prejuízos socializados” foi tão posta à prova: se os prejuízos com o péssimo serviço e a concessão de enormes subsídios são todos dos trabalhadores e os recursos dos municípios sustentam o negócio dos empresários do transporte no Alto Tietê e no resto do país, porque não são criadas empresas públicas para atender às necessidades do povo em vez de encher os bolsos dos ricos?

Em seu programa, a Unidade Popular pelo Socialismo (UP) defende a imediata “estatização de todos os meios de transporte coletivo”. Além disso, os comunistas apontam que é necessário que a gestão dessas empresas seja feita pelos próprios trabalhadores e pela população, pois só os que utilizam e manejam todos os dias esse serviço é que poderão orientá-lo a atender às necessidades de quem constroi a sociedade.

Para isso, a UP convoca toda a população a se organizar junto aos movimentos sociais e ampliar a denúncia das privatizações entre os vizinhos, colegas de trabalho e familiares, intensificando a luta contra os problemas que afetam a vida da classe trabalhadora. Como em tudo o que já foi conquistado pela classe trabalhadora na história do Brasil, a luta pelo fim dos abusos dos empresários na mobilidade urbana e por um serviço de transporte estatal e popular precisa ser coletiva e organizada.