UM JORNAL DOS TRABALHADORES NA LUTA PELO SOCIALISMO

domingo, 20 de abril de 2025
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A patente e a propriedade intelectual

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A história do homem se diferencia das demais espécies pela capacidade do ser humano de conhecer e pensar, desenvolvida pela necessidade de sobreviver num mundo hostil, ao contrário destas, que também apresentam certo conhecimento da natureza, mas se subjugam a ela ou se extinguem. O ser humano aprendeu a conhecer a natureza e, ao invés de esperar que ela lhe desse os meios de subsistência, foi extrair dali suas riquezas, através do trabalho; as mãos serviram de ferramenta, a habilidade do homem evoluiu em conjunto com seu cérebro e, assim, criou bens materiais para satisfazer suas necessidades, transformando a natureza pela aplicação da imaginação, raciocínio, criação e inovação.

Do arco e flecha ao computador, foi através da capacidade de descobrir, conhecer e transformar que se deu todo o desenvolvimento artístico, filosófico, cientifico e tecnológico, ressalvando-se que é na contradição entre as forças produtivas (meios de produção e força de trabalho) e as relações de produção (propriedade econômica das forças produtivas) que encontramos a explicação para a evolução dos modos de produção, como aprendemos com Marx.[1]

A criação da patente

O capitalismo, para assegurar a propriedade privada dos meios de produção, estabeleceu a “Patente” como um direito exclusivo em relação a um invento, que pode ser um produto, aparelho ou um processo, que proporciona um novo e criativo modo de fabricação, ou oferece uma nova e inventiva solução técnica a um determinado problema.

Um invento deve, em geral, preencher as seguintes condições para ser protegido por uma patente: Ser novidade, ou seja, deve demonstrar algumas características inéditas que não sejam conhecidas no estado da técnica, conjunto dos conhecimentos existentes no seu campo técnico; Não pode ser evidente ou envolver algo que possa ser deduzido por uma pessoa com conhecimento mediano naquele campo técnico, a denominada atividade inventiva, resultado da capacidade criativa do inventor; Deve ter uma finalidade pratica ou capacidade de aplicação industrial.

O invento deve constituir o que se denomina “matéria patenteável” em termos legais; os programas de computador, por exemplo, não são considerados matéria patenteável.

A Lei da Propriedade Industrial (LPI) brasileira exclui os Programas de Computador da competência da Propriedade Industrial, ao regular direitos e obrigações relativos à propriedade industrial.[2] A LPI também exclui da possibilidade de patenteamento os métodos matemáticos[2] e as concepções puramente abstratas[2]. O software como uma sequência de instruções expressa em linguagem de programação, ou seja, um método matemático, não é passível de patenteamento. Como método matemático, sua concepção é puramente abstrata, não o resultado nem sua representação, logo, também não seria patenteável. Os programas de computador já são protegidos por meio da Lei de Direitos Autorais e por legislação específica no Brasil.[3]

A patente de software

 No entendimento do professor Pedro Antonio Dourado de Rezende, do Departamento de Ciência da Computação da Universidade de Brasília, o patenteamento de programas de computadores não resiste a uma análise mais criteriosa[4]:

“…Processo executável por software nada mais é do que algoritmo. Software só faz manipular símbolos segundo regras lógicas. Um conjunto de tais regras visando obter resultado a partir de um contexto de valores iniciais admissíveis se chama, na ciência da computação, algoritmo. Um algoritmo é uma idéia de como se implementar um tal conjunto de regras; Falar de patente de software, de processo ou de produto, são truques para se desviar das restrições ao patenteamento de idéias, fórmulas ou leis matemáticas…”

Outro aspecto a abordar é a questão da atividade inventiva, requisito essencial a uma invenção, e esta como resultado da capacidade criativa não existe quando o objeto criado ou desenvolvido é evidente do Estado da Técnica para um técnico no assunto. O software não apresenta esta característica, daí a necessidade do “Software Proprietário” manter seu código fechado, pois o seu desenvolvimento é evidente para qualquer programador de nível mediano, já que a inovação em informática é acumulativa, baseada em experiências e conhecimentos prévios.

Os softwares relacionados a um equipamento, ou inseridos em um processo, também são vedados pela nossa legislação de forma indireta, já que a LPI[5] exige suficiência descritiva, logo o software com seu código fonte fechado não preenche este requisito, não sendo passível de patenteamento, não apresenta o fundamento básico da patente que é o retorno para a sociedade do conhecimento protegido.

Mesmo que se discuta a tecnicidade do software esta argumentação não prevalece, porque o significado das seqüências manipuladas pelos programas não altera e não faz parte da função técnica do hardware; de forma análoga, uma nova partitura não altera o funcionamento técnico de um violino, (Dourado e Lacerda, 2005)[6].

Este imbróglio referente aos softwares e à propriedade industrial não é único, muitos outros existem e, como as chamadas patentes de segundo uso terapêutico, de microrganismos, de sementes, etc., nos mostram que a utilização das atuais formas de proteção à Propriedade Intelectual não contemplam o estágio atual da sociedade em rede e às novas tecnologias. Fazem-se necessárias formas compatíveis de reconhecimento para o trabalho intelectual, incentivando sua produção, tendo como fontes a liberdade e a inclusão, ao contrário da visão enganosa neoclássica que procura vincular a concessão deste monopólio privado a um possível retorno deste conhecimento tecnológico para a sociedade ao fim deste.

A propriedade intelectual

O Certificado de Autor é um instrumento que demonstrou eficácia como alternativa aos instrumentos conservadores da propriedade intelectual, onde por questões de ordem política não se concede o monopólio privado, seja como um instrumento avançado em economias socialistas, seja como mecanismo de impulso para economias em desenvolvimento.

Em economias socialistas, onde a propriedade privada tem que ser gradativamente abolida, com sua substituição pela propriedade coletiva, temos a introdução da figura do Certificado de Autor, a princípio convivendo com os institutos anteriores. Esta experiência ocorreu em diversos países socialistas, em especial na extinta União Soviética, onde por um lado havia o reconhecimento ao inventor, lhe sendo concedidos privilégios na sociedade, como retribuição pelas suas criações, por outro lado havia o favorecimento incondicional da publicidade das inovações, seu uso e aplicação tendo como premissa principal o interesse geral da sociedade.

 A figura do Certificado de Autor permite que as criações sejam colocadas à disposição das organizações do Estado de forma livre para sua exploração, através de Empresas, Cooperativas, Sociedades, Organismos e Instituições estatais, sem qualquer anuência previa do autor e também comercializadas desta forma, sendo outorgado aos criadores um certificado que garanta sua autoria, o denominado Certificado de Autor. Este certificado propicia tão somente um direito pessoal, que não pode ser negociado por qualquer meio e que se extingue com o autor. Esta impossibilidade de transferência é uma diferença fundamental entre os dois institutos.

O Certificado de Autor tem em comum com o Direito Autoral o reconhecimento de um direito moral, porém se diferencia deste ao não conferir nenhum direito material. A figura que mais se aproxima do Certificado de Autor seria a de um artigo cientifico, onde a novidade é essencial e há o reconhecimento da capacidade intelectual do autor, como ensina Domingues[7],

O Certificado de Autor na União Soviética poderia ser definido como um título que atesta a autoria de um invento e o direito pessoal e intransmissível que o Estado outorga ao inventor”.

Na União Soviética, o autor da invenção tinha o direito de apresentar sua criação como tese e receber o titulo acadêmico correspondente, ser qualificado como mestre nas universidades, sem a necessidade de passar em processos seletivos, além de obter o titulo de “insigne inventor”, o que não persiste atualmente na Rússia .

A figura do Certificado de Autor poderia ser aplicada de forma imediata como um instituto dos Direitos da Propriedade Intelectual, para os casos mais controversos, como a questão da proteção aos programas de computador.

Concluindo, somos contrários à concessão de patentes para programas de computador por principio e contrários a esta diretriz que vem para disciplinar uma questão em que não há consenso no INPI – Instituto Nacional da Propriedade Industrial, no governo, nas universidades, centros de pesquisas, nas empresas e profissionais do ramo, e na sociedade em geral.

Joaquim Adérito
Pesquisador do
Instituto Nacional da Propriedade Industrial e militante do PCR

[1] Marx, Karl – Prefácio à “Contribuição à  Crítica da Economia Política”- Editora: Martins Fontes, 1977.

