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sexta-feira, 12 de setembro de 2025
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Polícia agride estudantes em ato contra embaixada de Israel no México

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Ao menos 2 manifestantes feridos em manifestação na Embaixada de Israel no México em defesa do povo palestino e contra o genocídio em Gaza. Ao menos um manifestante está gravemente ferido.

Redação


INTERNACIONAL – Em manifestação realizada na tarde desta terça (28/05), centenas de estudantes se mobilizaram em frente à embaixada israelense no México. O ato foi feito para exigir o rompimento de relações diplomáticas daquele país com o regime sionista.

O ato em repúdio ao genocídio cometido pelos israelenses em Gaza foi brutalmente reprimida pela polícia da Cidade do México. No enfrentamento, ao menos 2 pessoas ficaram feridas, sendo uma delas com maior gravidade. Rossel Rivera, estudante da UNAM (Universidade Nacional Autônoma do México) e militante da União da Juventude Revolucionária do México, foi agredido fortemente na cabeça e se encontra internado.

“Nesse contexto, a Polícia da Cidade do México protegendo a embaixada do Estado assassino de Israel, começou a reprimir os manifestantes, como resultado foi agredido o companheiro Rossel, militante da União da Juventude Revolucionária do México, provocando feridas na cabeça, no momento o companheiro se encontra com estado de saúde delicado.”, afirmou em nota no Instagram a Frente Popular Revolucionária.

Mobilização mundial em defesa da Palestina

Desde o início dos massacres em Gaza, a juventude de todo o mundo se levanta em defesa da causa palestina e contra o Estado de Israel. Nos últimos meses, tem tido grande repercussão as ocupações de estudantes em universidades dos EUA e da Europa.

Na América Latina, ocorrem manifestações de solidariedade em vários países com regularidade, sendo o México um dos locais com grandes mobilizações. Resultado dessa pressão, o Estado terrorista de Israel está cada vez mais isolado na região.

Na Europa, fruto das mobilizações populares, mais 3 países passaram a reconhecer formalmente a independência do Estado da Palestina. Irlanda, Noruega e Espanha, puseram em vigor a decisão tomada ainda em abril. Com ela, o esforço capitaneado principalmente pelos EUA, de impedir o reconhecimento dos palestinos ao seu Estado, ficou prejudicado, aumentando ainda mais a pressão internacional com Israel.

Embaixadas de Israel pelo mundo são alvos de protestos

O México não é o único país a ter protestos em frente à embaixada israelense. Na Europa e em países como a Turquia, a população também se mobiliza e demonstra o repúdio à política de extermínio dos sionistas.

O que ocorreu na Cidade do México, com ao menos um estudante gravemente ferido, mostra até onde os Estados capitalistas estão dispostos a ir para garantir os interesses do sionismo. Assim como no México, no Brasil, a voz de defesa do povo palestino é todo dia censurada, com o silenciamento completo das representações palestinas nos grandes meios de comunicação.

A situação impõe a necessidade de se ampliar as mobilizações em todos os países em defesa da libertação da Palestina. Apenas quando o povo palestino estiver livre, os povos do mundo serão realmente livres.

Confira abaixo a nota da União da Juventude Revolucionária do México, sobre o ataque da polícia aos manifestantes (publicação completa neste link):

Neste 28 de maio, numa manifestação de solidariedade com a Palestina nosso amigo e camarada Rossel foi agredido por parte da polícia da Cidade do México e se encontra grave no hospital.

A manifestação ocorria em solidariedade com o povo palestino que está sofrendo um genocídio. A polícia cercou e agrediu o conjunto dos manifestantes.

Rossel é um estudante de geografia da UNAM e militante da UJRM. Se destacou pelo seu papel na luta estudantil desta universidade, assim como pela sua participação no acampamento por Palestina na reitoria da mesma instituição.

(…) Rossel se encontra lesionado e em estado delicado no hospital com um traumatismo craniano.

CONDENAMOS esta agressão e EXIGIMOS que o governo repressor de Marti Batres [Chefe de Governo da Cidade do México] se responsabilize pelos gastos com a saúde do nosso companheiro Rossel Rivera.

Fazemos um chamado aos povos do mundo, aos coletivos, organizações e sindicatos para impulsionar uma frente única para resistir juntos e a todo custo à agressão do regime burguês.

Governo maldito, reprimir é um delito!

Governo farsante, que reprime estudantes!

Justiça para Rossel!

Israel usa programas de computador para assassinar em massa a população de Gaza

De acordo com os jornais israelenses +972 Magazine e Local Call, em reportagem traduzida pela Agência Pública, o Governo de Israel utiliza, desde o início dos bombardeios em Gaza, programas de computador e de Inteligência Artificial para orientar os bombardeios em Gaza. Os programas teriam como função criar listas de palestinos a serem assassinados na Faixa de Gaza.

Redação


INTERNACIONAL – De acordo com os jornais israelenses +972 Magazine e Local Call, em reportagem traduzida pela Agência Pública, o Governo de Israel utiliza, desde o início dos bombardeios em Gaza, programas de computador e de Inteligência Artificial para orientar os bombardeios em Gaza. Um deles é o chamado Lavender com a desculpa de “identificar pessoas envolvidas com alas militares do Hamas”. O programa teria como função criar uma escala de 1 a 100 para determinar o grau de envolvimento dos habitantes da Faixa de Gaza (2,5 milhões de pessoas) com o grupo da resistência palestina que governa o território desde 2006.

De acordo com a apuração desses veículos de imprensa israelenses, antes do massacre do povo de Gaza, o programa Lavender havia identificado 37 mil alvos potenciais de bombardeios. Para atingir esses alvos, o Exército sionista desenvolveu um segundo programa, chamado “Where’s daddy?” (“Onde está o papai?”). Este segundo programa tem como função identificar o momento em que cada um dos alvos estabelecidos estaria dentro de casa reunido com a família para determinar a hora do bombardeio. O propósito de Israel era, além de matar os alvos, também assassinar suas famílias.

Uma das provas de que Israel planejava, desde o início dos bombardeios, assassinar todas essas pessoas é o fato de que a mídia burguesa mundial sempre falou no número de 40 mil combatentes do Hamas dentro de Gaza, mesmo o grupo nunca divulgando o número real de efetivos militares que possui. Na realidade, os chamados “terroristas” eram servidores públicos civis que davam conta de atender a população local nas mais diversas áreas.

O governo do ditador Benjamin Netanyahu quer fazer como Hitler fez na Alemanha: levar a uma escala industrial o assassinato da população de Gaza. Se os drones e aviões de Israel usam programas de computador para matar 37 mil homens dentro de suas casas, somando suas esposas, filhos e vizinhos, veremos que ao menos um terço dos 2,5 milhões de habitantes são alvos potenciais dos programas israelenses.

Uma criança morta a cada dez minutos

O uso, por Israel, de inteligência artificial e programas de computador para realizar bombardeios indiscriminados explica também outros dados do genocídio do povo palestino. Segundo a Agência da ONU para Refugiados Palestinos (UNRWA, na sigla em inglês), a cada dez minutos, uma criança palestina é morta. 

O dado foi anunciado por Adnan Abu Hasna, assessor de imprensa da agência da ONU, a um canal de TV árabe. “A cada dez minutos, uma criança é morta em Gaza. A cada dia, são 67 mulheres, dentre as quais, 37 mães. Estamos falando de milhares de órfãos – cerca de 18 mil órfãos que perderam tudo: família, amor e vida”, afirmou ele.

Os dados oficiais da ONU e a apuração sobre as táticas de Israel em Gaza explicam, em grande medida, a dimensão do genocídio do povo palestino. A realidade é que o plano verdadeiro de Israel é acabar com a população de Gaza, assassinar uma parte e expulsar os sobreviventes para o Egito. Isto tudo para que novos colonos sionistas ocupem o território conquistado na base da matança. Desta forma, Israel e os monopólios imperialistas poderão explorar como quiserem as ricas jazidas de gás e petróleo que existem na costa da Faixa de Gaza.

Resistência estudantil no mundo

Desde o início de abril, milhares de estudantes ocupam universidades nos EUA. Apesar de toda a repressão imposta pelo Governo Biden, por governadores estaduais e pelas reitorias das instituições, as mobilizações só aumentaram.

Já foram mais de duas mil pessoas presas. Assim, o imperialismo estadunidense mostra que a liberdade de expressão nos EUA só existe no papel. Na prática, os governantes só aceitam manifestações desde que elas não afetem seus interesses imperialistas ou os lucros dos monopólios. Mesmo com um amplo movimento estudantil para acabar com os investimentos em Israel, as universidades estadunidenses preferem chamar a polícia contra os estudantes do que abrir mão dos contratos bilionários que têm com a indústria bélica sionista.

Universidades já foram ocupadas também na França, Suíça, México, Alemanha, Holanda, Espanha e aqui no Brasil. Estudantes da Universidade de São Paulo (USP) realizaram um acampamento contra o genocídio palestino no dia 07 de maio. A ocupação durou três dias e reuniu centenas de estudantes na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas. Além do cessar-fogo e do fim do genocídio, os estudantes pediram o fim dos convênios da USP com universidades israelenses e o rompimento de relações comerciais e diplomáticas do Brasil com Israel.

Pela independência da Palestina

Em outra frente, mais países também se juntam à pressão mundial pelo fim do genocídio e a libertação da Palestina. O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, anunciou diante de milhares de trabalhadores, num ato do 1º de Maio, o rompimento das relações diplomáticas com Israel. Na Turquia, após centenas de manifestações populares, o presidente autoritário Recep Erdogan se viu obrigado a romper todos os laços comerciais com Israel.

Ainda na diplomacia, mais países se somam no processo de reconhecimento do Estado da Palestina (passo importante para fortalecer a luta pela independência do país). No Caribe, Jamaica e Barbados declararam que reconhecem o Estado Palestino. Já na Europa, Irlanda, Noruega, Espanha, Bélgica e Eslovênia estão com projetos de decreto para o reconhecimento. 

