Acontecerá em Havana no Palácio das Convenções, a III Conferência “pelo Equilíbrio do Mundo” nos dias 28, 29 e 30 de janeiro de 2013, sob o lema martiano” PÁTRIA É HUMANIDADE.
O evento tem a finalidade de reunir homens e mulheres das mais variadas correntes de pensamento, disciplinas, instituições e países interessados na vida e obra do revolucionário cubano José Martí e identificados com a defesa dos supremos interesses da humanidade, ameaçada pelos perigos reais de uma conflagração nuclear por parte dos monopólios imperialista na insana disputa pelo controle dos recursos naturais estratégicos não-renováveis e pela hegemonia do planeta.
Este importantíssimo acontecimento conta com o apoio da UNESCO e da Organização de Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a cultura e outras instituições internacionais.
O evento também celebrará no dia 28 de janeiro de 2013, o 160º aniversário do nascimento do apóstolo da independência de Cuba, José Martí, figura marcante da história americana, com transcendente contribuição no terreno político-social, educacional, poético, literário e cultural.
Entre os eixos temáticos, destacam-se os seguintes:
* Desenvolvimento sustentável, equidade e justiça social: as sendas para consegui-lo.
* A mobilização social e o diálogo para encarar os perigos reais de uma confrontação nuclear.
* O terrorismo, o narcotráfico, a pobreza e a violência: males incuráveis?
* A Crise econômica mundial: causas reais, efeitos e soluções.
* Papel da educação nas circunstâncias do mundo atual.
* A arte e a literatura: um papel social?
* A juventude como setor dinâmico da sociedade: necessidade de diálogo de gerações.
* A América Latina e o Caribe: rumo à integração almejada pelos fundadores.
* José Martí e seu acervo latino-americano e universal.
O trabalho da Conferência será realizado em comissões e em plenário e conterá a realização de um Fórum Juvenil, um simpósio UNESCO – “por uma cultura da natureza”, um Workshop sobre próceres e Pensadores de Nossa América; uma Mesa Redonda EM DEFESA DA UMANIDADE e um colóquio de especialistas sobre Bioética e Desenvolvimento.
Os idiomas de trabalho serão o espanhol e o inglês.
Informações: inscrição, apresentação de trabalhos, certificado, etc.: consultar a página Web: HTTP://www.poeequilibriodelmundocuba.com
O mundo se mobiliza pela libertação dos 5 cubanos presos nos EUA
Vários estados preparam delegações de professores, pró-reitores e estudantes para participar da III Conferência “Pelo Equilíbrio do Mundo”. Pernambuco trouxe o conselheiro político da Embaixada de Cuba, Rafael Hidalgo, para uma palestra sobre o temário da Conferência. Rafael informou que cresce a criação e mobilização dos Comitês pela libertação dos 05 heróis cubanos presos injustamente nos EUA em todos os continentes e em quase todos os países do mundo.
A palestra aconteceu no dia 14 de novembro em Recife, na sede da Associação do Ministério Público de Pernambuco, com assento na mesa do Centro Cultural Manoel Lisboa, Associação dos Juízes Trabalhista, Juízes para a Democracia, Pró-Reitorias de Extensão da UFPE, UFRPE e UPE e intensa participação de estudantes e professores universitários vinculados às Cátedras José Marté-UFPE e Simón Bolívar, Sandino e Abreu e Lima-UPE.
Edival Cajá, presidente do Centro Cultural Manoel Lisboa
Uma em cada cinco brasileiras (19,7%) que fazem parte da população economicamente ativa é trabalhadora doméstica. Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2009, mostram o peso da categoria, que soma 7,2 milhões de trabalhadores, mas segue marginalizada e sem a garantia de alguns direitos trabalhistas.
“No mundo todo são 53 milhões de trabalhadores domésticos. Mas esse número é subestimado porque, na maioria dos casos, é um trabalho que se exerce de maneira invisível, informal e fora das garantias da legislação trabalhista”, aponta Laís Abramo, diretora da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil.
Um dos principais problemas que os trabalhadores domésticos enfrentam no país é a informalidade. Dados apresentados pela OIT indicam que menos de 30% das domésticas têm carteira assinada e, segundo Laís, boa parte ainda recebe menos do que o salário mínimo.
A Câmara dos Deputados aprovou no dia 21 de novembro deste ano, em primeiro turno, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 478/2010, que amplia os direitos dos trabalhadores domésticos. A proposta estabelece que os empregados domésticos tenham os mesmos direitos trabalhistas dos empregados das demais categorias. Para entrar em vigor, o projeto passará ainda por mais uma votação na Câmara e duas no Senado, necessitando sempre da aprovação de 2/3 dos parlamentares em cada votação.
Conhecida como PEC das Domésticas, a proposta inclui obrigatoriedade de recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), carga horária semanal de 44 horas, hora-extra e adicional noturno.
A verdade é que a média salarial das trabalhadoras domésticas é menor que o salário mínimo em todo país e no Nordeste é inferior a R$ 350. Sem falar que muitas dessas trabalhadoras começam ainda crianças nesses “empregos” e trabalham em troca de comida e “estudos”.
Por isso, a defesa dos direitos dessa categoria é fundamental para que muitas injustiças cometidas em nosso país sejam combatidas. Sem dúvida nenhuma, para avançar nessa luta é fundamental que cada vez mais trabalhadoras se organizem nos seus sindicatos e lutem pela aprovação em lei de seus direitos.
Com o objetivo de se manter no poder mesmo contra a vontade do povo e estabelecer uma nova ditadura no Egito, o presidente Mohamed Muorsi anunciou no último dia 22 de novembro que as declarações constitucionais, decisões e leis elaboradas por ele até o fim da elaboração da nova Constituição são definitivas e não podem ser anuladas nem mesmo pela Suprema Corte. Com essas medidas, o presidente tirou o poder da Justiça de dissolver o Parlamento, demitiu o procurador-geral, decretou sua autoimunidade judicial e determinou a retomada dos processos contra os membros da deposta ditadura de Hosni Mubarak. O presidente também passou a acumular o Legislativo, já que o Parlamento foi dissolvido em junho.
Em resposta ao que consideram um novo golpe de Estado, milhares de egípcios tomaram as ruas nas principais cidades do país exigindo a saída do presidente do poder e queimaram as sedes do partido do Governo em quatro cidades. Na famosa Praça Tahrir, no Cairo, os manifestantes gritavam “Mubarak, diga a Mursi que a prisão vem logo depois do trono” e pediam sua saída imediata. Em resposta, a Polícia lançou gás lacrimogêneo contra os manifestantes e prendeu mais de 130 pessoas.
