UM JORNAL DOS TRABALHADORES NA LUTA PELO SOCIALISMO

sexta-feira, 12 de setembro de 2025
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Epidemia de dengue mata 1.500 pessoas no Brasil

Até meados de abril, o Brasil já tinha ultrapassado três milhões de casos de dengue, o triplo em comparação ao total de casos do ano de 2023. Até o início de abril, 1.500 pessoas foram mortas pela doença. Alguns estados chegaram a decretar emergência em saúde pública, com números exorbitantes de casos e sobrecarga do sistema de saúde.

Priscila Voigt | Porto Alegre (RS)


BRASIL – A dengue é uma doença viral, transmitida pela picada do mosquito Aeds aegypti, quando infectados. Trata-se de um inseto doméstico, que vive dentro ou ao redor de domicílios. Normalmente, a primeira manifestação da dengue é a febre alta, acompanhada de dor de cabeça, dores no corpo e nas articulações, além de prostração, fraqueza, dor atrás dos olhos e, em alguns casos, manchas vermelhas na pele, podendo evoluir para uma queda brusca da pressão arterial ou hemorragia, levando a óbito.

Para ser considerada uma epidemia, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estipula que o coeficiente de incidência deva ser de 300 casos para cada 100 mil habitantes. O Brasil já tem 1.529 casos para cada 100 mil habitantes e concentra 70% de todos os casos da América Latina e do Caribe. Essa é a maior epidemia já registrada no país.

As causas do avanço da dengue 

A epidemia de dengue escancara a falência desse sistema moribundo que é o capitalismo, que, em nome do lucro, destrói o meio ambiente, causando crises climáticas; precariza e privatiza os serviços públicos, privando a classe trabalhadora dos direitos mais elementares, como o saneamento básico, o abastecimento regular de água e o acesso aos serviços de saúde. 

O aumento das temperaturas, chuvas e inundações, gerado pela crise climática, cria as condições propícias para a proliferação do mosquito Aeds Aegypt, acelerando o seu ciclo reprodutivo. Também, a situação de desigualdade social a que o nosso povo está submetido, vivendo em moradias precárias, sem saneamento básico e abastecimento regular de água, faz com que se amplie a transmissão da doença, uma vez que, sem água em quantidade e qualidade adequadas para o consumo diário, a população precisa acumular água nos mais diferentes tipos de reservatórios. 

Uma pesquisa do Instituto Trata Brasil, baseada nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Continuada Anual, produzida entre 2013 e 2022, aponta dados alarmantes. Da totalidade de 74 milhões de moradias brasileiras, quase 9 milhões não possuem acesso à rede geral de água; quase 17 milhões contam com uma frequência insuficiente de recebimento; cerca de 11 milhões não possuem reservatório de água; cerca de 1 milhão não possuem banheiro; e 22 milhões não contam com coleta de esgoto. Uma a cada duas moradias brasileiras convive diariamente com algum tipo de privação no saneamento.

Existem recomendações de cuidados individuais para o combate à dengue, como uso de telas nas janelas e repelentes, remoção de recipientes nos domicílios que possam acumular água e se transformar em criadouros de mosquitos, vedação dos reservatórios e caixas de água, desobstrução de calhas, lajes e ralos. No entanto, com medidas individuais sem medidas efetivas de saúde pública e sem planejamento urbano e ambiental, que garantam o atendimento aos direitos básicos à água potável e ao esgotamento sanitário, só estaremos “enxugando gelo”, como diz o ditado popular.

Além da dengue, existem outras diversas doenças causadas por falta de saneamento básico: diarreia por Escherichia coli, disenteria bacteriana, febre tifoide, cólera, leptospirose, hepatite A, verminoses, giardíase, amebíase, arboviroses (além da dengue, a zika e a chikungunya). Todos os dias, mais de mil crianças com menos de cinco anos de idade morrem no mundo devido a doenças causadas por falta de água potável, saneamento e higiene. Essas mortes poderiam ser evitadas se houvesse políticas públicas eficientes. 

Dessa forma, água e tratamento de esgoto devem ser encarados como direito, e não como mercadoria. No entanto, o que vemos é a privatização das empresas de abastecimento de água e coleta de esgoto, o que tem gerado o aumento da tarifa, queda na qualidade da prestação do serviço e baixa cobertura, a exemplo dos Estados do Rio de Janeiro, Alagoas e Amazonas; sem falar do marco regulatório do saneamento, aprovado no Governo Bolsonaro, que estimula a privatização. Além disso, ao invés de investimento nas áreas sociais, o que acontece, na prática, é o congelamento desses recursos através da política do teto de gastos e do arcabouço fiscal, com a finalidade de garantir o pagamento da dívida pública, transferindo anualmente 46% do Orçamento Federal para os banqueiros. Enquanto isso, míseros 0,0034% do orçamento 2023 foi destinado para saneamento.

De baixo do sistema capitalista, tudo vira mercadoria, a exemplo de direitos básicos e, enquanto essa for a regra que rege nossa vida econômica e social, a dengue, a Covid-19 e outras doenças que seriam de fácil controle, seguirão nos matando. Nossa sobrevivência depende, literalmente, da mudança dessa estrutura e na construção de uma outra sociedade que não degrade a natureza nem explore os seres humanos.

Matéria publicada na edição nº 290 do Jornal A Verdade.

A UP, as lutas do povo e as eleições

Mais que eleger representantes, o povo precisa ver e acreditar na força que tem e só aprenderá isso por meio de suas próprias lutas, deixando de lado as ilusões com o personalismo político, que só propaga mentiras e enganações para a manutenção de privilégios e o enriquecimento de uma casta de políticos corruptos e fascistas.

Samara Martins | Vice-presidenta da UP


BRASIL – Em breve, começará o processo das Eleições Municipais 2024. É bem comum, nesses períodos, que o debate político das cidades fique restrito apenas à escolha de quem são “as melhores pessoas” para resolver os problemas do povo. Nada mais errado.

Não são, nem de longe, as eleições, o movimento capaz de transformar a vida das pessoas. A história do nosso país já deu provas concretas de que todas as grandes conquistas dos trabalhadores e demais camadas oprimidas só foram possíveis por meio de muitas lutas coletivas, e não de um parlamentar ou governante, como pregam algumas forças políticas, inclusive, que dizem defender a classe trabalhadora.

A Unidade Popular (UP), por sua vez, é o partido político que considera que a luta é o melhor e único caminho para a participação do povo na política. Defende que a população não deve esperar um “salvador da pátria” para resolver seus problemas. Portanto, no momento em que o povo está discutindo a política convencional, a UP se esforça para demonstrar que a luta é o “fazer político” do povo.

Por isso, o partido apoia e participa de todas as lutas desenvolvidas, mesmo nos períodos eleitorais. Exemplo disso foi em 2020, em Natal (RN), em que o centro da campanha à Câmara Municipal foi o apoio e a participação na Ocupação Emmanuel Bezerra, organizada pelo Movimento de Luta no Bairros, Vilas e Favelas (MLB). No ano seguinte, as famílias conquistaram sua inclusão em projetos de moradia na cidade.

Também em Belém (PA), em 2022, a campanha eleitoral da UP se mobilizou, já no primeiro dia oficial de campanha, em torno da Ocupação de Mulheres Rayana Alves, organizada pelo Movimento de Mulheres Olga Benario. Esta Casa de Referência contra a violência às mulheres segue atuante até hoje.

Isso significa que não devemos participar das eleições nem indicar candidatas e candidatos? Pelo contrário! Não só podemos como devemos lançar candidaturas. Nossos indicados devem ser aqueles referenciados nas lutas dos sindicatos, movimentos sociais e estudantis, organizações de mulheres, do povo negro e indígena, do movimento LGBTIA+, etc. Lançar agitadores que denunciem a falta de democracia dessas “eleições democráticas”, que impedem que partidos como a UP tenham tempo de TV e rádio (nem um segundo sequer). Devem fazer a campanha para quebrar essa “Cláusula de Barreira” que permite que partidos pequenos não tenham parte do fundo partidário e só recebam as sobras do fundo eleitoral (mesmo havendo um gasto exorbitante de recursos públicos apenas para partidos já antigos e com parlamentares eleitos).

