UM JORNAL DOS TRABALHADORES NA LUTA PELO SOCIALISMO

terça-feira, 26 de novembro de 2024
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O Socialismo Científico – Parte IV

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Generalização da troca
(Continuação)

Toda sociedade baseada na produção de mercadorias apresenta a particularidade de que nela os produtores perdem o comando sobre suas próprias relações sociais. Cada qual produz para si, com os meios de produção de que consegue dispor, e para as necessidades de seu intercâmbio privado.

Ninguém sabe qual a quantidade de artigos do mesmo tipo que os demais lançam no mercado, nem da quantidade que o mercado necessita; ninguém sabe se seu produto individual corresponde a uma demanda efetiva, nem se poderá cobrir os gastos, nem sequer, em geral, se poderá vendê-lo. A anarquia impera na produção social. Mas a produção de mercadorias tem, como toda forma de produção, suas leis características, próprias e inseparáveis dela; e essas leis abrem caminho apesar da anarquia, na própria anarquia e através dela. Tomam corpo na única forma de enlace social que subsiste: na troca, e se impõem aos produtores individuais sob a forma das leis imperativas da concorrência. A princípio, esses produtores as ignoram, e é preciso que uma larga experiência vá revelando-as, pouco a pouco. Impõem-se, pois, sem os produtores, e mesmo contra eles, como leis naturais cegas que presidem essa forma de produção. O produto impera sobre o produtor.

Na sociedade medieval, e, sobretudo, em seus primeiros séculos, a produção destinava-se principalmente ao consumo próprio, a satisfazer apenas às necessidades do produtor e sua família. E onde, como acontecia no campo, subsistiam relações pessoais de vassalagem, contribuía também para satisfazer às necessidades do senhor feudal. Não se produzia, pois, nenhuma troca, nem os produtos revestiam, portanto, o caráter de mercadorias. A família do lavrador produzia quase todos os objetos de que necessitava: utensílios, roupas e viveres. Só começou a produzir mercadorias quando começou a criar um excedente de produtos, depois de cobrir suas próprias necessidades e os tributos em espécie que devia pagar ao senhor feudal; esse excedente, lançado no intercâmbio social, no mercado, para sua venda, converteu-se em mercadoria. Os artesãos das cidades, por certo, tiveram que produzir para o mercado desde o primeiro momento. Mas também elaboravam eles próprios a maior parte dos produtos de que necessitavam para seu consumo; tinham suas hortas e seus pequenos campos, apascentavam seu gado nos campos comunais, que lhes forneciam também madeira e lenha; suas mulheres fiavam o linho e a lã, etc. A produção para a troca, a produção de mercadorias, achava-se em seu inicio. Por isso, o intercâmbio era limitado, o mercado era reduzido, o modo de produção era estável. Em face do exterior imperava o exclusivismo local; no interior, a associação local: a marca no campo, as corporações nas cidades.

Mas ao estender-se a produção de mercadorias e, sobretudo, ao aparecer o modo capitalista de produção, as leis da produção de mercadorias, que até aqui haviam apenas dado sinais de vida, passam a funcionar de maneira aberta e poderosa. As antigas associações começam a perder força, as antigas fronteiras vão caindo por terra, os produtores vão convertendo-se mais e mais em produtores de mercadorias independentes e isolados. A anarquia da produção social sai à luz e se aguça cada vez mais.

Anarquia da produção

Mas o instrumento principal com que o modo de produção capitalista fomenta essa anarquia na produção social é precisamente o inverso da anarquia: a crescente organização da produção com caráter social, dentro de cada estabelecimento de produção. Por esse meio, põe fim à velha estabilidade pacífica. Onde se implanta num ramo industrial, não tolera a seu lado nenhum dos velhos métodos. Onde se apodera da indústria artesanal, ela a destrói e aniquila. O terreno de trabalho transforma-se num campo de batalha. As grandes descobertas geográficas e as empresas de colonização que as acompanham multiplicam os mercados e aceleram o processo de transformação de oficina do artesão em manufatura. E a luta não eclode somente entre os produtores locais isolados; as contendas locais não adquirem envergadura nacional, e surgem as guerras comerciais dos séculos XVII e XVIII 10. Até que, por fim, a grande indústria e a implantação do mercado mundial dão caráter universal à luta, ao mesmo tempo que lhe imprimem uma inaudita violência. Tanto entre os capitalistas individuais como entre industriais e países inteiros, a primazia das condições – natural ou artificialmente criadas – da produção decide a luta pela existência. O que sucumbe é esmagado sem piedade. É a luta darwinista da existência individual transplantada, com redobrada fúria, da natureza para a sociedade. As condições naturais de vida da besta convertem-se no ponto culminante do desenvolvimento humano. A contradição entre a produção social e a apropriação capitalista manifesta-se agora como antagonismo entre a organização da produção dentro de cada fábrica e a anarquia da produção no seio de toda a sociedade.

ENFELS, F. Do Socialismo utópico ao socialismo científico

Lançado livro sobre conspirações contra Stálin

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O professor e historiador estadunidense Grover Furr (A Verdade, nº 118) acaba de ter mais um livro publicado na Rússia, em parceria com o historiador russo Vladimir Bobrov: “1937. Stalin’s Justice: Not Subject to Appeal”(“1937. A justiça de Stálin: não cabe recurso”, em tradução livre). A dupla já teve um livro recentemente publicado naquele país, Antistalinskaia podlost, que nos próximos meses finalmente receberá uma tradução para o inglês, com o título “Khrushchev lied!” (ou “Khrushchev mentiu!”).

O novo livro é uma pesquisa sobre as conspirações da década de 1930 na União Soviética, que levaram aos famosos julgamentos públicos, desonestamente chamados de “o grande terror”.

Na introdução da obra, Furr e Bobrov afirmam que a maioria de tudo aquilo escrito até hoje sobre as conspirações de 1930 está errada. Pior: “A maioria de tudo isso é fraudulenta, deliberadamente desonesta.”

“A conclusão de nosso estudo, portanto, é que nenhuma das pesquisas anticomunistas contemporâneas sobre as conspirações de oposição pode ser acreditada. Todas são parte de um acordo tácito para denegrir, demonizar e falsificar a história soviética do período de Stálin”, afirmam os autores.

Furr e Bobrov investigam, em primeira mão, documentos mantidos em segredo de estado pelo governo soviético (e posteriormente pelo governo russo) e que aos poucos estão sendo publicados. Apesar dos arquivos ainda serem escassos, os autores afirmam que já se podem delinear os contornos do que realmente aconteceu.

“As conspirações de oposição dos anos 1930 estão entre as piores falsificações da história soviética. Historiadores famosos, em sua maioria anticomunistas, continuam simplesmente a negar que essas conspirações de fato existiram. Eles estão errados. Essas conspirações realmente existiram. As evidências de fontes primárias agora disponíveis confirmam que os relatos feitos dessas conspirações nos julgamentos públicos de Moscou são corretos.”

Um dos casos analisados no livro é o de Bukhárin, caso que chamou muito a atenção de Nikita Khrushchev e, uma geração depois, também de Mikhail Gorbachev. Furr e Bobrov provam, com o auxílio de um documento recentemente descoberto e ainda extremamente sigiloso na Rússia, que a “reabilitação” de Bukhárin pela Corte Suprema soviética em 1998 foi fraudulenta. A Procuradoria e a Suprema Corte possuíam evidências de que Bukhárin era culpado quando foi julgado, mas as suprimiram e o declararam “inocente”.

No entanto, os historiadores apresentam um resumo de todas as evidências contra Bukhárin, as quais provam que ele era, sem sombra de dúvida, culpado. E essas evidências, por consequência, também comprometem outros acusados, como o marechal Mikhail Tukhachevskii.

Baseando-se em materiais de primeira mão e com extremo rigor metodológico, os autores afirmam que a obra é uma “tentativa em descobrir a verdade sobre eventos de grande importância para a história da Rússia e para todo o mundo… A refutação de mentiras e a descoberta da verdade não é apologética, nem é ‘stalinismo’. É o dever de qualquer historiador.”

E pedem, àqueles leitores interessados em aprender a verdade, o seu criticismo: “Seremos muito gratos a todos vocês que nos informarem sobre quaisquer erros de documentação e de raciocínio.” O que soa também como um desafio a todos aqueles anticomunistas e falsificadores da história.

Glauber Ataide, Belo Horizonte

O Socialismo Científico – Parte III

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O antagonismo entre as forças produtivas e a propriedade capitalista conduz ao antagonismo de classes

Na produção de mercadorias, tal como se havia desenvolvido na Idade Média, não podia surgir o problema de a quem pertencer os produtos do trabalho. O produtor individual criava-os, geralmente, com matérias-primas de sua propriedade, produzidas não poucas vezes por ele mesmo, com seus próprios meios de trabalho e elaborados com seu próprio trabalho manual ou de sua família. Não necessitava, portanto, apropriar-se deles, pois já eram seus pelo simples fato de produzi-los. A propriedade dos produtos baseava-se, pois, no trabalho pessoal. E mesmo naqueles casos em que se empregava a ajuda alheia, esta era, em regra, acessória, e recebia freqüentemente, além do salário, outra compensação: o aprendiz e o oficial das corporações não trabalhavam menos pelo salário e pela comida do que para aprender a chegar a ser mestres algum dia. Sobrevém a concentração dos meios de produção em grandes oficinas e manufaturas, sua transformação em meios de produção realmente sociais. Entretanto, esses meios de produção e seus produtos sociais foram considerados como se continuassem a ser o que eram antes: meios de produção e produtos individuais. E se até aqui o proprietário dos meios de trabalho se apropriara dos produtos, porque eram, geralmente, produtos seus e a ajuda constituía uma exceção, agora o proprietário dos meios de trabalho continuava apoderando-se do produto, embora já não fosse um produto seu, mas fruto exclusivo do trabalho alheio. Desse modo, os produtos, criados agora socialmente, não passavam a ser propriedade daqueles que haviam posto realmente em marcha os meios de produção e eram realmente seus criadores, mas do capitalista. Os meios de produção e a produção foram convertidos essencialmente em fatores sociais. E, no entanto, viam-se submetidos a uma forma de apropriação que pressupõe a produção privada individual, isto é, aquela em que cada qual é dono de seu próprio produto e, como tal, comparece com ele ao mercado. O modo de produção se vê sujeito a essa forma de apropriação apesar de destruir o pressuposto sobre o qual repousa. Nessa contradição, que imprime ao novo modo de produção o seu caráter capitalista, encerra-se em germe, todo o conflito dos tempos atuais. E quanto mais o novo modo de produção se impõe e impera em todos os campos fundamentais da produção e em todos os países economicamente importantes, afastando a produção individual, salvo vestígios insignificantes, maior é a evidência com que se revela a incompatibilidade entre a produção social e a apropriação capitalista.