No último dia 10 de maio, a Assembleia Geral da ONU aprovou uma resolução que pede o reconhecimento do Estado da Palestina e sua independência e uma ampliação dos direitos da representação diplomática dos palestinos no organismo. Até hoje, os palestinos não têm seu Estado reconhecido pelas Nações Unidas por conta do veto dos EUA, principal aliado de Israel.

Com a resolução recebendo apoio de 143 países, com apenas nove votos contrários (entre eles, os EUA) e 25 abstenções (incluindo Reino Unido e Alemanha), Israel viu seu isolamento diplomático aumentar. Revoltado com a solidariedade mundial ao povo palestino, o embaixador israelense na ONU Gilad Erdan rasgou, no púlpito da Assembleia Geral, a Carta das Nações Unidas.

A representação palestina, por sua vez, comemorou o resultado. “Colonização e ocupação não são nosso destino, nos foram impostas. Votar pela existência da Palestina é um investimento na paz”, afirmou Riyad Mansour, representante da Palestina na ONU.

Mesmo com toda a pressão, a Casa Branca continua a mandar armas para Israel bombardear a Faixa de Gaza. Apesar de Joe Biden ter afirmado que suspenderá o envio de bombas e munição para Israel se eles invadirem a cidade de Rafah, fronteira da Faixa de Gaza com o Egito, ele manterá o apoio militar e logístico a Israel nas outras cidades do enclave palestino.

Nesse cenário, a única alternativa dos povos do mundo é continuar e ampliar a pressão para que os imperialistas e sionistas parem o genocídio e para que os palestinos conquistem sua libertação nacional. Assim como os povos colonizados da África, Ásia e América Latina, os palestinos sofrem hoje com o resultado da política colonial, imperialista e racista. A alternativa, portanto, é a luta por todos os meios para derrotar o Exército sionista de Israel.

Palestinos lembram 76 anos da Nakba, o êxodo palestino

Em meio aos bombardeios e ao apartheid, o povo palestino lembrou, no dia 15 de maio, os 76 anos da Nakba, nome em árabe para “catástrofe”. A Nakba ocorreu em 1948, quando Israel, após a declaração de sua fundação em 14 de maio de 1948, expulsou 800 mil palestinos de suas terras e destruiu mais de 500 vilas por todo o território que hoje é conhecido como Israel.

Ao contrário do que se conta na grande mídia, o território israelense era, antes de 1948, ocupado por uma grande maioria palestina. Antes do movimento sionista, palestinos muçulmanos e cristãos conviviam com o povo judeu sem nenhum tipo de discriminação. Com a criação de Israel pelos sionistas, o povo palestino foi forçado a sair de suas terras e os que decidiram ficar foram submetidos a um regime de exploração e discriminação racial.

Hoje, os palestinos continuam a perder e a serem expulsos de seus territórios. Se em Gaza vemos bombardeios a toda hora, na Cisjordânia, colonos sionistas expulsam palestinos de suas casas, destroem suas colheitas e roubam seu patrimônio. A Nakba é lembrada hoje como a catástrofe de 1948, mas, a cada dia, fica mais claro que o projeto de Israel é impor uma nova Nakba ao povo palestino, anexando completamente seu território.

Matéria publicada na edição nº 292 do Jornal A Verdade.

O que é e o que causa o aquecimento global

Neste mês, começamos a acompanhar o desastre climático que vem acontecendo no Estado do Rio Grande do Sul. Chuvas fortíssimas, levando a enchentes e inundações em 447 municípios, afetando 1,5 milhão de pessoas. O aquecimento global e suas consequentes alterações climáticas são a causa primária do problema.

Gildo Bastos* | Florianópolis


SOCIEDADE – No início do mês de maio de 2024, começamos a acompanhar a tragédia climática que vem acontecendo no Estado do Rio Grande do Sul. Chuvas fortíssimas, levando a enchentes e inundações em 447 municípios, afetaram 1,5 milhão de pessoas. Desabrigo, destruição de patrimônio público e privado, desabastecimento de alimentos e água, propagação de doenças e a situação extrema da morte de alguns habitantes são alguns dos efeitos dessa emergência climática.

Podemos apontar diversos fatos que atuaram para o agravamento dos problemas a que a população gaúcha foi submetida: demora dos governos municipais e estadual na pronta resposta à emergência; falhas no funcionamento de equipamentos públicos para o enfrentamento deste tipo de evento; destruição ambiental causada pelo desmatamento, assoreamento dos rios e perda das matas ciliares; flexibilização da legislação de controle ambiental; construções em áreas extremamente suscetíveis a inundações e chuvas fortes, como encostas e margens de rios.

O aquecimento global e suas consequentes alterações climáticas são a causa primária do problema. Pesquisadores nesta área do conhecimento humano não cansam de apontar que haverá, cada vez mais, a ocorrência de eventos climáticos extremos causados pelas mudanças climáticas: inundação de cidades, principalmente no litoral; perda de produção agropecuária, levando à fome; redução no estoque de água disponível para consumo; perda massiva da biodiversidade; aumento de epidemias; grandes migrações humanas. Todas essas transformações levariam a cenários adversos, que iriam desde uma Terra distópica e o fim da sociedade humana como a conhecemos até a possível extinção da espécie humana.

Efeito estufa

Mas o que seria o aquecimento global? Como é causado? Estaria relacionado às atividades humanas? Poderia ser evitado? São perguntas que fazemos e que, cada vez mais, interessam a mais pessoas.

Inicialmente é preciso conceituar o que é efeito estufa. Trata-se de um fenômeno planetário natural e está diretamente relacionado à presença dos gases de efeito estufa na atmosfera terrestre. Esses gases permitem que a energia luminosa do Sol alcance a superfície terrestre e os oceanos, aquecendo-os. O calor resultante é, parcialmente, irradiado de volta para o espaço. Nesse momento, os gases de efeito estufa impedem a passagem da energia calorífica, que se mantém próxima à superfície terrestre. Este processo é importantíssimo para manter a temperatura média da Terra em valores que permitem o desenvolvimento da vida em nosso planeta.

Os principais gases de efeito estufa presentes na atmosfera terrestre são: o dióxido de carbono (CO2), produzido pela queima de combustíveis fósseis, incêndios florestais e desmatamento; o metano (CH4), produzido em lixões, reservatórios de usinas hidroelétricas, mineração e agropecuária; e o óxido nitros (N20), produzido por uso de fertilizantes, e algumas atividades industriais. O aumento nas emissões e na quantidade destes gases na atmosfera, originados principalmente por atividades humanas, é o que causa o aquecimento global, que conduz ao aumento da temperatura média do ar e dos oceanos, levando a alterações climáticas e aos problemas decorrentes.

Podemos fazer algo? 

Já aumentamos a temperatura média do planeta 1,1°C acima daquela encontrada na época pré-industrial (anterior à Revolução Industrial, meados do século 18). Para evitar um aumento significativo dos impactos causados pelo aquecimento global, seria necessário atingirmos a meta de não ultrapassar 1,5°C acima da temperatura de referência. Segundo o último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), publicado em 2023, para conseguirmos atingir essa meta, seria necessário que o pico das emissões de gases de efeito estufa acontecesse até 2025. Após este ano, teria que se iniciar uma redução de 43% até 2030, de 60% até 2035, de 70% até 2040 e zerando as emissões até 2050. Conseguiremos isso? Infelizmente já não será possível. Conforme entrevista do professor Carlos Nobre, um dos mais destacados climatologistas brasileiros, disponível no site da Academia Brasileira de Ciências, a temperatura de 1,5°C foi atingida ainda em 2023.

E se a temperatura continuar aumentando, o que será de nós? Se os aumentos forem muito elevados podemos chegar até a extinção da espécie humana. Mas certamente a sociedade humana, tal qual a conhecemos, não conseguirá ser mantida e essa desagregação social, como uma foto do que já acontece hoje em dia, afetará mais as populações mais pobres e os países periféricos.

A nossa espécie (Homo sapiens) surgiu há mais ou menos 200 mil anos. As condições climáticas nesta época não eram as mais satisfatórias e os homens e mulheres primitivos viviam de forma nômade, sem o desenvolvimento da agricultura e sem a formação de grandes núcleos populacionais. Há aproximadamente 10 mil anos, a Terra entrou na época geológica conhecida como Holoceno e o clima se tornou mais ameno e mais estável, sem apresentar grandes variações entre as temperaturas mais frias e as mais quentes. Isso permitiu que os homens desenvolvessem a agricultura e passassem a construir povoações maiores, evoluindo até a sociedade atual.

No início dos anos 2000, começou a ser proposto por vários cientistas que a Terra teria entrado em outra época geológica. Esta época, nomeada como Antropoceno, teria as atividades humanas como principal agente de modificação das características ecológicas do nosso planeta. O início do Antropoceno ainda é controverso, com alguns pesquisadores sugerindo que se iniciou na Revolução Industrial, e outros apontando o início em meados do século 20, num período conhecido como Grande Aceleração, quando ocorreram grandes aumentos no consumo de recursos naturais, na concentração da população nas cidades, piora nos parâmetros ambientais, etc. Para confirmar a mudança do Holoceno para o Antropoceno, foram iniciadas diversas pesquisas para identificar as marcas das ações humanas nos registros geológicos da Terra, condição necessária para confirmar a troca de épocas.

Posteriormente, surgiu um conceito novo, proposto pelo professor Jason Moore, geógrafo e historiador. Segundo o pesquisador, não bastava considerar apenas os processos naturais para identificar a influência humana nas alterações ecológicas. Seria fundamental incluir os processos históricos e socioeconômicos. Com essa nova visão, começamos a perceber que o grande responsável pela degradação progressiva nas características ecológicas do planeta é o capital. Identificado o grande culpado, o pesquisador propôs o termo capitaloceno. Propôs também a data de início deste processo no século 16, quando começou a colonização dos continentes asiático, africano e americano pelas nações europeias. A invasão e a colonização destes continentes permitiram que as nações europeias tivessem acesso à chamada Natureza Barata, garantindo a apropriação de recursos naturais que serviram de arcabouço para a formação do capital. Este, com sua lógica de expansão constante da produção, é que, de fato, vem criando as condições para o aquecimento global, além de outros problemas que afetam a Terra.