Foi também nesse sentido que a UP republicou, em formato de cartilha, a resolução da Internacional Comunista intitulada “O Partido Comunista e o Parlamentarismo”, fruto da campanha do Fundo Partidário Popular, para ser lida pelos filiados nos núcleos de todo país, fazendo o debate de como a UP deve se posicionar nos processos eleitorais e nos mandatos que conquistaremos, pois, mesmo como apoio secundário às lutas, o Parlamento burguês (das classes ricas) deve ser uma tribuna de denúncias e desgaste do capitalismo.

Mais que eleger representantes, o povo precisa ver e acreditar na força que tem e só aprenderá isso por meio de suas próprias lutas, deixando de lado as ilusões com o personalismo político, que só propaga mentiras e enganações para a manutenção de privilégios e o enriquecimento de uma casta de políticos corruptos e fascistas.

Matéria publicada na edição nº 290 do Jornal A Verdade.

CARTA | Meus caminhos

Manuel Palmares | São José (SC)


CARTA – Os caminhos que me trouxeram até aqui foram de muitas dificuldades e sem compreensão do que a vida poderia me oferecer. Jamais compreendi o que realmente seria da minha vida, o que daria significado a cada década que passasse.
E me restava apenas decidir, buscar condições dignas para que meus filhos pudessem sobreviver sem dificuldades, longe das minhas inseguranças e das humilhações que já havia passado como um jovem. Não havia esperança naquela comunidade onde todas as tardes sabíamos que mais um foi morto ou havia decidido “entrar para o corre”.

Eu não queria ser morto. Sempre tive medo da morte. Medo de saber se não haveria continuidade após deixar esse corpo. Entre conversas, jogos de bola, aulas perdidas nas vielas da comunidade, faltava pouco para ingressar no que me daria uma esperança de ter alguém que me protegesse, e que eu protegesse, condições de comer e dar o que comer aos meus filhos. O crime sempre esteve próximo, mesmo que não pareça, mas, em muitos momentos de desespero, furtar sem ter o que pôr na mesa nunca foi imoral para mim.

Mas na cultura me encontrei e saí daquela condição. Foi onde comecei a compreender a importância da política. Passei pelo Terreiro e encontrei ações sociais na comunidade. Aprendi o valor da coletividade e, ao lado de uma grande companheira que tive, conheci os comunistas, pela literatura. Um livrinho de bolso, “Passado e presente” e a biografia do “Marighella”. Foi onde comecei a admirar essa caminhada tão determinada desses homens que haviam passado por esse momento de 1964. Foi quando entrei na universidade, coisa que jamais esperava acontecer na minha vida. Estava eu aqui em Floripa, na universidade, tudo havia mudado. Apenas uma coisa não mudou: a pobreza e a possibilidade de necessitar, cogitar ter que furtar ou vender drogas, ainda mais onde a droga é quase liberada. Vários playboyzinhos querendo se chapar para curtir a “Ilha da Magia” nos bares em que eu trabalhava. Era fácil.

Um colega surge entre as aulas de Serviço Social e me convida para fazer um trabalho no bairro com um tal de MLB. E bem aqui estou, após muitos desafios e apostas de várias/os camaradas. Tentei em muitos momentos me afastar das tarefas, mas, quando me afastava destes camaradas, percebia que a vida ficava mais difícil. Ao lado deles, estudava e compreendia o porquê eu estava naquelas condições. Não era culpa minha e, a cada reunião, ficava mais evidente que eu e mais muitos brasileiros estamos sendo colocados neste lugar. Inclusive, eu ter que roubar e me tornar um criminoso perante essa sociedade burguesa, geraria lucro para os vermes desta sociedade.

Caí em consciência e, dentro das minhas possibilidades, fiz o que tinha que ser feito: me dedicar a ser parte deste gigante Partido de Manoel Lisboa, Emmanuel Bezerra, Manoel Aleixo, Amaro Luiz de Carvalho e Amaro Félix Pereira.

Me dedico a cumprir esse caminho revolucionário, pois, apenas com nossa dedicação diária, poderemos denunciar e enfrentar quem vem explorando nosso povo desde a escravidão e tortura dos povos originários e africanos que aqui sofreram.

Nesse final de semana, fez mais sentido ainda quando fui democraticamente escolhido para estar ao lado de revolucionárias que admiro e respeito, com o compromisso de representar os valores desse gigante Partido no estado mais racista e fascista do Brasil.
Só agradeço a confiança e tenho certeza que buscarei me elevar sempre ao nível dos nossos mais honrados camaradas.

E a caminhada que farei, por muitas décadas de vida, será dedicada ao grande e gigante PCR, pois, enquanto existir fôlego e força neste peito, caminharei em direção de conquistar a massa a lutar pelos seus direitos. E, se em algum momento eu esmorecer, lembre-me de onde eu vim e de onde eu estou, pois, sem dúvidas, caminhar elevando essa grande bandeira me fará levantar a cabeça e enfrentar os desafios mais fúteis e individuais desta vida. E seu eu tombar, tombei honrado por ter vivido ao lado de cada camarada que aqui eu conheci. Irei sem preocupação. Deixarei meus livros às novas gerações e minha história para os que tiverem dúvida que não existe solução.

Obrigado a esse Partido por me permitir caminhar sobre suas orientações, pois, com elas, iremos vencer e trazer paz ao povo da nossa nação.

Carta publicada na edição nº 290 do Jornal A Verdade.

Contra interferência do governo nos grêmios, estudantes refundam entidade histórica em Alagoas

União Secundarista dos Estudantes de Alagoas é refundada e enfrenta tentativa do governo alagoano de interferir na organização dos grêmios estudantis.

Patrik Lira | Maceió


JUVENTUDE – No começo desse ano os estudantes de Alagoas decidiram reativar uma entidade histórica do Estado, a União Secundarista dos Estudantes de Alagoas (USEA). No dia 22 de fevereiro, reuniram-se estudantes da rede estadual e federal de ensino para debater a organização dos estudantes e a necessidade de uma entidade ativa. Na ocasião, a reativação foi dedicada em homenagem ao estudante alagoano, fundador da antiga UESA, assassinado no período da ditadura militar, Manoel Lisboa de Moura.

A reativação dessa entidade vem num momento de grande importância para a reconstrução de um movimento estudantil autônomo no Estado. Hoje, lamentavelmente o governo estadual tem uma política de cooptação dos grêmios estudantis através dos programas “avança grêmio” e “grêmio que cria”, programas que destinam dinheiro da rede estadual para os gremistas.

Essa política é um entrave à autonomia dessas entidades e na prática desmobiliza a luta, pois, gestores das escolas e professores acabam ditando o que os grêmios e gremistas devem ou não fazer e não se vê uma luta para cobrar do estado suas obrigações com a educação.

Um grupo de estudantes em torno da tese “Rebele-se na UBES”, abraçou essa luta e tem traçado esse debate da autonomia com os estudantes, debate que se consolida com a reativação da USEA.

O estudante Denisson, da escola estadual Drª. Eunice Lemos Campos, demonstrou sua indignação. “A SEDUC indica um professor para orientar o grêmio, mas o que acontece na prática é que o professor quer obrigar o grêmio a seguir seu comando. Me senti silenciado em uma reunião com uma ‘orientadora’ do nosso grêmio, pois ela indicou pessoas ao grêmio sem conversar com a gestão e sem ter tido novas eleições, além de não ouvir as atividades que propomos, só manda fazer as atividades que ela quer, expressando um autoritarismo.”, afirma.