Para os apoiadores do atual presidente, o decreto foi uma maneira de “preservar a revolução” e “acelerar a transição”. No entanto, a oposição acusa Mursi de querer deter os mesmos poderes do ex-ditador Hosni Mubarak e de se tornar um “novo faraó”. “Isso é um golpe de Estado contra a legalidade. Chamamos todos os egípcios a protestar em todas as partes do Egito”, disse Sameh Ashur, membro da ordem dos advogados.
A retomada das grandes manifestações por mudanças democráticas no Egito revela, além da disposição de luta desse povo, uma tomada de consciência por parte da juventude e dos trabalhadores do país, cansados de serem enganados e de verem seus direitos pisados. Iniciaram um processo de construção de uma nova história e, agora, querem chegar até o fim, pois aprenderam que não há no mundo força maior que a de um povo em luta.
Pela 21ª vez, a Assembleia Geral da ONU condenou o bloqueio econômico imposto pelos Estados Unidos a Cuba. A condenação foi aprovada de maneira esmagadora por 188 países, tendo apenas três votos contrários, dos Estados Unidos, Israel e Palau. Além deles, Micronésia e Ilhas Marshall se abstiveram.
Durante os debates que precederam a votação, o isolamento dos Estados Unidos já era evidente. A representante do Brasil e do Mercosul na Assembleia Geral, Maria Luísa Ribeiro, classificou o bloqueio como um exemplo de “política obsoleta, que não tem lugar na atualidade”. “O embargo é contrário ao princípio da justiça e dos direitos humanos, gera carências e sofrimento a toda a população cubana, limita e retarda o progresso econômico, social e a obtenção dos objetivos de desenvolvimento do milênio”. Já o embaixador da Argélia nas Nações Unidas, Mourad Benmehid, representando o Grupo dos 77 mais China, afirmou que “o Grupo dos 77 mais China considera que o bloqueio viola as leis fundamentais do direito internacional, […] a Carta da ONU e os princípio de relações pacíficas entre países”. A Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), a Comunidade de Estados do Caribe (Caricom) e alguns países individualmente, como México e Venezuela, insistiram em que o embargo é contrário aos princípios da Carta das Nações Unidas e às regras do direito internacional.
Antes da votação, o ministro das Relações Exteriores cubano, Bruno Rodríguez, denunciou um “persistente recrudescimento” do embargo contra Cuba durante os primeiros quatro anos do governo de Barack Obama. O governo Obama endureceu o embargo, em especial no setor financeiro, impondo, desde 2009, multas de mais de dois bilhões de dólares a empresas e pessoas de outros países que têm negócios com Cuba. “É um ato de agressão e uma ameaça permanente contra a estabilidade de um país. É também uma grosseira violação das normas de comércio internacional, da livre navegação e dos direitos soberanos dos Estados”, indicou.
O embargo foi imposto de maneira oficial em fevereiro de 1962, no governo do presidente John F. Kennedy. Mas o governo norte-americano já havia imposto algumas sanções em 1959, ano do triunfo da Revolução Cubana. As perdas da economia cubana em 50 anos de embargo norte-americano superam os 100 bilhões de dólares até 2011, de acordo com autoridades do país. Caso seja levada em conta a desvalorização do dólar frente ao padrão-ouro nesse meio século, a cifra superaria o trilhão de dólares.
No dia 14 de novembro, o Velho Continente parou. Convocada pelas principais entidades sindicais e partidos políticos de esquerda, a greve geral paralisou as atividades laborais em vários setores da indústria, nos serviços e nos mercados de alimentos, em países como Espanha, Portugal, Grécia, Itália, Chipre e Malta. Em outros países da região, como França, Bélgica e Alemanha, houve manifestações de apoio e solidariedade, com paralisações pontuais. Os protestos que tomaram as ruas das principais cidades europeias tiveram como mote a luta contra a política do capitalismo mundial de jogar nas costas da classe trabalhadora o ônus da crise econômica do capital, que, desde 2008, leva ao sofrimento milhões de trabalhadores em todo o mundo. A luta contra a retirada de direitos, aumento de impostos, corte de gastos e de investimentos nos serviços públicos, unificou o movimento da classeem toda Zonado Euro, e atingiu 23 países.
O “Dia Europeu de Ação e Solidariedade”, como foi batizada a greve geral, unificou pela primeira vez países da Península Ibérica, que somaram esforços e construíram um movimento que ficará na história e trará frutos para a luta da classe operária contra a exploração capitalista. Cada vez mais, os trabalhadores se organizam para derrotar a política que pune aposentados, servidores públicos, mulheres e jovens vítimas do aumento da recessão e do desemprego.
Na Espanha, país que vive o flagelo de enfrentar 25% de desemprego, ocorreram manifestações de rua lideradas pelas centrais sindicais União Geral dos Trabalhadores (UGT) e Comissões Operárias (CCOO), reprimidas pela violência covarde da Polícia, deixando um saldo de 34 feridos e 81 presos. Os manifestantes denunciavam o Governo espanhol por salvar bancos com dinheiro público, enquanto os trabalhadores sofrem com a política de “austeridade”, que deteriora a vida daqueles que constroem as riquezas dos países.
Os espanhóis se indignaram com o triste fato ocorrido com uma mutuária, desempregada, que se suicidou ao ser despejada de sua casa por não ter mais condições de pagar a hipoteca. A greve no setor energético espanhol mobilizou cinco milhões de trabalhadores, fazendo com que o consumo de energia caísse 11%.
Em nota, o Comitê Central do PCE (m-l) – Partido Comunista da Espanha (marxista-leninista) – ressalta o ambiente de combatividade que tomou conta das manifestações populares, principalmente em Madri e Barcelona, onde milhões ocuparam as praças e ruas, com a participação fundamental dos militantes do partido e da JCE (m-l), defendendo a unidade da classe e a necessidade de se levar essa unidade ao âmbito político “para construir uma frente capaz de dar um sentido geral à batalha travada”. O documento do PCE (m-l) também destaca a participação de pequenos empresários e comerciantes nesse dia internacional de luta contra a política capitalista de “austeridade”, que só tem desgastado as condições de vida do povo trabalhador. Da mesma forma, a Conferência Internacional de Partidos e Organizações Marxista-Leninistas (CIPOML) – em nota – convoca os trabalhadores a unirem-se em uma grande frente de luta contra a ofensiva capitalista, a reação política e as ameaças de guerra imperialista. “Unamo-nos em oposição ao saque dos recursos naturais, por uma ruptura revolucionária com o neoliberalismo e o social-liberalismo, com o sistema que engendra a crise”.