Mudar o presente e o futuro

Mas será que as soluções apresentadas e discutidas nas muitas Conferências da ONU sobre Mudanças Climáticas (COPs), realizadas em diversos países, abordam, de fato, que a responsabilidade dos problemas ambientais da atualidade cabe ao capital? Evidente que não. É muito mais fácil responsabilizar as pessoas em geral, que deveriam consumir menos, reciclar o lixo e adotar outras providências para não destruir o meio ambiente. Não que isto não seja importante em um nível local, mas é completamente inútil na escala planetária. É mais fácil para os países participantes das COPs discutir soluções que, na verdade, não conseguirão solucionar nada com a rapidez que precisamos, como créditos de carbono e tecnologias de retirada dos gases de efeito estufa da atmosfera. É inocente acreditar que os governos adotarão uma agenda ambiental realmente eficiente, pois, caso comecem a fazer isso, terão que enfrentar a oposição ferrenha das grandes empresas e de seus representantes políticos.

Devemos compreender que cabe a nós, classe trabalhadora, debater a questão ambiental, incluindo-a seriamente na nossa luta. Devemos acelerar o processo de organização da nossa classe com vistas à superação do capitalismo e à adoção de um socialismo que supere o capital.

Ressalto a urgência na luta porque vários pesquisadores afirmam que estamos vivendo a década decisiva, que se encerrará em 2030. O que fizermos até lá pode representar a forma como viverão ou mesmo a sobrevivência de nossos futuros descendentes. Uma coisa é certa: em uma situação de recursos escassos, sempre quem sai perdendo é a classe trabalhadora, especialmente os mais pobres e vulneráveis. O tempo se esgota e é preciso aproveitá-lo para tentar mudar nosso futuro.

*Gildo Bastos, oceanógrafo e analista ambiental do Ibama

Matéria publicada na edição nº 292 do Jornal A Verdade.

153 anos da Comuna de Paris e do assalto aos céus pela classe trabalhadora

Hoje se completam 153 anos da primeira experiência revolucionária dos trabalhadores no poder: a Comuna de Paris. Foram 72 dias de heroísmo, de coragem, de abnegação, de organização e de trabalho. A classe operária havia provado ao mundo que uma outra sociedade é possível. Conheça um pouco desta história.

Carlos Alberto Coutinho | São Paulo


LUTAS DO POVO – Em fevereiro de 1848, a classe operária parisiense coloca um ponto final na Monarquia de Julho (domínio da burguesia financeira) e dá vida à Segunda República francesa, sob a direção dos burgueses republicanos, que, em junho daquele mesmo ano, traem e promovem o massacre dos mesmos operários que haviam participado da Revolução.

O objetivo dos burgueses com a Revolução de Fevereiro de 1848 era acabar com o domínio exclusivo da aristocracia financeira, que o exercia na França desde 1830. Eles queriam que as demais facções da burguesia (industrial, comercial e latifundiária) tivessem seu lugar no poder político. Os trabalhadores que haviam feito a Revolução de Fevereiro com suas próprias mãos ficaram a ver navios e todas as suas principais vitórias foram por água abaixo.

“Não restou alternativa aos trabalhadores: ou morriam de fome ou partiam para a briga. Eles responderam, no dia 22 de junho, com a gigantesca insurreição em que foi travada a primeira grande batalha entre as duas classes [burguesia e proletariado] que dividem a sociedade moderna” (Karl Marx em As lutas de classes na França – 1848 a 1850).

Os burgueses venceram aquela batalha. A derrota colocou a classe operária da França na defensiva, o que permitiu a constituição da República burguesa. Com a derrota dos revolucionários em junho, a burguesia consolidou seu domínio pleno, o que não trouxe nenhuma melhoria material às classes oprimidas, em especial à maior classe da França naquele período, os camponeses.

Em dezembro de 1848, Luís Bonaparte foi eleito presidente da República pelo voto de protesto dos camponeses. Defendendo a ordem, a religião, a família e reivindicando-se sobrinho e herdeiro de Napoleão Bonaparte – primeiro imperador da França (1804 a 1815) –, Luís Bonaparte conciliou com a burguesia e reprimiu violentamente a massa do povo, ao mesmo tempo em que preparava seu golpe de Estado, que veio a se confirmar em 02 de dezembro de 1851, com aval de todos os burgueses, como “um golpe preventivo para impedir um novo ascenso do movimento revolucionário”.

A queda do Império e o novo ímpeto revolucionário

O Segundo Império francês deu à burguesia a “tranquilidade” que tanto exigia para que seus negócios prosperassem. Com a repressão brutal dos camponeses, dos operários e de povos de outras nações do mundo, a economia francesa adquiriu proporções inimagináveis.
Em 17 de julho de 1870, o Império Francês declarou guerra ao Reino da Prússia. A França é derrotada, Luís Bonaparte é enjaulado por Otto von Bismarck e os operários da capital declaram a Terceira República.

Os burgueses e seus representantes públicos, vendo o perigo de uma nova Revolução no horizonte, assinam acordos humilhantes de rendição com a Prússia. O proletariado parisiense não os aceitou e se prontificou a defender a capital. Os burgueses, que haviam clamado à França que a guerra era uma questão nacional, demonstraram que, na verdade, mais importante do que qualquer vitória militar sobre a Prússia, era garantir a vitória militar sobre a classe operária francesa.

“No mesmo passo em que o progresso da moderna indústria desenvolvia, ampliava e intensificava o antagonismo de classe entre o capital e o trabalho, o poder do Estado foi assumindo cada vez mais o caráter de poder nacional do capital sobre o trabalho, de uma força pública organizada para a escravização social, de uma máquina do despotismo de classe” (Karl Marx em A guerra civil na França).

As medidas da Comuna

É nesse cenário, que a classe operária novamente se levanta. Desta vez mais organizada ao ponto de tomar o poder na capital francesa, proclamando a Comuna de Paris, em 18 de março de 1871. A Comuna de Paris se inicia com as mulheres operárias acompanhadas de seus filhos. Elas tomam a colina Montmartre para impedir que os canhões da Guarda Nacional parisiense fossem capturados pelo Exército da França. Dava-se início à primeira experiência de governo autônomo da classe trabalhadora e dos oprimidos no mundo.

A massa do povo de Paris, tendo a classe operária em sua vanguarda, suportou a guerra, a fome e a traição, até que resolvem tomar o próprio destino nas mãos. “Logo nos primeiros dias, ficou claro que a máquina administrativa sabotava as ações do Governo Revolucionário e que era preciso organizar um novo tipo de Estado que garantisse o poder popular” (A Verdade, nº 52).

O Exército e a Polícia foram abolidos, o carreirismo político destruído, os altos salários extintos, a Igreja não influenciava mais a educação, a contradição entre os poderes executivo, legislativo e judiciário foi superada. Todos os cargos públicos eram eleitos por voto direto e os eleitos tinham cargos revogáveis a qualquer momento. Ao invés de representantes charlatões da burguesia, os representantes da Comuna eram os próprios trabalhadores. Ela reorganizou as fábricas que os burgueses haviam emperrado para aumentar a crise econômica, organizou as cooperativas livres dos patrões, gerenciadas unicamente pelos operários.

A Comuna abriu as portas dos palácios para todos aqueles que viviam nas ruas. Acabou com o regime de prostituição pública que era mantido em Paris para os homens burgueses e para a polícia e concedeu indenização a todas as mães e viúvas por conta da guerra. Abriu as portas das escolas e universidades, entregou gratuitamente todos os materiais pedagógicos aos professores e proibiu sua venda, acabou com os alugueis escorchantes que pesavam sobre os ombros dos pequenos comércios e extinguiu impostos abusivos. A Comuna de Paris foi o governo autônomo de toda a classe trabalhadora.

“Eis o verdadeiro segredo da Comuna: era essencialmente um governo da classe operária, o produto da luta da classe produtora contra a classe apropriadora, a forma política enfim descoberta para se levar a efeito a emancipação econômica do trabalho” (Karl Marx em A guerra civil na França).

A Revolução está morta? Viva a Revolução!

Os burgueses voltaram sua fúria contra os trabalhadores que ousaram tomar para si aquilo que lhes era de direito. Para desmoralizar e destruir a Comuna, de tudo fizeram: desde a interceptação de cartas que iam e vinham de Paris para o resto da França, até a execução sumária de todos os prisioneiros políticos. A imprensa burguesa contou todas as mentiras possíveis para evitar que o exemplo arrastasse toda a França para a Revolução e, quando os trabalhadores de outras regiões ousaram se levantar, foram massacrados sem piedade pelo Exército burguês.

Foram 72 dias de heroísmo, de coragem, de abnegação, de organização e de trabalho. A classe operária havia provado ao mundo que uma outra sociedade é possível. Uma sociedade livre de exploração e opressão, onde o livre desenvolvimento de cada um é a condição do livre desenvolvimento de todos.

Se 153 anos atrás, os trabalhadores e as trabalhadoras demonstraram que o socialismo é possível, hoje, o mundo nos mostra que o socialismo é – não apenas – possível, mas absolutamente necessário.

VIVA OS 153 ANOS DA COMUNA DE PARIS!
PELO PODER POPULAR E PELO SOCIALISMO!

FEPAL: “A humanidade precisa parar ‘israel’ como parou o nazismo: pelas armas”

No último domingo (26/5), o genocídio do povo palestino perpetrado por Israel alcançou, mais uma vez, um novo patamar de crueldade. Um ataque aéreo sionista atingiu intencionalmente um campo de deslocados na cidade de Rafah, ao sul da Faixa de Gaza.

As imagens disponíveis nas redes digitais são indescritíveis: milhares de tendas destruídas, cadáveres de crianças queimados pelas chamas, dezenas de pessoas – que já haviam perdido tudo – mortas. A agressão sionista precisa ser imediatamente parada.