Diante dessa afronta a USEA lançou a campanha “Tira a mão do meu Grêmio” reivindicando o respeito à lei do grêmio livre. A comissão gestora provisória eleita em assembleia denuncia esses problemas e de vários outros da educação de Alagoas, como as reformas das escolas e a revogação do “novo” ensino médio. Grêmio estudantil é dos estudantes e é pra lutar. Dessa forma, a entidade refundada realizará, no próximo período, grandes lutas e um vitorioso congresso para gestão dos próximos anos.

20 monopólios dominam produção mundial de plástico responsável pela poluição do meio ambiente

Monopólio e falta de planejamento da produção de plástico pelos monopólios capitalistas é uma das causas do aumento da poluição no mundo. Apenas 20 empresas controlam 55% da produção do material em todo planeta.

Caio Bessa | Macaé (RJ)


MEIO AMBIENTE – Um estudo alarmante, divulgado pela The Plastic Waste Makers Index, nos mostra a verdadeira face da crise do excesso de produção de plástico que assola o mundo: 20 empresas são responsáveis por 55% de todo o plástico produzido globalmente. Essa concentração de recursos naturais e meios de produção nas mãos de uma minoria de bilionários escancara a irracionalidade do sistema capitalista, onde o lucro é colocado acima do bem-estar dos povos do mundo.

Agravando ainda mais a situação, não é surpresa que apenas 100 empresas controlam 90% dos resíduos plásticos do mundo. Essas multinacionais, sedentas por lucro rápido, inundam o mercado com produtos de plástico de uso único, contribuindo para a crescente montanha de lixo que sufoca nosso planeta.

Enquanto isso, a reciclagem, uma solução óbvia, representa uma mera fração dos esforços, com apenas 2% dos plásticos descartáveis sendo reciclados. Além disso, os trabalhadores da reciclagem são submetidos à informalidade, falta de condições de trabalho e a jornada excessiva de trabalho, dificultando ainda mais o cenário.

O financiamento desenfreado dessas operações destrutivas é apoiado por 20 bancos globais, evidenciando a cumplicidade do sistema financeiro no agravamento da crise ambiental. No Brasil, o quarto maior produtor de lixo plástico do mundo, as políticas de gestão de resíduos são insuficientes, refletindo o quanto as autoridades se vendem para atender aos interesses dos monopólios do plástico.

No mesmo estudo há a previsão sombria de que até 2025 serão gerados três trilhões de itens descartáveis. Este dado é um fato assustador do colapso do capitalismo, que prioriza a produção incessante em vez da proteção do meio ambiente. Disseminando assim microplásticos em todos os cantos do globo, incluindo os ecossistemas mais remotos, sendo encontrados dissolvidos até no sangue humano e na placenta de gestantes, apontado como um fator de risco para o desenvolvimento embrionário.

Não geração ou redução da produção plástica é uma das saídas 

O Plano Nacional de Recursos Sólidos Brasileiro aponta que a primeira e mais importante medida a ser adotada é a substituição da composição das principais embalagens e sacolas de uso único freando a produção de plástico, no entanto essa medida não é adotada por conta de conflito de interesses corporativos.

Outro recente estudo do banco Credit Suisse revela números chocantes: mais de 400 milhões de toneladas de plástico são produzidas anualmente, resultando em uma média de 57 quilos por habitante que nunca pediram por essa produção. Ou seja, até um dos maiores bancos do mundo, controlado por bilionários, sabe da extensão do problema.

O plástico já foi encontrado desde o topo do Monte Everest até as profundezas inexploradas da Fossa das Marianas (na Oceania), demonstrando a onipresença e o quão irreparáveis são os danos causados pela sua produção.

Uma análise da indústria de embalagens no Brasil, feita pela Fundação Getúlio Vargas, mostra que esse mercado movimentou 93 bilhões de reais em 2020, aumentando para 118,4 bilhões em 2021 e alcançando 123,2 bilhões em 2022. Esse aumento exponencial no valor bruto da produção de embalagens no Brasil é apenas mais um indicador do crescimento descontrolado da indústria do plástico, alimentado pela ganância da burguesia e pela ausência do Estado no controle desta atividade econômica.

O único modo de frear essa  crise, é derrubando o capitalismo e responsabilizando os verdadeiros culpados: os bilionários donos das empresas que lucram com a destruição ambiental. Chegou a hora de abandonarmos a mentira que a solução são ações individuais e exigir mudanças sistêmicas que coloquem a saúde humana e ambiental acima dos interesses corporativos. É preciso lutar pelo controle dos meios de produção pela classe trabalhadora, de lutar pelo socialismo.

Professores da UFBA aderem à greve nacional das universidades federais

Em assembleia realizada na Universidade Federal da Bahia (UFBA), cerca de 400 professores estiveram presentes para debater a luta da categoria pela recomposição salarial e adesão à greve nacional das universidades federais. A ampla maioria presente decidiu pela deflagração da greve na universidade a partir do dia 29 de abril. 

Isabella Tanajura | Salvador 


EDUCAÇÃO – Nesta quinta-feira (25), os professores da Universidade Federal da Bahia (UFBA) decidiram pela adesão à greve nacional em assembleia geral realizada no Auditório da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA). As principais pautas da greve são o reajuste salarial, reestruturação da carreira e recomposição orçamentária das Universidades e Institutos Federais. 

O comando nacional de greve foi instaurado pelo Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN) a partir do dia 15 de abril e, desde então, 34 universidades federais aderiram à greve de professores. Na última semana 10 mil servidores públicos federais e estudantes participaram de um ato em Brasília para pressionar o governo nas negociações estabelecidas. 

Em assembleia realizada no dia 12 de março, o Sindicato dos Professores das Instituições Federais de Ensino Superior da Bahia (Apub Sindicato) decretou um estado de mobilização permanente da categoria dos professores na UFBA. Desde então as negociações com o governo federal não avançaram e a proposta continua de 0% de reajuste salarial para 2024, bem como nenhuma proposta significativa para o plano de carreira da categoria e recomposição orçamentária das universidades e institutos federais.

“O governo federal justifica que não há recursos por conta do arcabouço fiscal, mas 22% de reajuste foi dado para Polícia Federal, 60% da Polícia Penal Federal. 0% de reajuste para educação e a saúde é inaceitável!”, afirma Graça Druck, professora da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (FFCH), durante defesa pela deflagração da greve. 

Votaram a favor da proposta de deflagração da greve 210 professores, enquanto 129 votos foram dados à proposta de estado de greve com consulta via plebiscito à toda comunidade docente da UFBA.  

Segundo a Apub Sindicato, estavam presentes cerca de 400 professores da UFBA. Entre estes 280 são filiados ao sindicato e 120 são não-filiados. De acordo com o relatório UFBA em números publicado em 2022, a universidade conta com um quadro de 2.876 professores, incluindo os substitutos e visitantes. 

“A educação precisa ser valorizada no nosso país. Infelizmente, o que vemos é o agronegócio sendo valorizado. Nós vemos o sistema da dívida sendo prioridade nesse governo, que é o pagamento do juros da dívida pública, juros de amortização, ou seja, se esse recurso vem pra educação, nós temos a educação de qualidade do nosso país” declara Aroldo Félix, diretor do ANDES-SN e membro da coordenação nacional do Movimento Luta de Classes (MLC). 

O comando de greve, composto pela diretoria da APUB Sindicato, conselho de representantes sindicais e professores que se voluntariaram a participar, se reunirá na próxima segunda-feira (29) para iniciar de fato a greve na Universidade.