[2] Art. 10. Não se considera invenção nem modelo de utilidade:

 I – descobertas, teorias científicas e métodos matemáticos;

II – concepções puramente abstratas;

V – programas de computador em si.

[3] Art. 1º. Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados.

Art. 2º. O regime de proteção à propriedade intelectual de programa de computador é o conferido às obras literárias pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País, observado o disposto nesta Lei.

[4] Dourado de Rezende, Pedro Antonio, “Sobre Patentes `de software`” http://www.cic.unb.br/docentes/pedro/trabs/entrevistaPP.html, acesso em 25/07/2006

[5] Art. 24. O relatório deverá descrever clara e suficientemente o objeto, de modo a possibilitar sua realização por técnico no assunto e indicar, quando for o caso, a melhor forma de execução.

[6] Dourado de Rezende, Pedro Antônio e Lacerda, Hudson Flávio Meneses, Computadores, Softwares e Patentes, II Conferência Latino-americana e do Caribe sobre Desenvolvimento e Uso de Software Livre da UNESCO, Setembro de 2005, extraído de http://www.cic.unb.br/docentes/pedro/trabs/LACFREE2005.html , acesso em 23/12/2006.

[7] Domingues, Douglas Gabriel, “ Direito Industrial Patentes”, Capitulo 8, forense 1982

Cúpula dos Povos denuncia Rio+20

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Entre os dias 13 e 22 de junho, delegações de 186 países reuniram-se na Cúpula da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, com o objetivo de buscar soluções para os problemas ambientais do mundo. A conclusão de um texto consensual entre os países acerca de temas como a sustentabilidade foi o principal trabalho das delegações diplomáticas que durante meses trabalharam no que foi chamado de Rascunho Zero, a ser entregue aos chefes de Estado.

Oficialmente, a Rio+20 ocorreu entre os dias 20 e 22 de junho, com a chegada dos chefes de Estado, que se revezaram em discursos sobre o texto elaborado anteriormente por suas delegações negociadoras. Digno de nota foi o discurso do presidente de Cuba, Raúl Castro, que afirmou que “há 20 anos, nesta sala, o líder da revolução cubana disse que uma espécie muito importante corria o risco de desaparecer: o homem. O que poderia ser considerado algo alarmista, hoje é uma realidade irrefutável”.

A grande discussão da Rio+20 girou em torno do conceito de “Economia Verde” defendido pelos países imperialistas como novo paradigma para o desenvolvimento sustentável. Conceito novo de velhas ideias que se resume na privatização e mercantilização dos recursos naturais.

Da Rio+20 pouca coisa se produziu de concreto. Os interesses econômicos das grandes potências novamente foram entrave para a produção de propostas que solucionem os grandes problemas e males ambientais que assolam o mundo. As metas e o conceito de Economia Verde não foram definidos, e apenas recomendações gerais foram aprovadas. Uma verdadeira farsa foi montada nos dez dias de encontro no luxuoso centro de convenções da Barra da Tijuca.

Fracasso, decepção, desilusão, frustração, entre outros termos, são usados pelos movimentos sociais que participaram da Rio+20 ou acompanharam na Cúpula dos Povos o desenrolar dessa conferência, que teve um gasto de R$ 122 milhões somente com segurança. Na verdade, na semana do evento o Rio de Janeiro foi tomado por tropas do Exército que, com fuzis, tanques e todo o seu aparato, sitiaram a cidade para impedir qualquer tipo de manifestação contrária aos rumos tomados pela Rio+20.

Um momento importante da Cúpula dos Povos foi a presença do diretor-executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), Achim Steiner, no debate “Diálogo sobre Economia Verde”. Ao usar da palavra, foi vaiado por cerca de 300 pessoas ao defender ideias favoráveis à especulação financeira. O papel do Pnuma foi inclusive um dos principais temas debatidos na Rio+20. Para as potências imperialistas interessava transformar o Pnuma num organismo autônomo com poderes similares aos da Organização Mundial do Comércio (OMC), tornando-se assim um instrumento de “governança global” acima da soberania das nações.

O momento marcante da Cúpula ocorreu no dia 20 de junho, quando mais de 80 mil pessoas se concentraram entre as avenidas Presidente Vargas e Rio Branco em uma passeata que partiu rumo à Cinelândia, reunindo movimentos de todos os tipos: de trabalhadores sem-terra, feministas, estudantes, indígenas, sindicalistas e militantes de partidos de esquerda.

A Cúpula dos Povos encerrou suas atividades reafirmando a necessidade de se lutar contras as propostas capitalistas e convocando a todos para que “voltemos aos nossos territórios, regiões e países animados para construir as convergências necessárias e para continuar em luta, resistindo e avançando contra o sistema capitalista e suas velhas e renovadas formas de reprodução. Em pé, continuamos em luta!”.

Emerson Lira, Rio de Janeiro

Greve do Stiupb garante conquistas na Paraíba

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Foram 24 dias de greve, entre 28 de maio e 19 de junho. Os servidores da Companhia de Água e Esgotos da Paraíba (Cagepa), organizados pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas da Paraíba (Stiupb), realizaram um combativo movimento em todo o estado, que contou com adesão total em Campina Grande e no Sertão e se espalhou por outras regiões, desenvolvendo uma série de piquetes, atos, passeatas e assembleias gerais permanentes.

Houve também adesão na Capital João Pessoa, mesmo sem apoio do sindicato local. O Movimento Luta de Classes (MLC), juntamente com sindicados aliados, chegou a organizar manifestações e a paralisar setores importantes.

A deflagração da greve aconteceu após quase três meses de tentativas de negociação no Ministério do Trabalho, onde a Diretoria da Cagepa sustentou que não tinha condições de dar qualquer reajuste ou benefício à categoria, apelando para que os servidores “sejam compreensivos com a falta de recursos e aguardem o próximo ano”.

Os principais eixos da greve foram: a campanha salarial 2012 e o combate à situação caótica por que passa a empresa há anos, que agora se agravou pela falta de recursos, as péssimas condições de trabalho, as terceirizações, os altos salários dos cargos comissionados e o fantasma da privatização.

No fim, veio a vitória. Contando com grande repercussão na mídia e com a simpatia da população paraibana, que enxergou na greve a defesa do patrimônio público, o movimento conseguiu dobrar a intransigência da Cagepa e do Governo do Estado, conquistando 5% de reajuste nos salários, 5% no vale-alimentação e o pagamento de 60% do plano de saúde pela empresa.

Para Wilton Maia, presidente do Stiupb e militante do MLC, “conseguimos nesta greve o que poucos acreditavam do ponto de vista financeiro. No entanto, o mais importante foi a demonstração de força da categoria, que não permitirá mais que a Cagepa seja desmantelada ao ponto de ser privatizada. Todos estão de parabéns pelo despertar de consciência, pela certeza de que só com a luta poderemos conquistar dias melhores”.

Rafael Freire, João Pessoa

Montadoras demitem para reduzir salário

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As multinacionais de automóveis enviaram cerca de 5,6 bilhões de dólares para suas matrizes no exterior no ano passado. Foi o setor da economia que mais enviou lucros, superando as empresas de telefonia e os bancos. A razão para o envio de todo esse dinheiro arrecadado do povo brasileiro para os EUA, a Alemanha, a Itália e a França é que desde o golpe militar de 1964, o Brasil não tem uma lei que controle a remessa de lucros.

Já a explicação para esses altos lucros não é difícil de encontrar: o Brasil tem o carro mais caro do mundo, embora as empresas paguem baixos salários e recebam diversos benefícios do governo.

Levantamento feito pela consultoria KPMG sobre competitividade revelou que o Brasil tem o quinto menor custo de produção em ranking de 14 países. Segundo a pesquisa, o custo de mão de obra na indústria de manufaturados – soma de salários e direitos trabalhistas – é de 30% a 35%, menor do que na Alemanha ou nos Estados Unidos. Em custos, O Brasil está atrás apenas da China, Rússia, Índia e do México.

Outro estudo, esse do Departamento de Estatística do Trabalho dos EUA, mostra que em 34 países pesquisados, o Brasil, além de longas jornadas de trabalho, tem o mais baixo valor de encargos trabalhistas. Em dólares, a média brasileira é de US$ 2,70 a hora, enquanto em outras 33 nações, é de US$ 5,80 a hora.

Quando cobradas pelo alto preço do carro, as montadoras afirmam que os impostos são elevados. Entretanto, desde o início da crise capitalista, o governo federal vem reduzindo os impostos dos automóveis, além de financiar as montadoras com dinheiro do BNDES e, mesmo assim, o preço do carro vem subindo.