Os primeiros capitalistas já se encontraram, como ficou dito, com a forma do trabalho assalariado. Mas como exceção, como ocupação secundária, como simples ajuda, como ponto de transição. O lavrador que saía de quando em vez para ganhar uma diária, tinha seus dois palmos de terra própria, graças às quais, em caso extremo, podia viver. Os regulamentos das corporações velavam para que os oficiais de hoje se convertessem amanhã em mestres. Mas, logo que os meios de produção adquiriram um caráter social e se concentraram em mãos dos capitalistas, as coisas mudaram. Os meios de produção e os produtos do pequeno produtor individual foram sendo cada vez mais depreciados, até que a esse pequeno produtor não ficou outro recurso senão ganhar um salário pago pelo capitalista. O trabalho assalariado, que era antes exceção e mera ajuda, passou a ser regra e forma fundamental de toda a produção, e o que era antes ocupação acessória se converte em ocupação exclusiva do operário. O operário assalariado temporário transformou-se em operário assalariado para toda a vida. Ademais, a multidão desses para sempre assalariados vê-se engrossada em proporções gigantescas pela derrocada simultânea da ordem feudal, pela dissolução das mesnadas dos senhores feudais, a expulsão dos camponeses de suas terras, etc. Realizara-se o completo divórcio entre os meios de produção concentrados nas mãos dos capitalistas, de um lado, e, de outro lado, os produtores que nada possuíam além de sua própria força de trabalho. A contradição entre a produção social e a apropriação capitalista reveste a forma de antagonismo entre o proletariado e a burguesia.

Generalização da troca

Vimos que o modo de produção capitalista introduziu-se numa sociedade de produtores de mercadorias, de produtores individuais, cujo vinculo social era o intercâmbio de seus produtos. Mas toda sociedade baseada na produção de mercadorias apresenta a particularidade de que nela os produtores perdem o comando sobre suas próprias relações sociais. Cada qual produz para si, com os meios de produção de que consegue dispor, e para as necessidades de seu intercâmbio privado. Ninguém sabe qual a quantidade de artigos do mesmo tipo que os demais lançam no mercado, nem da quantidade que o mercado necessita; ninguém sabe se seu produto individual corresponde a uma demanda efetiva, nem se poderá cobrir os gastos, nem sequer, em geral, se poderá vendê-lo. A anarquia impera na produção social. Mas a produção de mercadorias tem, como toda forma de produção, suas leis características, próprias e inseparáveis dela; e essas leis abrem caminho apesar da anarquia, na própria anarquia e através dela. Tomam corpo na única forma de enlace social que subsiste: na troca, e se impõem aos produtores individuais sob a forma das leis imperativas da concorrência. A princípio, esses produtores as ignoram, e é preciso que uma larga experiência vá revelando-as, pouco a pouco. Impõem-se, pois, sem os produtores, e mesmo contra eles, como leis naturais cegas que presidem essa forma de produção. O produto impera sobre o produtor.

(Do socialismo utópico ao socialismo científico)

(Continua)

“Acusações de Kruschev contra Stálin são falsas”, afirma historiador

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Professor Grover Furr

A Verdade entrevistou Grover Furr, professor da Universidade de Montclair, no Estado de Nova Jersey, EUA, e autor do livro Antistalinskaia Podlost (“A infâmia antistalinista”), lançado recentemente em Moscou, na Rússia. Grover Furr é ph.D. em literatura comparada (medieval) pela Universidade de Princeton, e, desde 1970, ensina na Universidade de Montclair, sendo responsável pelos cursos de Guerra do Vietnã e Literatura de Protesto Social, entre outros. Suas principais áreas de pesquisa são o marxismo, a história da URSS e do movimento comunista internacional e os movimentos políticos e sociais. Nesta entrevista, o professor Grover fala de sua pesquisa e afirma que “60 de 61 acusações que  o primeiro-ministro Nikita Kruschev fez contra Stálin são comprovadamente falsas”.

A Verdade – Recentemente, um grande número de livros tem sido publicado atacando a pessoa e a obra de Josef Stálin. Como o senhor explica a intensificação desse antistalinismo nos EUA e no mundo?

Grover Furr – Desde o fim da década de 1920, Stálin tem sido o maior alvo do anticomunismo ideológico e acadêmico. Leon Trótsky atacava Stálin para justificar sua própria incapacidade de ganhar as massas trabalhadoras da União Soviética [URSS]. A verdadeira causa da derrota de Trótsky é que sua interpretação do marxismo – um tipo de determinismo econômico extremado – predizia que a revolução estava fadada ao fracasso a não ser que fosse seguida por outras revoluções nos países industrialmente avançados. Mas a liderança do Partido preferiu o plano de Stálin para primeiro construir o socialismo em um só país. As ideias de Trótsky tiveram (e ainda têm) uma grande influência sobre todos aqueles declaradamente capitalistas e anticomunistas. Os historiadores trotskistas são muito bem acolhidos pelos historiadores capitalistas. Pierre Broué e Vadim Rogovin, os mais proeminentes historiadores trotskistas das últimas décadas, já foram louvados e ainda são frequentemente citados por historiadores abertamente reacionários. Muitos na liderança do Partido em 1930 combateram Stálin quando este lutava por democracia interna no Partido e, especialmente, por eleições democráticas para os sovietes. As grandes conspirações da década de 1930 revelaram a existência de uma ampla corrente de oposição às políticas associadas a Stálin. Essas conspirações de fato existiam: os oposicionistas realmente estavam tentando derrubar o partido soviético e assassinar a liderança do governo, ou tomar o poder liderando uma revolta na retaguarda, em colaboração com os alemães e os japoneses. Nikolai Ezhov, líder da NKVD (o Comissariado do Povo para Assuntos Internos), tinha sua própria conspiração direitista, incluindo colaboração com o Eixo. Visando aos seus próprios fins; ele executou centenas de milhares de cidadãos soviéticos completamente inocentes para minar a confiança e a lealdade ao governo soviético. Quando Stálin morreu, Kruschev e muitos líderes do Partido viram que poderiam jogar a culpa por essas grandes repressões em cima de Stálin. Eles também inventaram muitas outras mentiras escancaradas sobre Stálin, Lavrentii Béria e pessoas próximas aos dois. Quando, bem mais tarde (1985), [Mikhail] Gorbachev assumiu o poder, ele também percebeu que as suas “reformas” capitalistas – o distanciamento do socialismo em direção a relações capitalistas de mercado– poderiam ser justificadas se sua campanha anticomunista fosse descrita como uma tentativa de “corrigir os crimes de Stálin”. Essas mentiras e histórias de horror permanecem como a principal forma de propaganda anticomunista, hoje, no mundo. A tendência é que elas se intensifiquem, pois os capitalistas estão diminuindo os salários e retirando benefícios sociais dos trabalhadores, caminhando em direção a um exacerbado nacionalismo, ao racismo e à guerra.

A Verdade – O que o levou a se interessar pela história da URSS?

Grover Furr – Quando estava na faculdade, de 1965 a 1969, eu fazia protestos contra a guerra dos EUA no Vietnã. Um dia, alguém me disse que os comunistas vietnamitas não poderiam ser “caras legais” porque eram todos “stalinistas”, e “Stálin tinha matado milhões de pessoas inocentes”. Isso ficou na minha cabeça. Foi provavelmente por isso que, no início da década de 1970, li a primeira edição do livro O grande terror, de Robert Conquest. Fiquei impressionado quando o li! Mas eu já tinha um certo domínio do russo e podia ler neste idioma, pois já vinha estudando literatura russa desde o ensino médio. Então examinei o livro de Robert Conquest com muito cuidado. Aparentemente ninguém ainda havia feito isso! Descobri, então. que Conquest fora desonesto no uso de suas fontes. Suas notas de rodapé não davam suporte a nenhuma de suas conclusões “anti-Stálin”. Ele basicamente fez uso de qualquer fonte que fosse hostil a Stálin, independentemente de se era confiável ou não. Decidi, então, escrever alguma coisa sobre o “grande terror”. Demorou um longo tempo, mas finalmente foi publicado em 1988. Durante este tempo estudei as pesquisas que estavam sendo feitas por novos historiadores da URSS, entre os quais Arch Getty, Robert Thurston e vários outros.

A Verdade – Seu livro Antistalinskaia Podlost (“A infâmia anti-stalinista”) foi recentemente publicado em Moscou. Conte um pouco sobre ele.

Grover Furr – Há aproximadamente uma década fiquei sabendo da grande quantidade de documentos que estavam sendo revelados dos antigos arquivos secretos soviéticos, e comecei a estudá-los. Li em algum lugar que uma ou duas das declarações de Kruschev em sua famosa “fala secreta”, de 1956, foram identificadas como falsas do início ao fim. Daí, pensei que poderia fazer algumas pesquisas e escrever um artigo apontando alguns outros erros de seu pronunciamento da “sessão secreta”. Nunca esperei descobrir que tudo o que Kruschev disse – 60 de 61 acusações que ele fez contra Stálin e Béria – eram comprovadamente falsas (não pude encontrar nada que comprovasse a 61ª)! Percebi que este fato mudava tudo, uma vez que praticamente toda a “história” anticomunista desde 1956 se baseia ou em Kruschev ou em escritores de sua época. Verifiquei que a história soviética do período de Stálin que todos aprendemos era completamente falsa. Não apenas “um erro aqui e outro ali”, mas fundamentalmente uma fraude gigantesca, a maior fraude histórica do século! E meus agradecimentos ao colega de Moscou Vladimir L. Bobrov, que foi o primeiro a me mostrar esses documentos, me deu inestimáveis conselhos, várias vezes, e fez um excelente trabalho de tradução de todo o livro. Sem o dedicado trabalho de Vladimir, nada disso teria acontecido.

A Verdade – Em suas pesquisas o senhor teve acesso direto a arquivos soviéticos abertos recentemente.  O que esses documentos revelam sobre os “milhões de mortos” sob o socialismo, especificamente no período de Stálin?