Docentes presentes na assembleia que aprovou greve na UFBA a partir do próximo dia 29. Foto: Isabella Tanajura/JAV-BA

Cenário das greves federais na Bahia

Os técnicos-administrativos da UFBA representados pelo Sindicato dos Trabalhadores Técnicos-administrativos da Universidade Federal da Bahia (ASSUFBA) já estão em greve desde 11 de março. Assim como a categoria dos professores, os TAEs pautam o reajuste salarial e reestruturação da carreira. Segundo a FASUBRA, federação nacional que representa a categoria, os trabalhadores técnicos-administrativos têm a pior remuneração dentro do serviço público federal. 

Na Bahia, a UFBA e a Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB) são as primeiras a aderirem à greve docente nacional. A próxima assembleia a ser realizada será na Universidade Federal do Recôncavo Baiano (UFRB) no dia 6 de maio. 

“Essa greve interessa a todos nós, porque a greve defende a universidade, a greve ocupa a universidade, a greve pressiona o governo. Não temos que ter vergonha de dizer que nós, em oposição ao governo anterior, defendemos a democracia. Não estamos aqui para derrubar governo nenhum, nós estamos aqui para defender a universidade” afirma Zacarias de Sena Junior, professor do Instituto de História da UFBA. “Defender a universidade é também fazer luta, ocupar a universidade com inteligência, energia e disposição como estamos vendo com a categoria e estudantes que estão aqui”, completa o professor. 

O movimento grevista dentro do serviço público federal tem crescido, especialmente na área da educação. Isso é consequência direta da desvalorização da categoria mesmo durante o governo atual que iniciou 2024 com um corte de R$ 310 milhões no orçamento para educação superior pública.

Estudantes e servidores conquistam suspensão do calendário da UFOP com greve de servidores

Servidores de Instituições Federais de Ensino Superior estão em greve desde março. Na UFOP, os estudantes realizaram assembleias no último dia 22 e foram favoráveis à suspensão do calendário acadêmico.

Mauri Antunes e Thiago Henrique | Ouro Preto – MG


EDUCAÇÃO – Os servidores de Instituições Federais de Ensino Superior estão em greve e suas principais reivindicações são: o aumento salarial, a recomposição do orçamento da educação das IFES, melhores planos de carreira, entre outros pontos. Três entidades sindicais responsáveis pela representação das categorias da educação estão encabeçando as demandas da greve: a FASUBRA – Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnicos-Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil, com os técnicos administrativos greve desde 11 de março; o SINASEFE – Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica, em greve desde 03 de abril; e o ANDES-SN- Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior, que declarou greve dos docentes no dia 15 de abril. Cabe ressaltar que cada categoria tem reivindicações distintas, mas que possuem pontos que as unificam.

Em decorrência das greves, na segunda-feira, 22 de abril, foram marcadas assembleias estudantis pelo DCE em todos os campus da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). As pautas foram a reunião do Conselho Universitário (CUNI), no qual foi debatido a suspensão do calendário acadêmico, as atividades inadiáveis bem como as possíveis demandas e atividades de greve e as demandas estudantis, a serem apresentadas no dia seguinte na reunião do CUNI.

Juntando as posições dos estudantes que participaram das três assembleias gerais, o resultado foi favorável à paralisação do calendário acadêmico. A compreensão é de que assim seria uma forma de pressionar o governo a renunciar às medidas impopulares que prejudicam a sociedade brasileira como um todo. 

O entendimento é de que graduação presencial, graduação EAD, pós-graduação pesquisa e inovação, extensão e cultura devem parar. Devemos olhar para a realidade de maneira objetiva e nos unir à luta dos trabalhadores em greve, propondo, não uma suspensão parcial das atividades, mas total. 

Calendário acadêmico da graduação foi suspenso

Durante a reunião do Conselho Universitário houveram os informes e as diversas falas dos conselheiros(as) e do público presente, onde foram feitas defesas das propostas de paralisação total ou parcial de alguns calendários. Nesse sentido, foi encaminhado à votação onde o calendário de graduação presencial foi suspenso por 29 votos (unânime). Também foi suspenso o calendário das atividades de extensão e cultura, no entanto o calendário acadêmico da pós-graduação e da educação à distância não foram suspensos.

Apesar a posição da representante discente da graduação na reunião do Conselho Universitário de votar a favor da proposta da reitoria, movimentos estudantis e sindicais reivindicaram e a suspensão total, mas com a garantia da manutenção das bolsas de pesquisa e extensão, além da assistência estudantil de permanência. Não é justo com os estudantes, no contexto de uma paralisação parcial, que continuem realizando pesquisas sem a garantia de que eles conseguirão se manter nas cidades. Além disso, o Restaurante Universitário é terceirizado. Isso significa que com uma baixa adesão de recebimento de lucro a empresa pode romper o contrato, deixando os estudantes às margens da vulnerabilidade alimentar e social. 

As consequências do Arcabouço Fiscal nas universidades

O chamado “arcabouço fiscal” é uma âncora que impede o próprio governo a investir em ações públicas e sociais, diminuindo os investimentos nas faculdades e instituições de ensino. Como resultado, as universidades ficam sem recursos, o que abre caminhos para a precarização do serviço público e avanço de medidas neoliberais de privatização do ensino.

Dados do orçamento federal executado no ano de 2024 mostram que 45,98% (2,5 trilhões) do orçamento do Brasil vai para juros e amortização da dívida pública. Em contraponto, o equivalente a apenas 3% do PIB do Brasil vai para educação, sendo que desses 3%, a maioria vai para a rede privada.

Desses 45,98%, 41% ficam para os bancos nacionais e estrangeiros, 20% para fundos de investimento, 19% são investidos na previdência privada aberta, 8% para estrangeiros, 3% para seguradoras, 4% para governo e 5% outros. O Tesouro Nacional omite nas suas tabelas as “Operações Compromissadas” e os “Depósitos Voluntários Remunerados”. Ou seja, os beneficiários são sigilosos e o Governo se recusa a informar os beneficiários da dívida pública. Com isso fica claro que a maior parte da arrecadação não vai para o povo e sim para os grandes empresários nacionais e internacionais.

Dito de outra maneira, existe um teto de gastos para as áreas sociais, mas não para o pagamento dos juros da dívida pública. Isso só mostra mais uma vez de que lado o Estado burguês está. Para mudar essa situação precisamos de um limite dos juros em lei, auditoria da dívida com participação social e, principalmente, mobilização popular com consciência de classe para combater os retrocessos, o congresso reacionário e os fascistas.

Fim da “saidinha” é cortina de fumaça e um retrocesso nos direitos

Lei que proíbe a chamada “saidinha” mostra avanço da pauta dos fascistas no Congresso Nacional. Nova regra pode levar a um aumento da criminalidade e do recrutamento de detentos pelas facções criminosas.

Rafael Figueira | Cabo Frio – RJ


BRASIL – A saída temporária, também conhecida popularmente como “saidinha” foi regulamentada no Brasil em 1984 na Lei de Execuções Penais, que tem como finalidade efetivar as sentenças e decisões criminais além de proporcionar condições para ressocialização do condenado pela justiça brasileira. No nosso país não existe prisão perpétua ou pena de morte. Em algum momento o preso será solto e já existem inúmeros estudos que mostram o resultado negativo de uma pessoa que fica isolada da sociedade e bruscamente ganha liberdade sem medidas de ressocialização.

Essa discussão não é nova na Câmara e no Senado, porém com o crescimento da bancada da bala no Parlamento o discurso reacionário ganhou eco, possibilitando que e esse tipo de projeto passasse sem nenhum estudo baseado em estatísticas de combate à violência. 

Hoje o Brasil tem mais de 851 mil presos. As prisões são uma fonte de recrutamento de pessoas para as máfias e facções criminosas. Essa discussão foi acelerada após a morte de um sargento da Policia Militar em 2023 por um preso que não cumpriu os critérios. Menos de 5% dos presos que usufruíram desse direito não retornam, um número considerado baixo por especialistas ou no mínimo que não justifica acabar com toda uma política de ressocialização para os outros 95%.