Além do mais, como revelou o banco de investimento Morgan Stanley, a taxa de lucro das indústrias de automóveis no Brasil é três vezes maior do que em outros países. Na verdade, nem o governo tem conhecimento de qual é a margem de lucro das montadoras, pois as empresas utilizam de diversos artifícios nos seus balanços como, por exemplo, importações de peças. Mas um setor que envia por ano 5,6 bilhões de dólares para o exterior, com certeza tem enormes lucros.

Em maio, o governo anunciou novas medidas em favor da indústria automobilística. Os carros até 1.000 cilindradas tiveram o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) reduzido de 7% para 0%. Para os automóveis de 1.000 a 2.000 cilindradas, o imposto caiu de 11% para 6,5%. Porém, as montadoras disseram que não irão repassar esses mesmos percentuais para os preços. Por quê? Ganância! As multinacionais querem ganhar mais dinheiro para poder enviar mais lucros para o exterior, já que na Europa e nos EUA estão com dívidas astronômicas e a venda de carros teve uma grande queda.

O pior é que a sede de lucros das multinacionais é tão grande que vez por outra inventam que estão com pátios lotados, que os custos de produção aumentaram, etc., para receberem mais subsídios do governo ou para intimidarem os trabalhadores a não realizarem greve na campanha salarial. Como sabemos, toda vez que ocorre uma elevação do salário do trabalhador, o empresário tem uma diminuição do lucro. Este é o motivo dos patrões estarem sempre buscando formas para que o operário produza mais com um salário menor.  É exatamente o que estamos vendo agora.

A General Motors lançou em junho dois PDVs (Plano de Demissão Voluntária), mês em que a empresa obteve maior crescimento no número de licenciamentos de carros, uma alta de 32%. “A montadora está usando o dinheiro conseguido com a redução de impostos para financiar as rescisões”, denunciou o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São José do Campos, Antônio Ferreira de Barros.

Também, a Mercedes-Benz de São Bernardo chegou a anunciar a demissão de 1.500 metalúrgicos. Mas, após intervenção do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, um acordo foi fechado suspendendo as demissões até novembro. Até lá, os operários ficarão afastados da empresa, realizando curso de qualificação profissional e recebendo uma bolsa mensal do FAT (Fundo de Amparo do Trabalhador) no valor de R$ 1.163. O restante do salário será complementado pela empresa.

Por coincidência, no último dia 29, os metalúrgicos do ABC realizaram uma manifestação em frente à sede da Fiesp na Avenida Paulista para entregar as reivindicações da Campanha Salarial 2012. Na pauta, os trabalhadores reivindicam reposição integral da inflação, aumento real no salário, jornada de 40 horas semanais, licença maternidade de 180 dias e seguro de vida.

No ato, o secretário-geral do Sindicato, Wagner Santana, fez questão de alertar os companheiros sobre a choradeira dos patrões: “O patrão vai exagerar nas tintas e pintar um quadro econômico muito pior do que acontece realmente. Por isso, como sempre vamos precisar de toda mobilização para arrancar uma proposta decente”.

Ao longo do tempo, vemos que toda vez que os operários se unem, lutam e realizam greves, eles conquistam suas reivindicações e derrotam os patrões. Não há outro caminho para enfrentar a exploração da classe capitalista e sua voracidade, senão a luta. Assim, é preciso conscientizar cada trabalhador dos seus direitos e da necessidade de travar uma dura luta contra o roubo realizado pelos patrões contra nós e o nosso país.

Lula Falcão
Membro do comitê central do PCR e diretor de A Verdade

Código Florestal ou Código do Desmatamento?

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A Câmara Federal aprovou recentemente o texto que modificou o antigo Código Florestal. A presidente Dilma Rousseff vetou da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012 (novo Código Florestal) – vários artigos totais e outros parciais – e publicou o texto no Diário Oficial da União com os vetos e acompanhado da Medida Provisória nº 571, que será votada pelo Congresso neste mês de julho. A MP, segundo o Governo, visa a preencher as lacunas deixadas pelos artigos vetados e as modificações.

Para se entender os interesses em jogo com o novo Código Florestal, é bom lembrar um pouco da sua história recente. Após a votação inicial na Câmara, sendo apelidado de “Código Ruralista” e tendo como relator o deputado Aldo Rebelo (PCdoB), em junho de 2010, o texto foi enviado ao Senado. Em dezembro de 2011, um novo texto foi aprovado nesta casa, preparado pelos relatores Luiz Henrique (PMDB) e Jorge Vianna (PT), em acordo com o Governo Federal, alterando o Código Ruralista aprovado na Câmara Federal.

Esta nova proposta do Senado manteve vários pontos que atendiam aos interesses do grande capital, mas a burguesia não se conformou e, quando o projeto voltou à Câmara, foi escalado deputado Paulo Piau (PMDB), que conseguiu a façanha de unir o que tinha de pior das duas versões aprovadas pela Câmara e pelo Senado.

Diante desta realidade, só havia um caminho a seguir em defesa do meio ambiente: organizar várias mobilizações, palestras, debates e atos para denunciar a segunda versão do Código Florestal aprovado na Câmara Federal, exigindo da presidente Dilma Rousseff o veto total ao projeto. A pressão social, no entanto, não foi suficiente, e ela só vetou o que considerava anistia e fragilização das Áreas de Preservação Permanentes (APPs) e Reservas Legais (RLs); ao mesmo tempo, editou uma Medida Provisória, que já esta completamente desfigurada na Câmara com quase 700 emendas.

As multas dos desmatadores chegam a R$ 8,4 bilhões. A maioria das multas milionárias foi aplicada pelo Ibama, e nenhuma foi paga até hoje, sendo que, ao menos 48 dos 150 maiores devedores respondem a processos judiciais por crimes contra o meio ambiente, e dez já foram processados também por manter trabalhadores em condições análogas à de escravos. A infração de maior valor (R$ 23,3 milhões) foi aplicada à agropecuária Santa Bárbara Xinguara, em São Félix do Xingu (PA), que tem o empresário Daniel Dantas como acionista e investidor.

Outra questão não menos importante, fruto das ações dos ruralistas e das entidades do capitalismo verde, foi a inclusão de artigos que institucionalizam o comércio de florestas para fins de compensação dos passivos das RLs e da APPs. A partir do novo Código, bolsas de valores e determinadas entidades estarão habilitadas a operar no mercado Títulos de Carbono e Cotas de Reservas Ambientais (CRAs).

O fato é que essas novas possibilidades de negócios tendem também a blindar o latifúndio improdutivo da desapropriação para fins de Reforma Agrária. Como exemplo, podemos citar um latifúndio na Amazônia de dez mil hectares, com toda a floresta originária preservada. O seu titular, proprietário ou posseiro, poderá fazer excelentes negócios no mercado de carbono em cima de oito mil hectares, e os outros dois mil hectares serão transformados em 2.000 (duas mil) cotas de reserva ambiental para compensar os passivos de reservas de outros imóveis e não poderá ser desapropriado para Reforma Agrária devido à legislação do novo Código Florestal.

Há quase dois anos, o Congresso Nacional debate possíveis modificações no Código Florestal. Apesar das diversas manifestações de cientistas, juristas, pequenos agricultores, ambientalistas e organizações sociais das mais variadas áreas, que denunciaram os efeitos perversos que as alterações pretendidas pela bancada ruralista trarão para o presente e futuro do equilíbrio socioambiental no país, esta discussão se tornou uma questão de honra para burguesia, e ela não medirá esforços para aprovar a MP 571 totalmente desfigurada. Será necessária então uma nova e maior mobilização social para não termos um Código de Desmatamento com o nome de Código Florestal.

Hinamar Araújo de Medeiros, engenheiro agrônomo

Burguesia paraguaia e EUA depõem Fernando Lugo

Em duas rodadas de votação no Parlamento, o presidente do Paraguai, Fernando Lugo, foi deposto de seu cargo no último dia 22 de junho. Na Câmara dos Deputados o resultado foi de 76 votos a favor do impeachment e apenas um contra, e no Senado de 39 votos a favor, quatro contra e uma abstenção. Assumiu imediatamente a Presidência da República o vice de Lugo, Federico Franco.

Em nota oficial, a Direção Nacional do Movimento ao Socialismo, partido do presidente deposto, afirma: “O Parlamento hoje só representa a si mesmo. Os parlamentares que votaram pela destituição do presidente Fernando Lugo não podem arrogar-se de maior representação que a si próprio. Assim, 115 indivíduos impuseram sua vontade sectária aos 700 mil cidadãos que elegeram Lugo como presidente”.