Grover Furr – Considerando que pessoas morrem a todo instante, eu suponho que você esteja falando de mortes “excedentes”. A Rússia e a Ucrânia sempre experimentaram fomes a cada três, quatro anos. A fome de 1932-33 ocorreu durante a coletivização. Sem dúvida, que um número maior de pessoas morreu do que teria morrido naturalmente. No entanto, muito mais pessoas iriam morrer em sucessivas fomes – a cada três, quatro anos, indefinidamente, no futuro – se não fosse feita a coletivização. A coletivização significou que a fome de 1932-33 foi a última, com exceção da grave fome de 1946-1947, que foi muito pior, mas isso devido à guerra. E, como mencionei anteriormente, Nikolai Ezhov deliberadamente matou milhares de pessoas inocentes. É interessante considerar o que poderia ter sucedido se a URSS não houvesse coletivizado a agricultura e não tivesse acelerado seu programa de industrialização, e se as conspirações da oposição nos anos 1930 não tivessem sido esmagadas. Se a URSS não tivesse feito a coletivização, os nazistas e os japoneses a teriam conquistado. Se o governo de Stálin não houvesse contido as conspirações direitistas, trotskistas, nacionalistas e militares, os japoneses e os alemães teriam conquistado o país. Em qualquer um desses casos, as vítimas entre os cidadãos soviéticos teriam sido muito, muito mais numerosas do que os 28 milhões mortos na guerra. Os nazistas teriam matado muito mais  eslavos ou  judeus do que mataram. Com os recursos, e talvez até mesmo com os exércitos da URSS do seu lado, os nazistas teriam sido muito, muito mais fortes contra a Inglaterra, a França e os EUA. Com os recursos soviéticos e o petróleo de Sakhalin, os japoneses teriam matado muito, muito mais americanos do que fizeram. O fato é que a URSS sob Stálin salvou o mundo do fascismo não apenas uma vez, durante a guerra, mas três vezes: pela coletivização; pelo desbaratamento das oposições direitista-trotskista-militares e também na guerra. Quantos milhões isso dá?

A Verdade – Alguns autores vêm tentando encontrar semelhanças entre Stálin e Hitler, e alguns até chegam a afirmar que o suposto “stalinismo” foi “pior” que o nazismo. Existia realmente alguma ligação entre Stálin e Hitler? 

Grover Furr – Os anticomunistas e os pró-capitalistas não discutem a luta de classes e a exploração. De fato, eles ou fingem que essas coisas não existem ou que não são importantes. Mas a luta de classes causada pela exploração é o motor da história. Então omitir isso significa falsificar a história. Hitler era um capitalista, um anticomunista autoritário de um tipo que é comum em vários países capitalistas. Stálin liderou o Partido Bolchevique e a URSS quando os comunistas em todo o mundo estavam lutando contra todo tipo de exploração capitalista. Sempre que dizemos “pior”, devemos sempre nos perguntar: “Pior para quem?” A URSS e o movimento comunista durante o período de Stálin foram definitivamente “piores que o nazismo”, para os capitalistas. Essa é a razão de os capitalistas odiarem tanto Stálin e o comunismo. O movimento comunista durante o período de Lênin e Stálin, e ainda por um bom tempo depois, foi a maior força de libertação humana da história. E novamente devemos nos perguntar: “Libertação de quem? Libertação do quê?” A resposta é: libertação da classe trabalhadora de todo o mundo, da exploração capitalista, da miséria e das guerras.

A Verdade – Um dos ataques mais frequentes a Stálin é que ele seria responsável pela fome na Ucrânia, em 1932-1933, também chamada de Holodomor. Esta versão da história corresponde ao que realmente ocorreu?

Grover Furr – O “Holodomor” é um mito. Nunca aconteceu. Esse mito foi inventado por ucranianos nacionalistas pró-fascistas, junto com os nazistas. Douglas Tottle comprovou isso em seu livro Fraud, Famine and Fascism(1988). Arch Getty, um dos melhores historiadores burgueses (isso é, não marxistas, não comunistas), também tem um bom artigo sobre isso. Até o próprio Robert Conquest deixou de defender sua antiga versão de que os soviéticos deliberadamente causaram a fome na Ucrânia. Nenhuma sombra de prova que poderia confirmar essa visão jamais veio à luz. O mito do “Holodomor” persiste porque ele é o “mito fundacional” do nacionalismo direitista ucraniano. Os nacionalistas ucranianos que invadiram a URSS juntamente com os nazistas mataram milhões de pessoas, incluindo muitos ucranianos. Sua única “desculpa” é propagandear a mentira de que eles “lutaram pela liberdade” contra os comunistas soviéticos, que eram “piores”.

A Verdade – Deixe uma mensagem para os trabalhadores brasileiros.

Grover Furr – Lutem pelo comunismo! Todo o poder à classe trabalhadora de todo o mundo!

Glauber Ataide, Belo Horizonte

O Socialismo Científico – Parte II

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O conflito entre o regime da produção e o regime da propriedade

Em que consiste esse conflito?

Antes de sobrevir a produção capitalista, isto é, na Idade Média, dominava, com caráter geral, a pequena indústria, baseada na propriedade privada do trabalhador sobre seus meios de produção: no campo, a agricultura corria a cargo de pequenos lavradores, livres ou vassalos; nas cidades, a indústria achava-se em mãos dos artesãos. Os meios de trabalho – a terra, os instrumentos agrícolas, a oficina, as ferramentas – eram meios de trabalho individual, destinados unicamente ao uso individual e, portanto, forçosamente, mesquinhos, diminutos, limitados. Mas isso mesmo levava a que pertencessem, em geral, ao próprio produtor. O papel histórico do modo capitalista de produção e seu portador – a burguesia – consistiu precisamente em concentrar e desenvolver esses dispersos e mesquinhos meios de produção, transformando-os nas poderosas alavancas produtoras dos tempos atuais.

Esse processo, que a burguesia vem desenvolvendo desde o século XV e que passa historicamente pelas três etapas da cooperação simples, a manufatura e a grande indústria, é minuciosamente exposto por Marx na seção quarta de OCapital. Mas a burguesia, como fica também demonstrado nessa obra, não podia converter aqueles primitivos meios de produção em poderosas forças produtivas sem transformá-los de meios individuais de produção em meios sociais, só manejáveis por uma coletividade de homens. A roca, o tear manual e o martelo do ferreiro foram substituídos pela máquina de fiar, pelo tear mecânico, pelo martelo movido a vapor; a oficina individual deu o lugar à fábrica, que impõe a cooperação de centenas e milhares de operários. E, com os meios de produção, transformou-se a própria produção, deixando de ser uma cadeia de atos individuais para converter-se numa cadeia de atos sociais, e os produtos transformaram-se de produtos individuais em produtos sociais. O fio, as telas, os artigos de metal que agora saíam da fábrica eram produto do trabalho coletivo de um grande número de operários, por cujas mãos tinha que passar sucessivamente para sua elaboração. Já ninguém podia dizer: isso foi feito por mim, esse produto é meu.

Mas onde a produção tem por forma principal um regime de divisão social do trabalho criado paulatinamente, por impulso elementar, sem sujeição a plano algum, a produção imprime aos produtos a forma de mercadoria, cuja troca, compra e venda permitem aos diferentes produtores individuais satisfazer suas diversas necessidades. E isso era o que acontecia na Idade Média. O camponês, por exemplo, vendia ao artesão os produtos da terra, comprando-lhe em troca os artigos elaborados em sua oficina. Nessa sociedade de produtores isolados, de produtores de mercadorias, veio a introduzir-se mais tarde o novo modo de produção. Em meio àquela divisão elementar do trabalho, sem plano nem sistema, que imperava no seio de toda a sociedade, o novo modo de produção implantou a divisão planificada do trabalho dentro de cada fábrica; ao lado da produção individual surgiu a produção social. Os produtos de ambas eram vendidos no mesmo mercado e, portanto, a preços aproximadamente iguais. Mas a organização planificada podia mais que a divisão elementar do trabalho; as fábricas em que o trabalho estava organizado socialmente elaboravam seus produtos mais baratos que os pequenos produtores isolados. A produção individual foi pouco a pouco sucumbindo em todos os campos e a produção social revolucionou todo o antigo modo de produção. Contudo, esse caráter revolucionário passava despercebido; tão despercebido que, pelo contrário, se implantava com a única e exclusiva finalidade de aumentar e fomentar a produção de mercadorias. Nasceu diretamente ligada a certos setores de produção e troca de mercadorias que já vinham funcionando: o capital comercial, a indústria artesanal e o trabalho assalariado. E já que surgia como uma nova forma de produção de mercadorias, mantiveram-se em pleno vigor sob ela as formas de apropriação da produção de mercadorias.

Na produção de mercadorias, tal como se havia desenvolvido na Idade Média, não podia surgir o problema de a quem pertencer os produtos do trabalho. O produtor individual criava-os, geralmente, com matérias-primas de sua propriedade, produzidas não poucas vezes por ele mesmo, com seus próprios meios de trabalho e elaborados com seu próprio trabalho manual ou de sua família. Não necessitava, portanto, apropriar-se deles, pois já eram seus pelo simples fato de produzi-los. A propriedade dos produtos baseava-se, pois, no trabalho pessoal. E mesmo naqueles casos em que se empregava a ajuda alheia, esta era, em regra, acessória, e recebia freqüentemente, além do salário, outra compensação: o aprendiz e o oficial das corporações não trabalhavam menos pelo salário e pela comida do que para aprender a chegar a ser mestres algum dia. Sobrevém a concentração dos meios de produção em grandes oficinas e manufaturas, sua transformação em meios de produção realmente sociais. Entretanto, esses meios de produção e seus produtos sociais foram considerados como se continuassem a ser o que eram antes: meios de produção e produtos individuais. E se até aqui o proprietário dos meios de trabalho se apropriara dos produtos, porque eram, geralmente, produtos seus e a ajuda constituía uma exceção, agora o proprietário dos meios de trabalho continuava apoderando-se do produto, embora já não fosse um produto seu, mas fruto exclusivo do trabalho alheio. Desse modo, os produtos, criados agora socialmente, não passavam a ser propriedade daqueles que haviam posto realmente em marcha os meios de produção e eram realmente seus criadores, mas do capitalista. Os meios de produção e a produção foram convertidos essencialmente em fatores sociais. E, no entanto, viam-se submetidos a uma forma de apropriação que pressupõe a produção privada individual, isto é, aquela em que cada qual é dono de seu próprio produto e, como tal, comparece com ele ao mercado. O modo de produção se vê sujeito a essa forma de apropriação apesar de destruir o pressuposto sobre o qual repousa. Nessa contradição, que imprime ao novo modo de produção o seu caráter capitalista, encerra-se em germe, todo o conflito dos tempos atuais. E quanto mais o novo modo de produção se impõe e impera em todos os campos fundamentais da produção e em todos os países economicamente importantes, afastando a produção individual, salvo vestígios insignificantes, maior é a evidência com que se revela a incompatibilidade entre a produção social e a apropriação capitalista.