Reproduzimos a seguir a nota da Federação Árabe-Palestina do Brasil (FEPAL), conclamando os povos do mundo a darem um fim ao genocídio da mesma forma que fizeram com o nazismo – pela força material das armas. 


A humanidade precisa parar “israel” como parou o nazismo: pelas armas

Os horrores testemunhados pela humanidade hoje, em Rafah, extremidade sul de Gaza, um sexto de seu minúsculo território, onde se acumulam mais de 2 milhões de palestinos em tendas, devido a mais ataques indiscriminados de “israel”, com dezenas de carbonizados, quase todos crianças e mulheres, são desafio à raça humana maior que foi o nazismo. Se é assim, “israel” e o sionismo, ideologia supremacista idêntica ao nazismo e demais supremacismos coloniais, devem ser parados pela força das armas, como foi parada a Alemanha nazista.

Já são, considerando desaparecidos sob os escombros, mais de 46 mil civis palestinos exterminados em 233 dias, mais de 2% da população de Gaza. Seriam mais de 4 milhões no Brasil e mais de 15 milhões na Europa, no espaço da Segunda Guerra Mundial. As crianças assassinadas já passam de 20 mil, 45% do total de assassinatos. São mais de 9 mil por milhão, superando as 2.800 por milhão mortas no período nazista, em 6 anos. As mulheres assassinadas já passam de 11 mil, 25% do total de exterminados, com pelo mil mortas grávidas. São as maiores matanças de crianças e mulheres da história!

A destruição de Gaza já passa dos 80%, superando a das cidades mais arrasadas na segunda Guerra Mundial. Detalhe: em Gaza em 233 dias, contra 6 anos no período nazista.

Todos os lugares definidos por “israel” como seguros foram atacados e milhares dos que neles estavam abrigados perderam suas vidas. “israel” perseguiu os palestinos em todos os seus abrigos para assassiná-los em massa.

Os assassinatos de médicos, jornalistas, funcionários da ONU, da defesa civil e de ONGs humanitárias não têm paralelo na história das guerras e dos genocídios.

Os feridos já se aproximam de 90 mil, quase todos graves e mutilados, padecendo para morrer porque todos os hospitais foram destruídos e não há medicamentos, água ou comida. A fome já foi tornada arma de guerra e mata centenas, especialmente crianças e mulheres, além dos doentes e anciãos.

A ordem para parar o genocídio emitida pela Corte Internacional de Justiça em 26 de janeiro ainda não foi obedecida, tal qual a de cessar-fogo do Conselho de Segurança da ONU. Desde estas ordens, mais de 20 mil palestinos foram exterminados.

O mundo declarou guerra à Alemanha nazista ainda em 1939, quando a máquina nazista fizera muito menos do que “israel” promove desde 7 de outubro na Palestina. O mundo não pode seguir assistindo calado ao maior genocídio da história.

Passou da hora da humanidade frear a máquina genocida de “israel”, que é pior que a nazista também por ser nuclear, isto é, ameaçar o fim da existência humana.

“israel” e seu genocídio só serão parados pela humanidade pegando em armas. Foi assim que o nazismo foi parado; será assim com o regime supremacista e genocida de “israel”.

Clamamos ao Brasil e ao mundo que parem o extermínio do povo palestino. Que seja construída uma força internacional de paz, com força bélica suficiente para colocar freio à máquina assassina de “israel”. Para impor imediato cessar-fogo. Para encarcerar todos os implicados no genocídio palestino.

Precisa ser agora, antes que seja tarde demais, com “israel” tendo alcançado seu único objetivo, perseguido pelo sionismo desde 1897, quando do 1° Congresso Sionista, e desde dezembro de 1947, quando fascistas sionistas armados iniciam a limpeza étnica da Palestina, a maior da história.

Basta! A humanidade precisa parar “israel” como parou o nazismo: pelas armas

Palestina Livre do genocídio e do apartheid a partir do Brasil, 26 de maio de 2024, 77° ano da Nakba.

Nota disponível aqui.

Francisco Vieira de Araújo: “Reciclar é cuidar do futuro”

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O jornal A Verdade entrevistou Francisco Vieira de Araújo, mais conhecido como Júnior da Reciclagem. Há seis anos ele montou uma cooperativa de reciclagem no Cabo de Santo Agostinho, Região Metropolitana do Recife, e vem desenvolvendo um trabalho junto a sua comunidade de conscientização e cuidado com o meio ambiente. 

Clóvis Maia | Redação Pernambuco


A Verdade – Júnior, como foi que começou esse teu trabalho com a reciclagem e como você despertou o interesse e consciência sobre a questão ambiental e o trabalho com a reciclagem?

Júnior – Eu sou marceneiro de formação e sempre gostei de aproveitar o resto das madeiras, fazendo tudo o que sobrava na marcenaria, reaproveitando as madeiras que sobravam, criando novas peças. E aí eu lembro que minha mãe tinha fundado uma cooperativa, lá em Dois Unidos [bairro popular do Recife], junto com algumas pessoas.  Pelo exemplo dela eu vi que poderia trabalhar também com a reciclagem, trabalhar com aquilo que é taxado de lixo, mas que pode ter muito proveito se a gente souber reutilizar. Eu via o trabalho dela e foi por meio do seu exemplo que eu me inspirei em começar. 

Antes de trabalhar com ela eu não fazia ideia da importância daquele trabalho. Eu não gostava, não entendia mesmo dessa urgência de cuidar do meio ambiente, zelar pela natureza, eu fui vendo o trabalho dela e quando vi me apaixonei.  Eu joguei o serviço pra lá, comprei uma bicicleta, e fui “puxar” papelão. No início tinha até amigo que não entendia, me chamava de doido, diziam que eu não estava bem do juízo por trocar a profissão de marceneiro pra ficar no meio da rua, tipo, nove da noite pegando papelão.

Mas eu costumo dizer que fui mordido pelo bichinho da reciclagem. Tinha jeito mais não. 

Foto: JAV/PE

Se você fosse falar para uma pessoa leiga no assunto, um adulto que nunca teve contato com o tema da reciclagem ou uma criança, o que seria mais interessante  nessa relação meio ambiente, reciclagem e sociedade para compartilhar? 

Eu acho que é a esperança. A forma mesmo como os materiais podem ser transformados. Muitas vezes as pessoas não dão importância a isso. Eu costumo dizer que a reciclagem é o mundo das coisas.  Porque, assim, as ferramentas que eu tenho hoje aqui, por exemplo, vieram tudo da reciclagem. As ferramentas que as pessoas jogam no lixo. E muita coisa que eu tiro até de dentro de canal passando no meio da rua, coisa boa que dá para se reaproveitar. A gente tira do lixo, reaproveita, e, ao mesmo tempo, limpa o lugar. As pessoas descartam muitas coisas por falta de consciência e informação. 

Você encontra muita coisa que teria serventia descartado? 

Eu tô fazendo aquela coleta ali para dentro do canal e tiro, por exemplo, alguma coisa que dá pra limpar e usar no mesmo dia. Um fogão bonzinho, por exemplo. A gente pega, ajeita e já dá pra uma pessoa que tá precisando. Até roupa boa a gente encontra. Roupa de marca. A gente faz todo esse apanhado de coleta de roupa, a triagem e depois doa essa roupa para o pessoal dos abrigos, por exemplo. 

Como se dá essa relação meio ambiente, comunidade e o trabalho que vocês vem desenvolvendo aqui na cooperativa? 

A relação meio ambiente e reciclagem está totalmente ligada. Eu acho que não tem nem como separar essas duas coisas, sabe? Aqui a gente começou a trabalhar com a reciclagem e logo apareceu essa discussão sobre o meio ambiente. As pessoas começaram a se interessar. Por sermos de uma comunidade que convive perto do mangue, as demandas relacionadas a proteção ambiental, o convívio em harmonia com a natureza acaba aparecendo quase que de forma natural.

Eu mesmo fui criado aqui, pegando caranguejo, quando eu me dei conta de lá para cá aquela área ali já tinha sido ocupada, as pessoas já estavam morando por aqui, até porque as pessoas não tem onde morar, né? A culpa não é do povo por não ter acesso a uma moradia. Então eu pensei: já que o povo tá morando aqui, vamos trabalhar pra que todo mundo aprenda a cuidar da natureza e não destrua esse lugar. Tem dado certo. 

Quais foram as primeiras ações que vocês fizeram?

Eu tinha essa preocupação. Das pessoas que passaram a morar aqui fizessem como os outros fazem em outros cantos. Aí juntamos o povo para dizer que não pode se acabar com as coisas aqui, que tem que saber tratar do Mangue, dos animais. A gente começou a fazer oficina para se trabalhar a questão da terra, o cuidado para quando fosse se construir alguma obra, enfrentamos a resistência e o olhar preconceituoso da vizinhança, tivemos que dar um enfrentamento a questão da violência e do convívio entra às pessoas. Aqui antigamente era um ponto de desova de corpos. Hoje a gente cuida disso aqui tudo. Planta muda de ipê, jenipapo, a gente fez todo um trabalho de reflorestamento onde antes se jogava lixo. Isso tudo sem ajuda do poder público. Só com a nossa mobilização. Os moradores se ajudando e fazendo junto. 

E como era essa dificuldade entre vocês, ocupando aqui esse espaço e os antigos moradores? 

A princípio pensavam que a gente vinha para invadir. E que algumas pessoas que vinham morar aqui eram do mal. Mas aí vai à gente e começa a trabalhar, por exemplo, em como se deve tratar o mangue no tempo de caranguejo, por exemplo, ou no período de defesa do caranguejo, onde a gente pegava, ia na guarda ambiental, trazia eles pra cá ou fazia uns panfletos para explicar isso para os moradores, que vivem disso, mas que muitas vezes não entendiam da verdadeira necessidade de se conviver nesse equilíbrio. Aí isso ajudou a conscientizar, unir. Diminuir os preconceitos. E também fortalecer pra ir atrás das outras pautas e demandas da gente aqui. 