Da abertura formal do processo de cassação à sua execução, passaram-se menos de dois dias, não possibilitando tempo real para a defesa, nem muito menos tempo para que o povo paraguaio, maior interessado na questão, pudesse opinar ou se manifestar sobre os rumos do seu país. Dada à forma truculenta e apressada como tudo foi feito, a manobra se constituiu num “Golpe de Estado Parlamentar”. Tudo isso, realizado com total monitoramento da Embaixada dos Estados Unidos no Paraguai.

O ex-bispo da Igreja Católica foi eleito como alternativa à dominação dos partidos oligárquicos, ao Partido Colorado – que comandou o país por seis décadas, inclusive sob uma ditadura abertamente fascista –, e recebeu apoio de parte das classes trabalhadoras, que acreditou em suas propostas.

Com o propósito de ganhar as eleições, Lugo construiu uma composição com o Partido Liberal, um dos partidos tradicionais da oligarquia, denominada Aliança Patriótica para a Mudança.

Devido a essa aliança com forças reconhecidamente de direita, um importante setor dos trabalhadores, especialmente dos camponeses, e as principais organizações de esquerda (Movimento Popular Pyhuara e o Pátria Livre) não o apoiaram, além de terem alertado para sua posição de conciliação com os latifundiários.

Como a principal promessa de Lugo para as massas populares foi a realização de uma Reforma Agrária que acabasse com o latifúndio, e esta não se concretizou em quatro anos de governo, os conflitos sociais no campo aumentaram. O último ato desta disputa secular no Paraguai foi o assassinato de 11 camponeses e a morte de seis policiais numa ação repressiva do Estado contra uma ocupação de terras improdutivas. A verdade é que Fernando Lugo, preso à aliança com as forças conservadoras, não conseguiu implementar nenhuma das reformas políticas, econômicas e sociais que prometeu na campanha, perdendo apoio popular.

Apesar de este fato ter sido o detonador da crise que culminou com o impeachment do presidente, este não foi um caso isolado, tendo já o Parlamento aprovado a Lei Antiterrorista, com a sanção presidencial, justamente para reprimir as lutas dos trabalhadores da cidade e do campo.

Centenas de militantes políticos estão sendo processados, perseguidos, demitidos e mesmo assassinadosd e os camponeses paraguaios permanecem vivendo na miséria, sem saúde, sem lar, sem terras, enquanto uma minoria de ricos fazendeiros enriquece cada vez mais.

As forças reacionárias nacionais e internacionais, em especial o imperialismo norte-americano, o Partido Colorado (derrotado nas últimas eleições) e o Partido Liberal (que governava com Lugo na Vice-Presidência) aproveitaram o cenário político de instabilidade e aplicaram sumariamente um golpe, valendo-se das próprias leis burguesas, que sempre permitiram que as classes dominantes imponham sua vontade. Novamente, a história se repete em nosso continente, já tão marcado por manobras políticas, corrupção estatal, golpes e ditaduras militares.

Mas o Governo de Fernando Lugo não satisfazia por completo a burguesia e os latifundiários,  já que se inscrevia entre os governos ditos progressistas na América Latina, que possuem certas contradições com o imperialismo ianque e que, permanentemente, são alvo de seus atos subordinadores.

Fica, mais uma vez, a lição: fazer aliança com a grande burguesia e os latifundiários é a mesma coisa que colocar raposas para tomar conta do galinheiro.

As massas populares, os povos originários, os trabalhadores, os camponeses, a juventude e a esquerda revolucionária paraguaia repudiam esta farsa para depor o presidente eleito e não reconhecem o impostor Federico Franco.

Seguirão seu caminho, firmes e de cabeça erguida lutando por seus interesses e pela libertação nacional e social e por um Paraguai socialista.

Frei Tito de Alencar: “Nem tortura nem perseguições evitarão o socialismo”

Frei Tito de Alencar“Agora você vai conhecer a sucursal do inferno”. Foi o que ouviu o frei Tito no dia 17 de fevereiro de 1970, ao ser retirado do Presídio Tiradentes pelo Capitão Maurício Lopes Lima.

Tito de Alencar Lima, caçula entre 11 irmãos, nasceu em Fortaleza no dia 14 de setembro de 1945. Estudou no Colégio dos Jesuítas, onde começou a participar da Juventude Estudantil Católica (JEC). Tornou-se dirigente regional da JEC em 1963, quando se transferiu para o Recife, residindo num velho casarão da Rua do Leite juntamente com outros dirigentes dos movimentos da Ação Católica. Em fevereiro de 1967, ingressou no noviciado dominicano, mudando para São Paulo – Convento de Perdizes. Cursando Filosofia na USP, Tito atuou no movimento estudantil. Foi ele quem conseguiu o sítio de Ibiúna, que pertencia a um amigo, para a realização do 30º Congresso da UNE na clandestinidade. Todos os 700 participantes foram presos.

O cerco da repressão

Com o fechamento cada vez maior do regime, parte da esquerda rompeu com o pacifismo do PCB e definiu a estratégia de enfrentamento armado. O Convento das Perdizes se transformou em base de apoio à esquerda revolucionária. Abrigava perseguidos, transportava-os para outros locais, ajudava-os a sairpara o exterior, transmitia recados para seus familiares. Um grupo de dominicanos aproximou-se da Ação Libertadora Nacional (ALN) e mantinha contato direto com seu comandante, Carlos Marighella. Neste grupo, estavam, entre outros, frei Betto (Carlos Alberto Libânio Christo), frei Ivo (Yves Lebauspin), frei Giorgio Callegari e frei Tito.

O cerco à ALN começou em outubro de 1969, com uma série de prisões, seguidas, como sempre, de violentas torturas com o objetivo de encontrar Marighella. Na manhã de 2 de novembro, um domingo, os freis Fernando e Ivo foram presos no Rio de Janeiro pela equipe do famigerado Sérgio Paranhos Fleury, logo após desembarcarem para visitar familiares. Em seguida, conduzidos para o Centro de Informações da Marinha (Cenimar) e depois para São Paulo (Dops e DOI-Codi).

Torturados continuamente até a segunda-feira com pancadas, choques elétricos e pau-de-arara, os frades não suportaram as sevícias. Confirmaram a existência da base de apoio do Convento das Perdizes e a forma como mantinham contato com Marighella. Isto possibilitou a armação da cilada que atraiu o comandante para a morte (ver A Verdade, nº 12).

Frei Betto explica que não se pode atribuir unicamente aos seus confrades o êxito da operação repressiva. Que foi uma sucessão de quedas, informações de elementos infiltrados e outros fatores que levaram ao lamentável desfecho. Os freis Fernando e Ivo assumiram sua parcela de responsabilidade, nunca negaram as informações dadas sob tortura. Acreditavam que a notícia de sua prisão teria se espalhado e Marighella não telefonaria marcando encontro.

Antônio Flávio Médici de Camargo, corretor, abrigava Marighella em seu apartamento e, muitas vezes, transportava-o para os pontos onde tinha tarefas a cumprir. Ele diz que realmente Marighella tomou conhecimento vagamente da prisão de dominicanos no Rio, mas não sabia os nomes nem as circunstâncias. Quando, a seu pedido, Antônio Flávio ligou para a Livraria Duas Cidades, e frei Fernando confirmou que ele podia comparecer ao encontro no dia 4 de novembro, às 20 horas, Marighella avaliou que estava tudo bem.

Na madrugada de 4 de novembro, a equipe de Fleury invadiu o Convento das Perdizes e levou para o Dops o prior, frei Edson Braga; o vice-prior, frei Sérgio Lobo; e os frades Tito de Alencar e Giorgio Callegari. Os dois primeiros foram ouvidos e liberados horas depois. Tito e Giorgio ficaram presos e conheceram o sadismo de Fleury.
Frei Betto encontrava-se no Sul. Foi preso em Porto Alegre na manhã do dia 9 de novembro. Levado para o Dops-SP; ao ser conduzido para cela no fundo do prédio, viu nos corredores Fernando, Ivo, Tito e Georgio. “Apertamo-nos as mãos, emocionados” .

Depois, todos foram transferidos para o Presídio Tiradentes. Na cela 7, tudo corria muito calmo. Rezas, estudos, trabalhos artesanais. Mas, define frei Betto, “na prisão, os próximos minutos assustam mais do que o feixe de anos da sentença de condenação. (…) o próximo minuto pode ser o início de uma fuga, a lâmina de uma faca retalhando a carne, a visita inesperada”.