(Extraído do livro Do socialismo utópico ao socialismo científico de F. Engels)

O Socialismo Científico – Parte I

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O texto aqui reproduzido é a primeira parte de uma seleção do livro de Friedrich Engels, Do socialismo utópico ao socialismo científico. Neste texto você entenderá a origem histórica, de maneira dialética, das relações sociais e de bens, como também como se desenvolve as forças produtivas nas sociedades. 

A concepção materialista da história parte da tese de que a produção, e com ela a troca dos produtos, é a base de toda a ordem social; de que em todas as sociedades que desfilam pela história, a distribuição dos produtos, e juntamente com ela a divisão social dos homens em classes ou camadas, é determinada pelo que a sociedade produz e como produz e pelo modo de trocar os seus produtos. De conformidade com isso, as causas profundas de todas as transformações sociais e de todas as revoluções políticas não devem ser procuradas nas cabeças dos homens nem na idéia que eles façam da verdade eterna ou da eterna justiça, mas nas transformações operadas no modo de produção e de troca; devem ser procuradas não na filosofia, mas na economia da época de que se trata. Quando nasce nos homens a consciência de que as instituições sociais vigentes são irracionais e injustas, de que a razão se converteu em insensatez e a bênção em praga, isso não é mais que um indício de que nos métodos de produção e nas formas de distribuição produziram-se silenciosamente transformações com as quais já não concorda a ordem social, talhada segundo o padrão de condições econômicas anteriores. E assim já está dito que nas novas relações de produção têm forçosamente que conter-se – mais ou menos desenvolvidos – os meios necessários para pôr termo aos males descobertos. E esses meios não devem ser tirados da cabeça de ninguém, mas a cabeça é que tem de descobrí-los nos fatos materiais da produção, tal e qual a realidade os oferece. Qual é, nesse aspecto, a posição do socialismo moderno?

A evolução das forças produtivas

A ordem social vigente – verdade reconhecida hoje por quase todo o mundo – é obra das classes dominantes dos tempos modernos, da burguesia. O modo de produção característico da burguesia, ao qual desde Marx se dá o nome de modo capitalista de produção, era incompatível com os privilégios locais e dos estados, como o era com os vínculos interpessoais da ordem feudal. A burguesia lançou por terra a ordem feudal e levantou sobre suas ruínas o regime da sociedade burguesa, o império da livre concorrência, da liberdade de domicílio, da igualdade de direitos dos possuidores de mercadorias, e tantas outras maravilhas burguesas. Agora já podia desenvolver-se livremente o modo capitalista de produção. E ao chegarem o vapor e a nova maquinaria ferramental, transformando a antiga manufatura na grande indústria, as forças produtivas criadas e postas em movimento sob o comando da burguesia desenvolveram-se com uma velocidade Inaudita e em proporções até então desconhecidas. Mas, do mesmo modo que em seu tempo a manufatura e o artesanato, que continuava desenvolvendo-se sob sua influência, se chocavam com os entraves feudais das corporações, a grande indústria, ao chegar a um nível de desenvolvimento mais alto, já não cabe no estreito marco em que é contida pelo modo de produção capitalista. As novas forças produtivas transbordam já da forma burguesa em que são exploradas, e esse conflito entre as forças produtivas e o modo de produção não é precisamente nascido na cabeça do homem – algo assim como o conflito entre o pecado original do homem e a justiça divina – mas tem suas raízes nos fatos, na realidade objetiva, fora de nós, independentemente da vontade ou da atividade dos próprios homens que o provocaram. O socialismo moderno não é mais que o reflexo desse conflito material na consciência, sua projeção ideal nas cabeças, a começar pelas da classe que sofre diretamente suas conseqüências: a classe operária.

(Extraído do livro Do socialismo utópico ao socialismo científico de F. Engels)

Nossa principal tarefa: combater junto à classe operária

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A classe operária é a força principal para garantir e realizar a revolução socialista no Brasil. Sem ela, é impossível vencer a burguesia, seu Estado e seu exército.  Porém, muito embora todos digam que estão de acordo que a nossa tarefa central seja organizar o partido na classe operária, pouco temos avançado nesse trabalho.

Num país onde a classe operária se constitui numa gigantesca força, a ponto de o atual presidente da República ser um ex-operário, é evidente que é necessário conquistar essa classe operária para a revolução. Este é exatamente o primeiro e o mais importante trabalho que hoje temos que realizar.

No entanto, esse objetivo só será atingido se levarmos a classe operária a adquirir uma nova consciência, uma consciência política revolucionária. E para desenvolver a consciência das massas o meio mais eficaz é desenvolver suas lutas. É claro que nessas lutas, a principal ajuda que os comunistas devem dar é no sentido de avançar a consciência da classe operária. Porém, o que devemos entender por consciência de classe?
Consciência de classe dos operários é a compreensão de que o único meio de melhorar sua situação e de conseguir sua emancipação consiste na luta contra a classe dos capitalistas. Assim, consciência de classe dos operários implica a compreensão de que os interesses de todos os operários de um país são idênticos, solidários, que todos eles formam uma mesma classe, distinta de todas as demais classes da sociedade. Por último, consciência de classe dos operários significa compreender que, para alcançar seus objetivos, a classe operária precisa atuar politicamente por meio de seu partido.

Os operários só adquirem essa compreensão a partir da luta que travam contra os patrões no seu dia-a-dia. Portanto, é  estando presentes nessas lutas, atraindo um número cada vez maior de operários para elas, que os comunistas revolucionários conseguirão desenvolver uma consciência de classe no movimento operário. A atividade principal do nosso partido deve ser, portanto, a luta de classe dos operários. Mas essa atividade não deve consistir em idealizar meios de moda para alcançar a influência entre os operários, e sim aderir ao movimento operário, ou, em outras palavras, ajudar os operários na luta concreta que eles estão desenvolvendo.

A greve

Houve tempo em que a indignação dos operários contra o capital se expressava num sentimento confuso de ódio, que os levava a querer se vingar dos capitalistas. Os operários, então, destruíam as máquinas, as fábricas. Esta foi a primeira forma do movimento operário resistir à exploração. Depois, os operários começaram a compreender o antagonismo de interesses entre a classe operária e os capitalistas. E então começaram a se reunir, discutir ações comuns, organizar suas reivindicações e apresentá-las aos capitalistas, a exigir melhores condições de trabalho, aumento de salários e redução da jornada. Para ver essas reivindicações atendidas, realizavam as greves. Cada greve ensina aos operários quem são os patrões e por que eles são seus inimigos. A greve mostra também o tamanho da força da classe operária.

Cada greve enriquece a experiência de toda a classe operária. Se a greve resulta vitoriosa, mostra à classe operária a força da união dos operários e impulsiona outros a aproveitarem o êxito de seus companheiros. Se a greve não é vitoriosa, debatem-se as causas de seu fracasso e a busca de melhores meios de luta.

Nesse momento cabe ao Partido incentivar os operários, em todos os Estados a uma luta firme por suas reivindicações, a lutar por mais direitos, melhores salários e redução da jornada de trabalho. Isso significa estar atento ao surgimento de todas as lutas operárias e fazer-se presente nelas. Nessas lutas, nossa ajuda deve consistir em apoiar suas reivindicações e mostrar-lhes como devem ser encaminhadas; esclarecer quais seus direitos e quais ainda temos que lutar por conquistar. Nossa ajuda deve também orientar sobre qual a melhor maneira de expressar as reivindicações, qual a forma de luta a ser adotada, em eleger o melhor momento para a luta ser deflagrada. Por isso, o sindicato é um instrumento muito importante e, por isso também, é preciso atuar dentro dos sindicatos e conquistar dezenas, centenas e milhares de sindicatos em todo o país.

Apesar dos obstáculos que temos que superar para conquistar influência na classe operária, particularmente a hegemonia dos revisionistas nos sindicatos, é importante frisar que  a grave e profunda crise que hoje assola toda a economia capitalista mundial, como não podia deixar de ser, põe em xeque todas as posições que defendem a conciliação com o grande capital e amplia os espaços para nossa atuação.  Desse modo, adquire uma importância decisiva a tarefa de introduzir no movimento operário as idéias socialistas.

A importância de atuar nos sindicatos
Portanto, aos militantes do Partido cabe a histórica tarefa de colocar o centro dinâmico do crescimento do nosso partido na classe operária.
Em outras palavras, o trabalho operário é a principal forma de trabalho da sociedade capitalista. É aquele que garante todos os produtos que a sociedade consome. É aí, portanto, que devemos concentrar nosso trabalho. Para dar cabo desta tarefa e atender ao imperativo do caráter proletário da nossa revolução, todos os militantes devem empenhar-se, com o máximo de suas forças, para fazer crescer o partido na classe operária.
Mas para aprofundarmos os vínculos com o proletariado, necessitamos ligar o Partido com os sindicatos, isto é, fazer ingressar rapidamente, o maior número possível de comunistas revolucionários nas empresas e nos sindicatos. Só com um trabalho sistemático dos comunistas nos sindicatos operários é possível aproximar as massas operárias do Partido e adquirir sua confiança.
Isto porque, como lembra Dimitrov, “os sindicatos são, nos regimes capitalistas, o principal instrumento da luta grevista, depois da ação de massa aberta contra o capital dos monopólios e seu Estado”.
Mais: os sindicatos representam, para a classe operária e o conjunto dos trabalhadores, a principal organização na sua luta contra os capitalistas e pela defesa dos seus interesses imediatos. Para a grande maioria do proletariado, os sindicatos são suas fortalezas, que os ajudam a defender o salário e a combater os abusos dos patrões.
Assim, de todas as organizações de massas, os sindicatos são aquelas de que mais a classe operária participa e onde mais se mobiliza para lutar por seus direitos e reivindicações. Constitui, portanto, um enorme prejuízo para a Revolução, os comunistas não compreenderem a importância da atuação nos sindicatos, não compreenderem que para impulsionar a revolução é necessário que ingressem nos sindicatos e se apóiem neles. Lênin, em seu importante trabalho O esquerdismo, doença infantil do comunismo, revelou o quanto a posição esquerdista de se ausentar dos sindicatos, alegando que seus chefes são reacionários, era errada. Vejamos:

“(…) Os comunistas alemães de esquerda deduzem do caráter reacionário e contra-revolucionário  dos chefes dos sindicatos que é necessário … sair dos sindicatos!!, renunciar ao trabalho neles!!, criar formas de organização operária, novas, inventadas!! Uma estupidez tão imperdoável, que equivale aos melhores serviços que os comunistas podem prestar à burguesia. …
“Para saber ajudar as massas e conquistar sua simpatia, adesão e apoio é preciso não temer as dificuldades, mesquinharias, armadilhas, insultos, perseguições dos chefes. Além disso, devem trabalhar obrigatoriamente onde estejam as massas.”. (Lênin, Esquerdismo, a doença infantil do comunismo, Editora Símbolo)

Portanto, não atuar nos sindicatos, mesmo os que têm chefes oportunistas e reacionários, significa abandonar as massas operárias, em particular as mais atrasadas, à influência desses oportunistas e reacionários; significa beneficiar a burguesia e sua dominação política e ideológica sobre o proletariado.