Depois de organizar essa questão da cooperativa e melhorar o convívio entre moradores e o meio ambiente, quais as pautas hoje de vocês? O que a comunidade mais precisa hoje? Qual a pauta de reivindicações de vocês? 

A maior urgência aqui hoje é a drenagem aqui nas ruas. E também, pode parecer besteira, mas até agora não foi estabelecida. Ou seja, a gente não tem nem endereço organizado direitinho. É por isso que estamos organizando, contando com o apoio da Unidade Popular, pra gente ter cada vez mais a nossa independência. 

A gente, a comunidade mesmo, conseguiu se reunir, compramos os  canos, puxamos a água lá do cano mestre da rua para aqui, para a comunidade e agora a gente tá cobrando que a prefeitura venha terminar o serviço. Boa parte a gente mesmo já fez. Mas ficam jogando: “é coisa da Compesa, é coisa da prefeitura”. Mas a prefeitura abriu mão daqui. A prefeitura não quer nem organizar nosso CEP. Nem isso a gente poder que eles não querem deixar. Toda vez que a gente vai na prefeitura somos ignorados. Por isso que o próximo passo nosso é criar aqui uma associação de moradores ou um conselho de moradores pra gente se representar. Isso deveria ser coisa da prefeitura: drenagem da rua, pavimentação. Mas o prefeito só nos ignora. Ninguém quer ajudar os moradores da Rua da Linha. Por isso a gente mesmo decidiu se ajudar. 

Custava nada ajudar. Só na primeira parte da rua tem 58 casas. São 58 famílias só nessa primeira rua. Aí tem o segundo percurso lá que fica por trás da gente e tem mais cerca de 15 famílias. 15 lares aqui por esse pedaço que é o que tem mais necessidade. E como a gente sabe disso? Porque fomos nós mesmo que fizemos esse levantamento, esses dados. E como foi que eu fiz isso? Pelo trabalho com a reciclagem. Todas essas famílias ajudam, contribuem e participam das nossas ações com a coleta seletiva, separaram seus lixos de forma consciente e tudo. 

Com essa questão do meio ambiente a gente acabou ajudando a criar um bairro inteiro que se preocupa com o seu lar. Aqui na Rua da Linha, temos uma comunidade que interage e trabalha junto esse tema. 

Como é o trabalho aqui de vocês com os materiais? Explica um pouco pra gente. 

Aqui a gente trabalha com todos os tipos de materiais recicláveis. A gente coleta vidro, embalagem tetra pack, papel, papelão. Traz tudo pra cá, faz a triagem e dar um destino. Hoje a gente trabalha com tonelada de material reciclado, dois mil, três mil quilos de material reciclado. Leva pra compostagem lá no lixão, lá vira gás metano e é aí que a gente começa a ver o impacto que a gente tem. Imagina você saber que conseguiu tirar tanta coisa que iria pro lixo e atrapalhar a vida da gente num futuro, né? 

Qual os mecanismos que vocês usam para fazer funcionar essa rede e reciclagem? 

A gente organizou uma rede de apoiadores no bairro. Primeiro a gente começou a distribuir esses sacos de ração, pra armazenarem o material reciclado. Esses sacos chegam aqui, a gente retira o material  e leva ele para ser higienizado, assim ele volta para a casa da pessoa. Aí criamos um grupo no WhatsApp e a cada quinzena, quando voltamos para recolher nas casas, fazemos um sorteio com os participantes, depois nós criamos uma espécie de pontuação para cada tipo de material a ser reciclado, e isso ajudou a estimular também as pessoas. Funciona assim: cada morador que ajuda a cooperativa vai ganhando pontos, de acordo com a quantidade e material para reciclagem, e depois, pelo WhatsApp mesmo. A pessoa troca seus pontos por algum item que a gente disponibiliza: faqueiro, jogo de pratos, brinquedos… A gente mantém o contato com os moradores e eles nos ajudam. 

Qual a mensagem que você deixa para os leitores do nosso jornal sobre a questão da reciclagem?

A mensagem que eu deixo para todos os leitores do jornal é: reciclem. Tudo que você puder. Reciclar é cada vez mais uma necessidade. Não tem pra onde a gente ir. A gente tá vendo aí essas questões do clima, temos pesquisas mostrando que os próximos anos a situação ficará ainda pior, nós já temos verdadeiras ilhas de lixo nos oceanos, mas esse lixo volta. Volta e ataca a nossa costa, a nossa fauna, nossa flora. O que é que vai sobrar pra gente se a gente não cuidar do nosso mundo? Por isso que eu repito essa frase e digo isso pra todo mundo sempre: reciclem. Reciclar é cuidar do futuro.

Foto: JAV/PE

Estudantes e servidores grevistas protestam por recomposição orçamentária

Desde o início do mês de março, os trabalhadores da educação federal encontram-se em greve. Neste sábado (25), representantes de todas as categorias e de diversos campi da Universidade e do Instituto Federal de São Paulo marcaram presença em evento para reivindicar diretamente ao presidente a recomposição orçamentária da educação federal.

Ester Vitória* | Guarulhos (SP)


Neste sábado (25), o presidente Lula esteve presente em evento que inaugurou a entrega de uma obra na rodovia Dutra, em Guarulhos, próximo ao campus de Guarulhos da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Representantes de todas as categorias e de diversos campi da Universidade e do Instituto Federal de São Paulo marcaram presença para reivindicar diretamente ao presidente a recomposição orçamentária da educação federal. Outro objetivo do ato era entregar ao presidente as cartas com as reivindicações específicas de cada categoria.

A palavra de ordem “Do arcabouço eu abro mão, quero dinheiro pra saúde e educação!” entoou na voz de estudantes, servidores e professores ao longo do evento, em denúncia ao Arcabouço Fiscal (ou “novo Teto de Gastos”), que concentra o orçamento da União no pagamento da dívida pública (isto é, o pagamento de juros a banqueiros e grandes empresários), enquanto bloqueia a verba destinada à educação, saúde e outras demandas sociais.

Desde o início do mês de março, os trabalhadores da educação federal encontram-se em greve por período indeterminado. A greve na educação conta com a adesão de estudantes, que junto aos professores e TAEs (técnicos-administrativos em educação), já somaram cerca de 80 institutos e 50 universidades em greve.

O desmonte dos Institutos Federais de Educação Ciência e Tecnologia

Entrevistamos Cristiane Toledo Maria, professora do IFSP Itaquaquecetuba e membro do Comando de Greve local, que estava presente no ato. Perguntada sobre a atual situação dos IFs, afirmou: “Já tem uns dez anos que o orçamento está sofrendo vários cortes, então o orçamento de dez anos atrás era maior que orçamento de hoje, sendo que os campi cresceram, tem mais alunos. Então a gente está sofrendo um estrangulamento financeiro.”

A maioria dos campi do IFSP não conta com restaurante estudantil, levando os estudantes a assistirem às aulas com a barriga roncando; há defasagem de programas de auxílio e permanência, além dos problemas estruturais, como péssimas condições dos prédios e falta de espaços de convivência, salas de estudo, etc. A defasagem salarial leva os servidores a pedirem exoneração dos cargos e, ao mesmo tempo, não há abertura de concursos, levando a um quadro de funcionários reduzido; os baixos salários também dificultam a contratação de professores. 

Ainda assim, diante das manifestações que ocorriam no evento, o presidente Lula relembrou a decisão de criar 100 novos Institutos Federais, ao que Cristiane afirma: “É uma contradição ele anunciar a abertura de 100 novos campi. Não que a gente seja contra, a gente acha que tem que abrir mais, mas se não tem dinheiro nem pra fazer o mínimo para manter a estrutura funcionando […] como que vai ter dinheiro para abrir esses 100 institutos?”

A precarização na Universidade Federal de São Paulo 

A reitora da Unifesp, Raiane Assumpção, afirmou recentemente que a universidade só tem recursos para funcionar até setembro deste ano. Na prática, há muito tempo a Unifesp funciona de maneira extremamente precária.

A situação de desmonte é evidente em todos os campi: há mais de 15 anos, se aguarda a entrega do campus definitivo da Unifesp Osasco, em Quitaúna; na Baixada Santista, no início deste ano, estudantes chegaram a passar mal de calor dentro do prédio; a Unifesp Zona Leste sequer possui restaurante universitário (RU); e, para chegar na Unifesp Guarulhos, um estudante trabalhador pode chegar a ficar três horas preso no trânsito. 

Além da defasagem salarial dos servidores e professores e da falta de condições de permanência estudantil, constata-se também o avanço da privatização dos setores da universidade. São comuns as denúncias de comida estragada e/ou contendo larvas de inseto nos RUs privatizados, que também já deixaram os trabalhadores terceirizados por meses sem receber.

No ano de 2024, a Unifesp recebeu o menor repasse desde 2014, ao passo que nesses anos houve abertura de novas turmas e novos cursos. A atual verba da Unifesp não contempla o mínimo, porém temos que lutar não só pelo mínimo, mas para que possamos construir coisas novas, para que tenhamos condições de criar inovações científicas e uma nova sociedade.

O descaso do governo federal e a necessidade da luta

Foram, sem dúvidas, os estudantes e trabalhadores da educação que elegeram Lula e derrubaram Bolsonaro, aguardando o cumprimento das promessas de investimento na educação.

O grevista e servidor técnico-administrativo do IFSP, Sidinei Roberto, afirmou: “Uma outra pauta muito importante para a gente é a revogação de uma série de medidas que foram tomadas nos governos anteriores, nos governos do fascismo, e que não foram revogadas […]. Se é um governo que se diz progressista, o mínimo que ele tem que fazer é revogar as medidas que atacam a educação, como o Novo Ensino Médio”

Durante o ato, a presidência se negou a receber e dialogar com os estudantes e trabalhadores que reivindicavam seus direitos. Às pressas, os TAEs conseguiram entregar sua carta reivindicatória e os professores da Unifesp conseguiram marcar uma reunião em Brasília. Os estudantes, categoria mais fragilizada pelo desmonte da educação federal e responsáveis por vanguardear a manifestação, por pouco não ficaram no completo desprezo.