O Calvário de frei Tito

De repente, dois anos depois, é preso o dono do sítio de Ibiúna, onde se realizara o Congresso da UNE. Tito, amigo do proprietário, é retirado da cela para a “sucursal do inferno”. É dele o relato: “Fui levado do Presídio Tiradentes para a Operação Bandeirantes (Oban – Polícia do Exército) no dia 17 de fevereiro de 1970. Algemaram minhas mãos, jogaram-me no porta-malas da perua. No caminho, as torturas tiveram início: cutiladas na cabeça e no pescoço, e apontavam-me seus revólveres”.

As primeiras perguntas foram sobre o Congresso de Ibiúna. Frei Tito disse que nada tinha a declarar. Os demônios entraram em ação. A primeira sessão foi só de pancadaria. Deram-lhe um descanso e mandaram que se preparasse para a “equipe da pesada”.

Não era mentira. No dia seguinte, em jejum, veio a sessão infernal com cadeira-do-dragão, choques elétricos nas mãos, nas orelhas, pau-de-arara, pauladas nos peitos, nas pernas. Repetição das perguntas, a mesma resposta: não ou silêncio!

Chamaram o chefe do inferno, Capitão Albernaz (major Benone de Arruda Albernaz, que seria preso por estelionato em 1984). “Tenho verdadeiro pavor a padre, e para matar terrorista nada me impede. (…) choques o dia todo, e, a cada ‘não’ que disser, maior será a descarga elétrica”.

Não era blefe. As perguntas não eram mais sobre Ibiúna. Nomes de padres metidos com a subversão, onde estava frei Ratton (autoexilado na Europa), aparelhos. “Não sei”, dizia frei Tito, e a cada negativa, de fato, uma descarga maior seguida de pontapés e pauladas nas costas. Partiram para a blasfêmia. Fizeram-no vestir os paramentos sacerdotais e lhe deram a “hóstia consagrada”, isto é, choques elétricos na boca.

Breve intervalo e nova sessão. Disseram que tanta resistência era característica de guerrilheiro. Então ele estava realmente mentindo e iria sofrer mais. Pontapés nos órgãos genitais, socos no estômago, cigarros queimando o corpo, “corredor polonês”. Nada conseguiram. O capitão Albernaz augurou: “…se não falar, será quebrado por dentro, pois sabemos fazer as coisas sem deixar marcas visíveis. Se sobreviver, jamais esquecerá o preço da valentia”.

De volta para a cela, frei Tito raciocinou que não queria mais continuar sofrendo. Os demônios tinham dito que todos os dominicanos presos iam passar pelo mesmo que ele, pois o primeiro interrogatório tinha sido muito fraco. Pensou que sua morte evitaria tudo isso e teria repercussão que talvez fizesse parar as torturas no Brasil. Conseguiu uma lâmina e cortou a artéria. Mas, avisados, os repressores socorreram e levaram-no prontamente ao Hospital Militar. Chamaram a atenção do médico: “doutor, este padre não pode morrer de jeito nenhum, senão estamos perdidos”.

Enquanto era tratado, os dominicanos conseguiram enviar mensagem aos seus superiores sobre o que estava acontecendo com Tito. Estes recorreram às autoridades eclesiásticas. Dom Paulo Evaristo Arns procurou a Oban, que negou estar com frei Tito Alencar. Dom Agnelo Rossi falou com o governador Abreu Sodré e encarregou dom Lucas Moreira Neves de procurar o juiz-auditor militar Nélson Guimarães, amigo de muitos anos de dom Lucas. O juiz concordou em visitar Tito no Hospital juntamente com dom Lucas com o compromisso deste nada divulgar do que visse ou ouvisse. A vida de frei Tito estava salva.

Voltou ao convívio dos companheiros e não se acomodou. Fez um relato de tudo o que passou e conseguiu mandar para fora da prisão. Ainda em 1970, foi publicado em jornais e revistas da Europa e dos Estados Unidos. Festejado como membro do grupo de heróis que suporta os horrores do inferno, mas não satisfaz ao diabo, fala disso com modéstia no citado informe: “…É preciso dizer que o que ocorreu comigo não é exceção, é regra. Raros os presos políticos brasileiros que não sofreram tortura. Muitos como Schael Schreiber e Virgílio Gomes da Silva morreram na sala de torturas. Outros ficaram surdos, estéreis ou com outros defeitos físicos. (…) Faço esta denúncia e este apelo a fim de que se evite, amanhã, a triste notícia de mais um morto sob torturas”.

Em dezembro de 1970, a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) sequestrou o embaixador da Suíça, Giovanni Enrico Bucher. Em troca de sua vida, conseguiu a libertação de 70 presos políticos, incluindo na lista frei Tito Alencar. Na despedida, deixou um bilhete para o advogado e companheiro de prisão Wanderley Caixe: “…Foi motivo de grande satisfação ter convivido com você durante 12 meses no Presídio Tiradentes. Sob o signo deste herói que, infelizmente, virou nome de cárcere, reuniremos os grandes ideais que o futuro do povo brasileiro tanto anseia: a construção do socialismo. (…) Contra isso, nada vence: nem tortura nem perseguições”.

Do Chile, em 20 de fevereiro de 1971, escreveu ao seu provincial frei Domingos Maia Leite, animado e esperançoso, embora preocupado. “…Tive uma vida muito movimentada aqui no Chile, fui eleito para a Comissão de Imprensa, participei do 2º Encontro Latino-Americano em comemoração à morte de Camilo Torres. Encontro-me bem do ponto de vista físico e psicológico. (…) A “infiltração” na Colônia está crescendo. O Fleury esteve há poucos dias no Chile. Está montando seu esquema por aqui…”. Decidiu ir para a Europa.

Apesar de não ter sido aceito no Colégio Pio Brasileiro, sendo acolhido no Convento de Saint Jacques, em Paris, estava razoavelmente bem na Europa. Em 7 de dezembro de 1973, três meses após o golpe militar que derrubou Salvador Allende, no Chile, escreveu a seu colega cearense frei Daniel Ulhôa: “…Aos poucos, vou me acostumando à solidão europeia… Ainda verei a chama do espírito latino-americano brilhar bem alto… Apesar de ainda angustiado, estou cheio de esperança… Nem um só momento de minha vida, lamentei o que fiz… Estou asilado, banido e longe de minha pátria, mas estou firme e disposto a continuar a lutar, embora minha resistência psicológica tenha se reduzido bastante após os 14 meses de prisão. Iniciarei uma psicoterapia para ver se a recupero o mais breve possível”.

Infelizmente, não recuperou. A maldição de Albernaz prevaleceu. No Natal de 1973, sua irmã, Nildes, o encontrou muito deprimido. Tinha visões de Fleury lhe dando ordens, ameaçando torturar seus parentes. Mudou-se para o campo, procurou trabalhar, mas não conseguia se concentrar. Perdia os empregos. Evitava conversar com os companheiros de convento. Isolava-se. Escreveu no marcador de um livro: “É melhor morrer do que perder a vida”. Descreveu num poema que vivia “Noites de silêncio”.
No dia 10 de agosto de 1974, seu corpo foi encontrado “balançando entre o céu e a terra, sob o céu azul do verão francês”. Frei Tito se suicidou sob a copa de uma árvore. Seu corpo foi sepultado num cemitério dominicano na França e trazido para o Brasil em março de 1983. Recebido em São Paulo, após celebração solene na Catedral da Sé, conduzida por dom Paulo Evaristo Arns, seguiu para sua terra natal, Fortaleza, onde repousa e recebe muitas visitas e homenagens.

No ano de 2004, fundou-se em Fortaleza o Instituto de Educação para os Direitos Humanos Frei Tito de Alencar. Outras entidades têm honrado sua memória. Poetas têm cantado em seu louvor, entre os quais Zé Vicente, cearense, poeta, cantor e compositor das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs): “…Ao saber disto não calo/Pois garanto com certeza/Que se calar este canto/Todos verão com espanto/Que as pedras clamarão/Tito recebe mensagens/Muitos lhe prestam homenagem/É o abraço da nação/Viva o mártir brasileiro/Vivam todos os irmãos/Que passaram no braseiro/De qualquer perseguição…”.