De fato, de todas as organizações de massas, os sindicatos são aquelas de que mais a classe operária participa e onde mais se mobiliza para lutar. Na realidade, a primeira manifestação de consciência dos operários o leva a procurar o sindicato ou a se filiar a um sindicato. Foi assim nos séculos XVIII, XIX e XX e continua sendo até hoje. Só após tomar consciência das limitações das ações sindicais, de que apenas com os sindicatos não será possível uma mudança radical e profunda na sua situação, é que os operários percebem a necessidade de construir um instrumento mais profundo, mais avançado e mais poderoso que o sindicato, o Partido.
Como, inclusive, analisa a Conferência Internacional de Partidos e Organizações Marxista-Leninistas (CIPOML) em seu documento A situação internacional e as nossas tarefas, “Os sindicatos são centros importantes de luta e união da classe operária frente ao capital. As lutas nos últimos quinze anos demonstram essa realidade: os sindicatos se constituem, ainda, em organizações insubstituíveis para os operários. Mesmo que alguns manifestem que os sindicatos são inúteis como meios de luta, todos os sucessos da vida econômica e social mostram que  sua presença junto aos operários é mais indispensável que nunca. (…) Os sindicatos são as únicas organizações capazes de unir e organizar juntas a massa dos operários com os operários avançados”. (Revista A Nova Ordem Mundial, Edições Manoel Lisboa.2007)
Prova disso é o aumento de sindicalização que tem se verificado nos últimos anos em nosso país, como revelou estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) a partir de dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio) e divulgado em agosto de 2008. Em 1998, o Brasil tinha 11,14 milhões de trabalhadores formais e informais associados aos sindicatos.  E apesar de todo o recuo das lutas sindicais no país, o número de sindicalizados pulou para 16,59 milhões em 2006.
Em 2008, de acordo com a Secretaria de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), o número de sindicatos no Brasil era de 23.077 sindicatos. Pois bem, em quantos desses sindicatos nosso partido tem atuação? Pouquíssimos, como sabemos.
Não bastasse, para formar uma Central Sindical necessitamos de, no mínimo 100 sindicatos nas cinco regiões do país.
Em resumo, a tarefa principal para ligar nosso Partido à classe operária é, de imediato, lançar o maior número de militantes para atuar nos sindicatos operários.  Ingressar nos sindicatos operários, realizar neles um trabalho paciente mas decidido, unificar a classe operária na luta contra o capital, aumentar a influência do partido nos sindicatos e ganhar a confiança, o respeito e a simpatia dos operários, eis as tarefas que levarão nosso Partido a transformar-se no verdadeiro Partido da classe operária.
É evidente que todo esse trabalho se desenvolverá ainda mais rapidamente se realizarmos  conjuntamente brigadas deA Verdade nas fábricas e no centro das cidades, bem como se o jornal se transformar num órgão de denúncia dos abusos e da exploração que os trabalhadores sofrem em seu dia-a-dia.
Comitê Central do Partido Comunista Revolucionário (PCR) – Julho de 2009

A importância da organização das mulheres

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“De nossas concepções ideológicas se desprendem como conseqüência medidas de organização. Nada de organizações especiais de mulheres comunistas! A comunista é tão militante do Partido como é o comunista, com as mesmas obrigações e direitos. Nisto não pode haver nenhuma divergência. Entretanto não devemos fechar os olhos perante os fatos. O Partido deve contar com os órgãos – grupos de trabalho, comissões, seções, ou como se decida denominá-los – cuja tarefa principal consista em despertar as amplas massas femininas, vinculadas ao Partido, sob a sua influência. Para isto é necessário, sem dúvida, que desenvolvamos plenamente, um trabalho sistemático entre essas massas femininas. Devemos educar as mulheres que tenhamos conseguido tirar da passividade, devemos recrutá-las e armá-las para a luta de classes proletária sob a direção do Partido Comunista. Não só me refiro às proletárias que trabalham na fábrica ou se afanam no lar, como também às camponesas e às mulheres das distintas camadas da pequena-burguesia. Elas também são vítimas do capitalismo e desde a guerra são mais que nunca. Psicologia apolítica, não social, atrasada dessas massas femininas; estreiteza de seu campo de atividade, todo seu modo de vida: estes são os fatos. Não prestar atenção a isto seria inconcebível, completamente inconcebível. Necessitamos de métodos especiais de agitação e formas especiais de organização. Não se trata de uma defesa burguesa dos “direitos da mulher”, e sim, dos interesses práticos da revolução”. (Lênin)

Disse a Lênin que suas reflexões constituíam para mim um apoio valioso. Muitos camaradas, muitos bons camaradas se opunham de maneira mais decidida a que o Partido criasse órgãos especiais para um trabalho metódico entre as amplas massas femininas. Chamavam a isto retorno às tradições social-democratas, à célebre “emancipação da mulher”. Tratavam de demonstrar que os partidos comunistas, ao reconhecerem por princípio e plenamente a igualdade de direitos da mulher, devem desenvolver seu trabalho entre as massas de trabalhadores sem diferença de qualquer espécie. A maneira de trabalhar entre as mulheres deve ser a mesma que entre os homens. Todo intento de considerar na agitação e na organização as circunstâncias indicadas por Lênin é considerada pelos defensores da opinião oposta: oportunismo, traição e uma renúncia aos princípios.

-“Isto não é novo nem serve de modo algum como prova- replicou Lênin- não se deixe confundir. Por que em nenhuma nação, nem na Rússia Soviética, militam no Partido tantas mulheres quantos são os homens? Por que o número de mulheres operárias organizadas nos sindicatos é tão pequeno? Estes fatos nos obrigam a refletir. Negar a necessidade de órgãos especiais para nosso trabalho entre as extensas massas femininas é uma das manifestações muito de princípio e muito radical de nossos “queridos amigos” do Partido Operário Comunista. Segundo eles, deve existir uma só forma de organização: a união operária. Já sei. Muitas cabeças de mentalidade revolucionaria, porém embaralhadas, se remetem aos princípios e não vêem a realidade, isto é quando a inteligência se nega a apreciar os fatos concretos aos quais se deve prestar atenção. Como fazem frente, estes mantenedores da “pureza de princípios”, às necessidades que nos impõe o desenvolvimento histórico em nossa política revolucionária? Todas essas defesas vêm abaixo ante uma necessidade inexorável: sem  milhões de mulheres não podemos levar a cabo a construção comunista. Devemos encontrar o caminho que nos conduz até elas, devemos estudar muitos métodos para encontrá-lo”.

“Por isto é totalmente justo que apresentemos reivindicações em favor da mulher. Isto não é um programa mínimo, não é um programa de reformas no espírito social-democrata, no espírito da II Internacional. Isto não é o reconhecimento de que acreditamos na eternidade ou ao menos na existência prolongada da burguesia e de seu Estado. Tampouco é nossa intenção apaziguar as massas femininas com reformas e desviá-las da luta revolucionária. Isto nada tem em comum com as superstições reformistas. Nossas reivindicações existem na prática, pela tremenda miséria e pelas vergonhosas humilhações que sofre a mulher, débil e desamparada em um regime burguês. Com isto testemunhamos que conhecemos essas necessidades, que compreendemos a opressão da mulher, que compreendemos a situação privilegiada do homem e odiamos. – Sim, odiamos e queremos eliminar tudo que oprime e atormenta a operária, a mulher do operário, a camponesa, a mulher do homem simples e inclusive, e em muitos aspectos, a mulher acomodada. Os direitos e as medidas sociais que exigimos da sociedade burguesa para a mulher, são uma prova de que compreendemos a situação e os interesses da mulher e de que na ditadura proletária a teremos em conta. Desde logo, não com adormecedoras medidas de tutela; não, claro que não, sim como revolucionários que chamam a mulher a trabalhar em pé de igualdade pela transformação da economia e da superestrutura ideológica.”

Assegurei a Lênin que compartilhava de seu ponto de vista, porém, que este ponto de vista encontraria, indubitavelmente, resistência. Mentes inseguras e medrosas o rechaçariam como “oportunismo perigoso”.

-“Que vamos fazer! – Lênin exclamou, algo irritado. Este perigo se estende a tudo que digamos e façamos. Se por temor a ele nos abstivermos de atos convenientes e necessários, poderemos converter-os em índios místicos contemplativos. Nada de mover-se, nada de mover-se, senão caímos da altura de nossos princípios! Em nosso caso, não se trata simplesmente de que exijamos isto e sim de como fazemos isto. Eu acredito que sublinhei com bastante clareza, isto. Como é lógico, em nossa propaganda não devemos ficar na posição de rezar um rosário de nossas reivindicações para as mulheres. Não, dependendo das condições existentes, devemos lutar ou por uma das reivindicações ou por outra, lutar de verdade, sempre em relação aos interesses gerais do proletariado”.

“Como é lógico, cada combate nos põe em contradição com a honorável camarilha burguesa e seus não menos honoráveis lacaios reformistas. Isto obriga estes últimos a lutar ao nosso lado, sob nossa direção – coisa que não querem – ou a tirar a máscara. Portanto, a luta faz com que nos destaquemos e mostra claramente nosso perfil comunista. A luta provoca a confiança das amplas massas femininas, que se sentem exploradas, escravizadas, esgotadas pelo domínio do homem, pelo poder dos patrões e por toda sociedade burguesa em seu conjunto. As trabalhadoras, traídas e abandonadas por todos, começam a entender que devem lutar junto conosco. Devemos ainda persuadir-nos uns aos outros que a luta pelos direitos da mulher tem de vincular-se com o objetivo fundamental: com a conquista do Poder e a instauração da ditadura do proletariado. Isto é evidente, completamente evidente. Porém as amplas massas femininas, trabalhadoras, não sentirão desejo irresistível de compartilhar conosco a luta pelo Poder do Estado, se sempre apregoamos somente esta reivindicação, ainda que seja com as trombetas de Jericó! Não, não! Também devemos vincular politicamente, na consciência das massas femininas, no chamamento, com os sofrimentos, as necessidades e os desejos das trabalhadoras. Estas devem saber que a ditadura proletária significa a plena igualdade de direitos com o homem, tanto perante a lei, como na prática, na família, no Estado e na sociedade, assim como também a derrubada do poder da burguesia.”