Foi então organizado um pequeno encontro entre o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, e representantes das categorias da educação federal de São Paulo, sendo permitida a participação de apenas um estudante. As cartas reivindicatórias dos professores e estudantes foram entregues ao ministro, que não deu nenhum compromisso de negociar e atender às demandas, mas apenas um discurso repleto de desculpas esfarrapadas, de que eles “entendem a situação, mas lá em Brasília é muito difícil”.

Fica cada vez mais nítido que a única saída para uma educação popular é a luta coletiva e organizada e que nada adianta esperar favores de políticos que não nos servem. A esse respeito, o estudante de Engenharia Mecânica, Micael Moreira, faz um chamado:

“Eu queria chamar todos os estudantes a participarem do movimento estudantil […]. A gente não pode ficar achando que vai ter bandejão, que vai ter PAP [Programa de Auxílio Permanência], auxílio moradia… se nós não integrarmos o movimento estudantil”.

Não vamos cessar as mobilizações. Só a luta muda a vida e só o povo salva o povo!

*Estudante e membro do Comando de Greve da Unifesp Guarulhos

Estudantes da UFRJ entram em greve contra cortes na educação

Na última quinta-feira (23), mais de 500 estudantes participaram da assembleia geral do DCE da UFRJ. A assembleia pautou a necessidade da luta pela recomposição orçamentária e decidiu pela deflagração de greve geral na UFRJ a partir do próximo dia 11.

Igor Marques* | Redação RJ


EDUCAÇÃO – Este ano já está marcado por uma das maiores greves na educação pública em todos os tempos. Em um contexto de constante desmonte da educação superior no país, diferentes categorias da educação entraram em greve por melhores condições de trabalho e estudo, por recomposição salarial e por mais orçamento para as universidades.

Desde março, os trabalhadores técnico-administrativos em educação (TAEs) estão em greve nacionalmente pela reestruturação da carreira e pela recomposição do orçamento das universidades. Além da UFRJ, TAEs de outras instituições de ensino superior do estado do Rio de Janeiro, como a UFF e a UNIRIO, também estão em greve. Nessas universidades, o movimento grevista conta também com apoio dos docentes das universidades.

No momento, já são mais de 60 universidades e 500 campi de institutos federais em greve por todo o país. As greves surgem em resposta a uma política de anos de falta de investimentos na educação pública, com um sucessivo sucateamento da estrutura física da universidade e falta de políticas de permanência estudantil. 

Neste ano, foram cortados mais de 300 milhões de reais das universidades pelo Ministério da Educação. A UFRJ, historicamente, é uma das universidades mais afetadas por essa realidade. Isso porque a universidade, além de todo o seu funcionamento básico, ainda possui diversos campus localizados em prédios históricos – como o IFCS e o Museu Nacional – e diversas obrigações orçamentárias específicas. 

Frente a toda essa conjuntura, os estudantes também se mobilizam por seus direitos. A greve na UFRJ se tornou cada dia mais inevitável. Durante semanas, diversos cursos mobilizaram os estudantes em assembleias e mobilizações locais até que, na última quinta-feira (23) ocorreu a Assembleia Geral do DCE Mário Prata da UFRJ para a deflagração da greve geral na universidade.

UFRJ sofre com a falta de estrutura

Durante os últimos dez anos, em especial nos governos de Temer e Bolsonaro, a política de desmonte da educação foi intensificada. Essa realidade, fruto de um projeto neoliberal de educação que não prioriza as universidades públicas do país e que impõe um teto de gastos para a educação impactou profundamente na UFRJ e em sua situação orçamentária

O orçamento da universidade para o ano de 2024, sem considerar a inflação, é inferior em cerca de 400 milhões em comparação com o ano de 2012. Além disso, a universidade sequer possui orçamento para cumprir com todas as suas despesas para o ano, sendo necessário um suplemento de, ao menos, 176 milhões de reais.

Considerando a estrutura física da universidade após tantos anos de descaso, seriam necessários quase 800 milhões de reais para todas as reformas urgentes na universidade. Essa falta de estrutura traz riscos diretos aos estudantes e trabalhadores da universidade, com prédios com risco de desabamento e com fiação elétrica completamente comprometida. O trágico caso do incêndio do Museu Nacional é um dos claros exemplos do que a falta de investimentos na estrutura da universidade pode causar.

Recentemente, já em meio ao período letivo, parte do prédio da Escola de Educação Física e Dança (EEFD) desabou durante uma madrugada, meses após evento semelhante já ter ocorrido. O prédio do IFCS-IH, que conta com os cursos de História, Ciências Sociais e Filosofia, está há cerca de duas semanas sem aulas por conta de uma contaminação da água do campus, que tornou a água potável imprópria para consumo; e, recentemente, passou por um princípio de incêndio fruto da falta de manutenção de equipamentos.

Essa realidade é comum em diversos locais da universidade. Diversos Centros Acadêmicos em toda a UFRJ, com apoio do DCE, organizaram assembleias para tratar da luta em defesa da educação e da greve. Estudantes de cursos como História, Ciências Sociais, Filosofia, Serviço Social, Educação Física e Dança já decretaram greve antes mesmo da assembleia geral do DCE.

Assembleia geral une estudantes em defesa da educação

Mais de 500 estudantes participaram da assembleia realizada na última quinta-feira (23), no prédio da EBA-FAU. A assembleia foi marcada pela necessidade de uma luta unificada em defesa da educação por todos os segmentos da universidade e a importância de construir mobilizações cada vez maiores dentro e fora da universidade.

Assembleia do DCE lota o auditório da EBA/FAU. Foto: Daniel Paiva (JAV/RJ).

Durante a assembleia, os estudantes decidiram pela deflagração da greve no dia 11 de junho, onde será realizada uma nova assembleia geral. Até lá, será realizado um grande calendário de lutas para mobilizar estudantes de todos os cursos e campi e garantir as demandas fundamentais para a universidade e para os estudantes, como o reajuste salarial dos trabalhadores da universidade, o PNAES como lei, o reajuste das bolsas pautado pelo salário mínimo, recomposição orçamentária e o fim da política de austeridade fiscal.

Alexandre Borges, coordenador-geral do DCE da UFRJ, declarou que “Nesse momento precisamos juntar os estudantes, professores, técnicos e terceirizados na educação para lutar pelo que é nosso: orçamento para universidade pública e dignidade para estudar”.

*Estudante de História na UFRJ

MG: Nasce a retomada do Kewá Matamba em Belo Horizonte

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Na madrugada de sexta-feira (24), em um ato histórico de resistência e afirmação cultural, cerca de 200 pessoas ocuparam o Território Kewá Matamba. A ação marca a retomada do mesmo espaço de onde quilombolas foram expulsos violentamente a mando da Prefeitura de Belo Horizonte em 2012, na gestão Marcio Lacerda, em uma ação carregada de preconceito racial e intolerância religiosa

Redação MG


LUTA POPULAR – Mãe Efigênia, conhecida como Mametu Muiandê, recebeu de Pai Benedito a missão de criar um espaço de acolhimento, onde quem chegasse pudesse ter água, comida e cama para dormir. Na década de 1970 fundou na cidade de Belo Horizonte o Kilombo Manzo Ngunzo Kaiango, que com o passar dos anos se tornou esse espaço de acolhida ao povo mineiro. Segundo Mãe Efigênia “Manzo quer dizer casa. Ngunzo quer dizer força, axé. E Kaiango é o nome de uma qualidade de Matamba, Iansã em bantu, porque somos uma casa de cultura bantu. Somos a casa da força de Iansã.”

No ano de 2012, o então prefeito Marcio Lacerda ordenou o despejo violento do quilombo, que já estava consolidado no local e havia construído um vínculo com a comunidade no local, que tinha no espaço um local de acolhimento, como pedido por Pai Benedito. Segundo Mametu Muiandê: “O dia do despejo foi muito triste, eles disseram pra gente que se a gente não saísse íamos ficar todos presos lá. Na época a gente não tinha a força que tem hoje e foi uma correria, muita gente saindo com seus filhos e sem ter pra onde ir. O que mais me doeu foi que com isso fecharam a nossa escola, onde a gente atendia 112 crianças e adolescentes lá da comunidade, na época a gente mesmo é quem fazia tudo, muitas vezes servia pão dormido e suco mas era um espaço onde a gente trabalhava com os jovens de lá.”

Com a expulsão do território as pessoas que moravam no local tiveram que ir para o abrigo Granja de Freitas e Mametu Muiandê se viu sem um espaço para dar continuidade às suas tradições e seus cultos. De modo provisório, levou os pertences para a cidade Santa Luzia, onde alguns meses depois o candomblé foi reconstruído. 12 anos após o despejo, o Kilombo Manzo, com o apoio do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) e da Teia dos Povos, retoma um espaço que é seu por direito.

Para Makota Cassia Kidoialê, liderança do quilombo “A retomada Kewá Matamba significa para nós uma retomada ancestral. É uma retomada da nossa identidade, do nosso pertencimento ao território, da nossa territorialidade. Desde a nossa infância a gente foi criado sem cerca, sem muro, sem asfalto, como se fosse tudo um território só. Aí veio a urbanização e ela acabou numa forma organizada nos desorganizando, dificultando assim o nosso acesso ao que nos sustenta. Aqui nessa terra a gente busca remédio, aqui a gente dialoga com a nossa ancestralidade. Nós somos de tradição de matriz africana e para a gente não existe manter as nossas tradições no distanciamento da água, das folhas, dos animais, da nossa cultura e da nossa tradição. A nossa existência é assim, nós somos quilombolas e quilombo precisa de terra para poder se sentir vivo, se sentir firme e se sentir identificado. O que me identifica é a natureza.”

No capitalismo, os interesses da burguesia estão à frente de tudo. Mesmo com leis que deveriam garantir a preservação da cultura e tradições quilombolas no país 98% dos quilombos estão ameaçados, tudo isso para atender os interesses econômicos da mineração e do agronegócio.