José Levino é historiador e colaborador de A Verdade

Fontes
Batismo de Sangue, frei Betto, 13ª edição, Editora Casa Amarela, São Paulo, 2004, do qual foram extraídas todas as citações e que serviu de roteiro para o filme de mesmo nome.

Burguesia do Paraguai mostra sua face golpista

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Burguesia do Paraguai mostra sua face golpistaA burguesia e os latifundiários do Paraguai, apoiados pela embaixada do EUA, aplicaram sumariamente um golpe no país, valendo-se das próprias leis burguesas, que sempre permitiram que as classes dominantes impusessem sua vontade.

Em duas rodadas de votação no Parlamento, o presidente do Paraguai, Fernando Lugo, foi deposto de seu cargo no último dia 22 de junho. Na Câmara dos Deputados o resultado foi de 76 votos a favor do impeachment e apenas um contra, e no Senado de 39 votos a favor, quatro contra e uma abstenção. Assumiu imediatamente a Presidência da República o vice de Lugo, Federico Franco.

Em nota oficial, a Direção Nacional do Movimento ao Socialismo, partido do presidente deposto, afirma: “O Parlamento hoje só representa a si mesmo. Os parlamentares que votaram pela destituição do presidente Fernando Lugo não podem arrogar-se de maior representação que a si próprio. Assim, 115 indivíduos impuseram sua vontade sectária aos 700 mil cidadãos que elegeram Lugo como presidente”.

Da abertura formal do processo de cassação à sua execução, passaram-se menos de dois dias, não possibilitando tempo real para a defesa, nem muito menos tempo para que o povo paraguaio, maior interessado na questão, pudesse opinar ou se manifestar sobre os rumos do seu país. Dada à forma truculenta e apressada como tudo foi feito, a manobra se constituiu num “Golpe de Estado Parlamentar”. Tudo isso, realizado com total monitoramento da Embaixada dos Estados Unidos no Paraguai.

O ex-bispo da Igreja Católica foi eleito como alternativa à dominação dos partidos oligárquicos, ao Partido Colorado – que comandou o país por seis décadas, inclusive sob uma ditadura abertamente fascista –, e recebeu apoio de parte das classes trabalhadoras, que acreditou em suas propostas.

Com o propósito de ganhar as eleições, Lugo construiu uma composição com o Partido Liberal, um dos partidos tradicionais da oligarquia, denominada Aliança Patriótica para a Mudança.

Devido a essa aliança com forças reconhecidamente de direita, um importante setor dos trabalhadores, especialmente dos camponeses, e as principais organizações de esquerda (Movimento Popular Pyhuara e o Pátria Livre) não o apoiaram, além de terem alertado para sua posição de conciliação com os latifundiários.

Como a principal promessa de Lugo para as massas populares foi a realização de uma Reforma Agrária que acabasse com o latifúndio, e esta não se concretizou em quatro anos de governo, os conflitos sociais no campo aumentaram. O último ato desta disputa secular no Paraguai foi o assassinato de 11 camponeses e a morte de seis policiais numa ação repressiva do Estado contra uma ocupação de terras improdutivas. A verdade é que Fernando Lugo, preso à aliança com as forças conservadoras, não conseguiu implementar nenhuma das reformas políticas, econômicas e sociais que prometeu na campanha, perdendo apoio popular.

Apesar de este fato ter sido o detonador da crise que culminou com o impeachment do presidente, este não foi um caso isolado, tendo já o Parlamento aprovado a Lei Antiterrorista, com a sanção presidencial, justamente para reprimir as lutas dos trabalhadores da cidade e do campo.

Centenas de militantes políticos estão sendo processados, perseguidos, demitidos e mesmo assassinadosd e os camponeses paraguaios permanecem vivendo na miséria, sem saúde, sem lar, sem terras, enquanto uma minoria de ricos fazendeiros enriquece cada vez mais.

As forças reacionárias nacionais e internacionais, em especial o imperialismo norte-americano, o Partido Colorado (derrotado nas últimas eleições) e o Partido Liberal (que governava com Lugo na Vice-Presidência) aproveitaram o cenário político de instabilidade e aplicaram sumariamente um golpe, valendo-se das próprias leis burguesas, que sempre permitiram que as classes dominantes imponham sua vontade. Novamente, a história se repete em nosso continente, já tão marcado por manobras políticas, corrupção estatal, golpes e ditaduras militares.

Mas o Governo de Fernando Lugo não satisfazia por completo a burguesia e os latifundiários, já que se inscrevia entre os governos ditos progressistas na América Latina, que possuem certas contradições com o imperialismo ianque e que, permanentemente, são alvo de seus atos subordinadores.

Fica, mais uma vez, a lição: fazer aliança com a grande burguesia e os latifundiários é a mesma coisa que colocar raposas para tomar conta do galinheiro.

As massas populares, os povos originários, os trabalhadores, os camponeses, a juventude e a esquerda revolucionária paraguaia repudiam esta farsa para depor o presidente eleito e não reconhecem o impostor Federico Franco.
Seguirão seu caminho, firmes e de cabeça erguida lutando por seus interesses e pela libertação nacional e social e por um Paraguai socialista.

Comitê Central do Partido Comunista Revolucionário (PCR)

Economia verde e outras panaceias ou “Rio, mas vim te…” [1]

Economia verde, capitalismo verde e outras panaceiasO caminho que me leva ao aterro do Flamengo, onde aconteceu a Cúpula dos Povos, me obriga a cruzar com carros pretos, esfumaçados, de sirenes cintilantes, adesivos VIP, indo em direção ao Rio Centro onde acontece a Conferencia das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, reunião chapa branca, aonde só entra quem tem CPF em dia e foto recente.

Caminho cruzando uma pista de alta velocidade que devorou mais vítimas essa semana. http://noticias.r7.com/rio-de-janeiro/noticias/mulher-morre-atropelada-no-aterro-do-flamengo-20120621.html. Ao caminhar vou devagar e divagando se há uma luta de classes entre motoristas e pedestres. Fica claro que não há espaço para outros ritmos, a cidade impõe o seu, vorazmente. Já vejo tendas brancas e outras coloridas brotarem como flores redondas, capítulos entre as árvores do jardim de Burle Max. A cada passo naquela direção, mais distante vai ficando meu horizonte, como dizia Galeano:

“A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar”.

Aterrizo lentamente no aterro, lembrando que piso no antigo morro de Santo Antônio, usado como adubo nesse lindo jardim. Piso onde havia um mar. Imagino suas praias com seus índios nus, esquecidos e afogados em um rio de janeiro que já foi de suas canoas de tronco só e de cuja a herança, nos restam apenas poucas memórias em nomes de ruas, sobrenomes e objetos de museus.

Começo essa caminhada na forma de texto, em homenagem ao professor Carlos Figueiredo do IBIO da UNIRIO que nos estimula a pensar e a professora Sandra Albernaz querida colega da Escola de Educação da UNIRIO, que me pediu para escrever algo sobre o que é essa tal “economia verde”. De pronto, começo a achar que a grafia mais correta talvez seja “green economy”. Prefiro escrevê-la em inglês, no idioma do império e dos neocolonizadores, o idioma da ONU para a Conferencia Oficial, pois é nessa língua que ela faz sentido e tem as suas ressonâncias em nossas vidas cotidianas e astuciosas[2].

É interessante notar a imensa dificuldade de traduzir essa ideia em especial para os povos originários. Esses dias me esforcei para explicar, na Cúpula dos Povos, no aterro, para meus amigos Guarani o que era a tal “green economy”. “Ao que parece essa discussão é muito mais pintada de verde do que “verde” de fato”, dizia um deles ao final de nosso papo, enquanto eu apertava sua mão como sinal de concordância e afinidade.

A base da green economy é o velho capitalismo, podre e moribundo. Prefiro continuar em inglês para não poluir o nosso português, uma língua parangoleica[3] que (ainda) nos pertence e nos une.

Tentei, mas descobri em meu pouco guarani, que não havia como traduzir a ideia de green economy. A dificuldade orbitava na ideia mesma de economia. Entre os povos originários faz mais sentido falar em eco-logia que em eco-nomia. Isso porque o prefixo “eco” que vem do grego oikos, quer dizer “casa” e nomia quer dizer administração, gerenciamento, daí economia: administração da casa. Entre os meus Guarani, assim como entre nós biólogos, é meio difícil, talvez impossível, pensar numa economia sem ecologia, já que “logia”, do grego, “logos”, quer dizer, estudo, saber. A pergunta é então: como administrar a casa sem conhece-la antes?