– A Rússia Soviética está demonstrando isto, exclamei! E nos servirá de grande exemplo!

A agitação e a propaganda entre as mulheres

Lênin prosseguiu:

-“A Rússia Soviética levanta nossas reivindicações para as mulheres sob um novo aspecto. Na ditadura do proletariado, estas reivindicações já não são objeto de luta entre o proletariado e a burguesia, e sim, são tijolos para a construção da sociedade comunista. Isto mostra às mulheres estrangeiras a importância decisiva da conquista do Poder pelo proletariado. A diferença entre sua situação aqui e lá, deve ser estabelecida com precisão, para que vocês possam contar com as massas femininas na luta revolucionária de classes do proletariado. Saber mobilizá-las com uma clara compreensão dos princípios e sob uma firme base organizativa, é uma questão da qual dependem a vida e a vitória do Partido Comunista. Porém, não devemos enganar-nos. Em nossas seções nacionais não existe ainda uma compreensão cabal deste problema. Nossas seções nacionais mantêm uma atitude passiva e expectante perante a tarefa de criar, sob a direção comunista, um movimento de massas das trabalhadoras. Não compreendem que liberar esse movimento de massas e dirigi-lo constitui uma parte importante de toda a atividade do partido, inclusive a metade do trabalho geral no Partido. Às vezes, o reconhecimento da necessidade e do valor de um potente movimento feminino comunista, que tenha diante de si um objetivo claro, é um reconhecimento platônico da palavra e não uma preocupação e um dever constante do Partido.”

“São muitos poucos os maridos, inclusive entre os proletários que pensam no muito que poderiam aliviar o peso e as preocupações da mulher e até suprimi-los por completo, se quisessem ajudar no “trabalho da mulher”. Não fazem por considerar isto em contradição com o “direito e a dignidade do marido”. Este exige descanso e comodidade. A vida continua substituindo de maneira encoberta. Sua escrava vinga-se dele objetivamente, por esta situação e também de maneira velada: o atraso da mulher, sua incompreensão dos ideais revolucionários do marido, debilitam o entusiasmo deste e sua decisão de luta. Estes são os pequeninos vermes que corroem e minam as energias de modo imperceptível e lento, porém seguro. Conheço a vida dos operários não somente pelos livros. Nosso trabalho comunista entre as massas femininas precisa ser compreendido por uma parte cada vez mais considerável dos homens. Devemos extirpar, até as últimas e mais ínfimas raízes, o velho ponto de vista próprio dos tempos da escravidão. Devemos fazê-lo tanto no Partido como entre as massas. Isto se relaciona tanto com nossas tarefas políticas como à imperiosa necessidade de formar um núcleo de camaradas – homens e mulheres – que conte com uma séria preparação, teórica e prática, para realizar e impulsionar o trabalho do Partido entre as trabalhadoras.”, concluiu Lênin.

(Fonte: livro Recordações de Lênin, de Clara Zetzin)

“Lênin vive! Lênin viverá!”

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Há 138 anos, no dia 22 de abril, nasceu Vladimir Ilicht Ulianov, Lênin, líder da mais importante revolução já realizada na história da humanidade, a revolução socialista russa, e fundador da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).

Para festejar o aniversário de Lênin e homenagear o herói da classe operária mundial, uma imensa multidão, em sua grande maioria jovens, se fez presente no último dia 22 de abril na Praça Vermelha, em Moscou, onde se encontra seu mausoléu. A presença da juventude na manifestação não é à toa. Os jovens são hoje as principais vítimas do retorno do capitalismo nesse país.

Em homenagem a Lênin e à sua vida dedicada à libertação da humanidade, A VERDADE publica o artigo Lênin, organizador e chefe do Partido Comunista da Rússia, publicado no Pravda por ocasião do 50 ° aniversário do nascimento de Lênin.

Lênin, organizador e chefe do Partido Comunista da Rússia

Há dois grupos de marxistas. Ambos atuam sob a bandeira do marxismo e se crêem marxistas “autênticos”. Não obstante, estão longe de ser idênticos. Mais ainda: separa-os um abismo, pois seus métodos de trabalho são diametralmente opostos.

O primeiro desses grupos limita-se, habitualmente, a aceitar formalmente o marxismo, a reconhecê-lo convencionalmente. Não sabendo ou não querendo penetrar na essência do marxismo, não sabendo ou não querendo traduzi-lo em fatos, transforma as teses vivas e revolucionárias do marxismo em fórmulas mortas e vazias. Baseia suas atividades não na experiência, não nos ensinamentos do trabalho prático, mas em citações de Marx. Deduz suas instruções e diretivas não da análise da realidade viva, mas de analogias e paralelos históricos. A divergência entre as palavras e os atos é a principal enfermidade desse grupo. Daí as decepções e o eterno descontentamento com o destino, que a todo o momento lhe prega boas peças a o deixa “de cara à banda”. Esse grupo se chama menchevismo (na Rússia) e oportunismo (na Europa). No congresso de Londres, o camarada Tyczko (Jogiches) definiu com muita acuidade esse grupo, quando disse que ele não sustentava o ponto-de-vista marxista, antes “jazia” sobre o mesmo.

O segundo grupo, pelo contrário concede primordial importância não à aceitação formal do marxismo e, sim, à sua aplicação, à sua transformação em realidade. Concentra sobretudo sua atenção determinação, em conformidade com a situação, dos caminhos e meios de realização do marxismo e na modificação desses caminhos e meios quando a situação se transforma. Deduz suas instruções e diretivas não de analogias e paralelos históricos, mas do estudo das condições. Baseia suas atividades não em citações e máximas, mas na experiência prática, verificando experimentalmente cada um dos seus passos, aprendendo com seus erros e ensinando os outros a construir a vida nova. Daí, precisamente, que não haja divergência entre palavras e fatos nas atividades desse grupo e que os ensinamentos de Marx conservem plenamente, entre eles, sua força revolucionária viva. A esse grupo podem ser perfeitamente aplicadas as palavras de Marx, segundo as quais os marxistas não se podem contentar com interpretar o mundo; devem ir mais adiante e transformá-lo. Esse grupo se chama bolchevismo, comunismo. O organizador e chefe desse grupo é V.I.Lênin.

A formação do Partido proletário na Rússia processou-se em condições particulares, diferentes das existentes no Ocidente na ocasião em que se organizara ali o Partido operário. Enquanto no Ocidente – na França, na Alemanha – o Partido operário nasceu dos sindicatos, nas condições de uma revolução burguesa já feita, com os sindicatos e os partidos tendo existência legal, com o parlamento burguês funcionando, com a burguesia – que ascendera ao poder – defrontando-se frente a frente  com o proletariado, na Rússia, pelo contrário, formou-se o Partido do proletariado nas condições do mais feroz absolutismo, na expectativa da revolução democrático-burguesa, num momento em que, de um lado, fervilhavam nas organizações do partido os elementos burgueses “marxistas-legais”, ansiosos por utilizar a classe operária para a revolução burguesa, e de outro lado, estavam os policiais  do tzar arrebatando ao partido seus melhores militantes, num momento em que o ascenso do movimento revolucionário espontâneo impunha a existência de um firme, combativo e unido núcleo de revolucionários, suficientemente conspirativo, capaz de dirigir o movimento para a derrubada do absolutismo.

Tratava-se de separar o joio do trigo, de desfazer-se dos elementos estranhos, de organizar por todo o país quadros de revolucionários experimentados, de traçar-lhes um programa claro, uma tática e construir uma combativa organização de revolucionários profissionais, suficientemente conspirativa para poder resistis às investidas dos policiais e, ao mesmo tempo, suficientemente ligada às massas para levá-la à luta no momento preciso.

Os mencheviques, aqueles indivíduos que “jazem” sobre o ponto-de-vista marxista, resolviam o problema de modo simples: Uma vez que o Partido operário nascera, no Ocidente, dos sindicatos apartidários, que lutavam pela melhoria da situação econômica da classe operária, também na Rússia se deveria proceder tanto quanto possível, assim; quer dizer, era suficiente para o momento “a luta econômica dos operários contra os patrões e o governo” no âmbito local, não deveria ser criada nenhuma organização combativa para toda a Rússia, e mais tarde…bem, mais tarde se nesse ínterim não surgissem os sindicatos, convocar-se-ia um congresso operário não-partidário em que seria proclamado o Partido.
Mal se davam conta, naquela época, os mencheviques – e talvez até um bom número de bolcheviques – de que esse “plano marxista”, embora utópico nas condições da Rússia, acarretava um vasto trabalho de agitação, destinado a rebaixar a própria idéia do partido, a destruir os seus quadros, a deixar o proletariado privado de seu Partido e a entregar a classe operária à vontade dos liberais.

Lênin prestou um imenso serviço ao proletariado russo e a seu partido, ao revelar todo o perigo do “plano” de organização dos mencheviques, quando esse “plano” ainda estava em germe, quando seus próprios autores ainda não percebiam claramente seus contornos e, após ter revelado o perigo, ao desencadear violento ataque contra o relaxamento dos mencheviques em matéria de organização, concentrando sobre este problema a atenção de todos os militantes dedicados à atividade prática. Foi um grande serviço porque era a própria existência do Partido que estava em jogo; tratava-se de questão de vida ou morte para o Partido.

O plano que Lênin desenvolveu em seus célebres livros: Que fazer? e Um passo adiante, dois passos atrás, foi o de criar um jornal político destinado a toda a Rússia como centro de reunião das forças do Partido, organizar nas localidades os quadros firmes como “formação regulares” do partido, reunir esses quadros por meio do jornal e agrupá-los através de toda Rússia num Partido combativo, com limites nitidamente marcados, possuidor de um programa claro, de uma tática firme e de uma vontade única. Esse plano tinha o mérito de corresponder por completo à realidade russa e de generalizar magistralmente a experiência de organização dos melhores militantes dedicados ao trabalho prático. Na luta por esse plano a maioria dos militantes russos seguiu decididamente Lênin, sem recuar ante a perspectiva de uma cisão. A vitória desse plano lançou as bases deste fortemente unido e temperado Partido Comunista, sem igual no mundo.