Em Portugal, os trabalhadores realizaram sua terceira greve geral deste ano. O setor de transportes foi um dos mais atingidos. Trabalhadores do metrô, dos trens e empresas aéreas como a TAP cruzaram os braços. A Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP) informou que 90% dos serviços estavam com suas atividades paradas. O país alcançou o recorde de 15,8% de desemprego.
Na Grécia, onde a produção econômica encolheu 7,2% no último trimestre, a greve geral foi organizada pelas Confederações Sindicais GSEE (setor privado) e Adedy (setor público) e o Sindicato de Trabalhadores Municipais, e duas mil escolas pararam em repúdio aos cortes de verbas para a educação. O país já vai para o sexto ano de recessão.
As centrais sindicais brasileiras, CUT, CST-Conlutas, CTB, UGT e NCST entregaram documento de apoio ao Dia Europeu de Ação e Solidariedade, no Consulado da Espanha, afirmando que “a crise do capitalismo não pode ser paga pelos trabalhadores, independentemente de sua nacionalidade”.
As avaliações feitas sobre as vitoriosas mobilizações da greve geral europeia do dia 14 de novembro deixam claro que os trabalhadores não estão dispostos a continuar vendo seus direitos, conquistados com muita luta e sacrifícios, serem surrupiados para garantir os lucros da classe capitalista. Em um futuro próximo, serão necessárias novas mobilizações que conterão novas exigências e objetivos, orientadas numa direção comum de ruptura com o sistema capitalista, no sentido da superação desse modelo que cada vez mais só tem a oferecer à humanidade guerras, miséria, fome e desemprego.
“Em breve o povo estará nas ruas a cantar – alguns esquecidos de que a miséria em que tantos vivem não se justifica, outros, como nós, confiantes em que um dia o mundo será melhor.”
Estou no Rio, em meu apartamento em Ipanema, alheio à agitação que hoje, 31 de dezembro, afeta toda a cidade. Recebo, pelo telefone, o abraço de fim de ano de meu amigo Renato Guimarães, lembrando-me, com entusiasmo, do livro sobre Stálin que, meses atrás, lhe emprestei. Uma obra fantástica do historiador inglês Simon Sebag Montefiore, sobre a juventude de Stálin, que tem alcançado enorme sucesso na Europa, reabilitando a figura do grande líder soviético, tão deturpada e injustamente combatida pelo mundo capitalista.
E fico a pensar como essa publicação me chegou às mãos por um amigo, o arquiteto argelino Emile Schecroun, que hoje reside na capital francesa. E vale a pena comentar um pouco da vida desse querido companheiro, que, ao ter início a luta entre a França e a Argélia, deixou o PCF em Paris, onde vivia, para filiar-se ao Partido Comunista Argelino e combater no seu país de origem, ao lado de seus irmãos, por sua libertação. E contar como sua mulher foi torturada e ele, um dia, preso e enviado sob algemas para a França.
Duas ou três vezes por ano Emile vem ao Rio me ver. Quer falar de política, lembrar dos velhos camaradas de Paris. Às vezes eufórico, contente com o que vai acontecendo pela Europa; outras, como na última ocasião em que me visitou, preocupado com a crise que envolve o PCF, na iminência de ter que alugar um andar da sede que projetei. Tentei intervir, propondo uma entrada independente que servisse de acesso aos que vão utilizar aquele pavimento… Mas logo meu amigo reage, certo de que a situação política tende a melhorar, de que os jovens da França continuam atentos ao que passa pelo mundo, prontos a protestar contra tudo o que ofende a dignidade humana.
E volto a lembrar daquele livro, a figura de Stálin ainda muito jovem, sua paixão pela leitura, o seu interesse nos problemas da cultura, das artes e da filosofia, sempre a cantar e dançar alegremente com seus amigos.
É claro que a juventude russa já sofria a influência de escritores como Dostoiévski, Tolstói e Tchecov, a protestar contra a miséria existente, revoltados com a violência do regime czarista. Muitos, a exemplo de Dostoiévski, enviados para a prisão na Sibéria, onde durante anos ficaram detidos. Depois, como tantas vezes ocorre, a vida a levar o jovem Stálin à luta política, que, apaixonado, o ocupou até a morte.
E o livro relata as prisões sucessivas que ocorreram em plena juventude, as torturas que presenciou, enfim, tudo que marcou a sua atuação heroica na luta contra o capitalismo.
Ponho-me a folhear a obra, surpreso em constatar que o seu autor, depois de enorme pesquisa que se estendeu a arquivos da Geórgia, somente há muito pouco tempo franqueados a pesquisadores, levantou informações inéditas importantes sobre a vida de Stálin.
É bom lembrar que não se trata de autor de esquerda, mas de alguém que, pondo de lado suas posições político-ideológicas, soube interpretar uma juventude diferente, marcada pela inquietação cultural, que levou Stálin à posição de revolucionário e líder supremo da resistência contra o nazismo. Muito animado, Renato me diz que, seguindo a linha política de sua editora, esse vai ser um dos livros que com o maior interesse irá publicar.
A tarde se estende lentamente. Em breve o povo estará nas ruas a cantar -alguns esquecidos de que a miséria em que tantos vivem não se justifica, outros, como nós, confiantes em que um dia o mundo será melhor.
“A vida pode mudar a arquitetura. No dia em que o mundo for mais justo, ela será mais simples.”
“A vida é um sopro. Por isso, não há motivo para tanto ódio.”
“A arquitetura não muda nada. Está sempre do lado dos mais ricos. O importante é acreditar que a vida pode ser melhor.”
“A vida é importante; a arquitetura não é. Até é bom saber das coisas da cultura, da pintura, da arte. Mas não é essencial. Essencial é o bom comportamento do homem diante da vida.”
“A luta por uma sociedade mais justa não pode se perder no tempo.”
A solução
“Enquanto existir miséria e opressão, ser comunista é a solução.”
“Lógico que ainda acredito no comunismo. Não sou cretino. É uma idéia que está no coração de todo mundo.”