Este é o equívoco central, fundante e essencial da green economy. Em linhas gerais, ela não fala da vida, nem da casa, só remaneja o velho paradigma. Mas para entendê-la e fundamentar nossa crítica, vamos analisar sua ideia central, esta se baseia na inserção e criação de critérios verdes para a economia como um todo, como por exemplo, levar em consideração o ciclo de vida dos produtos, buscando o que eles chamam de produção mais limpa, que significa redução da poluição na fonte da geração dos produtos, estratégias de mecanismos de desenvolvimento limpo ou MDLs, uma economia que pense a redução do desperdício e do reaproveitamento, reciclagem e redução de materiais da produção ao descarte. São os famosos 3 Rs (reduzir, reutilizar e reciclar) que já viraram 5 com recusar e repensar.

A proposta da green economy é o estímulo à uma economia que faça a redução da pobreza e das desigualdades sociais, através de empregos verdes e do tal desenvolvimento sustentável e da propalada sustentabilidade, das empresas às pessoas e governos, nessa ordem. Portanto, propõe-se promover o bem-estar e reduzir desigualdades sociais ao mesmo tempo em que se faz a redução dos riscos ambientais e da escassez ecológica. Para isso, há três pilares: ecoeficiência, ou seja, uso eficiente de recursos naturais, economia de baixo-carbono, ou seja, aquela que não emite ou reduz a emissão de gás carbônico e outros gases que contribuem para o polêmico aquecimento global, e então, supostamente, não influenciariam numa possível alteração climática, ao mesmo tempo em que ela seria uma economia inclusiva: http://www.radarrio20.org.br/index.php?r=conteudo/view&id=12&idmenu=20

Lindo? Os movimentos sociais, organizados ou não, as redes , os campesinos, o MST, o MAB, os índios, os migrantes climáticos, os povos tradicionais, os sedentos do planeta, os excluídos, o seu Miguel de Paraty, Seu Roque em Mamanguá, pescadores artesanais de Martim Sá, ribeirinhos do Amazonas, os que tiveram que deixar seus modos de vida por causa do acidente do rio Pomba, os pescadores de Sepetiba e da Baía de Guanabara, os trabalhadores de Jirau, os grupos agroecológicos, as ecovilas, alguns professores em greve e outras eco-vítimas, acham que a coisa pode não ser tão linda assim.

A discussão para esses grupos que fizeram coro na Cúpula dos Povos, é que a tal green economy é só pintar de verde o velho capitalismo excludente, patriarcal, racista, hipócrita, cruel, genocida e injusto de sempre. Para eles, essa suposta nova forma de economia, estaria usando o discurso da sustentabilidade como a velha estratégia antropofágica do capitalismo, ou seja, usando a sua imensa habilidade de incorporar e ressignificar qualquer coisa que se oponha a ele.

Desta forma, diretrizes ambientais, viram estratégias de marketing ecológico, o famoso greenwashing, bem como diferencial competitivo para conquista de um mercado de consumo cada vez mais “consciente”. O mercado consumidor se transforma num passe de mágica, em mercado verde, transformando compras governamentais, de empresas e de pessoas, em compras verdes e conscientes, http://cio.uol.com.br/tecnologia/2010/04/23/sustentabilidade-governo-lanca-portal-para-compras-verdes/. Ou seja, aquelas comprinhas feitas com “critérios ambientais”, do tipo: “leve esse camisa de algodão mestiço, rústico e azul, feita por mulheres-monges canhotas do alto solimões e do Tibet sagrado, costuradas pelas mãos sagradas do fogo sagrado dos povos do alto himalaia esquerdo, três é 10 real! Pode pagar com visa, a gente parcela” e coisas do tipo!

A incorporação do discurso ambientalista pelo “setor produtivo”, pelo capitalismo em processo de falência, cria estratégias de alianças público-privadas entre governos e empresas de eco-fachadas, tenta flexibilizar leis ambientais, financia a campanha de deputados e senadores para isso. Neste ponto, gostaria de dizer que venho estudando o financiamento de campanha da chamada “bancada ambientalista” no parlamento brasileiro e está ficando claro como as empresas transnacionais, símbolo de nosso modelo, mais interessados e “líderes” do discurso da green economy, entram no jogo político “democrático”. Elas financiam, sistematicamente, as campanhas de deputados e senadores (desde o início da carreira pública deles) e quando eles chegam lá, esses filhos-da-puta, ocupam cargos estratégicos nas comissões de meio ambiente tanto no senado quanto na câmara. Por isso conseguiram aprovar as vergonhosas, vexatórias e espúrias alterações no código florestal, aprovar Belo Monte e outros, mesmo com a sociedade, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) , Academia Brasileira de Ciências, entre outros segmentos sendo contrários[4].

O discurso da green economy fala em reciclagem e numa economia baseada na redução do desperdício que pensa os ciclos de vida dos produtos, e não no ciclo de vida das pessoas, como se os produtos tivessem vida e não consumissem a vida. Dessa forma, justifica-se manter milhares de catadores como catadores de lixo sem direito à mobilidade social. É uma economia que ao pensar no valor da natureza, quantificando seus custos e serviços ambientais, dialeticamente gera a precificação e a mercantilização da vida.

Vejamos os três pilares da economia verde: ecoeficiência, economia de baixo carbono e inclusão social, vamos fazer uma leitura crítica sobre os mesmos. Em primeiro lugar, a chamada ecoeficiência, como o nome sugere, trata-se de um fruto do pensamento neoliberal que quer medir a produtividade e a eficácia dos processos ambientais, nesse sentido, a natureza sempre perde, pois ela tem um tempo outro, um tempo próprio, nada eficiente diante dos desafios do mercado, por isso a necessidade da intervenção humana. É uma lógica coerentemente perversa. Que fez por exemplo, enquanto se negociava um acordo pífio na Rio+20, mudando uma vírgula aqui e um ponto parágrafo ali, a ambientalista Dilma doava 20 bilhões do seu , do meu, do nosso din din para salvar os bancos europeus, é a chamada “solidariedade dos emergentes”  http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2012/06/120619_g20_encerra_pu_ac.shtml

E mais 20 bilhões para a “infraestrutura nos estados” *(tipo assim, arco metropolitano que ia extinguir uma espécie de anfíbio) http://www.portogente.com.br/texto.php?cod=66678. Pergunto, porque não nos deu o aumento?

É importante lembrar também, que se ser ecoeficiente é reduzir problemas ambientais, podemos dizer: “Houston, temos um problema!” a Petrobras, a Vale. A Bunge, A MONSANTO e outras transnacionais altamente degradadoras e poluidoras têm todos os selos e prêmios de ecoeficiência.

O outro problema é concentrar os esforços em torno do gás carbônico e do discurso das mudanças climáticas. Tem gente que acredita nisso e tem gente que não, o problema para mim é, como nos falava Edgar Morin na Cúpula dos Povos, o risco da cegueira da hiperespecialização, olhamos para a molécula de CO2 e não para os conflitos e injustiças ambientais. Nesse sentido, ao reduzirmos cartesianamente a questão, não conseguimos contribuir em quase nada para mudanças sociais de fato. Como, por exemplo, a valorização verdadeira dos índios. Neste momento, enquanto escrevo essas linhas sentado numa confortável poltrona, a situação dos mortais é a seguinte: campesinos hondurenhos estão sendo mortos por conflitos no campo, pessoas estão sobre escolta policial no programa de proteção a testemunhas por conflitos e injustiças socioambientais na Amazônia, trabalhadores e moradores dos arredores de Jirau, estão sendo criminalizados, removidos e assassinados, torturados, desaparecidos, o presidente paraguaio que representa uma alternativa a uma ditadura de 70 anos sofre um golpe.[5].

E por fim, seu último pilar a ideia de inclusão social. Gosto de lembrar de Enrique Dussel, filósofo argentino, que nos diz que não se trata de incluir os excluídos, se trata de transformar a sociedade.

Mas, como eu acredito num mundo afetuoso e que só o amor constrói, o que vejo de alternativa é apontar para outros pilares, os pilares que a Cúpula Dos Povos apontou, ou seja por uma economia solidaria, baseada na justiça socioambietal, contra a mercantilização da vida e pela defesa dos bens comuns.