Nossos camaradas (e não apenas os mencheviques!) acusavam frequentemente Lênin de ter excessiva inclinação pela polêmica e a cisão, de manter uma luta intransigente contra os conciliadores, etc. Por vezes foi realmente assim. Não é difícil, porém compreender que nosso Partido não teria podido acabar com a debilidade e a desarticulação internas, nem adquirir a força e o vigor que lhe são próprios, se não tivesse alijado de seu seio os elementos não proletários e oportunistas. Na época do domínio da burguesia, o Partido do proletariado só pode crescer e fortalecer-se na medida em que leve a cabo, no seu seio e entre a classe operária a luta contra os elementos oportunistas, hostis à revolução e ao Partido. Lassale tinha razão quando dizia: “o Partido fortalece-se depurando-se”. Os acusadores citavam habitualmente o Partido alemão, no qual florescia então a “unidade”. Mas, em primeiro lugar, nem toda unidade é sinal de força e, em segundo lugar, basta voltar os olhos para o antigo Partido alemão, dilacerado hoje em três partidos, para compreender quanto havia de falso e fictício na “unidade” entre Scheidemann e Noske, de um lado, e Liebknecht e Luxemburgo, do outro. Quem sabe se não teria sido melhor para o proletariado alemão que os elementos revolucionários do Partido alemão se tivessem separado a tempo dos elementos anti-revolucionários… Não, Lênin tinha mil vezes razão ao conduzir o Partido pelo caminho da luta intransigente contra os elementos hostis ao Partido e à revolução. Pois foi somente em virtude dessa política de organização que nosso Partido pode criar essa unidade interna e essa surpreendente coesão que lhe permitiram incólume da crise de julho sob o governo Kerenski, agüentar o impacto da insurreição de outubro, atravessar sem qualquer abalo a crise do período de Brest-Litovsk, organizar a vitória sobre a “Entente” e , por fim, conseguir essa flexibilidade sem paralelo que lhe permite, a qualquer momento, reagrupar suas fileiras e concentrar centenas de milhares de seus membros numa grande tarefa determinada sem causar confusão em seu seio.

Pravda (A Verdade), nº 86.
23 de abril de 1920. 

Marxista ou robô burguês?

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Em discurso para dezenas de empresários, na abertura da 29ª Reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), no dia 5 de março, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou: “Será que os países ricos vão continuar apenas colocando dinheiro com o intuito de salvar os bancos ou será que alguns países terão coragem, sem medo da palavra, de estatizar os bancos, recuperá-los, fazer voltar o crédito e, depois, então, se quiserem, entregar os bancos a quem eles entenderem que devam entregar?”(Jornal do Brasil, 6/3/2009).

No mesmo discurso, Lula disse ainda: “Eu me lembro de que quando caiu o Muro de Berlim, eu fui muito criticado aqui no Brasil, porque eu dizia que a queda do Muro de Berlim era a oportunidade de a gente repensar as coisas no mundo, porque até então estava tudo escrito, o Manifesto Comunista dizia tudo o que a gente tinha que fazer, o Marx já tinha dito tudo o que nós tínhamos que fazer. Era como se nós tivéssemos que ser um pequeno robô, sem ter o direito de pensar. O meu Partido nasceu exatamente do desaforo de pensar diferente. Os sindicatos, no Brasil, cresceram exatamente pensando diferente. (Discurso do Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante abertura da 29ª Reunião do Pleno do CDES)

Ou o presidente Lula esqueceu o que leu no Manifesto do Partido Comunista ou, então, quando o leu, o fez apressadamente, pois, como se sabe, o Manifesto, um dos livros mais traduzidos e mais vendidos no mundo nos últimos 150 anos, nunca se propôs dizer tudo o que cada um ou que cada partido deveria fazer, mas, sim, expor o programa teórico e prático dos comunistas. Essa foi a decisão do Congresso da Liga dos Comunistas (mais tarde chamada de Associação Internacional dos Trabalhadores, a Internacional), realizado em novembro de 1847, e cumprida magistralmente por Karl Marx e  Friedrich Engels.

No entanto, embora nele não esteja escrito tudo o que cada um deva fazer, com certeza – se o que nele está escrito fosse cumprido pelos atuais governantes – não existiriam no mundo miséria, fome, guerras, desemprego e, tampouco, crises econômicas.

De fato, o Manifesto, queira ou não o presidente, permanece uma obra atual e profundamente necessária para quem quiser compreender por que ocorrem as crises econômicas e a verdadeira causa da existência de pobres e ricos na sociedade capitalista. Vejamos apenas algumas frases dessa importante obra de Marx e Engels:

“De há decênios para cá, a história da indústria e do comércio é apenas a história da revolta das modernas forças produtivas contra as velhas relações de  produção, contra as relações de propriedade que são as condições de vida da burguesia e de seu domínio. Basta mencionar as crises comerciais que, na sua recorrência periódica, põem em causa, cada vez mais ameaçadoras, a existência de toda a sociedade burguesa. (….) Nas crises declara-se uma epidemia social que teria parecido um contrassenso a todas as épocas anteriores – a epidemia da sobreprodução. A sociedade vê-se de repente retransportada a um estado de momentânea barbárie; parece-lhe que uma fome, uma guerra de destruição generalizada lhe cortaram todos os meios de subsistência; a indústria e o comércio parecem-lhe aniquilados. E por quê? Porque a sociedade possui civilização em excesso, comércio em excesso. As forças produtivas de que dispõe deixam de servir para promoção das relações de propriedade burguesas; pelo contrário, tornaram-se demasiado poderosas para estas relações, e são por elas tolhidas; e assim que superam este obstáculo lançam na desordem toda a sociedade burguesa, põem  em perigo a existência da propriedade burguesa.” (Manifesto do Partido Comunista. Edições Progresso)

Que há  de ultrapassado ou de superado nessas afirmações? Nada, absolutamente nada! Pelo contrário, aí está sintetizada a explicação para as crises econômicas que acometem o sistema capitalista desde seu nascimento.

Lutas de classes

O presidente Lula disse ainda que, com o Manifesto, Marx e Engels queriam dizer “tudo que a gente tinha que fazer”.  Os autores do Manifesto, entretanto, têm outra opinião sobre que o que pretenderam com o texto que escreveram: “O Comunismo é já reconhecido por todos os poderes europeus como um poder. Já é tempo de os comunistas exporem abertamente ao mundo inteiro o seu modo de ver, os seus fins, as suas tendências, e de contraporem à lenda do espectro do comunismo um Manifesto próprio do partido.” (Manifesto do Partido Comunista. Edições Progresso.)

Mais:

“A história de toda a sociedade até hoje é a história de lutas de classes. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, burguês da corporação e oficial, em suma opressores e oprimidos, estiveram em constante antagonismo entre si, travaram uma luta ininterrupta, umas vezes oculta, abertas outras, uma luta que acabou sempre com uma transformação revolucionária de toda a sociedade ou com o declínio comum das classes em luta.

(….)

A moderna sociedade burguesa, saída do declínio da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classe. Limitou-se a colocar novas classes, novas condições de opressão, novas formas de luta, no lugar das anteriores. A nossa época, a época da burguesia, distingue-se, contudo, por ter simplificado os antagonismos de classe. Toda a sociedade está a cindir-se, cada vez mais, em dois grandes campos hostis, em duas grandes classes em confronto direto: a burguesia e o proletariado.” (Manifesto do Partido Comunista)

Pois bem, quando se observa a atual realidade de nosso país e do mundo, com os Estados burgueses usando o dinheiro público para salvar uma minoria de bilionários, enquanto a cada três segundos uma criança morre de fome; quando vemos um estudo da própria Organização das Nações Unidas (ONU) revelar que os 10% mais ricos do mundo detêm 85,2% da riqueza mundial e que, do outro lado, os 50% mais pobres do mundo possuem apenas 1% dessa riqueza; quando dezenas de grandes empresas que auferiram enormes lucros nos últimos anos reduzem salários e demitem, 50 milhões de trabalhadores em todo o mundo, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT); e quando vemos continuar as guerras imperialistas para dominar o petróleo e as riquezas de dezenas países, etc. – é possível, por acaso, concluir que esse “antagonismo entre burguesia e proletariado” não está mais presente na sociedade?

Desaforos

Disse também Lula que o PT nasceu desse “desaforo de pensar diferente do Manifesto Comunista”. Como passaram, então,  a pensar o presidente e seu partido?

Vejamos: “Será que alguns países terão coragem, sem medo da palavra, de estatizar os bancos, recuperá-los, fazer voltar o crédito e, depois, então, se quiserem, entregar os bancos a quem eles entenderem que devam entregar?”

Em resumo, usar o dinheiro público para estatizar bancos e depois entregá-los sem dívidas aos banqueiros: esse o pensamento desaforado do presidente Lula e de seu partido em relação ao marxismo.

Ora, tal pensamento é um desaforo não só ao marxismo, mas a qualquer cidadão que paga impostos e  vê seu dinheiro, em vez de ir para a educação ou para a saúde, ser utilizado para salvar banqueiros falidos.

No Manifesto, Marx e Engels defendem exatamente o contrário. Entendem que, após a revolução, a classe operária arranque o capital das mãos da burguesia e coloque todos os instrumentos de produção nas mãos do novo Estado:  “Centralização do crédito nas mãos do Estado por meio de um banco central com capital do Estado e monopólio exclusivo.”

Nada, portanto, de bancos privados, menos ainda de estatizar para, depois, privatizar.

Outros desaforos do presidente: entregar R$ 4 bilhões às montadoras de automóveis, outros bilhões ao banco Votorantim (da família de Antônio Ermírio de Moraes) e financiar a Embraer com dinheiro público do BNDES – para essa empresa demitir 4.300 trabalhadores.

E:

“Hoje, mais do que fazer uma pauta de reivindicação pedindo aumento, temos que contribuir para que as empresas vendam mais. (…) Se tivermos medo de comprar, o comércio não vai vender. Se o comércio não vende, a indústria não produz”, disse Lula no último dia 28 de março na Feira da Construção Civil, em São Paulo.

Porém, presidente, se os trabalhadores não tiverem aumento salarial quem vai comprar? Além de que, no capitalismo, os trabalhadores já ajudam demais os empresários. Basta observar de onde vem os seus lucros.