Vale lembrar que existem vários critérios para ter acesso a esse benefício, que são: estar em regime semiaberto, ter cumprido um sexto da pena, se for réu primário, ou um quarto, se for reincidente, comportamento adequado reconhecido pela diretoria do presidio e pelo ministério público. São 4 saídas por ano, que não tem relação com feriados ou datas comemorativas, em que o preso precisa informar o endereço onde vai ficar, não pode frequentar bares, boates ou se envolver em qualquer tipo de delito e todas as noites precisa estar no lugar informado à justiça.

Uma questão importante de se destacar é que essas estatísticas de fuga dos presos em saída temporária no Brasil não existe nacionalmente. São estatísticas baseadas em alguns estados que implementam essa política pública, hoje existe um déficit de dados estatísticos em caráter nacional. Logo, não temos detalhamento para avaliar a eficiência da política de segurança pública do nosso país e isso faz com que as opiniões sejam baseadas por ‘’agitações’’ normalmente feita por porta vozes do senso comum conservador e não por estudos para diminuir a violência no nosso país.

Um exemplo é que não se sabe o perfil dos presos que não retornam da saída temporária, provavelmente ligados ao crime organizado. Isto porque o estado até hoje não conseguiu mapear essas informações, o que possibilitaria evitar possíveis infrações com o uso da tornozeleira eletrônica, por exemplo.

Outra questão importante é que o projeto aprovado pelo Parlamento, e vetado parcialmente pelo presidente Lula, impõe que, para progressão de regime, é necessário que o detento passe por um exame criminológico que precisa de laudos psiquiátricos e psicológicos. Esses laudos são exigidos para progredir ao regime semiaberto por exemplo.

O primeiro problema disso é que o sistema prisional do Brasil não tem profissionais de psicologia e psiquiatria para dar conta dessa demanda, que passa a ser muito grande com essa decisão. Outro ponto importante é que quando o exame criminológico era exigido, se notou uma grande dificuldade dos profissionais liberarem os laudos com medo de se comprometer, o que, consequentemente, atrasava muito o processo de progressão e, logo, as pessoas ficavam mais tempo presas. Com isso, a justiça entendeu que era um critério desnecessário para o protocolo.

O que deveria preocupar o parlamento prioritariamente não são os 5% de presos com bom comportamento que não retornaram, mas sim os líderes das facções e das milícias que estão soltos por aí, alguns com mandado de prisão já feitos, outros dentro das estruturas de poder do nosso país, como no caso do assassinato da vereadora Marielle Franco (assassinada a mando de um deputado, um conselheiro do Tribunal de Contas e o então chefe da Polícia Civil do Rio).

Existe uma ineficiência enorme para desestruturar essas organizações criminosas por falta de informação, inteligência e agilidade, além dos altos índices de corrupção dentro das policias do Brasil. Por outro lado, há uma agilidade enorme do parlamento para destruir uma das poucas políticas de ressocialização do sistema penal brasileiro sem nenhum estudo estatístico ou cientifico sobre.

Esse tipo de cortina de fumaça só fortalece as facções criminosas que dentro dos presídios cobram mensalidades dos presos não alinhados com determinada facção e vemos o estado paralisado no combate a esses absurdos.

Temos um problema de segurança pública muito sério, com uma estrutura corrupta, violenta, que se fortaleceu muito na Ditadura Militar. Até hoje não conseguimos resolver essa fatura histórica e quem paga é o povo preto e pobre do nosso país. Enquanto isso, os fascistas votam pela libertação dos irmãos Brazão, conspira contra a prisão dos milicianos do Rio de Janeiro e agita pro país que promovendo chacinas nas favelas e acabando com a ‘’saidinha” o problema da segurança pública estará resolvido.

Ocupação Ranúsia Alves, em Recife, mobiliza cerca de 500 famílias sem-teto

Na madrugada do dia 18 de março, cerca de 500 famílias sem-teto, organizadas pelo Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), ocuparam um terreno no bairro do Engenho do Meio, pertencente à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), que fica ao lado de um dos anexos da instituição. Lá, porém, não brotava conhecimento, só mato, muito mato, há mais de 30 anos.

Rafael Freire | Redação


LUTA POPULAR – “Procure acompanhar o pessoal do MLB, que tem um projeto de sucesso e que não deixa ninguém pra trás”. Assim Dona Maria finaliza nossa conversa na Ocupação Ranúsia Alves, em Recife, capital de Pernambuco. Maria Ferreira da Silva, 78 anos, é uma das moradoras mais experientes da recente ocupação, realizada no dia 18 de março. “Sou agradecida pela vida. Aqui todo mundo gosta de mim. Esta é a segunda vez que eu participo de uma ocupação, a primeira com o MLB, e estou gostando demais, tudo organizado. Tenho fé que, finalmente, vou conquistar minha casa!”, conta Dona Maria, muito animada.

Não é para menos tamanha animação. Após uma vida inteira de muito sofrimento, Dona Maria lembra da infância extremamente difícil que passou entre Pernambuco e Paraíba. “Eu era a maiorzinha e tinha que ajudar minha mãe a cuidar dos meus irmãos e ajudar meu pai na roça e quando ele viajava pra vender queijo. Nossa cama era de vara e minha mãe dormia no chão. Quando eu via que ela estava muito cansada, eu dava pra ela meu lugar na cama, que era uma só para todos os filhos. A gente cresceu sem educação, sem cultura. A comida, comprava uma vez por semana na feira”. Dona Maria entrou numa sala de aula pela primeira vez aos 15 anos, mas só aprendeu a escrever o nome e a ler algumas palavras, pois logo se mudou de vez para Recife para “trabalhar em casa de família”.

Agora, com seu barraco ainda em construção, passa o dia na Ocupação e, à noite, volta para dormir na casinha alugada na Favela do Detran, bairro da Iputinga. Ela é um retrato da luta pela sobrevivência travada diariamente por milhões de brasileiros que têm negado o direito à moradia digna.

NA LUTA. Camila com seu esposo e duas filhas. Fotos: Rafael Freire/JAV

Famílias organizadas para lutar

Na madrugada do dia 18 de março, cerca de 500 famílias sem-teto, organizadas pelo Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), ocuparam um terreno no bairro do Engenho do Meio, pertencente à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), que fica ao lado de um dos anexos da instituição. Lá, porém, não brotava conhecimento, só mato, muito mato, há mais de 30 anos. As famílias passaram os primeiros dias trabalhando duro, em regime de mutirão, para limpar o terreno, traçar os lotes e organizar os primeiros barracos, incluindo a cozinha coletiva.

Aliás, todo dia à noite ocorre a assembleia para dividir as tarefas para o dia seguinte, como ir à Ceasa em busca de doações de alimentos e preparar o almoço de quem participa da quotização.

Como é de costume nas ocupações organizadas pelo MLB, é feita uma sensibilização junto aos moradores das redondezas para explicar as motivações do Movimento e pedir apoio. Em frente à Ocupação Ranúsia, por exemplo, funciona um Espaço Cultural popular, que deu apoio para garantir água potável e ainda, no feriado da Páscoa, abraçou as crianças do MLB com atividades lúdicas.

Postura bem diferente adotou a Reitoria da UFPE. No dia 26 de março, a Ocupação recebeu a visita de um oficial de justiça para comunicar ao MLB sobre o pedido de reintegração de posse do terreno, por parte da administração da Universidade.

Sem diálogo prévio e sem nenhum interesse em dialogar dali para frente, a Reitoria recebeu de volta a visita. No dia 04 de abril, durante audiência entre as partes na Justiça Federal, uma parte das famílias realizou um ato em repúdio às ameaças de despejo e cobrou a abertura de negociações com a UFPE. Não houve avanços, mas agora o reitor Alfredo Macedo Gomes pôde entender melhor a força das famílias organizadas, e que não seria tão simples assim acionar aparato policial para executar o despejo.