Para Leonardo Péricles, presidente nacional da Unidade Popular, a retomada é uma luta exemplar do nosso povo. Confira a íntegra de sua fala na ação: “Essa luta tem uma significação presente e ancestral de extrema importância. Primeiro que os quilombos são a base das lutas de resistência no nosso país, desde a invasão portuguesa e o sequestro dos nossos irmãos e irmãs de África para cá. Segundo que os quilombos no momento atual vivem uma ameaça permanente da mineração – e no caso desse aqui é o exemplo concreto – e também do agronegócio. Saiu uma matéria recente em um jornal de grande circulação no país, que 98% dos quilombos estão ameaçados por esses dois setores que tanto degradam e destroem. Terceira questão, pelo exemplo. Os quilombos hoje no país, sofrendo tamanha ameaça, vem começando uma reação muito importante. E essa luta aqui, ela reforça e fortalece ainda mais a reação do movimento quilombola no nosso país. E a última questão é que essa luta vem em um momento extremamente importante, em que vivemos mudanças climáticas profundas, fruto do sistema capitalista. Essa retomada traz o debate da preservação da Serra do Curral, que vem sendo ameaçada pela mineração, especialmente após o apoio do Governador Romeu Zema que permitiu de forma criminosa a mineração no espaço, a serra é uma caixa d’água natural para a região metropolitana de Belo Horizonte. A retomada Kewá Matamba não se resume só aos quilombolas, mas é uma luta de toda a população frente às ameaças que estão dadas principalmente pelo agronegócio e a mineração. Viva a luta dos quilombolas e nós da Unidade Popular e do Movimento de Luta dos Bairros, Vilas e Favelas, estamos de forma ativa e presente nessa luta.”

A retomada Kewá Matamba mostra a todos nós o caminho, afinal, só a luta coletiva é capaz de combater as injustiças desse sistema que tenta o tempo todo nos massacrar e ignora nossas culturas e tradições. A burguesia nos quer cabisbaixos e desacreditados e utilizam do estado para terem seus interesses atendidos, mas mesmo com todo esse aparato, 12 anos após o despejo, o povo kilombola retoma o que é seu.

Quilombolas fazem cozinha coletiva na retomada Kewá Matamba. Foto: Luiza Poeiras
Quilombolas fazem cozinha coletiva na retomada Kewá Matamba. Foto: Luiza Poeiras

Leia na íntegra a carta da Retomada Kewá Matamba:

“Saudações kilombolas!

Com a licença de Pai Benedito, com as bênçãos de nossas mais velhas e mais velhos, em respeito às crianças e a nossa juventude, com a força das águas, matas, terras e ares; aos povos das Gerais:

É com a força dos búfalos, enfrentando e enfeitando a tempestade de ventos, que hoje, 24 de maio de 2024, o Kilombo Manzo Ngunzo Kaiango firma o seu ponto e demarca o Território Kewá Matamba, espaço ancestral e sagrado aos pés da Serra do Curral, na zona leste da cidade de Belo Horizonte, em aliança e com apoio ativo do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas – MLB e dos núcleos e elos da Teia dos Povos.

Reafirmamos aqui, nossa conexão sagrada com esse território, que cuida e nos dá condição de nos mantermos fortes e unidos. Sem a terra, o território, a mata, as águas e as plantas, o quilombo e o terreiro não tem como existir. Buscamos construir nossa autonomia quilombola para além do Estado, continuando nossas tradições sagradas de plantio, educação e conexão com a natureza, protegendo nossa forma de ser e viver. O Kilombu é espaço de resistência religiosa e cultural, referência de patrimônio afro descendente, e local de formação e vivência.

Retomamos esse território para construir nossa Escola das Ngoma, um espaço em que floresça uma pedagogia dos tambores (ngoma), que acolha e fortaleça o envolvimento de nossa juventude com o território e nossas práticas, em uma “educação não para ter, mas para poder ser”.

Continuaremos a missão dada por Pai Benedito, que na década de 70 orientou nossa Mãe Efigênia, matriarca liderança máxima da comunidade, para que construísse um lugar de acolhimento onde quem chegasse pudesse ter água, comida e cama para dormir. Mãe Efigênia, conhecida como Mametu Muiandê, é bisneta de escravizadas que se aquilombaram no Quilombo Engenho Novo, em Ouro Preto, região que é símbolo do vínculo entre a mineração e o processo escravizador dos povos africanos no Brasil. A história de Mãe Efigênia nos mostra a continuidade histórica da resistência quilombola frente à mineração e às opressões sofridas.

Na década de 70, encontrou no bairro Santa Efigênia uma nascente, um bambuzal e uma grande vegetação, riqueza que dialoga e mantém as práticas do Terreiro. Guiada por seu preto velho, ali construiu seu barraco. Dedicou um quartinho para sua Umbanda e assim, deu vida à Senzala de Pai Benedito, espaço onde iria cuidar de muita gente e também do território que habitava.

Firmada nesta terra, Mãe Efigênia criou sete filhos e mais de vinte filhos dos outros, além das várias pessoas que acolheu e cuidou ao passarem pela Senzala. A Serra do Curral, a Mata da Baleia, o córrego do Cardoso e as várias águas que ali corriam, foram a base para nos relacionar diretamente com nossa ancestralidade. É onde nasce toda força que nos alimenta e nutre a seiva de nossa fé. Não podemos fazer nada sem as nossas folhas, sem água não temos vida e nem ancestralidade, temos o compromisso e a missão de proteger toda essa abundância sagrada de nosso território, e vamos continuar fazendo isso em nossa retomada.

Querem forçar o quilombo a ser cidade, e ao longo das décadas, a expansão urbana e a mineração foram tomando o território e os caminhos que sempre fizemos para sustentar nossos modos de vida e nossa espiritualidade. Em 2012, fomos violentamente expulsos de nossas casas pela Defesa Civil e pela Companhia Urbanizadora e de Habitação de BH (URBEL). Essa ação feita pelo Estado, carregada de preconceito racial e intolerância religiosa, marcou uma ruptura e um enfraquecimento dos laços comunitários do Manzo. Transferidos para um abrigo público, fomos impedidos de realizar as práticas religiosas e de dar continuidade aos nossos projetos. O terreiro de Candomblé teve que se mudar para Santa Luzia, junto de Mãe Efigênia, e isso contribuiu mais ainda para um distanciamento da comunidade de nossa religião de matriz africana.

Ao retornar, encontramos nosso terreiro destruído e nosso território desmatado. Eles tiraram de nós o que nos sustenta, o que nos mantém. Mataram as plantas que sabem que são parte da nossa identidade cultural e religiosa, que têm com a nossa gente uma relação ancestral. Se a estratégia imposta é romper o nosso vínculo com a natureza, insistimos em retomar nossas tradições e nossa presença nesse território!

Em nossa missão de cuidar e curar do território que nos envolve, lutamos e vencemos a suspensão das atividades de mineração na Serra do Curral em 2022, que ignorava nossa existência e violava o nosso direito de consulta prévia, livre e informada, além de ameaçar os nossos modos de vida e o território natural que nos sustenta. Em nossa retomada, seremos guardiões dessa grandiosa serra, que protege e nutre toda a cidade.

Em abril de 2023, na Pré-Jornada de Agroecologia de Minas Gerais, realizada no Manzo pela Teia dos Povos, demos o primeiro passo para a retomada de nosso território, reunindo diversos povos, territórios, movimentos e apoiadoras, cultivando uma potente aliança entre povos, territórios, movimentos e apoiadoras. Re-plantamos uma muda de Jatobá, plantas sagradas e outras que nos ajudam a recuperar o solo degradado. Durante esse ano, realizamos diversos mutirões, que firmam nossa presença, a relação espiritual com o território e o compromisso com sua proteção.

A Retomada Kewá Matamba é uma afirmação de que vamos continuar realizando nossos rituais, colhendo nossas ervas, plantando nossas roças de quilombo e construindo nossa educação das Ngoma. Vamos sustentar nossas autonomias e garantir nossos modos de vida no território. Que nossos tambores alcancem e ecoem com os que ousam construir e encantar o mundo novo!

Que nossa Mãe Matamba ilumine todos nós, que vamos caminhando pelos nossos territórios.Que ilumine todos nós, nesta grande caminhada!

Que Ógùn abençoe, Nkosi abençoe, abra os caminhos de luz e prosperidade, e que leve todos até o topo da montanha.

Asé Ngunzo, nosso terreiro é comandado por mulheres negras e estamos aqui para gritar. Ninguém vai derrubar os nossos territórios!”

SP: Ato pede justiça por Geovanna, morta por motorista de carro de luxo

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Prefeitura de São Caetano do Sul tentou proibir a manifestação.  Mesmo assim, movimentos sociais, família e amigos de Geovanna mantiveram o ato para denunciar o constante assassinato da juventude negra

Redação SP


Na manhã do último sábado (18/5), no município de São Caetano do Sul (SP), familiares e amigos de Geovanna Viana, jovem negra de 19 anos atropelada em alta velocidade por um veículo de luxo, organizaram uma manifestação na avenida Presidente Kennedy, onde ocorreu a tragédia, para homenagear a jovem e denunciar sua morte e a impunidade do assassino.

Geovanna foi morta enquanto estava indo comprar um refrigerante acompanhada de mais três pessoas, que presenciaram seu atropelamento por um Mitsubishi Lancer branco. Segundo testemunhas e perícia inicial, seu dono o dirigia bêbado a uma velocidade de cerca de 150 km/h em uma avenida com limite de 50 km/h. Identificado como culpado, ele é um homem branco de 35 anos que exerce a profissão de engenheiro. Seu teste de bafômetro, realizado pela polícia somente cinco horas depois do ocorrido, constatou 0,09 mg de álcool por litro de sangue, média que se enquadra em uma infração severa.

A polícia registrou o caso como homicídio culposo, denominação dada quando o culpado tira a vida da vítima sem a intenção de fazê-lo. No entanto, essa acusação foi questionada pelos manifestantes.