Entretanto, não é à toa esse apego do presidente aos pensamentos diferentes ou opostos ao marxismo. Os bancos foram os principais financiadores da campanha de reeleição do presidente Lula, com doações que somam R$ 10,5 milhões, segundo a prestação de contas oficial do PT, seu partido, à Justiça Eleitoral. Entre os bancos, o maior doador foi o Itaú, com R$ 3,5 milhões.

Aliás, o chamado sistema financeiro dobrou de tamanho no governo Lula e seus lucros triplicaram: em 2007, o lucro líquido do setor financeiro alcançou R$ 57,4 bilhões, um crescimento de 200% sobre os R$ 19,1 milhões de 2003.

Na verdade, com esse “desaforo” ao Manifesto, mais uma vez Lula procura se apresentar perante as classes dominantes e seus meios de comunicação como um operário que traiu sua classe e sua ideologia e aderiu à ideologia burguesa. Aliás, a mesma burguesia que é responsável pelo dedo que ele perdeu, por ter sido preso e pela existência de milhões de brasileiros vivendo com fome e desempregados.

Não há de ser nada, pois, como bem escreveram Marx e Engels no Manifesto Comunista, “a burguesia produz o seu próprio coveiro. A sua queda e a vitória do proletariado são igualmente inevitáveis.”

Isso mostraram a Grande Revolução Socialista Russa de 1917, a revolução chinesa de 1949, a do Vietnã, em 1950, a de Cuba, em 1959, entre muitas outras – e o comprovarão ainda mais as revoluções que se realizarão nesse século XXI, inspiradas e animadas por esse pequeno mas profundo e verdadeiro  livro: Manifesto do Partido Comunista.

Lula Falcão é membro do comitê central do Partido Comunista Revolucionário-PCR

Gamal Abdel Nasser e a rebelião do povo egípcio

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O Egito se localiza no Nordeste da África. Sua história remonta a quatro mil anos antes de Cristo, quando, destruídas as Comunidades Primitivas, instaurou-se um Estado despótico, dominado por uma monarquia absolutista, na qual o rei, o Faraó, era um deus.

A economia se baseava na servidão coletiva dos camponeses e no trabalho escravo. Foi o esforço gigantesco desses trabalhadores que possibilitou a construção das famosas pirâmides, que nada mais eram do que túmulos dos faraós. Milhares de vidas foram sacrificadas em sua construção.

No período denominado Novo Império (1580-1080 a.C.), o regime adotou uma política expansionista, conquistando a Síria, a Fenícia, a Palestina e a Núbia (atual Sudão). Formou-se o Império Asiático do Egito, que chegava até o rio Eufrates.

As lutas de libertação das nações ocupadas e as revoltas internas dos camponeses e escravos ante a superexploração provocaram o declínio do Império. O Egito perdeu sua independência em 525 a.C. Já no ano 30 a.C, após a derrota de Cleópatra, tornou-se simples província de Roma.

A conquista do Egito pelos árabes acontece em 395 d.C., com a crise do Império Romano. Ao longo dos séculos seguintes, dá-se a completa “arabização” do país, que é disputado por Inglaterra e França. O general Napoleão Bonaparte invadiu o país em 1798. A Inglaterra expulsa o exército francês em 1801. Depois, ocorre uma parceria entre as duas potências europeias. O Canal de Suez foi construído com apoio da França entre 1860 e 1870. A parte egípcia foi comprada pela Inglaterra em 1875.

Concedida pela Inglaterra em 1822, a independência foi mera formalidade, pois o Reino Unido se reservou o direito de interferir nos assuntos internos sempre que seus interesses fossem contrariados.

Um sentimento anticolonialista foi tomando corpo e contrariando a potência dominante. Em 1945, o Egito integra a Liga Árabe e, em 1948, engaja-se num movimento contra a criação do Estado de Israel. A ONU aprovou a criação de Israel, e o Egito declarou guerra ao novo Estado, mas foi derrotado em 1949. O povo egípcio creditou a derrota à Monarquia, obtendo o apoio do Exército, no seio do qual nasce o Movimento dos Oficiais Livres, liderado pelo general Muhammad Naguib e pelo coronel Gamal Abdel Nasser.

“Os povos não desafiam a repressão e a morte nem permanecem noites inteiras protestando com energia por questões simplesmente formais. Eles fazem isso quando seus direitos legais e materiais são sacrificados sem piedade de acordo com as exigências insaciáveis de políticos corruptos e dos círculos nacionais e internacionais que saqueiam o país.”

(Fidel Castro, sobre a revolta popular no Egito, 2011)

Soberania e Socialismo

Gamal Abdel Nasser nasceu em Alexandria, em 1918, filho de um funcionário dos Correios. Concluiu os estudos na capital, Cairo, onde foi preso aos 17 anos por participar de manifestações contra a Grã-Bretanha e a Monarquia.

Tinha 34 anos quando comandou a derrubada do rei Faruk, na noite do dia 22 de julho de 1952, num golpe bem sucedido, sem derramamento de sangue. Nasser assumiu a liderança do Conselho Revolucionário, e Naguib, a Presidência da República. Eles lideram correntes divergentes do Movimento Nacionalista. Naguib é pró-ocidental e se alia com setores liberais da Monarquia. Nasser defende um Movimento Pan-árabe e quer a independência real do país ante as superpotências, bem como a eliminação das desigualdades econômicas e sociais.

Nessa disputa, Nasser sai vitorioso e assume a Presidência da República em fevereiro de 1954. Um referendo popular em junho de 1956 aprova o projeto de Constituição que torna o Egito uma república socialista, com a quase totalidade dos votos.

Em 1955, juntamente com Josip Broz Tito e Jawaharlal Neru, respectivamente presidente da Iugoslávia e Primeiro-Ministro da Índia, lança um movimento pela neutralidade diante das superpotências, precursor do Movimento dos Países Não-Alinhados. Os três Chefes-de-Estado foram reconhecidos internacionalmente como líderes do Terceiro Mundo.

O governo Nasser promoveu a reforma agrária e planejou um modelo desenvolvimentista, cujo símbolo foi o projeto de construção da barragem de Assuã, na primeira catarata do rio Nilo, para produzir eletricidade e possibilitar a irrigação do deserto. Buscou financiamento do Banco Mundial, negado porque ele rejeitou a condição de não colocar técnicos soviéticos na empresa. Com o apoio da URSS, a barragem de Assuã entrou em operação no ano de 1968.

Rompem-se as relações com Inglaterra e França, que articulam junto a Israel a invasão do Egito. A ofensiva israelense começou no dia 29 de outubro de 1956, penetrando pelo Monte Sinai até chegar perto do Canal. O Egito reagiu e, no dia seguinte, começam os bombardeios britânicos e franceses.

Mas o Egito ganhou no terreno da política. A ONU determinou a retirada dos invasores e reconheceu a soberania egípcia sobre o Canal. As tropas britânicas saíram de imediato, e Israel devolveu o Sinai no ano seguinte.

Vitorioso, Nasser radicaliza o processo revolucionário. Aprofunda a cooperação com a União Soviética e promove a estatização de empresas estrangeiras. Cria a República Árabe Unida em 1º de fevereiro 1958, reunindo Egito, Síria e Iêmen, com duração efêmera, em vista de um golpe de Estado na Síria em 02 de março do mesmo ano. Em 1964, Nasser recebe em Moscou a mais alta honraria do país, nunca antes concedida a um estrangeiro: o título de HERÓI DA UNIÃO SOVIÉTICA. Apoiou incondicionalmente a luta palestina, inaugurando o primeiro escritório da Organização para a Libertação da Palestina (OLP).

Nova ofensiva de Israel, com apoio das potências imperialistas, ocorre em junho de 1967, desta vez destruindo os exércitos do Egito, Jordânia, Líbano e Síria e ocupando a Península do Sinai, a Faixa de Gaza, a Cisjordânia e as Colinas de Golan, no episídio que ficou conhecido como Guerra dos Seis Dias.

A última ação destacada de Nasser foi a mediação do conflito entre o exército da Jordânia e a OLP. As partes firmaram acordo de paz no dia 27 de setembro de 1970. No dia seguinte, Gamal Abdel Nasser morre de um ataque cardíaco fulminante. Dia 1º de outubro, cinco milhões de egípcios dão o último adeus ao seu líder maior.

Abertura para o imperialismo

O sucessor, Anwar El Sadat, inicialmente parecia disposto a continuar aprofundando a Revolução.  Organizou uma expedição para libertar as áreas ocupadas por Israel, em 1973, mas não teve êxito. Então começou um recuo, que chamou de “retificação”.  Rompeu com a União Soviética e reaproximou-se das potências capitalistas. Reprivatizou as terras desapropriadas pela Reforma Agrária, bem como as estatais, e abriu as portas ao capital estrangeiro. Contraiu crescente endividamento externo, submetendo-se ao Fundo Monetário Internacional (FMI). Como consequência, os trabalhadores sofreram aumento do custo de vida e do desemprego, e os camponeses retornaram à servidão diante da retomada de suas terras.

Sadat ainda se reaproximou de Israel. Em troca da retirada do apoio à OLP, recebeu de volta o Sinai, consoante os Acordos de Camp David (1979). Em 1981, foi assassinado por militares contrários à sua aliança com Israel e à repressão desencadeada sobre os muçulmanos fundamentalistas.

As lutas de hoje

Assumindo a Presidência, Hosni Mubarak completa a abertura ao capital estrangeiro, a dependência do país e a intervenção do FMI. O agravamento dos problemas abre espaço para o fundamentalismo islâmico, por um lado, e, por outro, à insatisfação com as condições de vida e a repressão, independentemente de credo religioso. Esse caldeirão entornou em janeiro de 2011, quando multidões de egípcios foram às ruas exigir a mudança do regime. Mubarak renunciou, e o governo foi assumido, provisoriamente, promete-se, por uma Junta Militar.

Sem uma direção revolucionária, unitária, a revolta das massas tem futuro incerto. Está claro que não conseguiu impor o ritmo das mudanças que reivindicava e nem se configura o ponto até onde tais mudanças irão. Mas, pelo menos, algo positivo já aconteceu: a abertura da fronteira com a faixa de Gaza, fechada há quatro anos, desde que o Hamas foi eleito pelo povo para governar a Província. Foi uma exigência de Israel aceita por Mubarak. Com isso, os palestinos poderão respirar um pouco mais aliviados.

Embora o nasserismo não tenha se transformado em movimento organizado, com certeza a inspiração das idéias de Nasser, de soberania, união árabe e socialismo iluminam, ao menos, parte dessa multidão que clama por mudanças no país do rio Nilo.

José Levi, historiador