Importante destacar ainda que, além deste ato, as centenas de famílias também participaram de algumas manifestações políticas no Centro de Recife em solidariedade ao povo palestino; pela prisão de Bolsonaro e dos generais fascistas; em repúdio aos 60 anos do golpe militar de 1964. Uma clara demonstração do avanço em suas consciências.

Avanços também nas conquistas

Na verdade, para quem luta, os avanços vêm de todos os lados. No dia 11 de abril, o Governo Federal anunciou oficialmente as novas etapas do programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, especialmente na modalidade “Entidades”, em que o Ministério das Cidades celebra convênios com os movimentos sociais para a construção de moradias populares. O MLB foi um dos movimentos contemplados nacionalmente, com mais de 900 unidades habitacionais em seis empreendimentos, em estados diversos, incluindo Pernambuco.

Na solenidade, em Brasília, Poliana Souza, da Coordenação Nacional do MLB, falou em nome do conjunto dos movimentos: “Este programa, ao colocar os movimentos em seu devido lugar de protagonistas do processo, valoriza a organização popular, que não visa ao lucro, como o grande capital, mas sim à construção de moradia de maior qualidade para as famílias trabalhadoras do nosso país. Isso ajuda a combater a desigualdade social, a propriedade privada, os monopólios, a especulação imobiliária. Seguimos rumo à Reforma Urbana!”.

Dona Maria que está construindo a Ocupação Ranúsia Alves e falou com o Jornal A Verdade.

Na noite do mesmo dia, uma grande assembleia do MLB, envolvendo todas as famílias cadastradas em Recife, foi realizada na Ocupação para repassar os últimos informes. O clima geral foi de muita combatividade e alegria pelos avanços obtidos pelo MLB nacionalmente. Para a cidade, está prevista a construção de 128 unidades habitacionais em um terreno doado pela Prefeitura na comunidade Bola na Rede, Zona Norte da Capital. Como o número não atende todas as famílias cadastradas pelo MLB na cidade, as famílias seguem mobilizadas, organizando cada vez mais a Ocupação Ranúsia. Segundo o Plano Local de Habitação de Interesse Social, existe um déficit de mais de 70 mil moradias na Capital pernambucana.

Também foi anunciada a suspensão temporária do processo de despejo da Ocupação Ranúsia Alves e a abertura de negociações diretamente com o Governo Federal. Mais uma vitória da pressão e da luta!

Após a assembleia, Camila Santana, 31 anos, moradora da Ocupação Ranúsia, avalia: “Tem que lutar para ter a moradia. Eu pagava 400 reais de aluguel, mas só recebo 600 do Bolsa Família. Ou paga aluguel ou come”. Ela, que sobrevive catando material reciclável, também relata um pouco sobre sua vida: “Já morei muito em barreira, no Jordão (bairro de Recife, divisa com o Município de Jaboatão). Em 2022, teve uma enchente grande que derrubou a casa que eu morava antes e que eu tinha acabado de me mudar. A família que morava lá no momento, morreu. Por pouco, não perdi minha vida”. E completa, com lágrimas nos olhos: “Meu sonho é dar um quarto digno para meus filhos, já que é um direito de todo brasileiro. Então vou continuar lutando”.

Quem foi Ranúsia

Ranúsia Alves Rodrigues nasceu em Garanhuns, Agreste de Pernambuco, no dia 18 de junho de 1945. Era estudante de Enfermagem na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). No meio estudantil, envolveu-se com o Diretório Acadêmico e se aproximou do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR). Foi presa pela primeira vez no 30º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), realizado em Ibiúna (SP), em outubro de 1968. No ano seguinte, foi expulsa da Faculdade de Enfermagem por aplicação do Decreto-Lei nº 477/69. Passou, então, a viver na clandestinidade.

A partir de outubro de 1972, começou a atuar no Rio de Janeiro. Foi morta a tiros, no dia 27 de outubro de 1973, junto com outros militantes do PCBR, no episódio que ficou conhecido como “Chacina de Jacarepaguá”, em operação comandada por agentes do DOI-Codi do I Exército. Os quatro militantes mortos foram enterrados sem identificação, como indigentes. Os restos mortais de Ranúsia não foram localizados e identificados até hoje.

Matéria publicada na edição nº 290 do Jornal A Verdade.

Governo de Israel quer exterminar povo palestino

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Extrema direita que governa atualmente Israel tem interesse em escalar o conflito no Oriente Médio e quer perpetuar a política de genocídio em Gaza. É o que demonstra as últimas declarações dos políticos e membros do governo fascista de Israel.

Sávio Peres Loureiro  | Belo Horizonte


INTERNACIONAL – No início de abril deste ano, o membro do gabinete de guerra de Israel, Benny Gantz, propôs eleições antecipadas para setembro de 2024, enquanto o governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu enfrenta pressão interna por suas políticas fascistas e externa por causa do massacre de palestinos em Gaza perpetuado e articulado por seu governo.  

As novas eleições estão marcadas para acontecer apenas em 2026. “Devemos  chegar a um acordo sobre uma data para as eleições em setembro”, disse Gantz em um informe televisionado no dia 3 de abril. Cabe lembrar que a maioria do povo palestino não tem direito de voto nem de se manifestar nas eleições israelenses.  

Benny Gantz é o principal candidato que venceria Netanyahu em eleições antecipadas e é razão para que este último busque a todo custo rechaçar a hipótese de eleição antecipada. Porém, pesquisas de opinião indicam que mais  de 70% da população de Israel é favorável a tal pleito antecipado.  

Escalada militar no Oriente Médio

No sábado (13/4), o Irã, pela primeira vez, realizou ataques diretos contra  o território de Israel. O ataque direcionado a bases militares de Israel, apesar de repelido em sua maioria, contando com ajuda da União Europeia, dos EUA e das monarquias reacionárias árabes, como Jordânia e Arábia Saudita, conseguiu quebrar o grande sistema antiaéreo chamado de Domo de Ferro e acertar alguns dos alvos iniciais.

Como resposta, tímida comparado à fúria que direcionam à Gaza, Israel lançou misseis ao território iraniano, porém, todos abatidos.  

De toda forma, há uma escaldaa dos conflitos no Oriente Médio e um apetite  por guerra, possivelmente potencializados pelos riscos de Netanyahu perder um possível processo eleitoral antecipado devido a sua crescente impopularidade.  

Em entrevista para a emissora dos Estados Unidos, MSNBC, no dia 4 de  abril deste ano, o Ministro da Economia e Industria de Israel, Nir Birka, disse que Israel está unido para “eliminar aqueles jihadistas terroristas que querem tirar Israel do mapa”. 

Acontece que, como já amplamente divulgado, Israel está mirando para matar não só naqueles que eles chamam de terroristas de forma aberta, mas também milhares de crianças e mulheres.  

Nas últimas semanas, além de funcionários da ONU – Organização das  Nações Unidas, diversos jornalistas foram mortos em Gaza, além de funcionários de entidades como a World Central Kitchen (WCK) que foi bombardeada, no  início de abril, por soldados israelenses provocando diversas mortes.  

“Parece que esta é uma guerra contra a própria humanidade”  

Em entrevista à Reuters, Jose Andre, chefe da WCK, disse que “esta não  foi apenas uma situação de azar em que ‘opa jogamos a bomba no lugar errado’”,  disse. “Foram mais de 1,5 a 1,8 quilômetros, com um comboio humanitário muito  definido que tinha placas no topo, no telhado, um logotipo muito colorido que  obviamente nos orgulha muito. É muito claro quem somos e o que fazemos”.  