Segundo Julyver Modesto, mestre em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) e em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública pelo Centro de Altos Estudos de Segurança, no site da CTB Digital, quando a pessoa, premeditadamente, ingere bebida alcoólica, para, sob seu efeito, praticar um crime, entende-se presente o dolo, pois o que se avalia é a liberdade de ação no momento em que se decidiu por aquela conduta.

A Avenida Presidente Kennedy é um dos pontos mais movimentados de São Caetano do Sul, sendo bastante frequentada por famílias. Contudo, também é muito conhecida a prática de “rachas” na via.

A falta de comprometimento do Estado em culpabilizar devidamente um homem bêbado dirigindo a uma velocidade três vezes maior que a permitida indignou os familiares e amigos da vítima, que prestaram depoimentos ao jornal A Verdade na manifestação do dia 18/5.

Relatos de indignação

Pamella Lopes, integrante do mesmo grupo de dança que Geovanna e sua amiga próxima, nos relatou: “Sinto um misto de luto com raiva, pois no noticiário está escrito ‘homicídio culposo’, o que não faz sentido, afinal ele [o culpado] assumiu a responsabilidade assim que se embebedou e começou a dirigir em alta velocidade. É um absurdo pensar que a nossa vida vale isso. Sentiremos muitas saudades em ter ela nos ensaios. Era uma vida nova e foi completamente interrompida. Ela já tinha uma festa surpresa que estávamos preparando para os seus 20 anos. Tinha acabado de começar a namorar. Estava iniciando seu TCC do técnico.”

Já Bruna Biondi, vereadora do PSOL no município, afirmou: “Agora que esse assassinato aconteceu, o nosso comprometimento é na luta por justiça e por memória. Memória para que Geovanna e seu caso não caiam no esquecimento. Justiça para que o caso não caia na impunidade e, então, a família possa ter ao menos o conforto em saber que o responsável foi devidamente punido, além de servir para que a prefeitura de São Caetano do Sul pare de ser negligente com os casos rodoviários no município, que têm um recorte claro de classe, pois as vítimas injustiçadas são, justamente, a classe trabalhadora periférica e negra. Portanto, a luta continuará por justiça para Geovanna.”

Por sua vez, Rogério Padial, grafiteiro responsável pelo mural em homenagem a Geovanna feito no ato do dia 18, ofereceu o seguinte depoimento ao jornal A Verdade: “Quando recebi a notícia, eu fiquei bem mexido pelo fato ter ocorrido perto da minha casa, pois poderia ter acontecido com alguém que eu amo, então tomei a decisão de que iria fazer um grafite independente dos apoios, porque acho que não poderia ter passado em branco. Afinal, Geovanna era uma menina preta e periférica que saiu do Jardim Ângela, um lugar considerado violento, para ser assassinada na ‘cidade de primeiro mundo’, no ‘IDH padrão.’” O braço armado deste Estado, em uma tentativa clara de desresponsabilização, alegou que o culpado não tinha intenção em assassinar ninguém.

Os prantos de uma família que tem seus sentimentos estilhaçados por uma perda tamanha deveriam ser acolhidos pelo poder público. Contudo, a prefeitura do município se omitiu de dar qualquer declaração sobre o caso e ainda planejava boicotar a realização da manifestação alegando ser proibida a ocupação da avenida. Mas os movimentos sociais, família e amigos de Geovanna mantiveram o evento cultural no dia 18 de maio para arrecadar fundos, denunciar o constante assassinato da juventude e defender o direito dos pedestres de circularem em vias públicas sem correrem risco.

Juvenal dos Santos, tio de Geovanna, em relato ao jornal A Verdade, declarou: “Queremos denunciar esse caso para que ele não seja mais uma estatística. Hoje foi a Geovanna, amanhã pode ser outra Geovanna e depois outra. O sentimento da gente é de descaso por parte do poder público. Em momento algum tivemos apoio de alguém. Essa tragédia veio muito de repente e não ter o apoio de ninguém é duro.”

Porque os negros morrem mais?

Segundo o Atlas da Violência, a cada dez pessoas assassinadas no Brasil, oito são negras. Esse dado e o caso de Geovanna não devem ser vistos como desconexos. O que garante a perpetuação dessa gravíssima segregação é a impunidade garantida pela Justiça brasileira, que dá o aval para que a burguesia mate pessoas negras livremente.

Nesse sentido, o Estado e seus poderes se revelam enquanto agentes dessa classe dominante, agindo a seu favor e perpetuando a exploração da classe trabalhadora, marcada sempre pela violência. O recente “Caso Porsche” é outra evidência dessa realidade, no qual um empresário dirigindo seu carro de luxo a 150 km/h assassinou um motorista de aplicativo e, mesmo assim, a Justiça negou seu pedido de prisão.

Só a luta popular poderá garantir justiça por Geovanna. A mobilização deve ter como objetivo não apenas a pressão para que se declare doloso o homicídio realizado pelo culpado, mas também um horizonte de lutas anticapitalistas para por um fim ao genocídio do povo negro.

Educação: Proposta do governo revolta servidores federais e greve continua

70 dias após o início da greve, governo continua sem atender às demandas dos Técnicos Administrativos das instituições federais de ensino. Servidores manterão a luta pela recomposição salarial e do orçamento da Educação.

Esteban Crescente | Rio de Janeiro


TRABALHADOR UNIDO – No dia 21 de maio, ocorreu a 5ª mesa de negociação nacional das entidades representativas da categoria dos Trabalhadores Técnicos Administrativos em Educação (TAE) das universidades e institutos federais, que estão em greve. A reunião contou com a participação da Fasubra e do Sinasefe, representando os servidores públicos, e do Ministério de Gestão e Inovação (MGI), que respondia pelo Governo Federal.

Na discussão, a proposta apresentada pelo governo teve ampliação de apenas 1,5% no índice linear de reajuste no vencimento básico da categoria. Na mesa anterior, de 19 de abril, o governo havia indicado 0% de reajuste em 2024, 9% em 2025 e 3,5% em 2026. Com a nova proposta, o percentual de 2026 muda para 5%. A situação indignou os milhares de trabalhadoras e trabalhadores presentes na marcha unificada de TAEs que acompanhou a mesa de negociação.

Após mais de um mês de espera, o governo não mudou quase nada no orçamento destinado à reestruturação da Carreira dos TAEs, mantendo o reajuste zero em 2024. O objetivo do governo é evitar a todo custo o reajuste dos salários dos servidores neste ano para poder gastar mais dinheiro com o pagamento dos juros da dívida pública, que financia banqueiros do Brasil e do exterior.

Para piorar o quadro, durante a negociação, o mediador do MGI disse que esta seria a última proposta e solicitou que as lideranças sindicais presentes desligassem seus celulares na reunião. Frente à primeira afirmação, a bancada dos trabalhadores afirmou que não aceita ultimatos e que negociará sob comando das bases em greve. Além disso, os sindicalistas não aceitaram a imposição sobre seus aparelhos pessoais.

A revolta da categoria se dá pelo alto grau de desvalorização salarial e endividamento destes trabalhadores. Os técnicos administrativos em educação amargaram 7 anos de congelamento salarial durante os governos Temer e Bolsonaro e já acumulam perdas de 52% em relação à inflação nos salários desde 2010.

A urgência de um reajuste em 2024 frente à piora das condições de vida da categoria levou os TAEs a reafirmarem de forma contundente a continuidade da greve. Uma das demandas das entidades na negociação é que o Presidente Lula se manifeste sobre os pleitos da base, considerando que esta é a maior categoria do serviço público.

Além da forte mobilização em Brasília dirigida pela Fasubra e o Sinasefe, um potente protesto com fechamento da pista de chegada ao aeroporto ocorreu em Maceió, liderado pelo Sintietfal (sindicato que representa o Instituto Federal de Alagoas), com pneus na estrada e apoio dos estudantes.

Greve de 70 dias é exemplo de mobilização

Com mais de dois meses de greve, a categoria que conta com mais de 200 mil membros entre ativos e aposentados faz um grande movimento nacional que impacta a conjuntura e inspira a classe trabalhadora, arrastando para a luta de rua outras dezenas de categorias de servidores federais. Em conjunto com os professores dos Institutos e Universidades federais (representados pelo sindicato Andes-SN), que também estão em greve há mais de um mês, os TAEs expõem os problemas da valorização de uma categoria fundamental para o acesso da população aos direitos sociais e também a necessidade de recomposição do orçamento das instituições de ensino federais.

A greve já contou com alguns ganhos: entre eles, os reajustes de 51% nos auxílios alimentação, creche e saúde. Apesar disso, a maior parte destes reajustes somente se aplicou aos servidores da ativa. A luta dos trabalhadores também forçou o governo a recompor R$ 342 milhões do orçamento dos institutos e universidades, o que é pouco frente ao necessário, mas só ocorreu devido a greve. Além disso, alguns itens da carreira foram acatados. 

Nas próximas semanas, as entidades representativas da categoria farão uma contraproposta ao governo e pretendem intensificar os atos e mobilizações de rua.

Para Clodoaldo Gomes, Coordenador de Educação da Fasubra e dirigente do Movimento Luta de Classes (MLC), “é necessário buscar ao menos a reposição da inflação em 2024, porque é um absurdo um trabalhador alcançar zero de reajuste. O governo precisa respeitar os TAEs, oferecendo pelo menos o mesmo montante de orçamento da proposta apresentada para os professores universitários na negociação.”

Já Yuri Buarque, Presidente do Sintietifal, diz que “existe uma estratégia de divisão da parte do governo de tentar um acordo com a categoria docente de forma isolada, para encerrar a greve e não ceder mais na disputa orçamentária”. Contudo, ele também revela que “a unidade das categorias está firme e os sindicatos de TAEs e Docentes firmaram a campanha conjunta ‘Sem TAEs não tem acordo!’, expressando a importância da solidariedade de classe”.

“Além disso, vemos como fundamental a reposição do orçamento para garantia do funcionamento das instituições de ensino para a população”, conclui Yuri.