“A arquitetura não é importante. O importante é a solidariedade humana.”
“Acho muito bom a pessoa se recolher e ficar pensando em si mesma, conversando com esse ser que tem dentro dela, que é nosso sósia, né? Eu converso com ele a vida inteira.”
“Cem anos é uma bobagem. Depois dos 70 a gente começa a se despedir dos amigos. O que vale é a vida inteira, cada minuto também, e acho que passei bem por ela.”
“Desejo ver um mundo melhor, mais fraternal, em que as pessoas não queiram descobrir os defeitos das outras, mas, sim, que tenham prazer de ajudar o outro.”
“Enfim, pude conviver com verdadeiros patriotas. Brizola, preocupado com a formação das crianças, levou adiante o projeto de Darcy de construir os CIEPs. Do ponto de vista da arquitetura, os CIEPs não tinham importância. Do ponto de vista social, tinham. Hoje estão por aí, abandonados. Estamos otimistas, o mundo está mudando, o império velho de Bush está desmoralizado. Acho que o mundo está melhorando. O capitalismo está desmoralizado.”
“Lembro-me da noite em que Fidel esteve em meu escritório. Convidei amigos e, à meia-noite, quando ele ia embora, o elevador enguiçou. Para pegar o outro, ele teve de passar pelo apartamento de um vizinho, que até hoje conta essa ocorrência com certo orgulho. Dá para imaginar o susto do casal ao abrir a porta e dar de cara com o Fidel? O único comunista que mora nesse prédio sou eu. Mas, quando Fidel saiu, o edifício todo estava iluminado e o pessoal batendo palmas. Dizem que é preciso a noite para surgir o dia, e foi isso que aconteceu com Cuba.”
“Mais importante do que a arquitetura é estar ligado ao mundo. É ter solidariedade com os mais fracos, revoltar-se contra a injustiça, indignar-se contra a miséria. O resto é o inesperado; é ser levado pela vida.”
“No dia em que o mundo for mais justo, a vida será mais simples.”
“Nossa passagem pela vida é rápida. Cada um vem, conta sua história, vai embora e depois ela será apagada para sempre. A vida continua.”
“Nunca acreditei na vida eterna. Sempre vi a pessoa humana frágil e desprotegida nesse caminho inevitável para a morte… Às vezes, muito jovem, o espiritismo me atraía, logo dissolvido pelo materialismo dialético, irrecusável. Se via uma pessoa morta, meu pensamento era radical. Desaparecera, como disse Lacan, antes de morrer. Um corpo frio a se decompor, e nada mais.”
“Não é o ângulo reto que me atrai. Nem a linha reta, dura, inflexível, criada pelo homem. O que me atrai é a curva livre e sensual. A curva que encontro nas montanhas do meu país, no curso sinuoso dos seus rios, nas ondas do mar, nas nuvens do céu, no corpo da mulher preferida. De curvas é feito todo o Universo – o Universo curvo de Einstein.”
“O mais importante não é a Arquitetura, mas a vida, os amigos e este mundo injusto que devemos modificar.”
“O que nós queremos na arquitetura com a mudança na sociedade não é nada especial: as casas de luxo vão ser menores. Os grandes empreendimentos urbanos… vão ser maiores ainda porque todos deles vão participar.”
“O ruim de Brasília é que quando a gente chega lá percebe que a cidade está inacabada.”
Amazônia
“Patriota é quem defende o patrimônio nacional. É lutar pela Amazônia. Os americanos estão voando sobre nossas riquezas porque a Amazônia faz parte do plano deles. Até os militares no Brasil estão contra isso.”
“Quando faço palestras para estudantes,digo que a arquitetura não é importante,o importante é a vida.”
“Urbanismo e arquitetura não acrescentam nada. Na rua, protestando, é que a gente transforma o país.”
Comunismo
“Nunca me calei. Nunca escondi minha posição de comunista. Os mais compreensíveis que me convocam como arquiteto sabem da minha posição ideológica. Pensam que sou um equivocado e eu penso a mesma coisa deles. Não permito que ideologia nenhuma interfira em minhas amizades. A humanidade precisa de sonhos para suportar a miséria; nem que seja por um instante.”
“A direita quer manter este clima de poder, de injustiça social e de subserviência ao império norte-americano.”
“Acontece que as mentiras que contam sobre Stalin são invencione da burguesia.”
Fantasia
“A gente precisa sentir que a vida é importante, que é preciso haver fantasia para poder viver um pouco melhor.”
Capitalismo
“O Bush, no fundo, é um idiota que tem as armas na mão, e delas se serve para levar o terror às áreas mais desprotegidas. Representa o capitalismo, que, decadente, tudo faz para subsistir.”
Revolução
“Quando a vida se degrada e a esperança sai do coração dos homens, só a revolução.”
A mudança e a miséria
“A miséria existe. E a burguesia brasileira, que é das mais atrasadas, está sentindo isso na pele pela primeira vez. A chance de mudança está aí, nesta situação-limite. E há o inesperado, com o qual devemos contar. Um dia, lá em Paris, Sartre me disse que gostava de ter dinheiro no bolso para dar esmola. O sujeito chegava, Sartre dava um dinheirinho e quase agradecia por isso. Mudei minha opinião sobre a esmola. Como dizia o padre Teillard Chardin, quando ser for melhor que ter, estará tudo resolvido no mundo.”
O cantor Caetano Veloso dedicou uma música do novo disco “Abraçaço” ao comunista Carlos Mariguella. Confira!
A música chamada “Um Comunista” trata não só da vida de Marighella, como dá uma leitura de esperança social a que tem e lutam os comunistas. Já diz a letra: “Os comunistas guardavam sonhos”.
A Organização das Nações Unidas (ONU) e as Convenções Internacionais de Direitos Humanos já definiam a participação especial que as sociedades e os Estados deveriam assegurar às crianças e aos adolescentes. Mas, quem disse que ditadura respeita lei, convenção, tratado, regra de moral ou ética? Desse modo, a longa noite de terror que escureceu o país durante 21 anos (1964-1985) vitimou também crianças e adolescentes.