Os trabalhadores humanitários foram mortos, quando seu comboio foi  atingido, pouco depois de supervisionarem o descarregamento de 100 toneladas  de alimentos trazidos para Gaza pelo mar. Segundo Jose André, “parece que  não é uma guerra contra o terrorismo. Parece que esta é uma guerra contra a  própria humanidade”.  

Durante a entrevista, o Ministro da Economia de Israel disse que tal ataque foi “fogo amigo” e uma “fatalidade”, reforçando que estas situações seriam sem intenção e um erro.  

O apresentador do programa da MSNBC, neste momento, contradita o  Ministro e o questiona acerca da possibilidade de um erro destes acontecer,  tendo Israel um exército sofisticado que pode ter um ataque certeiro contra generais iranianos dentro de uma embaixada na Síria.  

Além disso, o próprio exército sabia o trajeto da WCK, então estavam avisados que o grupo supervisionava a chegada de ajuda humanitária em Gaza.  

“Eles (o exército) achavam que eram terroristas”, disse o Ministro. “Esse é o erro. E tenho certeza de que será descoberto. Mas, novamente, temos que perceber contra quem estamos lutando. Isso não é intencional, diferente dos terroristas, tudo o que fazem é intencional e temos que eliminá-los”.

A política de assassinato em massa de palestinos  

Para piorar, demonstrado seu total desprezo pelas vidas palestinas,  quando questionado sobre a grande quantidade de inocentes mortos neste  massacre perpetrado por Israel (já passa de 30 mil, em sua maioria crianças e  mulheres) o Ministro disse: 

“Geralmente não queremos machucar pessoas inocentes. Mas o que você viu no ataque de 7 de outubro foi civis inocentes entrando em Israel e tomando parte dessas atrocidades, e quando você os pressiona, a maioria deles, a grande maioria deles apoia o 7 de outubro. Eles dão cobertura aos terroristas e é muito lamentável. O que queremos são vizinhos amigáveis como os Emirados, como os Sauditas que querem buscar a paz. O sistema nos Emirados Árabes mudou para buscar a paz agora. Todas as crianças que estão sendo educadas no Hamas, em Gaza e na Judeia e Samaria são treinadas para matar judeus. (…) É isso que  estamos enfrentando e vamos vencer a guerra. Não temos escolha a não  ser vencer a guerra. Vamos acabar com o Hamas. Não temos escolha.  (…) e é por isso que estamos lutando. Estamos lutando porque  entendemos que estamos lutando para garantir que nada disso aconteça  novamente. Estamos lutando para matar todos esses terroristas, os  terroristas jihadistas. Eles são treinados e educados para matar judeus.”.  

Por fim, questionado acerca do objetivo de Israel de resgatar os reféns,  podendo esse objetivo ser alcançado com um cessar fogo permanente e acatar  as negociações com o Hamas, o Ministro da Economia e Industria diz que o  objetivo é exterminar o Hamas e resgatar os reféns, e não só este último.  

Esta parte, ao que parece, é central para melhor entender a posição do  governo de Israel com o genocídio em curso em Gaza.  

Para além dos interesses econômicos e geopolíticos no território Palestino  – no qual Israel durante décadas vem ocupando e pilhando -, a morte de civis  palestinos é a política central – e não um mero infortúnio – do Exército de Israel.  

Segundo as palavras do próprio Ministro, há o entendimento pela extrema  direita Israelense de que os civis estão “ajudando” o Hamas; de que as crianças palestinas são educadas pelo Hamas para matarem judeus.  

E quem são essas crianças? Essas crianças palestinas são filhas e filhos de mães palestinas – responsáveis por colocarem mais um palestino no mundo,  ao arrepio de Israel.  

Portanto, todos os “demônios”, “terroristas”, “jihadistas” (não só os combatentes, mas as crianças – “terroristas em potencial” – e as mulheres – mães de terroristas, terroristas então) que atacam não só Israel, mas todo o Ocidente, devem ser eliminados. E depois disso, se possível, os reféns israelitas liberados.  

Fica claro que apesar de toda a tentativa do governo de Israel em se  posicionar como vítima do “pior ataque após o Holocausto”, de falsamente se  importarem com seu próprio povo, a sua política é justamente articular a opinião  publica ocidental para sua proteção (proteção dos fascistas como Netanyahu) ao buscar exterminar não só o Hamas, mas todos os Palestinos (crianças.  mulheres, idosos, homens, tudo) de uma vez por todas. E quem entrar no  caminho de seus objetivos, como a WCK, vai também ser considerado terrorista  e morrer bombardeado. 

O veto que os Estados Unidos fizeram na  ONU para que a Palestina não possa ser considerada um país membro (o  resultado da votação ficou em 12 votos favoráveis, 1 contrário e 2 abstenções), reforça que a saída diplomática de criação de um Estado Palestino será ainda  pauta para momento futuro.  

Enquanto isso Netanyahu vai batalhar o mais rápido possível para realizar a limpeza étnica e exterminar o povo Palestino, pois sua popularidade está  abalada e ‘a guerra’, ‘os terroristas’, ‘os jihadistas’ o ajudam a ficar no governo  por mais tempo.  

Israel está preparado para invadir Rafah, a cidade mais ao sul da Faixa  de Gaza, onde estão refugiados cerca de 1,5 milhão de palestinos. No último dia 21 de abril, um bombardeio Israelense matou 21 palestinos.  

O cessar fogo imediato e prolongado, juntamente da criação do Estado Palestino e o fim do apartheid em Israel; a deposição de Netanyahu de sua administração e o julgamento de todos eles, juntamente da administração Biden – e anteriores – dos Estados  Unidos, por seus crimes de guerra são pautas urgentes neste nesse momento.

50 anos da Revolução dos Cravos: resta uma semente em algum canto de jardim

Nos anos 1970, Portugal vivia uma situação de decadência da economia nacional e de empobrecimento e rebaixamento das condições de vida do povo. O campo, dominado pelo latifúndio; nas cidades, a degradação das condições de vida, com apenas metade das casas com fornecimento de água e ligadas à rede de esgotos. O problema apontado como causa maior da situação era a guerra colonial, com o Estado português destinando quase metade do orçamento para sustentar a guerra contra os movimentos de libertação de suas colônias africanas, especialmente Moçambique, Angola e Guiné-Bissau.

José Levino | Historiador


Foi bonita a festa, pá

Fiquei contente

E ainda guardo renitente

Um velho cravo para mim…

(Chico Buarque)     

LUTAS DO POVO – O povo português viveu sob ferrenha ditadura durante 48 anos. De 1926 a 1933, sob a bota dos militares; de 1933 a 1974, sob o Estado Novo, debaixo do tacão autoritário, de corte fascista, comandado por António de Oliveira Salazar. Quem ousava defender a democracia ou simplesmente mobilizar-se, reivindicando direitos básicos, corria o risco de ser preso, torturado, morto. E milhares o foram.

Em Lisboa, existe o Museu do Aljube – Resistência e Liberdade, onde a repressão está documentada. Aljube, palavra de origem árabe, significa poço, cisterna, sendo utilizado para designar prisão obscura e profunda. O prédio foi usado como prisão – durante o Império Romano, na ocupação muçulmana, cadeia eclesiástica, prisão para mulheres e depósito de presos políticos a partir de 1926. De escavações a documentos, os registros estão ali expostos. No segundo andar, ficam as solitárias, verdadeiras gavetas onde eram mantidos os prisioneiros.

Em 1968, por razões de saúde, Salazar passou o poder para Marcello Caetano, professor de Direito e militante do Movimento Integralista (fascismo português) desde a juventude. Salazar morreu em 1970. Marcello Caetano tentou remendar o regime ditatorial, mas não conseguiu.