Nesse sentido, este é o momento de radicalização do pensamento ambientalista, como nos diz Agripa[6]. Radical do latim radis, quer dizer raiz, então radicalizar quer dizer ir até a raiz de algo, neste caso a raiz do problema é o sistema capitalista, neoliberal, do estado mínimo, da flexibilização das leis, da gestão, do produtivismo e da produtividade, da precarização do trabalho e do trabalhador, que mercantiliza a vida, polui, privatiza a semente, o genoma, a água e nos envenena, consumindo e privando-nos da natureza, gerando exclusão, miséria, luta no campo, conflitos e injustiças socioambientais, destruição ambiental, perda da bio e sociodiversidade e diretores de polos da EAD. Tudo isso sob o aval dos selos ambientais, das certificações, normas ISSO-isso, ISSO-aquilo, do greenwashing, que dá prêmios de meio ambiente e outras panaceias da ecopalhaçada da green economy, que nada mais é do que o velho modelo fantasiado de verde, com “políticas pra inglês ver”, com uma lógica interna que incorpora o discurso ambiental em “práticas de sustentabilidade”, que pinta o telhado de verde e manda mijar no banho para sanar a culpa judaico-cristã dos nossos “empresários conscientes”.

Enfim, precisamos mudar o sistema, mudar o modelo, tornando-o capaz de olhar para quem precisa ser visto. Isto se chama REVOLUÇÃO. Assusta? Como dizia Guimarães Rosa: “carece de ter coragem”! E ela já está acontecendo. Esse modelo já era! Veja o que está acontecendo na praça Tahir, em Quebec, na Síria e em várias partes do mundo.

Eu continuo apostando no diálogo, na construção de uma agenda comum, mas sobretudo, na visibilização dos vulneráveis, dos esquecidos, na visibilização de suas lutas. Precisamos nos unir a elas, pensar numa agenda de pesquisa que nos aproxime dos movimentos sociais e das pessoas. Que nos aproximemos em particular dos índios, a quem tanto devo por tudo que me ensinam.
Aprendi, seguramente, muito mais com meus Tudjá Kuery (os mais velhos) que com minha formação acadêmica formal. Vou terminar repetindo o que falei esses dias no Rio Centro:

Eju Py Nhande Apy Nhanderu, Nhande a´e ma xereterã kuery, eju py nhande apy yvymarane´y, Eju Py nhande apy yy porã!. Havete í ité, epytã nhanderu reve!

Celso Sánchez
(Esse texto é dedicado à Professora Sandra Albernaz e ao Professor Carlos Figueiredo da UNIRIO)


Notas

[1] Este título me foi dado por um guardador de carros, o famoso “flanelinha”, na rua Silveira Martins no Catete, e embora eu tenha a maior antipátia dessa turma, devo admitir: vox populi, vox dei!

[2] No sentido de Certeau,que nos diz que entre estratégias e táticas vamos criando nossa vida cotidiana e astuciosa, em suas palavras: “ Il est toujous bon de se rappeler qu’il ne faut pas prendre les gens pour des idiots.” (Sempre é bom lembrar que não se deve ter as pessoas por idiotas. Tradução deste idiota) CERTEAU, Michel d L’invention du quotidien, t. I: arts de faire. Paris, Gallimard, 1990.

[3] Em refencia a obra de Hélio Oiticica – Parangolé.
– Ressalva: Prof. Alberto Roiphe, me perdoe por essa e outras blasfemias! Lembre-se das palavras de Jesus:”Perdoe-os, eles não sabem o que dizem” .. nem o que escrevem, aliás ele (eu) não sabe (sei) escrever!

[4] Para maiores informações: http://www.remea.furg.br/edicoes/vol27/art7v27.pdf

[5] Para maiores detalhes:
www.cebraspo.org.br/ br.vlex.com/vid/-318732847/
http://www.folhabv.com.br/Noticia_Impressa.php?id=107951
http://desacato.info/2010/12/ataque-militar-contra-campesinos-hondurenhos/
http://racismoambiental.net.br/2011/12/camponeses-ameacados-de-morte-no-amazonas-perderao-protecao-da-forca-nacional/
http://noticias.terra.com.br/mundo/noticias/0,,OI5853788-EI294,00-OEA+expressa+preocupacao+e+pede+devido+processo+no+julgamento+de+Lugo.html[6] ALEXANDRE, Agripa Faria. A perda de Radicalidade do Movimento Ambientalista Brasileiro. Uma contribuição à critica do movimento. Blumenau Florianópolis:Edifurb Editora da UFSC. 2000. p.23.

Esquema na entrega de casas populares em Patos tem prejudicado quem de fato precisa

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Esquema de entrega de casas populares em Patos, PBO caso da senhora Luciana Ferreira, 41 anos, mãe solteira de três filhos, residente na Quadra A, lote 25 no Conjunto Geralda Medeiros, pode ser comparado aos inúmeros casos que foram denunciados ao Ministério Público em busca de solução para reparar uma injustiça. Luciana mora de favor em uma das casas que foi parar na mão de quem não precisa de moradia. Agora o “dono” da casa a quer de volta e busca na justiça ordem de desejo para Luciana e seus três filhos. Vivendo de bico através de faxinas em residências, de contribuição de pessoas da Igreja, Luciana é mais uma vítima da política de moradia em Patos.

Dona Luciana não foi contemplada com moradia através dos programas sociais dos governos, apesar de se encaixar perfeitamente nos requisitos para receber. O dono da casa, ao contrário de Luciana, recebeu a moradia popular devido à aproximação com políticos influentes na distribuição de casas. Como o “dono” não precisava de residência emprestou para que Luciana morasse temporariamente até que ele desejasse ter de volta a casa. Passados quase três anos, o “dono” volta e pede na justiça que Luciana seja despejada.

Assistentes Sociais da Companhia Estadual de Habitação Popular – CEHAP tomaram ciência do caso e comprovaram que quem de fato precisa da casa é Luciana e seus filhos, mas todos os documentos estão em nome do cidadão que foi contemplado com a casa. O caso agora está na justiça. O receio de Luciana é de que ela seja expulsa da residência com seus filhos passando a engrossar a fila dos sem-teto.

O caso relatado é semelhante a outros inúmeros denunciados junto ao Ministério Público. Enquanto quem não precisa de moradia popular recebeu generosamente casas, outros, como no fato relatado, enfrentam dificuldades para moradia indo constituir favelas na cidade de Patos e no país.

Fonte: PatosOnline.com

Incêndio no Hospital Pedro Ernesto é reflexo do descaso com a saúde

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Incêndio no Hospital Pedro Ernesto é reflexo do descaso com a saúde No dia 4 de junho, pacientes, familiares e funcionários do Hospital Universitário Pedro Ernesto foram surpreendidos com um incêndio que afetou todo o almoxarifado do HU. Todo o material do hospital foi destruído. Entre eles, seringas, luvas e medicamentos. Diversos andares foram afetados, cerca de 100 pacientes tiveram que ser deslocados e uma senhora de 65 anos morreu após inalar fumaça. Segundo o Governador do Estado, Dr. Sergio Cabral, a morte da mulher já estava prevista, a inalação da fumaça apenas abreviou o tempo.

Após o acidente diversas falhas foram encontradas. Entre elas a não existência de uma brigada de incêndio no hospital e 12 anos sem vistoria do corpo de bombeiros, falta de material cirúrgico e filme para raio-x e diversas salas de cirurgia funcionando com metade de sua capacidade. Isso tudo evidencia o descaso com a saúde pública em nosso estado. Em um bairro próximo ao hospital, fica o estádio de futebol Mario filho (Maracanã), onde foram gastos R$1 bilhão e 600 milhões em reformas enquanto a Unidade hospitalar recebeu em 5 anos R$35 milhões para a aquisição de aparelhos. Isso evidência a preferência do governo em investir mais dinheiro na Copa do Mundo em detrimento da saúde. Segundo o diretor do hospital, a construção é da década de 40. Por isso, há muito problemas elétricos e hidráulicos. Já a assessoria do Governo informou que o prédio é uma construção nova, que tem cerca de um ano. Nesse jogo de empurra, os mais prejudicados são os pacientes que dependem desse atendimento e ficarão sem medicamentos. O problema da saúde pública no Brasil é fruto de uma política econômica que privilegia o capital financeiro em vez do povo. Enquanto se destina 3,6% do PIB em Saúde, se gasta 45,9% em juros e amortizações da dívida pública. Entendemos, que para termos uma saúde de qualidade, devemos ter hospitais bem equipados, funcionários capacitados e materiais a serem disponibilizados a população (medicamentos, seringas, etc.), investimento público nas unidades hospitalares e melhor remuneração aos profissionais da área.

 Karen Lemes, Rio de Janeiro