O movimento estudantil – secundarista e universitário – engajou-se com todas as forças na luta para pôr abaixo a Ditadura Militar. Nas manifestações de rua que se seguiram ao golpe militar, tombaram garotos que se tornaram símbolos de resistência. Jonas José de Albuquerque Barros, 17 anos, foi assassinado no dia 1º de abril de 1964, por ocasião de uma manifestação pública no Centro do Recife, em protesto contra o golpe que acabara de derrubar João Goulart da Presidência da República e implantar um regime ditatorial. Édson Luís de Lima Souto, há pouco havia completado 18 anos. Durante protesto por melhoria de condições no restaurante Calabouço, no Rio de Janeiro, foi atingido mortalmente por um tiro da Polícia Militar. Fernando da Silva Lembo, 15 anos, participava de uma passeata contra a ditadura no Rio de Janeiro em 21 de junho de 1968, quando foi atingido na cabeça por uma bala disparada por um PM. Morreu no Hospital Miguel Couto no dia 1º de julho.
Adolescentes entre mortos e desaparecidos
Após a edição do AI-5 (13/12/1968), várias organizações políticas de esquerda optaram pela ação armada como forma de derrubar a Ditadura e implantar o socialismo. Entre seus militantes, havia secundaristas adolescentes que conheceram o braço pesado do terror estatal.
As crianças não foram poupadas. Filhos(as) de militantes foram apresentados(as) aos porões do DOI-Codi, do Dops e outras Casas da Morte, como ameaça para “abrir a boca” dos revolucionários que resistiam aos choques elétricos, pancadaria, pau-de-arara, sessões de afogamento.
Eis, sinteticamente, algumas dessas histórias para não esquecermos jamais e cobrarmos com intensidade maior o direito à memória, à verdade, à punição dos algozes.
“…Dorme, meu menino, dorme…”
VLADEMIR tinha oito anos e VIRGÍLIO FILHO, seis, na ocasião em que seu pai, Virgílio Gomes da Silva (leia A Verdade, nº 144) foi sequestrado, torturado e morto no dia 29/09/1969. Dia seguinte, a casa da família foi invadida e toda a família aprisionada, inclusive Isabel, um bebê de quatro meses. As crianças foram levadas para um Juizado de Menores em São Paulo. Virgílio lembra: “…A noite era pior. Tinham umas luzes meio roxas para o lado do berçário da Isa. Meu irmão (Vlademir) me levava na cozinha para a gente roubar leite e dar para ela”. Eles dormiam embaixo do berço para impedir que levassem a irmã. “Eles nos levavam para ver umas casas bonitas e perguntar se gostaríamos de morar ali”. Uma tia os resgatou e periodicamente levava as crianças para uma esquina próxima ao presídio, de onde Ilda (a mãe) podia vê-las, embora elas não a vissem. Mas sabiam que era a mãe porque viam um jornal balançando (era Ilda acenando para eles). Quando a visita foi permitida, diz Virgílio, “a alegria de ver a mãe foi maior que todo o sofrimento pelo qual passaram”. Libertada em 1979, Ilda foi com a família para Cuba, de onde só voltaram depois de adultos e formados. “Se há um paraíso na Terra, é Cuba. No Brasil, meu pai era tratado como bandido, em Cuba como herói. Nós éramos filhos de um herói”, testemunha Virgílio Filho.
IVAN SEIXAS tinha 16 anos no momento em que, no dia 16 de abril de 1971, foi preso juntamente com seu pai, Joaquim Alencar de Seixas. Ambos militavam no Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT), do qual Joaquim era dirigente. Foram barbaramente torturados. Depois, na mesma cela, Ivan ouviu do seu pai a última frase de sua vida: “Aguenta firme. Não fala”. Poucas horas depois, Joaquim morreria. Ivan não falou, sofreu muito, mas sobreviveu. Passou seis anos na cadeia (o resto de sua adolescência e parte da juventude). Atualmente, é diretor do Fórum de Ex-Presos Políticos de São Paulo.
MARCO ANTÔNIO DIAS BAPTISTA (1954-1970) tornou-se o mais jovem “desaparecido político” brasileiro. Tinha apenas 15 anos quando sumiu (1970). Militava na Vanguarda Armada Revolucionária – Palmares (VAR-Palmares). Há testemunho de que foi preso pela equipe de Fleury em São Paulo.
NILDA CARVALHO CUNHA era casada, mas contava apenas 17 anos. Militava no Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8) com o seu companheiro Jaileno Sampaio. Eles abrigaram Iara Iavelberg (leia A Verdade, nº 65). Tiveram o apartamento invadido. Iara foi morta. Nilda passou três meses presa, sofrendo torturas físicas e psicológicas. Saiu doente, ficou cega, teve pesadelos e crises de delírio. Estava internada quando o torturador, major Nilton Cerqueira, teve a ousadia de invadir seu quarto no hospital e ameaçá-la. A “visita” aterrorizante agravou seu estado de saúde, e Nilda faleceu em novembro de 1971.
MARIA AUXILIADORA DE ALMEIDA ARANTES, mulher de Aldo Arantes, ex-presidente da UNE e dirigente do PCdoB, viveu 11 anos na clandestinidade, dois anos no exílio e passou quatro meses presa em Maceió. Sua prisão se deu juntamente com dois filhos – um menino de três anos e uma menina de dois. Passaram pelo Dops, Cadeia Pública, Escola de Aprendizes de Marinheiro e Hospital da Polícia Militar. As crianças sofreram todos os rigores da prisão: “…não podiam ir à escolinha, nem sair para brincar no pátio. Estavam confinadas, privadas de liberdade, submetidas a condições degradantes”. Por conta da clandestinidade, os filhos de Aldo, como de muitos outros militantes, não sabiam o verdadeiro nome do pai. Conheciam-no como Roberto.
JOÃO CARLOS GRABOIS – JOCA sofreu as consequências da tortura ainda no útero quando sua mãe (oito meses), Crimeia Schimidt de Almeida foi presa e torturada pela Operação Bandeirantes (Oban), em São Paulo. Ele nasceu prematuro e ficou 52 dias na cela com a mãe.
Queriam separar o CACÁ, com apenas um mês de idade, de sua mãe Rose Nogueira (leia A Verdade, nº 125), mas ela resistiu tão bravamente que os repressores cederam. Depois, no Dops, a criança foi utilizada como ameaça para que a prisioneira respondesse ao que os torturadores gostariam de ouvir. Somente após 30 dias de prisão, deixaram-na vê-lo, e apenas por alguns minutos. Cacá (Carlos Guilherme Clauset, hoje jornalista e piloto de rally) tinha dez meses quando Rose foi solta.