A música deu o sinal

Nos anos 1970, Portugal vivia uma situação de decadência da economia nacional e de empobrecimento e rebaixamento das condições de vida do povo. O campo, dominado pelo latifúndio; nas cidades, a degradação das condições de vida, com apenas metade das casas com fornecimento de água e ligadas à rede de esgotos. O problema apontado como causa maior da situação era a guerra colonial, com o Estado português destinando quase metade do orçamento para sustentar a guerra contra os movimentos de libertação de suas colônias africanas, especialmente Moçambique, Angola e Guiné-Bissau.

É tal a situação que provoca divisão no interior das Forças Armadas, levando ao surgimento do Movimento das Forças Armadas (MFA), no segundo semestre de 1973, composto em sua maioria por capitães do Exército.

Já no ano de 1974, o Coronel Otelo Saraiva de Carvalho, um dos líderes mais importantes do MFA, procurou o radialista João Paulo Diniz, na tarde do dia 24, e combinou para que, às 22h55, seu programa (Rádio Peninsular) desse a senha para os comandos se prepararem nos quartéis sublevados (a maioria). A música escolhida foi “E depois do adeus”, de Paulo de Carvalho, que ganhara há pouco o Eurofestival 74. Deu tudo certo. À meia-noite e 20 minutos, outra senha seria tocada na Rádio Católica Renascença. Antes de tocar a música “Grândola, vila morena”, de Zeca Afonso (o “Chico Buarque” português), o locutor moçambicano Teodomiro Leite leria a primeira estrofe. Era para os comandos saírem para as ruas.

De vários quartéis, tropas rebeldes se deslocaram para o Terreiro do Paço (hoje, Praça do Comércio), onde ficavam os órgãos do Governo. Foram chegando pelas cinco horas da manhã do dia 25 de abril, mesmo horário em que os trabalhadores iam desembarcando e se aglomerando em torno das tropas. Não houve resistência mais significativa, pois os poucos batalhões deslocados para conter o levante não agiram (os soldados se recusaram a atirar contra seus colegas). E o povo foi só entusiasmo, aplausos e gritos: “VIVA A LIBERDADE!”, “ABAIXO OS FASCISTAS!”, “VITÓRIA, VITÓRIA!”.  O capitão Fernando Salgueiro Maia, outro líder do MFA, discursou: “Não são mais só os militares de um lado e o regime do outro. É o povo. O golpe transforma-se em revolução”.  Floristas foram abrindo suas lojas e distribuindo flores com os presentes. Os soldados colocavam cravos vermelhos nas bocas dos seus fuzis.

Cabe registrar que o 25 de abril não teve como centro o movimento operário e popular, o movimento de massas, que se mantinha muito tímido, dadas as condições de clandestinidade, embora nunca tenha deixado de existir e que graças ao enfrentamento heroico à repressão por parte das organizações de esquerda, sendo o Partido Comunista Português (PCP) a maior e mais influente delas, o desgaste do regime fascista aumentava a cada dia.  De fato, o MFA promoveu um golpe de Estado eficaz, sob rigoroso sigilo, e recebeu naturalmente o aplauso entusiasmado do povo, quando este tomou conhecimento do Movimento por ocasião da tomada do poder.

Uma revolução em curso

Realmente, estimuladas pelas organizações de esquerda (comunistas, anarquistas, socialistas, sindicatos, organizações populares), as massas trabalhadoras portuguesas foram à luta, que adquiriu um caráter não apenas imediatista, mas anticapitalista. O lema “A terra para quem nela trabalha” foi posto em prática nas regiões do Alentejo e Ribatejo. Num processo dirigido pelo PCP, que tinha forte trabalho de base na região, mesmo na clandestinidade. A reforma agrária teve caráter socialista, com a criação de unidades coletivas de produção e cooperativas, e não com a distribuição de parcelas por unidade familiar. O objetivo não era ganhar um pedaço de terra, mas produzir alimentos, gerar trabalho e renda, tudo em vista do bem comum.

O Poder Popular também deu o tom nas cidades, com a ocupação de prédios, de terras para a construção de casas, criação de cooperativas habitacionais; muitos bairros foram construídos por todo o país. Os operários foram também ocupando fábricas e assumindo o lugar de seus donos em situações em que elas estavam em crise, falindo ou promovendo políticas de demissão em massa.

Cabia à Junta de Salvação Nacional aplicar o Programa do MFA, que apresentava três eixos: Desenvolvimento, Democratização e Descolonização. Esta foi se dando nos anos de 1974 e 1975, com o fim das guerras e o reconhecimento da independência das nações africanas.  Quanto às medidas internas, o avanço da iniciativa popular dividiu o MFA. Os setores à direita, com apoio da burguesia e dos latifundiários, preparam um golpe, tendo à frente o presidente da Junta, general António Espínola, visando a conter os avanços do Processo Revolucionário em Curso (PREC), mas foram contidos pela esquerda do MFA, em aliança com partidos políticos e organizações populares. Espínola é demitido e alguns dos seus partidários fogem do país. A Presidência da República é assumida pelo general Francisco da Costa Gomes.

As forças capitalistas continuam se organizando para deter o processo revolucionário em curso e promovem nova tentativa de golpe de Estado em 11 de março de 1975, sofrendo, entretanto, nova derrota. Dessa vez, Espínola, que comandou o golpe abortado, se exilou. Como consequência, é extinta a Junta de Salvação Nacional e criado o Conselho da Revolução. A 26 de março, assume o IV Governo Provisório. O Conselho da Revolução busca aprofundar as mudanças estruturais da sociedade portuguesa, decretando a nacionalização e estatização dos bancos, do sistema de seguros e de empresas importantes para a economia nacional.

Com sua derrota nas eleições para a Assembleia Constituinte (abril de 1975), a direita e os fascistas partem para o ataque às forças populares, no período que foi chamado de “verão quente”, com ataques às sedes do PCP, a sindicatos e organizações populares, provocando o temor de uma guerra civil. A esquerda diverge na forma de enfrentar a situação, entre os que defendem a via revolucionária e os que abraçam a via eleitoral.

“Já murcharam tua festa, pá”!  

Nos meses seguintes, formam-se o V e o VI Governos Provisórios. Setores da Esquerda militar tentam destituir o VI Governo mediante golpe de Estado, com a adesão dos paraquedistas, que ocuparam unidades militares em 24 de novembro. A direita militar reage, através do grupo dos nove, no dia seguinte, com apoio do PS e de toda a direita civil, pondo fim ao Processo Revolucionário em Curso. O que segue é um recuo da mobilização campesina, operária e popular e a institucionalização do processo, que, então, passa a ser contrarrevolucionário.

A Nova Constituição de Portugal, promulgada em 25 de abril de 1976, ainda no espírito da Revolução de 1974, assegurava garantias de transição para o socialismo e o desenvolvimento de relações sociais de produção. Tais artigos, entretanto, ficaram só no papel e foram revogados ou substituídos em emendas posteriores. A ofensiva contra a reforma agrária foi corroendo os avanços de 1974 e, embora as forças camponesas tenham resistido, no ano 2000, esses avanços encontram-se destruídos. As empresas nacionalizadas pela Revolução dos Cravos foram reprivatizadas. As reformas trabalhistas enterraram direitos históricos conquistadas em pujantes lutas operárias. A falta de moradia e as condições de vida nos bairros populares voltam a constituir sérios problemas. Os braços abertos para acolher os imigrantes, especialmente das antigas colônias, estão ameaçados de fechamento. Em vez de progresso, retrocesso.

O capitalismo não resolveu os problemas do povo. A entrada de Portugal na União Europeia, a adesão à chamada economia moderna, em vez de solucionar, traz de volta antigos problemas e gera novos. Então, se os problemas continuam, a semente está viva “em algum canto de jardim”. É preciso saber cultivá-la. E isso só pode ser feito no contato direto com a terra em que ela é plantada. Não se constrói socialismo de cima ou por cima. Ele tem que acontecer de baixo pra cima, mediante a criação do Poder Popular.

Matéria publicada na edição nº 290 do Jornal A Verdade.