OS “MALDITOS” DO ARAGUAIA – Durante a guerrilha do Araguaia (1973-1975), não foram apenas os guerrilheiros as vítimas da violenta repressão. Camponeses, tendo mantido ou não alguma relação com os militantes sofreram barbaramente, inclusive o sequestro de filhos, a maioria dos quais nunca apareceu. É o caso de Maria Bezerra de Oliveira, cearense que se deslocara para a região ainda na década de 50 e perdeu seus filhos levados pelos militares sem motivo algum. “Tinha um filho de oito anos, Juracy, que foi iludido por um militar e me largou por ele. Chorei 15 dias. Depois, eles voltaram com o menino, perguntaram se eu dava, então eu disse que não, porque meus filhos não eram cachorros, e ele levou. Dias depois, outros soldados vieram e levaram o caçula, Miraci”. Quando completou 15 anos, Juracy deixou a família do militar e reencontrou a mãe. Do filho mais novo, ela não teve mais notícias.
Um sentimento profundo de amor
Sofreram ainda os(as) filhos(as) de militantes que não foram presos nem mortos ou desaparecidos ou tiveram vida clandestina. Trabalhando, estudando e dedicando-se à militância, tiveram pouco tempo livre para dar atenção e carinho às suas crianças, que naturalmente carregam essa carência dentro de si.
Não foi por falta de amor; ao contrário, foi por serem movidos(as) por um profundo sentimento de amor por todas as crianças; não conseguiam se sentir felizes ao lado do(a) filho(a), sabendo que milhares de meninos(as) sofrem as consequências do terror, de um sistema excludente e repressor.
Muitas vezes, com o coração partido e lágrimas contidas, deixaram de comemorar o aniversário do(a) seu (sua) filho(a) ou saíram no meio de uma festinha, pedindo desculpas entre abraços e beijos: “desculpa, filho(a), mas papai (mamãe) precisa trabalhar”.
Em nome de todos(as) os(as) militantes, um brilhante pedido de perdão feito por Ivan Lins e Vítor Martins. Aos que não seguiram o caminho do pai e/ou da mãe, que os compreendam, pelo menos, e os amem cada vez mais, certos de que são ou foram muito amados.
Aos Nossos Filhos
Ivan Lins
Perdoem a cara amarrada
Perdoem a falta de abraço
Perdoem a falta de espaço
Os dias eram assim
Perdoem por tantos perigos
Perdoem a falta de abrigo
Perdoem a falta de amigos
Os dias eram assim
Perdoem a falta de folhas
Perdoem a falta de ar
Perdoem a falta de escolha
Os dias eram assim
E quando passarem a limpo
E quando cortarem os laços
E quando soltarem os cintos
Façam a festa por mim
Quando lavarem a mágoa
Quando lavarem a alma
Quando lavarem a água
Lavem os olhos por mim
Quando brotarem as flores
Quando crescerem as matas
Quando colherem os frutos
Digam o gosto pra mim
Fonte – Direito à Memória e à Verdade – Histórias de meninas e meninos marcados pela ditadura – Secretaria Especial da Presidência da República, 2009
Desde que pisou pela primeira vez o território brasileiro, o negro tem sido um resistente. Inicialmente, como escravizado vindo de diversas partes da África, a organização de fugas e o aquilombamento foram as principais formas de tentar obter a liberdade retirada por algozes, até aquele período desconhecidos, como mercadores e compradores de escravos.
Apesar de o escravismo ter sido a relação social marcante durante três séculos, desde meados do século 18 o Brasil já não estava mais dividido apenas em um punhado de senhores brancos e uma multidão de escravos negros. A mestiçagem sempre foi uma realidade, embora não eliminasse o racismo, a violência e as desigualdades sociais. Tanto que, no começo do século 19, calcula-se que um terço da população nacional era composta pelos chamados pardos livres. Muitos negros haviam conquistado alforria e seus descendentes imediatos atuavam nos diversos trabalhos artesanais, nas irmandades religiosas, em milícias e alguns poucos até integravam as elites culturais e políticas, como José do Patrocínio (1854-1905) e Luís Gama (1830-1882)[i] Os homens e mulheres escravizados sofreram muito e enfrentaram desafios duros, mas não foram apenas vítimas. Como agentes históricos, participavam e interferiam, dentro de suas possibilidades, nos rumos da sociedade e em seus próprios destinos. “Vale chamar atenção para um ponto: a Abolição, oficializada pela Lei Áurea em 13 de maio de 1888, não se realizou apenas ‘por cima’, isto é, pela iniciativa das elites parlamentares, de abolicionistas ilustres, dos proprietários ‘esclarecidos’ e da Coroa Imperial. De fato, um longo e penoso processo de embates ocorreu, do qual participaram, principalmente, os cativos. De forma direta ou indireta, as ações individuais ou coletivas dos escravos ajudaram a minar o sistema escravista, por meio de pequenos e grandes quilombos, de fugas coletivas ou individuais, cometendo violências contra a violência opressora, enfim, com variadas atitudes de resistência”[ii].
Nesse contexto de luta e de indignação acerca do sistema escravista, surge Carukango, trazido de Moçambique para o Brasil – mais especificamente, para Macaé.
A Resistência em Macaé
Quando em 1817, Saint Hilaire passou por Macaé, havia poucos anos que o local tinha sido erigido em vila. A criação da vila ocorreu em 1813 e no ano seguinte a Câmara iniciou seus trabalhos de ordenamento urbano e social. Assim, o que o naturalista viu ao passar pela região foi o início de um processo de consolidação espacial e de poder comandado pela elite local. Segundo seus relatos, “naqueles anos iniciais do século 19, a principal atividade econômica da vila era o comércio de madeiras. Tanto os ricos como os médios e pequenos proprietários de terras e homens se dedicaram a esta exploração. Havia também outros produtos na região, vinte engenhos de açúcar que existiam entre o sítio do Paulista e o porto de São João da Barra. Além destes engenhos, alguns fazendeiros estavam também iniciando o cultivo de café. Outros, ainda, plantavam milho, algodão, arroz e mandioca”[iii].
Em todas estas atividades, bem como nos serviços urbanos e domésticos, a mão de obra cativa era essencial. Todavia, para manter o controle sobre este elevado contingente era preciso ordená-lo. Para isto, a Câmara, em 1814, criou o cargo de Capitão do Mato para tentar coibir o número de escravos fugitivos que viviam pelos matos da região[iv].
Para períodos posteriores, através das informações remetidas ao Presidente de Província pelo administrador da Mesa de Renda do Município, em 21 de novembro de 1877, sabe-se que Macaé possuía um total de 11.599 escravos matriculados desde o ano de 1872 até o de 1876[v].
Como não poderia deixar de ser, e também de modo similar a outras searas, a região de Macaé, repleta de escravos, conviveu durante todo o século 19 com inúmeros quilombos e quilombolas. Os quilombos poderiam ser formados por centenas de pessoas, ou por apenas três ou quatro indivíduos. Normalmente surgiam em momentos de desacordos nas relações cotidianas entre escravos e senhores e seus capatazes, ou em épocas de crise política aguda, em função de uma desorganização maior.
A fuga e instalação do negro no quilombo colocava em xeque a sociedade patriarcal, além de resgatar, mesmo que momentaneamente (até nova recaptura possível), a condição de ser humano aviltado pela condição de mercadoria. A evasão de escravos, é claro, gerava prejuízos ao proprietário, ao Estado, à Coroa, que passaram a investir na manutenção da ordem, recaptura e castigos exemplares aos reintegrados à condição de cativos.
A fuga, então, era uma das formas de negação da sociedade opressora que anulava os seres humanos eliminando a possibilidade de usar suas línguas, religiões e estilos de vida. Dessa forma, a criação de quilombos fez parte da sociedade escravista. Onde havia uma, necessariamente surgiria a outra organização.
Ainda que fossem formados basicamente por escravos fugidos, tal não significa que outros grupos da população também não recorressem a eles quando sentiam necessidade de proteção e esconderijo. Tudo leva a crer que, em quilombos menores, a população seria predominantemente de escravos fugidos. Já nos maiores haveria a presença de elementos étnicos diferentes. Esta diferenciação poderia ser explicada, relacionando-a às condições econômicas do grupo. “Somente um grupo estável, com organização social, política e econômica forte, poderia permitir outros elementos em seu interior”[vi].
Tal estrutura, contudo, entrava em choque sempre que o quilombo se tornava perigoso para a população ou quando constituía um empecilho ao aumento da fronteira agrícola. As florestas, os índios e os quilombolas eram problemáticos à expansão da fronteira, porque quase sempre eram considerados hostis à população. Logo, o seu extermínio tornava-se condição essencial para a possibilidade do estabelecimento de novas áreas cultiváveis. “Os quilombolas, ao penetrarem nas matas e criarem as condições propícias ao desenvolvimento da agricultura, desencadeavam a cobiça por novas terras que, graças a eles, tornavam-se aptas à exploração. E então, os fazendeiros passavam a ter interesses cada vez maiores no extermínio do quilombo e, para isso, lançavam mão dos mais variados mecanismos para auxiliar as autoridades locais: colocavam seus escravos à disposição dos chefes das tropas; forneciam alimentos e estadias; participavam dos grupos de perseguição, havendo casos, inclusive, de fazendeiros que utilizaram espiões colocando-os no interior dos quilombos com o objetivo de conhecer suas fraquezas e o melhor meio para serem atacados”[vii].
O Quilombo de Carukango
Carukango seria um escravo proveniente de Moçambique[viii]. Fugira de seu senhor, o português Antônio Pinto, em uma noite, formando, juntamente com outros escravos da localidade, um quilombo numeroso. Na fuga, roubaram o que puderam da fazenda, principalmente ferramentas e alimentos. A área de atuação dos quilombolas era a divisa de Macaé com os atuais municípios de Trajano de Morais e Conceição de Macacu. Provavelmente, o quilombo ficava estabelecido na Serra do Deitado, no distrito de Crubixais.
Junto com um grupo crescente de fugitivos, Carukango percorria à noite as fazendas da região insuflando os escravos a se evadirem também. Numa destas incursões, ao invadir a fazenda de seu ex-senhor, matou-o. Depois, tentou assassinar um outro fazendeiro, Chico Pinto, irmão do assassinado, que vivia há muitos anos com uma mulata de nome Josepha. Ao ter sua casa atacada pelo grupo, Chico Pinto conseguiu dar um tiro no braço de Carukango, mas, por via das dúvidas, resolveu, no dia seguinte, deixar a casa de tapera e buscar proteção na cidade.
O medo do crescente poder de Carukango determinou que as autoridades proporcionassem condições ao coronel Antão de Vasconcelos, que era chefe do Distrito Militar da Capitania do Espírito Santo, para organizar uma expedição contra o quilombo. Essa expedição contava não só com soldados, mas também com grande número de moradores da região, inclusive da família do senhor assassinado.
O grupo conseguiu prender um negro que fazia parte do bando de Carukango e, por meio dele, localizou o quilombo. É Lamego quem o descreve: “Um chapadão a perder de vista era a sede do Quilombo e se achava coberto, em grande parte, de muitas roças de milho, feijão e outros cultivos. Tudo oculto pela mata virgem circundante. No centro havia uma casa apoiada nos fundos por três grandes pedras. Como se sabia que no quilombo existiam cerca de duzentos escravos foragidos, não era possível a tão pequena habitação abrigar tanta gente. Havia certamente algum mistério a ser desvendado”[ix].
Depois da troca de tiros, o grosso da população quilombola teria surgido do interior da casa, da floresta e de trás das pedras. Mas, mesmo assim, as tropas teriam conseguido dizimar a maioria. Uns poucos fugiram e o restante teria ficado em poder dos soldados. Carukango estava liderando o grupo que se entregara à polícia. Saiu “vestido com hábito sacerdotal, trazendo ao peito um rico crucifixo de ouro, ante o qual todos se descobriram e abaixaram as armas”[x].
Chegando à frente do filho do seu ex-senhor, assassinado por ele próprio, retirou do interior do hábito uma pistola e desferiu-lhe dois tiros mortais. Logo, a população que ali estava e as autoridades mataram-no com golpes de foice, cortaram sua cabeça, colocando-a à beira da estrada para que servisse de exemplo aos demais escravos da região.
Pode-se perceber que Carukango não é um simples bandido, como afirma Vasconcelos. Ele é um líder respeitado porque proclama uma justiça para seus companheiros mediante a fuga. Esta era encarada pelos escravos que o seguiam como um mecanismo para a liberdade que Carukango afirmava ser possível. Por isso, os negros das senzalas ajudavam-no a fugir todo o tempo de seus perseguidores. Além disso, ele é um líder que os escravos em dificuldades procuravam a fim de resolver seus problemas.
Foram encontradas “roças de milho, feijão e outros cultivos” no quilombo. Havia, pois, uma relativa independência da população quilombola no tocante à alimentação, o que era de muita valia para a manutenção de uma comunidade com tal porte. Esta “independência” dos quilombolas aponta para o fato de que Carukango não queria ficar escondido como os outros líderes (até mesmo os localizados em sua área). Ele poderia, graças à estrutura montada, sobreviver com seu povo. Contudo, Carukango preferia o ataque, preferia mostrar-se e auxiliar a outros escravos.
Carukango foi homenageado com o nome de um rio e de uma serra, no município de Conceição de Macabu, a fim de que sua luta e coragem estejam sempre vivas em nossas memórias.
Diogo Belloni, militante da UJR
[i] Luís Gama foi jornalista e escritor. Filho de uma cativa com seu senhor,foi alforriado ainda criança. Publicou livros, manifestos; redigiu e dirigiu importantes jornais engajados na luta contra o escravismo, além de ter criado entidades e participado de ações diretas para libertar escravizados.
²BARBOSA, P. Almanaque histórico: João Cândido: a luta pelos direitos humanos. Brasília: Abravídeo, 2008.
³SAINT-HILAIRE, A. Viagem pelo distrito dos diamantes e litoral do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia, 1974.
4ARQUIVO NACIONAL (Brasil), 1814-1828, Livro da Câmara Municipal de Macaé.
5ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, 1877, Mesa de Renda do Município de Macaé.
6AMANTINO, M. O mundo dos fugitivos: Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX. 1996.
7AMANTINO, M. Banditismo social e quilombolas no Rio de Janeiro, século XIX. In: Cadernos do Laboratório Interdisciplinar de Pesquisa em História Social. Rio de Janeiro, UFRJ, v.1, n. 1, p. 21-33, 1995.
8O tráfico na região Leste da África incrementou-se a partir de 1815, em função do aumento das pressões inglesas para proibir o tráfico ao Norte do Equador (tratados comerciais da Inglaterra com Portugal de 1815 e 1817). Em 1812, os portugueses instalaram uma feitoria em Quelimane e os traficantes de Cuba e do Brasil puderam comprar escravos diretamente. Em 1813 eram 8.000, em 1820 subiram para 19.000. Em 1828, 34.500, e em 1829, 30.400. Depois de 1830, os escravos de Moçambique constituíram um dos maiores grupos no Rio de Janeiro.
9LAMEGO, A. Macaé à luz de documentos inéditos. In: Anuário Geográfico do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, n.11, p. 97, 1958.
10VASCONCELOS, A. Evocações: crimes célebres em Macaé. Rio de Janeiro: B. Aguilla Edt., 1911.
Nascido e criado no Rio de Janeiro, Marcos André da Silva, presidente e mestre de bateria do bloco Samba Brilha e membro do Círculo Palmarino, organização nacional do movimento negro na luta contra o racismo e pelos direitos civis, conhece as ruelas, os morros, os bairros do subúrbio e zona sul por onde o samba, com suas rodas, seus batuques e melodias, atravessam a cidade. O bloco surgiu no Centro do Rio, mais propriamente na Cinelândia, berço de manifestações políticas. Foi construído há seis anos com o objetivo de resgatar as lutas sindicais e populares e seus protagonistas. Por ser um bloco que nasceu na escadaria de um botequim, num local onde as passeatas por melhores salários e uma vida digna estiveram sempre presentes no calendário histórico da cidade, criou-se a perspectiva de que esse bloco apresentasse, em seus enredos, letras e músicas, reivindicações políticas pelos partidos de esquerda do Rio de Janeiro e, com isso, resgatasse esse palco político e efervescente da Cinelândia.
“Nós entendemos que a Cinelândia, por causa da sua história de ser um palco de luta dos movimentos sociais de muitos anos, desde a Passeata dos Cem Mil, da luta pela anistia, merece ser preservada e respeitada como patrimônio histórico e político. Por isso, o Samba Brilha está junto com todos que desejam preservar essa história”, afirma mestre Marco André. O samba, na época da ditadura, foi um dos movimentos musicais mais reprimidos pelos órgãos de repressão. Compositores como Candeia, Noca da Portela e Beto Sem Braço, entre outros, compunham sambas de resistência e exaltavam a necessidade da libertação do povo. Sambas que retratavam questões sociais, a luta do povo por uma vida mais digna. “O samba tem que continuar brilhando. Ele representa o carro-chefe das diversas histórias cantadas nos enredos deste país” esclarece Marco André.
Depois de seis anos de bloco, foi necessário avançar nesse compromisso com a cultura popular. As rodas de samba hoje contam as histórias das diversas lutas do nosso povo. Essa atividade acontece no segundo sábado de cada mês. A primeira atividade aconteceu em março e teve como mote a homenagem às mulheres, no 8 de Março, Dia Internacional das Mulheres. Depois foi a vez do padroeiro dos trabalhadores e sambistas, São Jorge Guerreiro, quando a cor vermelha tomou conta do ambiente. Em maio, a classe trabalhadora teve sua vez, e o Primeiro de Maio foi saudado com muito samba referente às lutas dos trabalhadores.
Nesse ritmo, no mês de outubro a lembrança foi a luta dos professores e suas reivindicações. Também nesse mês, o Samba Brilha homenageou o grande compositor Luís Carlos da Vila, que completa cinco anos de sua morte física, pois seus sambas ficarão eternamente na memória de todos os brasileiros. Quem não se lembra de Quizomba, samba-enredo que homenageou o herói Zumbi dos Palmares e a luta de libertação dos Quilombos?
A Verdade comparece sempre a essa roda de samba. Marcos André assim definiu a importância do jornal: “Nós entendemos que o jornal A Verdade é um veículo de comunicação do proletariado. Tenho o maior orgulho de ser contribuinte desse jornal. O Samba Brilha tem A Verdade como grande parceiro, nas questões culturais, nas questões políticas e nas questões raciais. Estamos propondo, que no mês de novembro, A Verdade seja o grande homenageado no Samba Brilha, no intuito de ajudar a fortalecer ainda mais esse veículo de comunicação que discute o povo brasileiro, a cultura brasileira, a raça negra, o socialismo e o samba”.
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